Partido Comunista Português
"Têxtil e cláusulas de salvaguarda"
Ilda Figueiredo no "Comércio do Porto"
Quarta, 18 Maio 2005

É conhecido que há muito tempo acompanhamos com preocupação a evolução do sector do têxtil e vestuário nacional, que temos, no âmbito da nossa intervenção política e institucional, chamado a atenção para a grave situação do sector e apresentado propostas visando a sua defesa, desenvolvimento e modernização. Sabe-se como, no Parlamento Europeu e na Assembleia da República, defendemos o accionamento das cláusulas de salvaguarda ao regime de importações, bem como exigimos medidas para responder às dificuldades que atravessa o sector e, particularmente, as regiões onde a sua existência é dominante. Recentemente, realizámos, em Guimarães, uma iniciativa que também preparou o debate desta semana na Assembleia da República e que, conjuntamente com a campanha nacional que o PCP vem promovendo em sua defesa, é o desenvolvimento natural da batalha que travamos conjuntamente com os trabalhadores, os micros, pequenos e médios empresários e as populações das regiões afectadas pela crise na defesa deste decisivo sector da nossa indústria nacional. Quando, há três ou quatro meses, face ao crescimento dos pedidos de licenciamento para importações de produtos têxteis e vestuário, se tornou mais evidente a dimensão do desastre e se passou a recear o pior, estávamos sós, no plano político, a chamar a atenção para a necessidade de se agir com urgência e tomar medidas para defender o que resta deste nosso sector da economia nacional. Como sublinhou Jerónimo de Sousa, no encontro de Guimarães, no passado dia 7 de Maio, enfrentámos, então, não só a arrogância dos ideólogos do liberalismo radical e dos seus tenores que, ao serviço dos grandes interesses económicos querem manter florescentes e em lugar de destaque na mesa do orçamento os seus negócios especulativos e de lucro fácil e rápido, mas também a irresponsável sobranceria de quem se diz de esquerda e com preocupações sociais. Uns e outros, tentaram e ainda tentam desvalorizar os esforços, como os que o PCP faz, na defesa da nossa economia nacional e dos sectores produtivos, deturpando e adulterando as nossas orientações e propósitos e identificando o esforço desenvolvido em defesa da indústria nacional, e no caso concreto, do nosso sector têxtil, de proteccionismo serôdio. Uns e outros quiseram fazer crer que nada havia a fazer e consideraram a defesa dos nossos sectores produtivos uma batalha perdida. Quem os ouve falar e escrever pensaria que a solução para a retoma do nosso processo de crescimento e desenvolvimento económico só poderia ser realizada a partir da ruína dos nossos sectores produtivos e das suas cinzas que o justo e necessário era abandoná-los à sua sorte. É verdade que estamos longe ainda de conseguir uma solução e as respostas adequadas para conter a sua crescente degradação e promover a viabilização do sector, mas é um facto indesmentível que, na agenda política e mediática e na consciência do país, o sector têxtil passou a ter outra visibilidade e crescem as preocupações face às consequências da sua implosão. Hoje estamos menos sós neste importante combate.

Sabe-se que depois da França, Grécia e Itália, também, timidamente, o Governo Português se decidiu a apoiar a abertura de um inquérito relativamente a 9 categorias de produtos têxteis e de vestuário, para as importações provenientes da China, com vista à eventual implementação de uma cláusula de salvaguarda.

No entanto, a importância da indústria têxtil e vestuário no nosso país não tem paralelo nos restantes países da União Europeia. Somos o país com maior volume de emprego no sector, com mais de 4% da população activa e quase 25% do emprego da indústria transformadora, contra, por exemplo, os 0,7% da França, o que, só por si, demonstra o comportamento do governo do PS face ao problema do acréscimo das licenças de importação têxteis da China e da exigência das medidas de salvaguarda previstas nos acordos da Organização Mundial de Comércio. Também é verdade que a França avançou mais rapidamente porque receia a ameaça do NÃO à constituição europeia no referendo do próximo dia 29 de Maio. A Comissão Europeia decidiu-se pela abertura do referido inquérito no final de Abril, através do Aviso publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 29/04/05, depois de verificar que houve aumentos de importações que, nalguns casos, atingiram mais de 500%.

Mas o processo é moroso e de conclusões ainda pouco claras. O inquérito correrá no prazo de 60 dias, que ainda poderão ser prorrogados por 10 dias úteis. Só então, se a Comissão concluir que estão reunidas as condições para a instituição de medidas de salvaguarda específicas aos produtos em causa, deve consultar o Comité dos Têxteis e decidir se apresentará um pedido de consultas formais com a República Popular da China. Isto significa que, na melhor das hipóteses, só já no verão muito adiantado poderemos ter a cláusula de salvaguarda accionada. O que, para alguns produtos, pode ser demasiado tarde. Ora, Portugal não pode garantir um desenvolvimento firme e sustentável, com elevada criação de riqueza, sem a existência de uma indústria transformadora forte e com um perfil de especialização avançado e produções de elevado valor acrescentado. Por isso, insistimos na cláusula de salvaguarda e nos programas e medidas concretas de apoio ao sector, às PME e à revitalização das zonas atingidas.