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Projecto de Lei nº 422/VII
Sobre iniciativa legislativa popular

Situação


Com o presente projecto de lei, o PCP visa dar conteúdo efectivo e concreto ao direito de grupos de cidadãos de apresentarem iniciativas legislativas junto da Assembleia da República. Desta forma, dá-se um passo de grande significado na efectivação de um importante mecanismo de participação dos cidadãos na vida política. Por outro lado, este mecanismo consubstancia uma importante aproximação entre os cidadãos, a Assembleia da República e os Deputados que a compõem.

O PCP defendeu a consagração constitucional deste mecanismo, apresentando uma proposta nesse sentido no seu projecto de revisão constitucional. Consagrado como foi, importa agora concretizá-lo.

As soluções propostas pelo PCP visam facilitar o exercício deste direito, despindo-o de formalismos desnecessários.

Considera-se o número de cinco mil cidadãos eleitores como um número mínimo adequado. Na verdade, se cinco mil cidadãos podem fundar um partido, não se compreenderia que não pudessem suscitar a apreciação pela Assembleia de uma iniciativa legislativa.

Através de diferentes mecanismos, procura-se dar corpo a um princípio de aproveitamento útil da iniciativa, evitando burocratizá-la ou fazê-la precludir por razões que possam ser superadas. É isso que justifica os mecanismos previstos nos artigos 6º, nºs 3 e 4, 8º, nº 2, 9º, nº 2 e 13º, nºs 2 e 3.

Consagra-se o princípio da obrigatoriedade da apreciação e votação da iniciativa pela Assembleia da República, fixando-se nesse sentido regras e prazos de tramitação (artigos 10º, 11º e 12º).

Procura-se ainda garantir que os peticionários possam acompanhar todos os passos processuais da iniciativa, consagrando um princípio de notificação obrigatória (artigo 5º).

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1º

Direito de iniciativa legislativa

Os cidadãos eleitores gozam do direito de iniciativa legislativa junto da Assembleia da República, nos termos e condições do disposto na presente lei.

Artigo 2º

Titularidade

A iniciativa legislativa é exercida por um número mínimo de 5.000 cidadãos eleitores.

Artigo 3º

Petição

  1. A iniciativa legislativa assume a forma de petição dirigida ao Presidente da Assembleia da República.
  2. Os signatários devem ser identificados pelo nome completo, número de eleitor e residência.

Artigo 4º

Representantes

  1. O primeiro signatário da petição da petição será, para todos os efeitos, o representante do grupo de cidadãos eleitores, a menos que outra indicação resulte do texto da petição.
  2. A petição pode conter a indicação expressa de um grupo promotor.

Artigo 5º

Notificação do representante

O representante do grupo de cidadãos eleitores será notificado de todos os actos do processo legislativo decorrente da iniciativa apresentada ou conexa com ela.

Artigo 6º

Forma

  1. A petição é apresentada por escrito, subscrita nos termos do artigo 3º.
  2. A petição deve definir concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa, e deve constar uma breve justificação ou exposição de motivos.
  3. Se da petição não constar a designação proposta para a iniciativa legislativa, ou se esta não estiver redigida sob a forma de artigos, a petição é submetida à Assessoria Jurídica da Assembleia da República.
  4. A Assessoria Jurídica, no prazo de oito dias, sugere um título e um articulado, sendo então notificado o representante do grupo de cidadãos eleitores, que aceitará o texto proposto ou apresentará outro, coincidente com o conteúdo da petição.

Artigo 7º

Objecto

Podem ser objecto de iniciativa legislativa popular todas as matérias sobre as quais a Assembleia da República pode legislar, com excepção das previstas no artigo 161º da Constituição, ressalvado no entanto o disposto na sua alínea f).

Artigo 8º

Limite da iniciativa

  1. Os grupos de cidadãos eleitores não podem apresentar iniciativas que, em violação do disposto no artigo 167º, nº 2 da Constituição, envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento.
  2. Verificando-se, em iniciativa apresentada por cidadãos eleitores, a situação referida no número anterior, o Presidente da Assembleia da República notificará o representante desse grupo, para que diga se mantém a iniciativa para vigorar somente a partir do ano económico seguinte, caso em que a iniciativa será admitida.
  3. É aplicável a decisão de não admissão o disposto no nº 2 do artigo anterior.

Artigo 9º

Admissão

1.  A iniciativa legislativa popular só não será admitida nos seguintes casos:

  1. se não estiver subscrita pelo número mínimo de cidadãos eleitores identificados nos termos da presente lei;
  2. se não for indicado concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa;
  3. se infringir a Constituição ou os princípios nela consignados;
  4. se não respeitar os limites do objecto definido no artigo 7º;
  5. se, no caso do artigo 8º, não for aceite a vigência da iniciativa para o ano económico seguinte.

2. O Presidente da Assembleia da República, antes do despacho de não admissão, deve notificar o representante, para suprir as deficiências encontradas.

3. Da decisão do Presidente da República de não admissão podem recorrer para o Plenário da Assembleia da República qualquer Deputado, nos termos regimentais, ou o representante do grupo, no prazo de cinco dias após notificado.

Artigo 10º

Exame em Comissão

  1. Admitida a iniciativa, o Presidente ordenará que ela baixa à Comissão Especializada competente em razão de matéria, para emissão de parecer.
  2. O parecer deve ser admitido no prazo de 20 dias.
  3. A Comissão notificará o representante para expor a iniciativa e dar as explicações que lhe forem solicitadas.

Artigo 11º

Agendamento

  1. Recebido o parecer da Comissão, ou esgotado o prazo referido no artigo anterior, a iniciativa legislativa é agendada para uma das dez reuniões plenárias seguintes.
  2. A iniciativa é obrigatoriamente apreciada pelo Plenário.
  3. Juntamente com a iniciativa legislativa do grupo dos cidadãos, podem ser agendadas iniciativas de Deputados ou do governo sobre a mesma matéria que tenham sido apresentadas até sete dias antes do agendamento, desde que os autores o requerimento e o representante do grupo, notificado, não se apanha.

Artigo 12º

Votação

A votação na generalidade e, sendo caso disso, a votação na especialidade e votação final global da iniciativa, devem estar concluídas no prazo de sessenta dias após o agendamento referido no artigo anterior.

Artigo 13º

Renovação e caducidade

  1. As iniciativas legislativas populares definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República.
  2. As iniciativas legislativas populares não votadas na sessão legislativa não carecem de ser renovadas na sessão legislativa seguinte.
  3. As iniciativas legislativas populares caducam no termo da legislatura, mas para a sua renovação pode ser usada a mesma lista de subscritores.

Assembleia da República, 14 de Outubro de 1997

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