Partido Comunista Português
"Revisão da Estratégia de Lisboa"
Ilda Figueiredo no "Semanário"
Sexta, 11 Março 2005

Esta semana estiveram em debate no Parlamento Europeu temas da maior importância para Portugal, designadamente a situação social na União Europeia, a revisão da Estratégia de Lisboa e as orientações para o futuro da investigação.

Ora, a verdade é que estamos longe do crescimento económico e do emprego do final dos anos noventa, consequência das políticas económicas e financeiras restritivas do Pacto de Estabilidade, das liberalizações e privatizações aceleradas e da flexibilidade laboral previstas na Estratégia de Lisboa, de um alargamento mal preparado e deficientemente financiado.

Quanto ao desemprego, cuja taxa média ronda 9%, embora nas mulheres atinja os 10% e nos jovens mais de 18%, há situações particularmente graves na Polónia com quase 19% de desemprego global, Eslováquia com cerca de 16%, a que se seguem a Lituânia e Espanha com cerca de 11%. Mas noutros países, como Portugal, há regiões onde a percentagem de desemprego já ultrapassa estes valores mais elevados.

O emprego existente é cada vez mais precário, e mulheres são as principais vítimas da precariedade. Em média, na União Europeia, em cada três empregos permanentes e a tempo inteiro, apenas um é ocupado por mulheres, as quais também continuam a ser vítimas de discriminação salarial directa e indirecta, com diferenças salariais que, em média, variam entre 16 e 33 por cento.

Esta situação demonstra que não estão a ser suficientes as estratégias definidas relativamente ao crescimento do emprego de qualidade e com direitos, porque, em nome da competitividade, se tem insistido nos dogmas do neoliberalismo, nas prioridades do Banco Central Europeu, na aplicação irracional dos critérios de convergência nominal do Pacto de Estabilidade, na aceleração das liberalizações e privatizações, na flexibilidade e na desregulamentação laboral. Impõe-se, pois, a revogação do Pacto de Estabilidade e a sua substituição por um verdadeiro Pacto de Desenvolvimento e Emprego, que dê prioridade ao crescimento de empregos de qualidade e com direitos e aposte na revisão profunda da Estratégia de Lisboa, eliminando as liberalizações e a desregulamentação laboral, dando toda a prioridade ao emprego com direitos e à inclusão social. Registe-se que é necessário criar cerca de 22 milhões de novos empregos com direitos para atingir, em 2010, a meta de 70% de emprego global definida em Lisboa, em 2000.

Há enormes desigualdades, com vários Estados-Membros a apresentar médias de rendimento por habitante inferiores a 51% da média comunitária, enquanto dez países têm valores superiores a 100% da média. Entretanto, os 20% da população com mais altos rendimentos recebe cinco vezes mais do que os 20% da população com mais baixos rendimentos, embora este indicador varie entre 3% na Dinamarca e 6,5% em Portugal.

Há mais de 15 % da população da União Europeia em situação de pobreza, mas nalguns países essa situação atinge 20 por cento ou mais, como Portugal, Grécia e Irlanda. Só a protecção social e as prestações da segurança social impedem o agravamento desta situação. Sem as diversas transferências sociais, incluindo pensões e outros apoios, o risco de pobreza atingiria, em média, entre 30% da população da Finlândia, 37% em Portugal, 40% na França e Reino Unido e 42% na Itália.

Isto coloca a questão da prioridade que deve ser dada à inclusão social nas diversas políticas comunitárias, designadamente nas políticas monetária e do mercado interno, para defender serviços públicos de qualidade, dando prioridade a investimentos públicos na saúde, educação, formação, alojamento e protecção social. Por isso, é preciso que a Comissão retire a sua proposta de directiva sobre a criação do mercado interno dos serviços e não insista em novas desregulamentações na organização do tempo de trabalho.

Igualmente se impõem medidas que condicionem as fusões de empresas e deslocalizações de multinacionais, que apoiem os sectores produtivos e as micro, pequenas e médias empresas, combatam as discriminações existentes, promovam a igualdade e a democracia participativa, contribuam para a redução do horário de trabalho sem perda de remuneração, de forma a facilitar a criação de mais empregos, de conciliar o trabalho com a vida familiar, assegurar a formação e educação ao longo da vida.

A nova Agenda de Política Social não pode ser um mero conjunto de palavras e afirmações sem conteúdo prático. É essencial que seja assegurada uma partilha da riqueza criada para garantir o crescimento do bem-estar para todos, o que pressupõe que os sistemas de protecção social sejam públicos e universais, não se insista no aumento da idade da reforma e se garanta a todos, incluindo crianças, idosos, pessoas com deficiência e respectivas famílias, o acesso a serviços públicos de qualidade.