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Consulta cronológica de Projectos de Resolução
Projecto de Resolução nº 5/VIII
Sobre a Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, em Seattle

  1. A Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio que se realiza de 30 de Novembro a 3 de Dezembro de 1999, em Seattle, marca uma primeira etapa do Ciclo do Milénio com vista à abertura de uma nova fase na liberalização do comércio mundial, designadamente em matéria de serviços, movimentos de capitais, bens culturais e agricultura.
  2. O sistema multilateral de comércio, a par com o desenvolvimento tecnológico, permitiram que, nas últimas décadas, o volume das trocas e a produção económica globais tivessem beneficiado de um enorme incremento. Mas a liberalização e a desregulamentação do comércio mundial que lhe esteve associado bem como o livre acesso dos interesses económicos particulares aos serviços públicos têm vindo, por sua vez, a agravar as desigualdades entre países, a acentuar a troca desigual, a multiplicar os problemas da segurança alimentar, a agravar as desigualdades sociais, a acelerar os processos de êxodo e de desertificação rural, impedindo a criação de um verdadeiro mundo multipolar assente na cooperação entre povos e países soberanos iguais em direitos, como revelam os sucessivos relatórios do PNUD.
  3. Importa, por isso, que seja feita a avaliação dos ciclos anteriores do GATT, dsignadamente após os acordos de Marrakech. É que não se podem reduzir todas as esferas da actividade humana à lógica do mercado e dos respectivos interesses e dinâmicas próprias. Em particular, questões como a do intercâmbio de bens culturais e da propriedade intelectual ou dos bens e segurança alimentar não podem ser tratados como meras mercadorias no âmbito do comércio mundial.
  4. É necessário introduzir regras de regulação do comércio mundial, reorientando e reformulando a Organização Mundial do Comércio, reequilibrando o desenvolvimento mundial, contribuindo para menos desigualdades e maior coesão social, introduzindo menos opacidade e mais transparência democrática no funcionamento das instituições comerciais e financeiras internacionais, designadamente nas próprias estruturas da OMC.
  5. Neste quadro, a ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA, em vésperas da Conferência Mundial da Organização Mundial do Comércio, em Seattle,
    • Pronuncia-se pela necessidade, antes de novos aprofundamentos, de ser feita uma avaliação das consequências dos processos de liberalização e desregulamentação do comércio, designadamente os que decorrem dos anteriores Ciclos de negociação do Uruguay Round do GATT.
    • Defende a incorporação nas regras da OMC de normas adoptadas noutros fóruns internacionais, contemplando-se a fixação de regras no plano social e ambiental como as que decorrem das convenções e recomendações da OIT em relação ao trabalho infantil, à contratação colectiva e a sindicatos livres; das Cimeiras do Rio de Janeiro e de Quioto quanto á defesa da biodiversidade do planeta; da Cimeira de Copenhaga quanto ao emprego e da Conferência de Pequim quanto aos direitos das mulheres; da UNESCO quanto à garantia da existência de políticas culturais nacionais e da FAO quanto ás políticas de segurança alimentar.
    • Recusa que as regras aplicáveis ao intercâmbio de bens culturais e à propriedade intelectual não respeitem os direitos de criação e a diversidade e especificidade culturais dos vários membros da OMC bem como a salvaguarda do património genético criado por gerações de agricultores e pela biodiversidade do planeta, designadamente com a tentativa de patenteamento de seres vivos.
    • Sublinha a necessidade de no plano agro-alimentar ser respeitado o direito de cada povo a produzir e á segurança alimentar, valorizado o carácter multifuncional da agricultura, na sua dupla valência de produtora de alimentos e de promotora do desenvolvimento rural e da protecção do ambiente , respeitada a diversidade e especificidade das agriculturas mundiais valorizando-se a base familiar das explorações agrícolas em que assenta a agricultura mediterrânea e europeia. Igualmente é necessário proteger os direitos dos consumidores a bens alimentares de qualidade garantida, o que implica severas restrições á liberalização dos Organismos Geneticamente Modificados e á multiplicação da produção animal assente em promotores artificiais de engorda e crescimento bem como a adopção do princípio da precaução e a obrigação de rotulagem suficiente dos produtos alimentares.
    • Defende que a criação de um quadro multilateral aplicável aos investimentos estrangeiros directos visando oferecer aos investidores estrangeiros uma maior segurança e clareza jurídica deve introduzir regras que disciplinem a circulação de capitais, que respeitem a soberania e os interesses de cada um dos Estados na definição da dimensão do seu sector público e na defesa dos sectores produtivos, na aplicação de normas que permitam fiscalizar o IDE e os movimentos de capitais, que defendam o direito dos povos e dos países a um desenvolvimento económico sustentável, que recusem a aplicação de legislação extraterritorial. Defende a adopção, no plano internacional, de uma taxa sobre todas as operações cambiais, de curto prazo, não suportadas em transacções comerciais (Taxa Tobin), cujo produto deveria ser aplicado em políticas de desenvolvimento e progresso social dos países e povos menos avançados.
    • Pronuncia-se a favor da exigência de maior transparência no funcionamento da OMC, o que implica designadamente a informação e participação dos trabalhadores e de todos os cidadãos através das organizações sindicais, das organizações de defesa dos direitos dos consumidores, das associações ambientais e das Organizações Não Governamentais. Defende que nas decisões da OMC sejam incorporadas as avaliações feitas pela Conferência da ONU sobre o comércio e desenvolvimento, a CNUCED. Sublinha a necessidade dos diferendos comerciais serem resolvidos na base de acordos mutuamente vantajosos.
    • Insta o Governo a manter a Assembleia da República informada do desenvolvimento dos processos negociais com o fornecimento, em tempo útil, da documentação necessária e da realização periódica de reuniões de trabalho em sede de Comissão.


Assembleia da República, 23 de Novembro de 1999
Os Deputados