Partido Comunista Português
Política de trabalho e segurança social - Intervenção de Jorge Machado na AR
Quinta, 20 Abril 2006

Debate sobre política de trabalho e segurança social

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social

O Sr. Ministro fez referência a um «acordo» quanto às alterações ao subsídio de desemprego. Em bom rigor, o que aconteceu foi que foram consensualizados alguns aspectos onde o Governo aceitou as propostas dos parceiros sociais.

Apesar disso, o último texto proposto não passa de um conjunto de princípios e generalidades que importa concretizar e verter em diploma legal, que, na nossa opinião, deve ter a forma de proposta de lei e não de decreto-lei.

Não podemos deixar de salientar, para já, a nossa preocupação quanto a diminuição do apoio aos desempregados. Isto porque, com as novas regras, o período de tempo a que o desempregado tem direito ao subsídio depende não de toda a carreira contributiva mas, sim, do tempo que decorre desde a última vez que esteve desempregado. Com os níveis de precariedade que existem em Portugal, facilmente se percebe que esta medida visa reduzir o tempo a que os desempregados têm direito ao subsídio de desemprego e, assim, poupar dinheiro à custa de uma menor protecção social.

O Sr. Primeiro-Ministro disse que o acordo representa «um elemento de confiança e de esperança na redução do desemprego». Sr. Ministro, em que medida vão estas alterações reduzir o desemprego? Quantos postos de trabalho vai o subsídio de desemprego criar, Sr. Ministro?

Vão os trabalhadores da Panibel, em Lisboa, vão os trabalhadores da Triveni, em Gondomar, ou os trabalhadores da Sorefame recuperar os seus postos de trabalho por causa das novas regras do subsídio de desemprego?

Segunda questão: quando se fala da redução do número de desempregados no País é importante saber se essa redução se está a efectuar à custa de engenharia estatística ou não.

Por exemplo, seria bom que o Sr. Ministro informasse quantos desempregados estão a prestar funções permanentes na segurança social ao abrigo dos POC. Sabemos que existem desempregados que estão a exercer funções permanentes, por exemplo, no processamento de dados sobre desempregados e, até, no atendimento ao público. É preciso saber quantos desempregados, ao abrigo dos POC, estão a trabalhar na Administração Pública.

Sr. Ministro, fomos recentemente confrontados com estudos que vêm confirmar aquilo que já todos nos receávamos: o número de idosos vítimas de abandono e de abuso é preocupante. Outro facto preocupante é a informação de que a maior parte destes abusos se verificam no seio da família Infelizmente, tínhamos razão quando afirmámos que a solidariedade familiar não se impõe por decreto e que há situações em que são os próprios familiares a causa do abandono dos idosos e, por isso, importava corrigir as regras de atribuição do complemento solidário para idosos. Infelizmente, a maioria socialista assim não entendeu e rejeitou as propostas do PCP, pelo que pergunto ao Sr. Ministro como é que vai resolver o problema da atribuição do complemento solidário para idosos em casos de vítimas de abandono e abuso. Vai exigir que o idoso peça aos seus familiares que entreguem as declarações de IRS?

Vai exigir que os idosos vítimas de abusos intentem acções contra os seus familiares? Já imaginou o Sr. Ministro as consequências desses actos?

Sr. Ministro, tivemos conhecimento de um facto que nos deixou muito preocupados. Por circular do Sr. Procurador-Geral da República, este informa que existe um elevado número de menores institucionalizados ilegalmente. Os dados disponíveis permitem-nos afirmar que existem cerca de 2440 crianças entregues ilegalmente às instituições.

Na verdade, existem casos em que são as famílias que entregam directamente as crianças às instituições, mas existem outras situações onde as comissões de protecção de menores entregam os menores sem comunicar esse facto ao Ministério Público, logo sem qualquer processo de promoção e protecção.

Veja-se a situação do distrito de Vila Real, Sr. Ministro, onde 58% das crianças institucionalizadas não tinham qualquer controlo judicial. Isto é, são 2440 crianças entregues em instituições que fogem ao controlo da lei, encontrando-se estas crianças num limbo jurídico e, consequentemente, com menos garantias quanto à defesa dos seus direitos e quanto a sua protecção.

A falta de formação e de meios das comissões de protecção de menores e a crescente desresponsabilização do Estado são os responsáveis por esta situação. Que medidas vai o Governo tomar para pôr cobro a esta situação?

Sr. Ministro, surgiu recentemente na comunicação social a informação dada pela Associação Nacional de Empresas de Segurança de que cerca de metade das empresas deste sector não cumprem as suas obrigações com a segurança social. Que medidas vai o Sr. Ministro tomar para pôr cobro a esta situação?

Sr. Ministro, para terminar, a falta de recursos humanos e materiais, bem como a utilização abusiva de contratos precários nos centros regionais de segurança social, leva a que se verifiquem atrasos nas prestações, como o fundo de garantia salarial, que em Braga conta com atrasos de dois anos, e do rendimento social de inserção, que no Porto tem atrasos de cerca de seis meses. Considera estes atrasos aceitáveis, Sr. Ministro? Que medidas vai tomar, uma vez que essas prestações são prestações de emergência?

(…)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr. as e Srs. Deputados,

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social disse, quanto ao subsídio de desemprego, que o decreto-lei não tem de ser discutido em sede de concertação social. Lamentamos que o Governo opte por um decretolei, quando podia, e devia, optar por uma proposta de lei, trazendo, assim, a discussão desta importante questão, que tanto afecta os portugueses, a esta Assembleia.

Sr. Ministro, porque é que tem medo de trazer à Assembleia da República esse diploma?

Porque não apresenta uma proposta de lei? Tem medo do contraditório, Sr. Ministro?

Sr. Ministro, está em curso nas empresas e locais de trabalho uma violenta acção das organizações patronais, que procuram eliminar a contratação colectiva e os direitos que esta consagra; viola-se o direito à greve e o direito da organização e acção sindical; promovem-se acções repressivas sobre os dirigentes e activistas sindicais, chegando-se, em alguns casos, a chamar-se a GNR e a PSP, usando-as como instrumentos dessas acções ilegais. Da Cimpor à Repsol, da Lusosider ao Hotel Tivoli, os exemplos não param. Enquanto isto está a acontecer, o Sr. Ministro e os seus serviços tomam que atitude?

«Lavam as mãos»? O que é que faz a Inspecção-Geral do Trabalho? Como usa os meios que tem ao seu dispor para actuar, fiscalizar e impedir estes atropelos?

O Sr. Ministro, depois de ter dado o dito por não dito quanto à alteração do Código do Trabalho, promoveu algumas alterações ditas urgentes, parte das quais vem ainda agravar em vários aspectos, dizendo que o Governo iria, daqui a um ano, promover as alterações globais ao Código do Trabalho. Passou-se esse ano e as alterações ao Código do Trabalho que o PS voltou a prometer perderam-se no tempo.

O Sr. Ministro dirá que não, que ainda na terça-feira passada divulgou um Livro Verde e anunciou um Livro Branco , mas, na verdade, as alterações que deviam estar clarificadas pelo Governo, ao fim de um ano são agora remetidas para o trabalho de uma comissão, que vai elaborar um Livro Branco com propostas que o Governo irá, posteriormente, analisar e discutir. Até quando? Qual é o prazo, Sr. Ministro?

Entretanto, na negociação do contrato colectivo da FAPEL, que abrange, entre outras empresas, a Renova, o mediador indicado pelo Ministério apresentou como proposta nada mais nada menos do que a proposta patronal. O que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre isto e o que é que se propõe fazer para evitar que esta organização patronal, boicotando a negociação, consiga fazer caducar a contratação, criar um vazio contratual e eliminar os direitos dos trabalhadores?

Sr. Ministro, as coisas hoje estão bastante mais claras. Já o sabíamos. Mas, agora, o responsável do Livro Verde sobre as Relações Laborais também veio declarar que a principal consequência do Código do Trabalho foi a diminuição da força negocial dos sindicatos.

É, assim, por demais evidente a necessidade de agir para com a legislação de trabalho, corrigindo os desequilíbrios nas relações laborais, defendendo os direitos dos trabalhadores, no respeito pelos princípios constitucionais, e confrontando aqueles que querem aprofundar os malefícios do Código. É isso que é preciso fazer com urgência. Qual é a posição do Sr. Ministro? É, mais uma vez, adiar ou é, mais uma vez, fazer um discurso de preocupação com os trabalhadores e juntar-se aos interesses das confederações patronais?