Intervenção de Francisco Lopes na Assembleia de República

Sessão solene de comemoração do Centenário da República

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Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,
Senhoras e Senhores Convidados,

Assinalamos hoje um importante acontecimento da história de Portugal. O triunfo da Revolução Republicana de 1910 pôs fim a um regime caduco e anquilosado, é indissociável de um forte sentimento de independência nacional e democracia e venceu com uma contribuição decisiva do movimento operário e popular. Promoveu significativas mudanças, no plano das liberdades e direitos fundamentais, da educação e da cultura, combateu a ignorância e o obscurantismo, implementou reformas positivas em relação à família e aos direitos das mulheres (não abrangendo o direito de voto), concretizou a laicização do Estado e dotou o país de uma Constituição avançada para a época, a Constituição de 1911.

A implantação da República impulsionou importantes avanços, mas rapidamente o poder político se virou contra os trabalhadores e as suas organizações, defraudou expectativas populares, contrariou necessárias transformações, deixou praticamente intactas as estruturas económicas e sociais e prosseguiu uma política colonialista e de submissão de que é exemplo a entrada de Portugal na I Guerra Mundial.

As concepções e apreciações laudatórias sobre a implantação da República não podem apagar as suas limitações, designadamente a violenta repressão sobre o movimento operário e sindical, que reduziu o apoio popular ao regime e a mobilização em sua defesa, tantas vezes decisiva, enfraquecendo a possibilidade de enfrentar com êxito a reacção monárquica e fascista.

Neste centenário, impõe-se valorizar o inegável conteúdo democrático e progressista do 5 de Outubro e combater as linhas de ataque à República, que visam justificar o golpe militar de 1926 e a instauração do fascismo, esconder o atraso e as injustiças a que este condenou o País e branquear os seus crimes. O fascismo não foi a correcção de erros ou insuficiências da República, mas sim a liquidação por largas décadas do que de mais positivo – em avanços e esperanças – esta representou.

Na nossa história, foi a Revolução de Abril que, pela sua densidade, profundidade e consequências marcou a realidade nacional com notáveis avanços democráticos e progressistas. Iniciada com a acção dos militares e propulsionada pela participação decisiva dos trabalhadores e das massas populares, respondeu em pouco tempo, com profundas transformações, às necessidades e aspirações dos trabalhadores, da juventude do povo português, às exigências de liberdade, democracia, desenvolvimento, justiça social, paz e independência nacional, compromissos que inscreveu na Constituição da República Portuguesa de 1976.

Hoje, após mais de trinta anos de uma política, contrária aos valores de Abril e à Constituição, subordinada às opções da integração europeia, que empurra o País para o declínio, as injustiças e desigualdades sociais, empobrecendo o regime democrático e amputando a soberania nacional, coloca-se a necessidade inadiável de promover a ruptura com o rumo que está a afundar o País e assegurar um caminho de desenvolvimento, democracia, justiça e progresso social.

República, povo, justiça social, democracia, soberania popular, independência nacional: aí estão fundamentos essenciais de Portugal, que a Constituição consagra e que devem ter tradução na vida. No entanto em grande medida eles foram substituídos por uma outra vinculação. A vinculação aos mercados financeiros e aos grupos económicos, sempre ao serviço dos seus interesses, da especulação, da dependência e contra os interesses nacionais e do povo português.

Quando ouvimos defender o brutal pacote de ataque aos trabalhadores, ao povo e ao País e apelar à “união” e ao “compromisso”, que mais não é que uma união e um compromisso para prosseguir e acelerar o rumo de injustiças sociais e declínio nacional, afirmamos claramente que o caminho é outro. O compromisso que se exige é o da responsabilidade da mudança. A ruptura e mudança para pôr Portugal a produzir, a criar emprego com direitos e a distribuir a riqueza com justiça. A mudança, não com a subversão da Constituição, seja pela prática ou por projectos que a põem em causa, mas sim com a sua efectiva concretização. A mudança para a concretização de um rumo patriótico e de esquerda.

Quando ouvimos falar contra o exercício dos direitos constitucionalmente consagrados, afirmamos claramente que a mobilização e a luta dos trabalhadores, da juventude, do povo português, não é apenas um direito, é acima de tudo um dever, para com sua própria vida, para impedir o desastre, para construir um futuro melhor.

O 5 de Outubro e a Revolução de Abril de 1974 mostram que o povo português será o obreiro do seu futuro. Um futuro de soberania, justiça e progresso social, cuja concretização está e estará sempre nas suas mãos.

Viva a República,
Viva Abril,
Viva Portugal,

Disse,

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