Partido Comunista Português
Intervenção de Miguel Tiago na AR
Organização da escola pública
Quinta, 30 Abril 2009
educacao3.jpgEstas iniciativas, de facto, têm a virtude de nos trazer a possibilidade de aqui, na Assembleia da República, debatermos também o enorme fosso entre a propaganda do Governo, aquilo que o Governo faz os possíveis por passar na televisão e paga para que apareça nos jornais, aliás, tudo aquilo que já hoje foi, um pouco, abordado nesta sessão, e aquilo que, realmente, se passa nas escolas  


Princípios de organização da escola pública visando o reforço da equidade social e a promoção do sucesso educativo

Sr. Presidente,

Srs. Deputados:

Estas iniciativas (projecto de lei n.º 522/X e projecto de resolução n.º 439/X), de facto, têm a virtude de nos trazer a possibilidade de aqui, na Assembleia da República, debatermos também o enorme fosso entre a propaganda do Governo, aquilo que o Governo faz os possíveis por passar na televisão e paga para que apareça nos jornais, aliás, tudo aquilo que já hoje foi, um pouco, abordado nesta sessão, e aquilo que, realmente, se passa nas escolas.

É importante que não se esqueça que, embora exista um regime legal que o proíba, há um Ministério que permite uma elitização brutal e galopante do sistema de ensino português, uma elitização e uma triagem social que se expressam não só de escola para escola mas, muitas vezes, dentro das várias turmas da mesma escola, uma separação, uma triagem em função de resultados, das origens sociais, dos rendimentos familiares, da localidade e de muitas outras coisas, inclusivamente, bem conhecidas, até porque este problema já foi estudado em sede de Comissão de Educação e Ciência, nesta Assembleia da República.

Portanto, esta é uma realidade existente, que se verifica no terreno, que passa, obviamente, ao lado da propaganda do Governo, que tenta, por força, fazer-nos crer que combate a desigualdade no ensino.

Basta ir às escolas públicas portuguesas para verificar que isto não é verdade.

Com efeito, o que se está a fazer é a criar duas escolas públicas: uma escola pública para os filhos de quem pode pagar as explicações, de quem pode pagar os livros, de quem pode pagar as deslocações em viatura própria e uma escola para os outros, para aqueles que não podem pagar as explicações e que têm como única solução a de se encaminharem, directamente, para o mundo do trabalho precário, mal pago e sem nenhuns direitos.

Esta é, de facto, a escola pública que este Governo está a construir ou, melhor dizendo, é nisto que este Governo está a transformar a escola pública, subvertendo todo o edifício do ensino em Portugal, à margem da lei, à margem da Constituição da República e da Lei de Bases do Sistema Educativo. Por isso mesmo, esta iniciativa do Bloco de Esquerda contém um conjunto de princípios que são valiosos e que importa, de facto, trabalhar, não sem, no entanto, salvaguardar a necessidade de uma análise aturada em sede de especialidade, caso isso venha a ser possível, para limitar alguma excessiva burocracia que pode estar contida nesta iniciativa e que até pode, de alguma forma, funcionar como um estímulo negativo à autonomia dos estabelecimentos de ensino.

Sobre as actividades de enriquecimento curricular, a posição do Partido Comunista Português tem sido bastante clara: as actividades de enriquecimento curricular são uma ilegalidade, são uma marginalidade no quadro legal português e reflectem uma tendência que este Governo tem manifestado para a privatização de importantes dimensões do currículo escolar previsto na Lei de Bases do Sistema Educativo.

Não aceitamos nenhuma pequena transformação em torno das actividades de enriquecimento curricular que vise, no essencial, permitir que se continuem a privatizar partes importantes do currículo previsto na Lei de Bases do Sistema Educativo.

É urgente que o Governo chame a si a responsabilidade por uma resposta integrada, que possibilite aos pais mais e melhor acompanhamento dos seus filhos, ao invés de vir apresentar como solução para todos os problemas das famílias a abertura da escola como um «armazém», onde se podem «depositar» as crianças, sem preocupações para as famílias.

 O que é preciso é que os pais tenham tempo para acompanhar os seus filhos, o que é preciso é que, na escola, depois da escola, haja actividade lúdica e não mais escola.