Partido Comunista Português
Resposta a Pergunta escrita de Ilda Figueiredo no PE
Diferença entre preços nos produtores e os preços pagos pelos consumidores
Terça, 07 Abril 2009

A Senhora Deputada faz diversas perguntas sobre a acção da Comissão no contexto da diferença crescente, na União Europeia, entre os preços no produtor e os preços no consumidor.


A primeira pergunta diz respeito à apresentação de uma investigação e análise criteriosas da transmissão de preços e das margens existentes entre o preço na exploração agrícola e o preço no consumidor final. A Comissão tem investigado e analisado a diferença entre o preço dos géneros alimentícios no produtor e no consumidor, assim como os mecanismos de transmissão dos preços ao longo da cadeia de abastecimento alimentar, e gostaria de recordar que, ao avaliarem-se as repercussões dos preços dos produtos agrícolas de base e dos preços no produtor, há que estabelecer uma distinção entre intensidade e rapidez da repercussão. Estes dois factores são influenciados, designadamente, pelas condições do mercado. A Comissão estudou recentemente o grau de repercussão e de inércia dos preços na cadeia de abastecimento alimentar1. A análise efectuada confirmou, por um lado, a existência de diferenças ao nível da estrutura de custos entre os mercados alimentares dos Estados Membros e, por outro, que esses mercados parecem ter reagido diversamente às oscilações dos preços. Uma vez que a estrutura de custos do sector alimentar varia bastante de Estado Membro para Estado Membro, o impacto das variações nos preços à partida é também diferente. São factores importantes neste contexto o grau de desenvolvimento tecnológico do país e a estrutura do seu sector alimentar.


Importa também salientar que há muito tempo que a parcela correspondente ao valor dos produtos agrícolas nos preços dos géneros alimentícios no consumidor tem vindo a diminuir. Devido a factores estruturais (ligados à queda dos preços na exploração agrícola em consequência do aumento da produtividade) e à importância crescente dos géneros alimentícios transformados na alimentação europeia, é muito provável que essa parcela continue a baixar. Os mecanismos de transmissão dos preços variam consideravelmente de sector para sector, de país para país e de produto para produto e dependem de muitos factores, nomeadamente da distribuição do poder negocial ao longo da cadeia de abastecimento alimentar, do quadro legislativo e das práticas contratuais entre os retalhistas e os produtores alimentares. A transmissão dos preços depende ainda de factores que as políticas seguidas não influenciam, como a perecibilidade dos géneros alimentícios e as preferências dos consumidores. Há, por conseguinte, que ser cauteloso ao tentar tirar conclusões gerais neste domínio.


Como será do conhecimento da Senhora Deputada, a Comissão adoptou em Dezembro de 2008 uma Comunicação sobre os preços dos géneros alimentícios2. Essa comunicação visa melhorar o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar na Europa, de modo a oferecer preços permanentemente concorrenciais aos europeus. Para isso, propõe um quadro geral de acção, sob a forma de um roteiro a pôr em prática ao nível dos Estados Membros e da União Europeia com o envolvimento activo de todas as partes interessadas. Numa perspectiva de política de concorrência, a comunicação de Dezembro de 2008 identifica as práticas com incidências no sector retalhista alimentar que, em determinadas circunstâncias, podem justificar uma avaliação mais aprofundada segundo critérios de concorrência. Nesse contexto, a Comissão e as autoridades nacionais da concorrência vigiarão tais práticas, tomando em consideração as implicações das mesmas, a longo prazo, nos interesses dos consumidores. Dado que é frequentemente atribuído âmbito nacional aos mercados retalhistas, as autoridades nacionais da concorrência estão igualmente bem colocadas para agir em caso de práticas contrárias à concorrência que afectem o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar.


A comunicação referida também visa uma melhor transparência de preços ao longo da cadeia de abastecimento e informar melhor os consumidores. Na sequência da comunicação, irão acompanhar se em pormenor uma série de preços comparáveis de géneros alimentícios no consumidor, bem como o processo de repercussão ao longo da cadeia alimentar.


O painel de avaliação dos mercados de consumo publicado em Fevereiro de 2009 (http://ec.europa.eu/consumers/strategy/facts_en.htm) compara igualmente os preços de 26 géneros alimentícios (incluindo bebidas não-alcoólicas) comparáveis em toda a União Europeia.

Está previsto que nas futuras edições, anuais, desse painel seja comparado um leque mais alargado de preços de géneros alimentícios.


A segunda questão refere-se ao fomento de um contacto mais amplo e directo entre os produtores e os consumidores. A Comissão dispõe de vários instrumentos políticos com esse objectivo, seja no âmbito da sua política geral de informação e promoção de produtos agrícolas, seja no quadro da sua política de mercado, que incentiva os agricultores a constituírem organizações de produtores e/ou a aumentar o papel das mesmas.


A reforma de 2007 da organização de mercado no sector das frutas e produtos hortícolas simplificou, flexibilizou e tornou mais atractivo o regime das organizações de produtores. Um dos objectivos é o reforço do poder negocial do produtor em relação aos outros agentes do mercado. Por outro lado, a Direcção Geral da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (DG AGRI) tem a funcionar um sistema de grupos de prospectiva, constituídos por peritos, numa série de produtos fundamentais. Os membros desses grupos são originários de diversos agentes do mercado ao longo da cadeia: produtores, importadores, grossistas e, futuramente, também retalhistas. Esses peritos debatem a evolução dos mercados, mas também trocam pontos de vista sobre aspectos do sector com interdependências, como o aumento dos custos na produção e as margens nos diversos níveis da cadeia. Por outro lado, o grupo consultivo para o sector das frutas e produtos hortícolas, que reúne duas vezes por ano, conta com a participação de organizações de consumidores. A DG AGRI também colige e analisa os preços no produtor da maior parte das frutas e produtos hortícolas nos Estados Membros. Pondera-se actualmente um alargamento aos produtos (semi)transformados e aos preços de retalho.


As organizações de produtores também desempenham um papel importante no âmbito da organização do mercado vitivinícola3. Um dos objectivos principais da recente reforma do sector vitivinícola é favorecer a produção de vinhos de melhor qualidade. O artigo 64.º do Regulamento (CE) n.º 479/2008 do Conselho estabelece as condições de reconhecimento das organizações de produtores pelos Estados Membros. Entre essas condições contam-se a necessidade de as organizações de produtores perseguirem determinados objectivos específicos, como a adaptação conjunta da produção aos requisitos do mercado e o melhoramento dos produtos (subalínea i) da alínea c) do artigo 64.º).


No terceiro ponto, a Senhora Deputada pergunta à Comissão que medidas estão a ser tomadas para reforçar o conceito de «alimentação local», apoiando os mercados tradicionais, onde há um contacto directo entre produtores e consumidores. A Comissão já promove as produções locais através dos sistemas UE de rotulagem DOP (Denominação de Origem Protegida) e IGP (Indicação Geográfica Protegida). O logotipo DOP, nomeadamente, garante que todas as etapas da produção decorreram na zona delimitada.


A Comissão lançou recentemente várias iniciativas ligadas à questão da produção local de géneros alimentícios transformados e não-transformados:


    - A proposta de revisão4 da Directiva 2000/13/CE, relativa à rotulagem geral dos géneros alimentícios, que propôs critérios relativos à declaração voluntária do país de origem ou do local de proveniência.

    - A proposta de aplicação do rótulo ecológico aos géneros alimentícios transformados e aos produtos da pesca e da aquacultura5.

    - Uma consulta iniciada em 15 de Outubro de 2008, na sequência da adopção do Livro Verde6, sobre a política de qualidade dos produtos agrícolas. A consulta pretendia obter respostas a 19 perguntas, que contemplavam muitos aspectos referidos pela Senhora Deputada. A DG AGRI recebeu 560 contribuições, que estão ser analisadas. O Livro Verde, bem como as perguntas colocadas e as respostas recebidas, podem ser consultados no seguinte endereço:

    http://ec.europa.eu/agriculture/quality/policy/index_en.htm.

     

Embora o Livro Verde não incida na questão do apoio aos mercados tradicionais, as alterações ao relatório do Parlamento sobre o Livro Verde (do qual é relatora a Deputada Maria Petre), adoptado na sessão plenária de 10 de Março de 2009, solicitam a adopção de tais medidas. A Comissão terá isso em conta na sua reflexão sobre o assunto.


Ao procurar reforçar o conceito de «alimentação local», há que ver em que medida os consumidores são capazes de compreender e absorver efectivamente a informação. A economia comportamental chama a atenção para o facto de que o excesso de informação não ajuda os consumidores a decidir. No que respeita a rotulagem, é, portanto, essencial informar os consumidores com criatividade, em vez de simplesmente lhes transmitir mais informação.


O último ponto relaciona-se com um estudo mais aprofundado sobre a criação de um rótulo especial para produtos agrícolas europeus que garanta um tratamento justo dos participantes no mercado em toda a cadeia de produção e de distribuição. O Livro Verde sobre a qualidade dos produtos agrícolas já continha algumas perguntas específicas sobre estas questões (perguntas 14 a 18). Dado que a Comissão ainda está a analisar as respostas que recebeu, não lhe é neste momento possível responder a este ponto com base nas contribuições recebidas durante a consulta. Foi apresentado um relatório com as principais conclusões na conferência organizada pela Presidência Checa em Praga, em 12 e 13 de Março de 2009. Se se verificar haver muito interesse numa iniciativa do tipo da que a Senhora Deputada refere, a Comissão ponderará se é oportuno avançar nesse sentido.


1 Documento de trabalho dos serviços da Comissão intitulado «The functioning of the food supply chain and its effects on food prices». Documento de acompanhamento da Comunicação «Preços dos géneros alimentícios na Europa».

2 COM(2008) 821 final.

3 Regulamento (CE) n.º 479/2008 do Conselho, de 29 de Abril de 2008, relativo à organização comum do mercado vitivinícola, que altera os Regulamentos (CE) n.º 1493/1999, (CE) n.º 1782/2003, (CE) n.º 1290/2005, (CE) n.º 3/2008 e que revoga os Regulamentos (CEE) n.º 2392/86 e (CE) n.º 1493/1999 (JO L 148 de 6.6.2008).

4 Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à informação sobre os géneros alimentícios prestada aos consumidores, COM(2008) 40 final.

5 Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a um sistema comunitário de rótulo ecológico, COM(2008) 401 final.

6 Livro Verde sobre a qualidade dos produtos agrícolas: normas aplicáveis aos produtos, requisitos de produção agrícola e sistemas de qualidade, COM(2008) 641 final.