Partido Comunista Português
Família - Intervenção de Jorge Machado na AR
Quinta, 15 Maio 2008

Agendamento potestativo do PSD em torno do tema da família

 

 

Sr. Presidente,

Sr. Deputado Hugo Velosa,

Gostaria de fazer um conjunto de considerações.

O Sr. Deputado fez uma eloquente exposição sobre as questões da família, defendendo que a diferença entre o PS e o PSD é que o PS nada fez para defender a família. Ora, importa ter memória nesta Casa e percebermos o que é que o PSD fez em defesa da família quando era governo, Sr. Deputado.

Em 2003, criou um conjunto de mecanismo que restringiu muito o abono de família, alterando as formas de cálculo dos rendimentos das famílias, o que impediu que milhares de trabalhadores tivessem acesso a esta importantíssima prestação familiar.

No Rendimento Social de Inserção, o que é que o PSD fez? Introduziu novos mecanismos de restrição em que limitou, e muito, o acesso a esta prestação!

No Código do Trabalho, o que é que o PSD fez no que diz respeito à família e aos direitos de maternidade e paternidade? Deu o primeiro passo na ofensiva contra os direitos dos trabalhadores num código PSD/Bagão Félix e que agora tem fiéis seguidores na bancada do Partido Socialista que pretendem levar mais além a ofensiva iniciada pelo próprio PSD. Portanto, estamos esclarecidos no que diz respeito à legislação laboral.

Iniciou um processo de privatização da segurança social que o PS não pôs de parte - bem pelo contrário, abriu novas portas para a privatização da segurança social que atacam prestações sociais importantíssimas no âmbito da família.

Sr. Deputado, importa saber se o PSD tem alguma responsabilidade na situação que os trabalhadores hoje vivem de constrangimento, de aperto financeiro, de condições sociais muitos desfavoráveis para a subsistência e que encontram políticas de sucessivos governos que vão contra os seus interesses.

Sr. Deputado, neste âmbito de intervenção permita-me que lhe diga que não há grande diferença entre o PS e o PSD - aliás, em muitos outros âmbitos de intervenção não há grandes diferenças entre o PS e o PSD, há uma coerência entre estes dois partidos. É uma política de ataque às classes sociais mais desfavorecidas e em posições de sacrifícios e mais sacrifícios que atacam as pessoas e as famílias são necessariamente compostas por pessoas.

(...)

Senhor Presidente

Senhores Deputados

O agendamento do PSD em torno do tema da família, revela as profundas contradições do PSD e das bafientas ideias e concepções de família que dominam alguns destes projectos de Lei.

Do conjunto de seis iniciativas que o PSD apresenta ( projecto de lei n.º 512/X , projecto de lei n.º 513/X , projecto de lei n.º 514/X , projecto de lei n.º 515/X , projecto de lei n.º 516/X e  projecto de lei n.º 517/X ), algumas merecem ser discutidas na especialidade e outras merecem a nossa frontal oposição.

Dos diferentes projectos, a lei de bases da política de família, merece particular atenção.

Assentando numa concepção conservadora da família, que não traduz a realidade que hoje as famílias vivem, faz tábua rasa da Constituição, legislando sobre moralidades e afectos, introduzindo retrocessos sociais gravíssimos no que diz respeito aos direitos das mulheres, das crianças, dos idosos, dos indivíduos enquanto titulares de direitos.

 Na verdade, não há apenas um conceito de família, há vários tipos e conceitos de família que estão em constante transformação e não pode o PSD impor até formas de estar, uniformizando um só conceito de família.

De facto, o Projecto de Lei 515 que cria a "Lei de bases da política de família" procura criar, na lei, uma família padrão.

Este diploma faz referência a uma maternidade e paternidade "responsáveis" e não enquanto funções sociais. Prevê a protecção das crianças "antes e depois do nascimento" numa clara tentativa de atacar o direito à interrupção voluntaria da gravidez, sobre o qual a população Portuguesa já se pronunciou: pela despenalização. Reconhece ainda "o valor humano, social e económico do trabalho doméstico" sem nunca referir uma mais justa distribuição de tarefas familiares entre homem e mulher, assentando assim na ideia do trabalho doméstico como profissão da mulher, em mais uma tentativa de fazer retornar as mulheres a casa, pretensão já antiga da direita.

Por fim importa referir que as famílias não são uma realidade de "per si": são compostas por pessoas, necessariamente diferentes e de classes sociais diferentes. Pessoas titulares de direitos que as políticas de sucessivos Governos PSD e PS têm destruído, agravando a sua condição social e económica - aumenta o desemprego, baixam os salários, aumenta a pobreza e a exclusão social. Este Projecto de Lei tenta ainda descontextualizar a família das opções de classe que o PSD toma.

Assim, importa lembrar que o PSD que fala na família é o mesmo PSD que quer desmantelar o Estado em 6 meses, é o PSD que rejeita as propostas do PCP de aumentos dos salários e reformas, é o mesmo PSD que utilizando a esfarrapada desculpa do deficit implementa, juntamente com o PS, as políticas neo-liberais que atacam serviços públicos essenciais, promovem a concentração da riqueza, aumentam o desemprego e tentam impor retrocessos inaceitáveis na legislação laboral.

Por isso não é de estranhar que, apesar do discurso em defesa da família, o PSD tenha rejeitado a proposta do PCP de criação do subsídio social de maternidade e paternidade, tenha rejeitado propostas em sede de orçamento de estado que visavam, entre muitas outras, criar uma rede pública de equipamentos sociais nas valências de creches e jardins-de-infância e aumentar o subsídio de apoio à terceira pessoa ou o abono de família.

Senhor Presidente

Senhores Deputados

Da análise dos restantes projectos queremos destacar, de forma sumária, o seguinte: 

O projecto de Lei 514 cria o "Cartão da família", que é já uma discussão antiga. Nunca foi concretizada não obstante o PSD já ter tido a oportunidade de o concretizar quando teve responsabilidades no Governo. O projecto Lei não concretiza que tipos de apoios são dados, não clarifica se está ou não sujeito a condição de recurso e tem uma perspectiva caritativa e não de afirmação de direitos, pelo que iremos votar contra.

Quanto ao projecto de lei 512 que cria apoios à permanência e integração na família de idosos e pessoas com deficiência, importa referir que este não pode ser o caminho para desresponsabilizar o Estado das suas obrigações. Muitas famílias não têm nem vão ter as condições para integrar estas pessoas pelo que o Estado deve desempenhar o seu papel e garantir uma rede pública de equipamentos.

Não obstante considerarmos que este apoio que o PSD propõe precisa de muito trabalho em sede de especialidade, entendemos que este pode ser útil para certas famílias, pelo que iremos votar favoravelmente.

O projecto de lei 513 passa a considerar, para a atribuição do abono de família, os rendimentos anuais líquidos e não ilíquidos para a determinação dos rendimentos do agregado familiar. Assim melhora-se um pouco os critérios de atribuição do abono, sendo que o PCP propõe que este seja universal e não sujeito a condição de recurso, pelo que votaremos a favor.

O projecto de Lei 516 aumenta as deduções à colecta nas despesas de educação e de formação profissional, mas estas apenas se aplicam às famílias com gastos superiores a 2300 euros por ano em educação, pelo que fica claro a que estratos sociais se destina. Tendo como aspecto positivo o aumento da dedução de 35% do valor do salário mínimo nacional a partir do segundo e não terceiro filho pelo que merece a nossa abstenção.

Já o Projecto de Lei 517 considera como custos das empresas 50% das remunerações e demais encargos dos patrões com os trabalhadores em licença de maternidade, paternidade ou adopção, "Ainda que aquelas não constituam, durante o período dessas licenças, encargos efectivos do sujeito passivo". Isto é, as empresas deduzem como custo despesas que efectivamente não tiveram, o que constitui um benefício absolutamente ilegítimo e inaceitável pelo que merece o nosso voto contra.

Senhor Presidente

Senhores Deputados

Com o presente agendamento, o PSD tentou disfarçar as opções políticas, profundamente lesivas para os trabalhadores e para a larguíssima maioria das famílias, que tem vindo a tomar quando tem responsabilidades no Governo e mesmo quando está na oposição.

Sucessivos Governos, com particular acutilância o actual, têm vindo a aplicar a cartilha neo-liberal oriunda dos directórios internacionais, no nosso país. As consequências desta política traduzem-se, para a grande maioria dos Portugueses, na degradação das suas condições de vida e consequentemente das suas famílias. Não é por acaso, que cada vez mais trabalhadores recorrem ao rendimento social de inserção uma vez que os rendimentos do seu trabalho são insuficientes. Os responsáveis são o PS, o PSD com ou sem o CDS.

Para o PCP as políticas de protecção das famílias têm que passar, necessariamente, por uma política de classe diferente.

O PCP contrariamente ao que a direita pretende dar a entender apresenta alternativas.

Só nesta legislatura apresentámos projectos de valorização das prestações familiares, aumento extraordinário das pensões e dos salários, o pagamento da licença de maternidade a 100% nos 150 dias, reforço dos direitos de maternidade e paternidade, reforço da rede pública de equipamentos sociais de qualidade e a preços acessíveis, garantia e reforço dos direitos dos idosos, e entre muitas outras iniciativas a garantia do trabalho com direitos.

É assim possível e urgente uma política que defenda os interesses e direitos dos trabalhadores e este não é, definitivamente, o projecto político do PSD.

Disse.