Partido Comunista Português
Cirurgia Ambulatória - Intervenção de Bernardino Soares na AR
Sexta, 22 Fevereiro 2008

Promoção da Cirurgia Ambulatória

 

Sr. Presidente e Srs. Deputados:

Este projecto de resolução (projecto de resolução n.º 244/X) propõe uma medida com a qual, certamente, todas as bancadas estão de acordo. Ela é óbvia e evidente, não tem nenhuma especificidade própria, trata-se de uma matéria importante.

É evidente que as cirurgias ambulatórias significam a possibilidade de resolver, quando se pode aplicar, de uma forma mais rápida e mais simples, um conjunto de casos clínicos e cirúrgicos, garantindo uma maior comodidade para os utentes e para as suas famílias. Esse factor deve ser valorizado. Mas esta questão, merecendo o nosso acordo, não pode deixar de ter também alguns comentários.

O primeiro é que convém não fazer o que fez o governo PSD/CDS, que foi utilizar o aumento da cirurgia ambulatória como um instrumento estatístico para mascarar a falência da recuperação das listas de espera em geral e procurar mostrar um aumento de produtividade que não tinha, em rigor, correspondência com a realidade.

Foi o que aconteceu no governo PSD/CDS, muito à custa das alterações estatísticas de contabilização da cirurgia ambulatória. Portanto, essa questão tem de acautelada.

Convém ter também muito cuidado com os critérios de financiamento das unidades hospitalares em matéria de cirurgia ambulatória por contraposição com as restantes cirurgias. O que temos vindo a assistir nos últimos anos é que o justo incentivo que foi dado às cirurgias ambulatórias levou a que, nalguns casos, muitos hospitais descurassem as restantes cirurgias, porque se tornava mais rendível, do ponto de vista do financiamento, fazer muitas cirurgias ambulatórias, pois eram mais fáceis e exigiam menos recursos e menos disponibilidade de profissionais e de meios, em contraposição com a maior complexidade das restantes cirurgias.

Portanto, quem determina os incentivos nesta matéria não pode deixar de ter em atenção que o incentivo à cirurgia ambulatória não pode ser utilizado perversamente como desincentivo às restantes cirurgias mais complexas, até porque essas, as que não podem ser feitas em ambulatório, são as mais graves, as que mais directa e rapidamente põem em risco, de forma mais grave, a vida e a saúde das pessoas, pelo que não podem ser prejudicadas pelo aumento da cirurgia ambulatória. Seria um absurdo que este aumento justo, que agora é proposto pelo CDS, se traduzisse numa paralisação da recuperação das listas de espera das restantes cirurgias, deslocando-se sobretudo para esta área os recursos que existem.

Esta precaução é muito importante e tem de ser tida em conta. Espero que o Governo altere a situação que temos em cima da mesa.

Finalmente, queria referir-me ainda, com a licença do CDS, a uma matéria que não tem a ver com este projecto de resolução em concreto mas com a afirmação ontem feita pelo Sr. Ministro das Finanças, de que, com este Governo, nos últimos anos, tinha diminuído o gasto dos utentes com medicamentos.

Ora, consultámos a estatística apresentada pelo Infarmed - não é a estatística do PCP! - relativa à evolução do mercado dos medicamentos no Serviço Nacional de Saúde entre 2005 e 2006 e constatámos que os encargos públicos do Serviço Nacional de Saúde com medicamentos diminuíram, neste período, 24 milhões de euros, o que significou uma diminuição de 1,6%. Mas o que é que aconteceu aos encargos para os utentes? Os encargos para os utentes aumentaram no mesmo período, entre 2005 e 2006, mais 39 milhões de euros, mais 5,8%!

Portanto, toda a propaganda que andamos a ouvir desde o início da Legislatura, designadamente ontem neste Plenário, de que o Governo estava a fazer baixar os custos dos medicamentos para os utentes é falsa, e essa falsidade está agora demonstrada não já pela sensibilidade das populações ao problema e pelas afirmações dos partidos da oposição nesta Casa mas pela estatística oficial da entidade reguladora deste sector.

Repito: no período entre 2005 e 2006, os utentes pagaram mais quase 40 milhões de euros e tiveram, portanto, um aumento dos seus gastos em quase 6%. Esta realidade tem de ser posta aqui muito claramente, desmentindo a propaganda falsa e mentirosa que foi feita, ainda ontem, no Plenário da Assembleia da República!

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Ana Manso,

Não, não foi distracção.

O ex-ministro do seu partido Luís Filipe Pereira é que utilizou o aumento de cirurgias ambulatórias para «mascarar» a falta de resolução das restantes cirurgias.

Essa é que é a realidade, Sr.ª Deputada!

Repito: é muito bom que se incentive a cirurgia ambulatória, não há nenhuma questão em relação a isso e as medidas que foram ou que venham a ser tomadas nesse sentido são positivas. O que não se pode é fazer isso à custa das restantes cirurgias!

Porque as restantes cirurgias, as mais complexas, as mais difíceis, as que exigem mais recursos e mais complexidade de intervenção, são normalmente as mais graves, aquelas que mais perigo têm para a saúde e para a vida das populações.

A lista de espera não é apenas uma estatística quantitativa, tem de ser alvo de uma análise qualitativa. E, se temos de fazer crescer, como propõe o projecto do CDS, a cirurgia ambulatória no Serviço Nacional de Saúde, temos de garantir que esse crescimento não é feito à custa das restantes cirurgias. Esse ponto é fundamental, quando não teremos um efeito perverso de uma medida que se pretende positiva.