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Projecto de Lei nº 533/VII
Lei das Associações de Imigrantes

Situação


(Preâmbulo)

A luta pelo aumento e dignificação do apoio do Estado ao associativismo tem sido uma constante da actividade do PCP. Na Assembleia da República, esta acção tem-se traduzido na apresentação de um conjunto significativo de iniciativas legislativas, tendo como objecto, quer o apoio ao associativismo popular em geral, quer o apoio a determinados tipos de associações tendo em consideração as suas particulares especificidades.

São de salientar, a título de exemplo, e de entre as iniciativas mais recentes, com carácter geral, o Projecto de Lei Quadro do Apoio ao Associativismo (Projecto de Lei n.º 195/VII); e o Projecto de Lei de Estatuto do Dirigente Associativo Voluntário (Projecto de Lei n.º 196/VII), já aprovado na generalidade, mas que à data da apresentação do presente projecto de lei aguarda apreciação na especialidade. Com carácter específico, saliente-se, por exemplo, o Projecto de Lei n.º 204/VII sobre pais e encarregados de educação, ou o Projecto de Lei n.º 397/VII sobre associações de deficientes.

Neste quadro, entende o PCP, que a especificidade das associações representativas dos imigrantes, a vários títulos, justifica a aprovação de uma lei especial das associações de imigrantes. De facto, estas associações, sendo merecedoras do apoio e atenção que deve merecer o associativismo em geral, têm como objectivo a defesa dos direitos e interesses legítimos de um segmento da população residente em Portugal que se confronta com problemas específicos, nos planos económico, social e cultural.

Acresce que várias comunidades de imigrantes residentes em Portugal, particularmente as que representam cidadãos originários de países da CPLP, têm estruturas associativas próprias, que desenvolvem actividades de reconhecido mérito e cuja actividade deve ser especialmente apoiada. Por outro lado, tendo em consideração o papel que estas associações podem desempenhar, nos planos nacional e local, na inserção social das respectivas comunidades, no estreitamente de laços de amizade entre as suas comunidades e o conjunto da comunidade nacional, e no combate de todos contra o racismo e a xenofobia, mais se justifica uma especial atenção do legislador no apoio a estas formas de associativismo.

O Grupo Parlamentar do PCP propõe, assim, que seja aprovada uma Lei das Associações de Imigrantes, que reconheça a estas estruturas associativas um conjunto relevante de direitos de participação e de intervenção social, a nível nacional e local. Propõe-se ainda a atribuição às associações de imigrantes dos direitos que são legalmente concedidos às associações detentoras do estatuto de utilidade pública, bem como de formas de apoio técnico e financeiro ao desenvolvimento das suas actividades. De entre as propostas mais inovadoras do presente Projecto de Lei, cumpre assinalar a proposta de criação de um Fundo de Apoio às Associações de Imigrantes, dispondo de verbas próprias, a inscrever no Orçamento de Estado, destinadas a financiar o apoio a conceder às associações mediante a celebração de protocolos com o Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas, salvaguardados que sejam os princípios da autonomia e independência das associações, da não discriminação, e da participação dos interessados.

Participação esta, que seria assegurada através do Conselho para os Assuntos da Imigração, cuja criação o PCP propõe, em substituição do actual Conselho Consultivo, criado pelo Decreto-Lei n.º 39/98, de 27 de Fevereiro. O PCP considera como questão fundamental, que a atitude do estado português em relação às associações de imigrantes deve ser de apoio, de incentivo e de criação de condições para uma maior afirmação da autonomia das associações, estando assim em oposição a uma linha de intervenção que tem caracterizado o actual Governo, assente em tentativas de controlo e de instrumentalização do movimento associativo, acentuando a sua dependência em relação ao poder político.

O PCP propõe por isso a criação de um Conselho para os Assuntos da Imigração que, para além de ser dotado de reais poderes de participação, seja uma expressão real do associativismo representativo da imigração e de um conjunto de entidades que desenvolvem uma acção de mérito no interesse das suas comunidades.

Ao apresentar este Projecto de Lei, o PCP não pretende impôr soluções, mas acima de tudo, debatê-las, em especial com os imigrantes e com as suas associações. Esta iniciativa legislativa pretende ser mais um contributo do PCP para a dignificação do estatuto dos imigrantes em Portugal, através da valorização do estatuto legal das suas associações representativas. Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1º
(Objecto)

1 - A presente lei define os direitos específicos das associações de imigrantes residentes em Portugal.

2 - Em tudo o que não se encontre especialmente regulado na presente lei é aplicável às associações de imigrantes o regime legal das associações, de acordo com a sua natureza estatutária.

Artigo 2º
(Âmbito de aplicação)

1. Para os efeitos da presente lei, consideram-se associações de imigrantes as associações dotadas de personalidade jurídica, que não tenham fins lucrativos e que tenham como objectivo a defesa dos direitos e interesses legítimos dos imigrantes residentes em Portugal.

2. Para os efeitos da presente lei, equiparam-se às associações de imigrantes as uniões e federações por elas criadas.

Artigo 3º
(Direitos de participação e intervenção)

São direitos das associações de imigrantes:
a) Participar na definição das políticas e nos processos legislativos sobre matérias que digam directamente respeito aos imigrantes.

b) Participar no Conselho para os Assuntos da Imigração nos termos da presente lei, bem como em outros órgãos de consulta que sejam constituídos.

c) Constituírem-se como assistentes em processo penal no caso de crimes de índole racista e xenófoba, nos termos da lei aplicável.

d) Intervir junto das autoridades públicas em defesa dos direitos dos imigrantes.

e) Participar, junto das autarquias, na definição e execução das políticas locais que digam directamente respeito aos imigrantes.

Artigo 4º
(Direito de antena)

As associações de imigrantes têm direito de antena nos serviços públicos de rádio e de televisão através das respectivas associações representativas de âmbito nacional.

Artigo 5º
(Direito à informação)

As associações de imigrantes têm o direito de solicitar e obter das entidades da Administração Pública o acesso à informação e documentação que lhes permita acompanhar a definição e execução das políticas que lhes digam respeito.

Artigo 6º
(Estatuto de utilidade pública)

1. As associações de imigrantes beneficiam de todos os direitos e regalias atribuídos por lei às pessoas colectivas de utilidade pública.

2. As associações de imigrantes beneficiam ainda de isenção de custas e preparos judiciais e de imposto de selo.

Artigo 7º
(Mecenato associativo)

1. As quotizações pagas pelos associados e outras contribuições de pessoas singulares às associações de imigrantes são consideradas para efeitos de deduções ao rendimento colectável em sede de IRS.

2. As contribuições das pessoas colectivas às associações de imigrantes são consideradas para efeitos de deduções ao rendimento colectável em sede de IRC.

Artigo 8º
(Apoio do Estado)

1. As associações de imigrantes têm direito a apoio técnico e financeiro da parte do Estado, nos termos de protocolos a celebrar entre as associações e o Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas.

2. A celebração dos protocolos referidos no número anterior baseia-se em projectos apresentados pelas associações e é precedida de parecer favorável do Conselho para os Assuntos da Imigração.

Artigo 9º
(Fundo de apoio)

1. É criado pela presente lei o Fundo de Apoio às Associações de Imigrantes, com o objectivo de suportar os encargos financeiros previstos no artigo anterior.

2. As dotações do Fundo de Apoio às Associações de Imigrantes são inscritas anualmente no Orçamento de Estado, em rubrica própria, e afectas ao Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas.

Artigo 10º
(Autonomia e independência das associações)

1. A concessão de qualquer tipo de apoios por parte do Estado às associações de imigrantes não pode condicionar a autonomia e independência das associações.

Artigo 11º
(Não discriminação)

Na concessão de qualquer tipo de apoios por parte do Estado, nenhuma associação de imigrantes pode ser privilegiada ou prejudicada em relação às demais, por motivos étnicos, políticos, ideológicos, religiosos, ou de situação geográfica.

Artigo 12º
(Registo Nacional)

1. Compete ao Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas organizar um Registo Nacional das Associações de Imigrantes.

2. Para efeito do disposto no número anterior devem as associações de imigrantes enviar ao Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas cópia dos respectivos estatutos e acta de constituição.

3. A não inscrição no Registo Nacional de Associações de Imigrantes por facto não imputável às associações não pode implicar para estas qualquer prejuízo no gozo de direitos ou na atribuição de quaisquer apoios.

Artigo 13º
(Conselho para os Assuntos da Imigração)

1. É criado, na Presidência do Conselho de Ministros, o Conselho para os Assuntos da Imigração, com vista a assegurar a participação na definição das políticas e das grandes linhas de orientação legislativa sobre matérias que lhes digam directamente respeito e a exercer as demais competências que lhe sejam conferidas por lei.

2. Ao Conselho para os Assuntos da Imigração compete:
a) Pronunciar-se sobre os projectos de diplomas legislativos relativos aos direitos dos imigrantes.
b) Participar na definição das políticas de integração social que visem a eliminação de discriminações e promovam a igualdade.
c) Participar na definição de medidas e acções que visem a melhoria das condições de vida dos imigrantes e acompanhar a sua execução.
d) Participar na defesa dos direitos dos imigrantes, com respeito pela sua identidade e cultura, formulando propostas com vista à sua promoção.
e) Emitir parecer sobre os protocolos de apoio a celebrar entre o Gabinete do Alto Comissário para as Minorias Étnicas e as associações de imigrantes nos termos da presente lei.
f) Elaborar e aprovar o seu regimento interno.

3. O mandato dos membros do Conselho para os Assuntos da imigração é de três anos, renovável.

4. O Conselho para os Assuntos da Imigração tem a seguinte composição:
a) O Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas, que preside.
b) Um representante de cada uma das comunidades de imigrantes de língua portuguesa (angolana, brasileira, cabo-verdiana, guineense, moçambicana, são-tomense e timorense), eleitos, cada um, pelas associações representativas da respectiva comunidade inscritas no Registo Nacional de Associações de Imigrantes.
c) Três representantes eleitos pelas associações representativas das outras comunidades não incluídas no número anterior, inscritas no Registo Nacional de Associações de Imigrantes.
d) Um representante de cada uma das centrais sindicais.
e) Duas personalidades cooptadas pelos restantes membros.
5. O Conselho para os Assuntos da Imigração reúne ordinariamente de três em três meses e extraordinariamente quando convocado pelo presidente, por sua iniciativa ou a solicitação de um terço dos membros.
6. Compete ao Gabinete do Alto Comissário para a Imigração e as Minorias Étnicas prestar o apoio técnico e administrativo ao funcionamento do Conselho para os Assuntos da Imigração.

Artigo 13º
(Regulamentação)

Compete ao Governo, ouvidas as associações representativas dos imigrantes, regulamentar a presente lei no prazo de 90 dias após a sua entrada em vigor.

Artigo 14º
(Norma revogatória)

É revogado o decreto-lei n.º 39/98, de 27 de Fevereiro.

Artigo 15º
(Entrada em vigor)

Sem prejuízo da sua entrada em vigor nos termos gerais, a presente lei só produz efeitos financeiros após a entrada em vigor da Lei do Orçamento de Estado posterior à sua aprovação.