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Projecto de Lei nº 76/VII
Programa de Emergência para a Reabilitação Urbana - PERU


A situação existente nas zonas históricas, particularmente nas grandes Cidades é, em muitos casos, de verdadeira calamidade.

As condições de vida extremamente degradantes e inadmissíveis que se verificam em muitas dessas áreas potenciam fenómenos de marginalidade, insegurança, insucesso escolar e toxicodependência.

Com propriedade se pode afirmar que, nos Centros Históricos populares das grandes Cidades, se vive muitas vezes tão mal como nos bairros de barracas e, ainda por cima, em situação de maior perigosidade.

Só nos bairros históricos populares de Lisboa mais de 100 edifícios podem, a qualquer momento, ruir sobre cerca de 3 000 pessoas que neles residem em condições inumanas. A situação pode, aliás, agravar-se com a existência de calamidades ou catástrofes naturais.

A melhoria das condições de vida destas populações é, assim, um imperativo de solidariedade nacional.





A reabilitação urbana dos centros históricos, por outro lado, é indispensável para assegurar a memória histórica e cultural, perservando e revitalizando as identidades sócio-culturais. É, também, social e economicamente vantajosa e indispensável ao equilíbrio das Cidades.

Na verdade, os processos de reabilitação urbana evitam a desertificação, o aumento dos movimentos pendulares casa-trabalho, investimentos em infraestruturas e os custos sociais inerentes à deslocação das populações.

Por outro lado, a reabilitação de um fogo antigo custa menos de metade do que a construção de um fogo de habitação social.

Acontece, porém, que os instrumentos actualmente existentes para a reabilitação urbana, aliás não específicos para este tipo de intervenção, tal como o direito de preferência, Declaração de Áreas Críticas de Recuperação e Reconversão Urbanística e o Programa RECRIA, embora de grande utilidade, têm-se revelado insuficientes.

Na Cidade de Lisboa, por exemplo, onde se desenvolvem processos de Reabilitação Urbana nos Bairros de Alfama, Castelo, Sé, Mouraria, Bairro Alto, Bica, Madragoa e outros núcleos dispersos seriam necessários, a manterem-se os actuais níveis de investimento, mais 25 anos para a respectiva conclusão o que, na prática, significaria o seu fracasso. E isto apesar do enorme esforço do Munícipio, que já investiu nesta área cerca de 6,5 milhões de contos.

Refira-se, aliás, que a repartição dos investimentos é, por si só, bastante elucidativa: enquanto os investimentos municipais representam 53% do total, os particulares investiram 33,2% e a Administração Central, através do IGAPHE, apenas 13,8%.




Esta realidade revela-se mais chocante se tivermos presente que o Estado arrecadou 4, 2 milhões de contos através da carga fiscal sobre as Empresas de Construção Civil relativamente àquelas obras e apenas investiu 1,7 (no âmbito do RECRIA) tendo, portanto, "lucrado" 2,5 milhões de contos!

Embora, como já se referiu, as condições de vida nos Bairros Históricos populares sejam, em muitos casos, tão más como nos bairros de barracas, a solução prevista no Decreto-Lei nº 163/93, que aprovou o "Programa Especial de Realojamento- PER" (aliás, carece de revisão), aplica-se exclusivamente a estes últimos bairros das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

Torna-se, pois, essencial criar um programa específico destinado a viabilizar a Reabilitação Urbana dos Centros Históricos num prazo socialmente justo.

O que se procura, através do presente projecto, é dar respostas excepcionais a situações verdadeiramente excepcionais.

Assim, partindo dos instrumentos já existentes - Direito de Preferência, Declaração de Áreas Critícas, Programa RECRIA e Programa PERU - procurar-se conferir-lhes coerência e introduzir-lhes as alterações indispensáveis.

Em termos globais pretende-se reequilibrar as diversas responsabilidades: Administração Central, Administração Local e Particulares.

Para além da criação de diversos incentivos e de um programa especial de financiamento semelhante ao PER, prevê-se a possibilidade de utilização temporária, mediante compensação, de fogos devolutos (cerca de 2 000 só nos bairros de Lisboa atrás referidos).



Esta utilização é absolutamente essencial para o êxito do programa, dado o grande número de realojamentos temporários que é preciso fazer em virtude da profundidade das obras necessárias.

Aliás, trata-se apenas de uma extensão do mecanismo legal actualmente previsto no caso de "Áreas Críticas de Recuperação e Reconversão Urbanística", que prevê a possibilidade de "ocupação temporária de terrenos para instalação transitória de infraestruturas ou equipamento social ou à realização de outros trabalhos necessários (art°. 42, alínea b) do Decreto-Lei nº 794/76, de 5 de Novembro).

O articulado seguinte consubstancia, assim, o Programa de Emergência para a Reabilitação Urbana - PERU, que viabilizará a Reabilitação Urbana dos Bairros Históricos populares no prazo de 7 anos.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados apresentam o seguinte projecto de lei:


Artigo 1°

O presente diploma é exclusivamente aplicável aos núcleos históricos legalmente declarados "Áreas Críticas de Recuperação e Reconversão Urbanística" que tenham Planos Gerais de Urbanização, Planos de Pormenor ou Regulamentos Urbanísticos aprovados.






Artigo 2°

As obras de recuperação de fogos, construção de fogos para realojamento provisório ou definitivo, construção e reparação de equipamentos, infraestruturas e espaços públicos, bem como a aquisição e expropriação de imóveis por parte dos Munícipios, serão financiadas em 50% a fundo perdido pelo IGAPHE e em 50% através de empréstimos pelo INH, nas condições previstas no Decreto-Lei nº 163/93, de 7 de Maio, com as necessárias adaptações.

Artigo 3º

Poderão recorrer ao RECRIA os proprietários, inquilinos ou Munícipios que pretendam fazer obras em fogos arrendados, sem qualquer restrição, ou em fogos habitados pelos proprietários.

Artigo 4º

As comparticipações do IGAPHE no programa RECRIA são aumentadas em 15%, com a consequente diminuição da comparticipação dos beneficiários do subsídio.

Artigo 5º

Em caso de campanhas especiais decididas pelos Munícipios para recuperação de ruas ou áreas delimitadas, as comparticipações municipais e do IGAPHE no Programa RECRIA são aumentadas em 5%.






Artigo 6º

0 valor das obras de recuperação de edíficios ou fogos efectuadas por particulares é integralmente deduzido no IRS e no IRC.

Artigo 7º

A taxa de IVA aplicável a empreitadas de obras de recuperação de edifícios, fogos, infraestruturas, equipamentos ou espaços públicos é de 5%.

Artigo 8º

Os particulares que pretendam efectuar obras de recuperação de edíficios ou fogos habitacionais têm direito a recorrer ao crédito em condições idênticas ao crédito à habitação própria, independentemente de terem ou não beneficiado do programa RECRIA.

Artigo 9º

0 n°. 1 da alínea b) do art°. 42º do Decreto-Lei nº 794/76, de 5 de Novembro passa a ter a seguinte redacção:

"À ocupação temporária de terrenos ou de fogos devolutos, com vista à instalação transitória de infraestruturas ou equipamento social, à realização de outros trabalhos necessários ou ao realojamento transitório de moradores por virtude de obras nas respectivas habitações".





Artigo 10º

Nos casos em que os Munícipios tenham realizado obras coercivas em edifícios utilizados ao abrigo do artigo anterior, o valor das obras efectuadas é dedutível à indeminização referida no artigo seguinte.

Artigo 11º

0 artigo 45º do Decreto-Lei nº 794/76, de 5 de Novembro passa a ter a seguinte redacção:

"1. A ocupação temporária de terrenos e fogos devolutos, nos termos do n° 1 da alínea b) do n°. 1 do artigo 42º, confere direito a indemnização.

2. Se a ocupação do terreno ou fogo se prolongar para além de cinco anos, o proprietário tem o direito de exigir que a Administração proceda à respectiva expropriação."

Artigo 12º

A declaração da "Área Crítica de Recuperação de Reconversão Urbanística" confere, automaticamente, aos Municípios Direito de Preferência na alienação de imóveis, nos termos dos artigos 27º e 28º do Decreto-Lei nº 794/76, de 5 de Novembro.









Artigo 13º

Este diploma entra em vigor com a publicação da próxima Lei do Orçamento de Estado.

Assembleia da República, 17 de Janeiro de 1996

Os Deputados,