Partido Comunista Português
"As ameaças sobre o sector têxtil"
Ilda Figueiredo no "Semanário"
Sexta, 17 Dezembro 2004

A poucos dias da eliminação das quotas existentes no comércio internacional de têxteis e vestuário, é enorme a preocupação com o futuro de milhares de empresas e mais de 2,5 milhões de trabalhadores concentrados fundamentalmente nos países do sul da União Europeia, sector que já perdeu mais de um milhão de empregos nos últimos dez anos.

Foi desta forma que, esta semana, iniciei uma intervenção no debate que se realizou no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, sobre o Conselho de 17 de Dezembro, lamentando que não se tenha realizado, no Parlamento, o debate que solicitámos sobre este problema da maior importância, porque consideramos essencial executar medidas adequadas, e não apenas enunciar possíveis acções, para evitar o encerramento de empresas, o desemprego de milhares de trabalhadores e a ameaça de pobreza e exclusão social que paira sobre extensas zonas de forte concentração destas indústrias, como acontece em Portugal.

Daí, a pergunta que, mais uma vez, fiz:

- Como irão ser tidas em conta as consequências da abolição do sistema de quotas nos países de maior concentração da indústria têxtil e de vestuário, de forma a impedir o agravamento do desemprego e defender esta indústria tão importante?

Como se sabe, este mês, o Conselho adoptou uma proposta de Regulamento da Comissão Europeia que eliminará, a partir de 1 de Janeiro de 2005, todas as restrições quantitativas sobre a importação de produtos têxteis de vestuário dos países da Organização Mundial de Comércio - OMC.

Ora, para Portugal, sobretudo Norte e Beiras, é particularmente importante e preocupante a evolução da situação, sabendo-se que o sector emprega mais de 200 mil trabalhadores efectivos directos em 4000 empresas, com diversas ligações a outros sectores de actividade, representa cerca de 18% das exportações totais do país, 16,% da produção industrial e de 22% do emprego da indústria transformadora.

Também a União Europeia é, ainda, o segundo maior exportador mundial do sector, logo a seguir à China, e produz cerca de 40% do vestuário mundial. Mas as importações têm crescido imenso, desde 1995, de tal modo que, de 1995 a 2001, o défice comunitário da balança comercial do sector cresceu cerca de 106%.

As mudanças, nos últimos anos, foram enormes, com as importações crescentes, resultantes da progressiva abertura das restrições quantitativas de acesso ao mercado da União Europeia, ao abrigo do calendário estabelecido no acordo sobre têxteis e vestuário (ATV) e dos recentes acordos bilaterais (Sri LanKa, Paquistão e Brasil).

Entre 1990 e 2000, a quota mundial da União Europeia no comércio têxtil desceu de 48% para 34% e no vestuário passou de 38% para apenas 24%. Mas sabe-se que a China poderá duplicar as suas exportações nos próximos 5 anos (passar de 20 por cento para 40% ou mais), e a Índia, com a abolição das quotas, seguirá caminho idêntico.

Assim, entre 1995 e 2002, o peso do vestuário de origem externa à União Europeia aumentou de 25% para 75% do total do vestuário comercializado nos 15 Estados-membros. Também em Portugal, embora de forma mais suave, a quota de mercado nacional desceu de 55% para 47%. Daí que seja essencial adoptar objectivos e medidas concretas para evitar os perigos da total liberalização, sem quaisquer regras, e sem ter em conta a especificidade do sector, impedindo que seja usado como moeda de troca para obter outras vantagens na área da liberalização dos serviços e dos investimentos que interessam às multinacionais, grupos financeiros e países mais poderosos da União Europeia.

Por isso, temos considerado que é necessário definir uma política sectorial não só ao nível dos apoios, mas também dos instrumentos, na óptica da fileira produtiva que importa defender, seja na União Europeia, seja no plano nacional. Como temos defendido, a política comunitária para o sector não se pode limitar a uma política comercial, embora, aí, seja também essencial caminhar no sentido das vantagens recíprocas no comércio de têxteis e vestuário. É fundamental executar uma política específica apostada na inovação, no apoio às PME e na manutenção desta importante fileira produtiva.