Partido Comunista Português
Projecto do PCP introduz isenção de Propinas no Ensino Superior
Quinta, 07 Maio 2009
20090507-miguel-tiago-ar.jpgFoi discutido na AR, o projecto de lei do PCP que «estabelece um regime suplementar de apoio aos estudantes do ensino superior». Esta iniciativa visa dar uma resposta imediata à grave situação em que se encontram actualmente milhares de estudantes do ensino superior que se vêem obrigados a abandonar as instituições de ensino que frequentam por razões financeiras.
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Regime suplementar de apoio aos estudantes do ensino superior

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

O PCP traz hoje a este debate o projecto de lei n.º 698/X e, de alguma forma, congratula-se, porque está à vista a oportunidade e a urgência de se tomarem medidas nesta matéria, tendo em conta que quase todos os partidos, com excepção do Partido Socialista - e saudamos essa participação - apresentaram também diplomas sobre a mesma matéria (projecto de lei n.º 699/X, projecto de lei n.º 748/X, projecto de resolução n.º 471/X e projecto de resolução n.º 421/X).

O PCP apresentou este projecto de lei, antes de mais, partindo do pressuposto de que as medidas nele propostas visam responder à situação actual e não consideramos que isso sacrifique a nossa posição de fundo contra esta Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior - aliás, apenas a evidencia.

Os resultados que hoje estão à vista e a situação que os estudantes do ensino superior ou parte deles vive é o melhor exemplo dos efeitos que esta lei acabou por trazer.

Aliás, o PCP lembra-se bem de o Partido Socialista a criticar, bem como o próprio Ministro Mariano Gago, mas, curiosamente, não só permite que ela continue a vigorar como ainda a agravou com a retirada de um tecto para o valor das propinas dos 2.os ciclos após a implementação do chamado Processo de Bolonha.

Portanto, sem sacrificar esta posição de fundo do Partido Comunista, que entende que o ensino em todos os seus graus - aliás, como consta da Constituição da República Portuguesa - é um direito e não um qualquer negócio ou mercado e que o investimento feito na frequência do ensino superior não é apenas um investimento individual, não aproveita apenas ao estudante, pois é um investimento nacional, é um investimento que aproveita ao País, ao tecido produtivo e ao sistema científico e tecnológico.

Aliás, é uma exigência estrutural para o desenvolvimento económico do País que exista mais qualificação superior, permitindo aos estudantes e aos jovens que possam dar um maior contributo para o desenvolvimento nacional.

O que o Partido Socialista e este Governo estão a fazer é, objectivamente, a centrar no indivíduo o financiamento dos seus próprios estudos superiores, dando um estímulo negativo à frequência do ensino superior e impedindo os jovens que querem participar e contribuir para o desenvolvimento nacional de chegarem aos mais altos níveis do conhecimento para poderem dar esse contributo com mais vigor.

A situação que vivemos, com o desemprego, a crise e a degradação das condições e da qualidade de vida dos portugueses, afecta particularmente a juventude, como todos sabemos. Aliás, não é por acaso que a própria Constituição da República Portuguesa defende a juventude, estipulando que o Estado tem deveres especiais para com a juventude, e isso também acontece na educação.

A situação que vivemos é, pois, particularmente grave para os jovens portugueses e também para os estudantes. A crise estrutural do sistema capitalista que atravessamos tem efeitos também particularmente pesados junto dos jovens, tendo em conta o período de vida que atravessam, de fragilidade, de entrada no mundo do trabalho, muitas vezes sem quaisquer direitos, de baixos rendimentos para aqueles que são trabalhadores-estudantes e de resultados óbvios do desemprego para aqueles que ainda dependem dos seus pais ou das suas famílias. Portanto, ainda que o PCP continue, como sempre, a defender a extinção da propina e a gratuitidade total do ensino superior, entendemos que urge tomar medidas rápidas para suprir, de facto, as falhas que o sistema de acção social escolar apresenta.

São milhares os estudantes em risco de abandonarem o ensino superior e são ainda mais milhares aqueles que hoje nem pensam sequer em entrar no ensino superior porque sabem que não o vão poder pagar.

E esse estudo o Partido Socialista, obviamente, não pode fazer porque esse é um pré-abandono do sistema educativo.

Portanto, é preciso tomar medidas que estimulem, de facto, a procura do ensino superior e que garantam a qualidade, porque só com a responsabilização do Estado poderá existir qualidade nas escolas.

Está à vista, aliás, que não é com as propinas que se assegura a qualidade do ensino.

Por isso é que o PCP propõe o alargamento do sistema de acção social escolar e o seu reforço, criando um regime suplementar àquele que hoje existe: apoio aos transportes; diminuição do preço do prato social nas cantinas de 2,2 euros para 1,00 euro; apoio ao alojamento, através da gratuitidade das residências para estudantes deslocados e bolseiros; e a criação de uma isenção de propinas, a requerimento do estudante, nos casos em que, sendo trabalhador-estudante, se encontre no desemprego ou em que, sendo dependente, algum membro do seu agregado familiar se encontre no desemprego.

Julgamos que estamos aqui a dar uma oportunidade ao PS para que manifeste a mínima sensibilidade perante a situação que se vive.

A questão é muito simples: será justo, hoje, numa altura em que devemos estimular a qualificação das populações e dos jovens, em que devemos exigir também da população que se qualifique para entregar um contributo cada vez mais poderoso ao País, exigir a quem não pode pagar que pague propinas para ter acesso a um direito que consideramos que não está a ser exercido de uma forma justa, quando consideramos que o sistema actual de acção social escolar é insuficiente? É por isso que fazemos este desafio à Assembleia da República e, particularmente, ao PS.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Manuel Mota,

Ficámos a perceber, ao longo da sua intervenção, que é à custa dos estudantes do ensino superior que este Governo pretende poupar uns «tostões» enquanto, ao mesmo tempo, enterra milhares de milhões de euros na banca portuguesa.

É à custa dos estudantes do ensino superior que pretende poupar uns «tostões».

Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque aquilo que este Governo tem enterrado na banca - para não falar das garantias que tem dado - representa quatro vezes o necessário para garantir a total gratuitidade do ensino superior público em Portugal.

Nem se fala aqui de alargar a acção social escolar, mas da total gratuitidade. Sr. Deputado, gostaria de fazer algumas perguntas muito breves.

O que tem o Sr. Deputado a dizer sobre o facto de, hoje, para uns, ser muito mais barato estudar no ensino superior privado do que no ensino superior público?

Como é possível que um Governo, que ainda por cima se diz socialista, permita que hoje seja mais barato, em grande parte dos casos, estudar numa instituição de ensino superior privada, porque fica perto de sua casa, já que, muitas vezes a rede pública não tem uma cobertura territorial como a privada?

Isto significa que o Estado, além de não cumprir o seu papel, retirando-se das suas responsabilidades no que toca ao ensino superior, está a criar as condições para que o ensino superior privado seja aquele que dá a resposta mais imediata às necessidades dos estudantes, retirando o Estado de uma sua função constitucional essencial.

O ensino superior privado, ao invés de estar a cumprir o seu papel de complementaridade e de opção, está a ser a única opção para muitos estudantes do ensino superior, porque o acesso ao ensino superior público lhes é vedado por este Governo, que ainda tem o descaramento de se chamar socialista e de, de vez em quando, se dizer de esquerda!

Sr. Deputado, também gostaria de saber o que tem a dizer aos estudantes que nem chegam a pensar candidatar-se. Já não lhe pergunto o que tem a dizer a todos os que abandonam o ensino superior por não conseguirem pagar. Mas o que diz a todos os estudantes que percorreram 12 anos de ensino, que se esforçaram, que foram aos exames nacionais - também impostos por estes governos -, que gastaram tudo o que tinham, e às vezes o que não tinham, para dar resposta ao seu anseio de ingressar no ensino superior e que agora nem pensam nisso porque não lhes chega o dinheiro?

O que tem a dizer relativamente ao facto de o Governo, em vez de investir na acção social escolar, andar a angariar clientes para a banca portuguesa para poder vender empréstimos aos estudantes que não têm dinheiro para pagar as propinas?

(...)

Sr. Presidente, peço a palavra para uma nova intervenção.

Certamente, o Sr. Presidente zelará pelo meu poder de síntese.

Sr. Presidente, queria apenas referir que, da parte do PCP, existe um sentimento de dever cumprido, porque apresentámos aquilo que consideramos ser a resposta para o momento actual, ainda que numa perspectiva de apelo constante ao combate a esta política de privatização e mercantilização do ensino superior, que tem motivado o crescimento do abandono escolar.

É lamentável que o Sr. Deputado Manuel Mota venha aqui fazer comparações entre o número actual de estudantes no ensino superior com o novo mecanismo, ou seja, aquele que se destina a maiores de 23 anos, e o anterior, comparando o que não é comparável. É lamentável que o Sr. Deputado venha aqui branquear a situação real que se vive no ensino superior e que está à vista de quem a queira ver.

Na verdade, está à vista dos estudantes e das suas famílias, que fazem «30 por uma linha» para conseguirem manter os estudantes no ensino superior. E está à vista dos estudantes, que são obrigados a recorrer a empréstimos, porque este Governo não lhes assegura a acção social escolar necessária.

Também está à vista dos estudantes que são obrigados a estudar no ensino superior privado porque este ...

Vou terminar, Sr. Presidente.

Dizia eu que os estudantes são obrigados a estudar no ensino superior privado porque este Governo não lhes permite que entrem nas instituições de ensino superior públicas. Alguém acredita que, num universo de 300 000 estudantes no ensino superior, só haja necessidade de 16 novas bolsas?! Tenha piedade, Sr. Deputado!