Sobre a actual revisão dos Tratados da União Europeia
e a denominada "constituição"


Passo a passo...

A integração europeia tem sido um processo continuo, concretizado, como alguns designam, passo a passo. Alicerçando e procurando justificar cada novo avanço no anterior.

Na Cimeira de Nice, de Dezembro de 2000, foi decidido iniciar mais um processo de revisão dos Tratados da União Europeia (UE) - saliente-se, o quarto apenas numa década: Maastricht (1992), Amesterdão (1998), Nice (2003) - e uma Conferência Intergovernamental (CIG), com inicio previsto para Outubro e finalização prevista para o primeiro semestre de 2004 (embora alguns governos, entre os quais o francês e o alemão, continuem a apontar Dezembro de 2003 como meta para a sua conclusão).

Saliente-se que nesta Cimeira de Nice foi concluída uma outra CIG para a revisão dos Tratados. Revisão que ficou marcada por mais um aprofundamento da integração federalista e pelo reforço do poder dos "grandes" países no processo de decisão na UE. "Grandes" países que procuraram desta forma antecipar a adesão de 10 novos países à UE. Tratado de Nice que, recorde-se, "obrigou" à realização de dois referendos na Irlanda, por forma a ultrapassar o NÃO vitorioso no primeiro referendo.

Procurando ultrapassar contradições evidenciadas durante esta última revisão, os governos dos países da UE tomaram a decisão de avançar mais uma vez com o processo de integração da UE.

A Convenção

A "Convenção sobre o futuro da UE", criada, em 2002, na sequência da Cimeira de Laeken, de Dezembro de 2001, foi dominada pelas forças políticas sociais-democratas e de direita que desde sempre dirigiram a integração europeia, e de onde se procurou afastar todas as forças políticas com uma visão critica e com reais propostas alternativas - veja-se o exemplo de Portugal, onde ao nível da Assembleia da República só estiveram representados o PSD e o PS.

A Convenção teve como objectivo preparar a revisão dos Tratados, iniciando um processo então denominado de "constitucional" (refiram-se os propósitos dos mais ambiciosos federalistas que sempre procuram transformar abusivamente a Convenção em "assembleia constituinte") e que, se possível, levaria à apresentação de um projecto de "constituição", o que veio a verificar-se em Junho deste ano.

A Convenção imiscui-se, desta forma, no que só aos governos e parlamentos nacionais compete: rever os Tratados. Convenção que, como comprovam diferentes sondagens, passou naturalmente à margem dos povos dos países que integram a UE, evidenciando, mais uma vez, que se tratou de um processo que fundamentalmente procurou dar resposta aos interesses e aspirações dos grandes grupos económicos e financeiros e dos "grandes" países.

Utilizando como pretexto a adesão de novos países à UE e um conjunto de formulações e noções "bem" intencionadas - a "democracia", o "papel da Europa no mundo", as "expectativas do cidadão europeu", a "transparência", a "simplificação" e a "eficácia", entre outras - os "grandes" países da UE procuram assegurar o aprofundamento da integração da UE, desde que garantam o seu domínio e salvaguardem os seus interesses. Realidade, aliás, evidenciada na disputa em torno da definição de quem seria o presidente da Convenção e a concertação entre os "grandes" países para a designação de Giscard D'Estaing para esta responsabilidade.

Os "grandes" países, concertando interesses, equilibrando protagonismos e ultrapassando divergências, querendo arrastar consigo os denominados "pequenos" países, procuram criar e implementar os instrumentos e o quadro institucional que permitam concretizar os seus objectivos políticos de domínio, procurando melhorar a sua posição no quadro da relação de rivalidade / parceria com os EUA.

As críticas tão veemente formuladas - quanto tão rapidamente "esquecidas" - por governos e representantes dos denominados "pequenos" países perante a afirmação de soluções institucionais que reafirmam ou reforçam o poder dos "grandes", evidenciam uma das contradições da UE, mas não iludem o que une uns e outros. Ou seja, as forças políticas que desde sempre foram responsáveis pela integração europeia e os interesses económicos que lhe estão subjacentes - nos "pequenos" e "grandes" países - apostam num significativo salto em frente na integração federalista, neoliberal e militarista da UE.

A denominada "constituição"

A Convenção apresentou na Cimeira de Salónica, em Junho, um "Projecto de Tratado que institui uma Constituição para a Europa". Os chefes de estado e de governo aceitaram o projecto de "constituição" como uma boa base de trabalho para a CIG. Nesta Cimeira foi definido o objectivo político de concluir a CIG de forma a permitir a utilização das eleições para o Parlamento Europeu (PE), em Junho de 2004, como meio de "legitimação" da designada "constituição". Deste modo, a "constituição" seria assinada entre o 1 de Maio de 2004 - data da adesão dos novos 10 Estados-membros - e as eleições para o PE.

Sem que seja possível, neste momento, avaliar todo o alcance real do projecto de "constituição" apresentado pela Convenção (que à data da elaboração deste texto ainda não tinha completado os seus trabalhos quanto às importantes Parte III (políticas) e IV (disposições finais)). Salientando que em Outubro se iniciará a CIG - a quem cabe decidir - e que as suas conclusões terão que posteriormente ser aprovadas / ratificadas pelos parlamentos nacionais e que, em alguns países, se realizarão referendos. Apresentamos uma primeira e resumida análise, incidindo sobre questões institucionais da chamada "constituição europeia" (que integram a sua Parte I).Desta destacamos:

- A assunção explícita do primado da "constituição" e do direito da UE sob o direito dos Estados-membros, subalternizando, desta forma, as Constituições nacionais, nomeadamente a Constituição Portuguesa, no que se refere ao primado quanto aos actos adoptados no domínio das competências da UE;

- A introdução com carácter vinculativo da "Carta dos Direitos Fundamentais", com a sua concepção minimalista de direitos, que representa um recuo face a direitos consignados na Constituição portuguesa, possibilitando a existência de conflito entre o inscrito na Carta e a nossa Constituição;

- O reforço das competências a nível da UE, nomeadamente em áreas da Justiça e Assuntos Internos, da Política Externa e de Segurança Comum e da Política de Segurança e Defesa Comum (saliente-se com a concepção de pilar europeu da NATO) ou quanto a aspectos ligados à denominada "governação económica", por exemplo, passando a Comissão Europeia a poder dirigir, em algumas áreas, advertências directamente aos Estados-membros;

- O reforço dos poderes das instituições da UE e do seu carácter supranacional / federalista (recorde-se que para Giscard D'Estaing, a evolução das instituições da UE seria no sentido da "emergência de funções federais nas duas instituições com vocação executiva - o Conselho e a Comissão - que acabarão um dia por se unir, para dar origem ao governo da Europa Unida" - Le Monde 13.01.03), de que se referem alguns exemplos:

Conselho Europeu e Conselho: com a extensão da decisão por maioria qualificada no Conselho. O fim das presidências semestrais rotativas do Conselho Europeu, e desta forma do Conselho (que passam, no mínimo, a anuais), e a eleição por maioria qualificada do Presidente do Conselho Europeu com um mandato de dois anos, renovável. A reafirmação da PESC e PSDC (salientando-se o significado da criação do Ministro dos Negócios Estrangeiros);

Comissão Europeia: com novas áreas de competência. A plena assunção do fim do principio um país / um comissário permanente com direito a voto (já anteriormente perspectivado no Tratado de Nice) - mesmo que seja proposto um mecanismo de rotação equitativo entre os Estados membros, coloca-se em causa o principio da igualdade da presença de todos os Estados membros na Comissão Europeia, a instituição que detém o poder de iniciativa legislativa na UE. O reforço dos poderes do seu presidente quanto à composição (deixa de ser cada Estado membro a indicar o comissário, passando a indicar três possibilidades, sendo que o presidente da Comissão escolhe uma de entre estas) e quanto à organização da Comissão;

Parlamento Europeu: com a extensão da aplicação do processo de co-decisão e com a previsão de uma nova redistribuição de lugares no PE para as eleições de 2009, num quadro de valorização do critério demográfico;

- A valorização do critério demográfico em detrimento da representação de Estados soberanos enquanto tais, procurando aproximar a representatividade de cada pais ao seu peso demográfico (na perspectiva da revisão do número de deputados no PE para 2009 ou na ponderação de votos e limiares da maioria qualificada no Conselho) e limitando o direito de veto no Conselho (sendo o recente exemplo de liberalização do acesso aos recursos pesqueiros das águas portuguesas, nomeadamente pela frota espanhola, eloquente quanto à importância da manutenção deste instrumento para a defesa de interesses vitais do País);

- A perda de influência de Portugal no processo de decisão ao nível da UE, pois:

Perde as presidências semestrais rotativas do Conselho Europeu (e desta forma, a direcção semestral dos trabalhos do Conselho);

Perde o comissário permanente com direito a voto na Comissão Europeia (mesmo que com base num mecanismo de rotação equitativa);

Perde com mais uma ampliação da decisão por maioria qualificada (com a respectiva amputação do direito de veto, num quadro em que se valoriza o critério demográfico);

Pode perder mais deputados ao Parlamento Europeu nas eleições de 2009 (perdendo já um em 2004);

- A reafirmação do poder do conjunto dos "grandes" países no processo de tomada de decisão, através:

Da ampliação da decisão por maioria qualificada, tendo em conta o seu peso na ponderação de votos no Conselho e os limiares para a maioria qualificada (salientem-se que decisões tão importantes como a da escolha do Presidente do Conselho Europeu, do Presidente da Comissão Europeia ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros são tomadas por maioria qualificada);

Da ampliação do processo de decisão por co-decisão, tendo em conta o seu peso na distribuição de deputados do PE;

- E os parlamentos nacionais vêem a sua intervenção limitada a um pseudo controlo da aplicação do principio da subsidariedade, recusando-se a sua participação directa no processo de decisão comunitário;

Se adicionarmos a reafirmação dos objectivos neoliberais (nos objectivos da UE, do Banco Central Europeu,...) e militaristas (com a criação de novos instrumentos) contidos no "Projecto de Tratado que institui uma Constituição para a Europa", podemos afirmar que este representa um avanço significativo na integração europeia, consolidando as bases e concretizando os eixos fundamentais lançados no Tratado de Maastricht (1992) - o federalismo, o neoliberalismo e o militarismo - tendo por objectivo a criação de um bloco político-militar.

Maiores que sejam os eufemismos ou as mistificações, acelera-se a construção de um sistema de poder, dominado pelas grandes potências da UE, que colocará em causa os interesses e a soberania de Portugal, subalternizando as instituições nacionais e colocando em risco a democracia, ao transferir decisões fundamentais para os trabalhadores e para o País para "Bruxelas".

Saliente-se que, face a este quadro, o Governo PSD / CDS-PP, com a conivência do PS (não é um maior aprofundamento da actual "integração europeia" nos seus principais eixos que coloca dificuldades às forças políticas e outros protagonistas que estão na sua génese), aceita os limites impostos pelos denominados "grandes" países (recorde-se a proposta franco-alemã sobre o quadro institcional da UE, logo apoiada pela Grã-Bretanha, Itália e Espanha e que Giscard D'Estaing levou a "bom porto"...) não colocando em causa as principais orientações da actual revisão dos Tratados, entrando numa lógica de negociação e de conivência inaceitáveis, que alguns designam de "mal menor".

A tentativa de condicionar o debate

Em Portugal foram evidentes as tentativas de condicionar o debate político sobre a "integração europeia", nomeadamente pela intenção de o limitar a um quadro de partida que não se quer questionado. Ou seja, discute-se se é um bocadinho mais à "esquerda" ou à "direita", se o avanço é maior ou menor, mas não se quer ver questionado o actual rumo que as forças políticas e económicas que dominam a actual integração da UE querem impor.

Procura-se limitar as alternativas a pseudo dicotomias, como a tentativa de limitar o debate sobre as questões institucionais à dicotomia “federalismo” versus “directório”, procurando apresentar o federalismo como a única resposta à tentativa de imposição de um directório dos "grandes" países. Mistificando que não há directório dos "grandes" sem aprofundamento federalista, nem federalismo sem o reforço dos "grandes" no processo de decisão. E, sobretudo, procurando apresentar a cooperação entre estados soberanos e iguais em direitos - que é a melhor resposta à imposição de um directório dos "grandes" países - como "ultrapassada" ou "irrealista".

Mistificam-se igualmente as consequências das medidas propostas. Como a apresentação do projecto de "constituição" como um aprofundamento da democratização e da participação dos cidadãos na UE. Silenciando que, por exemplo: se propõe uma Comissão Europeia onde só alguns Estados terão comissários com direito a voto; que serão tomadas decisões fundamentais onde os Estados participarão com uma influência diferenciada; ou que Portugal poderá ver-se impossibilitado de defender os seus interesses nacionais fundamentais.

Ou ainda, a tese de que a "constituição" contribuirá para que a UE esteja em condições de equilibrar o actual poder hegemónico dos EUA, quando a realidade demonstra que em inúmeras questões económicas, políticas e militares estes dois pólos capitalistas partilham das mesmas posições - vejam-se as conclusões das recentes Cimeira de Salónica e Cimeira UE / EUA, ambas realizadas em Junho - apesar da existência de contradições, tão recentemente evidenciadas aquando da agressão militar ao Iraque.

Por outro lado, somos confrontados com a tentativa de centrar o debate nas questões institucionais e na dicotomia “grandes” versus “pequenos”, procurando que não sejam debatidas as orientações e as políticas definidas a nível da UE e as suas consequências para Portugal (e como estas tantas vezes deram e continuam a dar suporte à política de direita realizada no País). Como igualmente se procura evitar que sejam debatidas as enormes responsabilidades dos Governos PS, PSD ou PSD / CDS-PP que durante os últimos 18 anos dirigiram a integração de Portugal na CEE / UE, assim como as consequências das suas políticas na situação da nossa economia, na destruição de parte do aparelho produtivo nacional, na crescente dependência externa, na limitação do pleno desenvolvimento económico do País e melhoria das condições de vida dos trabalhadores portugueses.

A urgência de um verdadeiro debate nacional

Em Portugal é urgente a realização de um amplo debate nacional que contribua para a demonstração de que existem alternativas ao "caminho único" que nos querem impor. Um debate que ponha em causa a tentativa de imposição do que alguns pretendem que seja um facto consumado, a "constituição", destinada a ser objecto de amplas campanhas de promoção, abundantemente financiadas pela UE.

Constitui uma exigência para todos os órgãos de soberania nacionais a salvaguarda da Constituição da República Portuguesa, que têm o dever imperativo de a respeitar e fazer respeitar. O que se impõe não é, como alguns advogam, uma revisão da Constituição da República, que atingiria os seus limites materiais por pôr em causa a soberania constitucional original do povo português, para permitir acolher na Constituição os «avanços da unificação europeia», mas impedir uma reformulação dos Tratados da União Europeia que afronte e viole a Constituição da República Portuguesa e atinja gravemente a soberania e a independência nacionais.

O que é urgente não é mais um avanço no aprofundamento da integração europeia mas sim a realização de um amplo debate sobre que Europa interessa aos trabalhadores e às populações do nosso país, que avalie os riscos do actual processo de integração europeia e que mobilize o nosso povo para a necessidade de um outro rumo que assuma a defesa da soberania nacional como um valor fundamental e uma questão política estratégica para Portugal, na construção de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, aberta ao mundo, de paz e solidariedade.

Um debate que necessariamente irá crescer até às eleições para o Parlamento Europeu, em Junho de 2004.

Uma outra Europa

Em vez de mais um "passo em frente" que encerra grandes perigos para o nosso País, afirmamos que é necessário um novo rumo para a Europa que concretize os princípios da "coesão económica e social" e da "igualização no progresso das condições de vida e de trabalho", no respeito pela igualdade de direitos dos Estados, recusando a via federalista com a redução de poderes e papel dos países mais "pequenos" e a lógica de bloco político-militar.

Um novo rumo que reafirme que um verdadeiro desenvolvimento do País exige uma constante e firme defesa dos interesses nacionais. O que necessariamente passa pela afirmação da soberania nacional, pelo pleno papel das instituições nacionais e não pela sua alienação e desvalorização. Pela soberania do povo português nas decisões fundamentais para o presente e o futuro do País, e a consequente travagem na transferência de mais competências para a União Europeia. Pelo que, deverá ser liminarmente afastado o projecto de uma constituição europeia ou de tratado constitucional, e se tenha em conta o princípio de estados soberanos e iguais em direitos, se aprofunde a democracia e aproxime o processo de decisão dos cidadãos, reservando para os parlamentos nacionais maior capacidade de intervenção e decisão nas políticas comunitárias, seja garantido que cada país tenha um comissário permanente com direito a voto, que se mantenham as presidências semestrais rotativas do Conselho, se mantenha ou alargue a possibilidade de usar o direito de veto e se garanta uma presença em igualdade dos Estados membros na direcção do Banco Central Europeu.

Sendo igualmente fundamental que se suspenda e reveja o Pacto de Estabilidade e se revejam profundamente as políticas económica e monetária da UE, por forma a dar prioridade ao desenvolvimento sustentado, ao investimento público, à defesa dos serviços públicos e ao emprego, à inclusão social e aos direitos dos trabalhadores.

E se promova uma Europa de paz e de cooperação com todos os povos do mundo e não a militarização da UE e a aceleração da corrida aos armamentos.

Projecto de "constituição" (1) - Competências da União Europeia (Artigos I-12º a I-17º)

Âmbito

Competências

Exclusivas da UE (só a UE pode legislar e adoptar actos juridicamente vinculativos) . Regras de concorrência do mercado interno;
  . Política monetária da zona euro;
. Política comercial comum;
. União aduaneira;
. Conservação de recursos marinhos no âmbito da Política Comum de Pescas;
. Acordos internacionais (quando previsto);
Partilhadas entre a UE e os Estados-membros (os Estados-membros só podem legislar e adoptar actos juridicamente vinculativos se a UE ainda não o tiver feito nesse domínio) . Mercado interno;
  . Justiça e Assuntos Internos;
. Agricultura e Pescas;
. Transportes e redes transeuropeias;
. Energia;
. Política social (quando previsto);
. Coesão económica, social e territorial;
. Ambiente;
. Defesa dos Consumidores;
. Questões comuns de segurança em saúde pública;
Coordenação das políticas económicas e de emprego pela UE . Adopção das orientações gerais das políticas económicas dos Estados-membros, com disposições especificas para a zona euro;
  . Adopção das directrizes das políticas de emprego dos Estados-membros;
. Pode ainda adoptar iniciativas que visem garantir a coordenação das políticas sociais dos Estados-membros;
Política Externa e de Segurança Comum (PESC) . A competência da UE abrange todos os domínios da política externa, todas as questões relativas à segurança, inclusive a definição progressiva de uma política de defesa comum que poderá conduzir a uma defesa comum;
Acções complementares às dos Estados-membros . Investigação, desenvolvimento tecnológico e espaço;
  . Cooperação para o desenvolvimento e ajuda humanitária;
Acções de apoio, de coordenação ou de complemento por parte da UE (não obriga à harmonização de disposições legislativas e regulamentares pelos Estados-membros) . Indústria;
  . Protecção e melhoria da saúde humana;
. Educação, formação profissional, juventude e desporto;
. Cultura;
. Protecção civil;
Cláusula de flexibilidade . Se necessário, o Conselho, decidindo por unanimidade, após proposta da Comissão Europeia e aprovação do PE, poderá ampliar o campo de competência da UE;

 

Projecto de "constituição" (1) - Quadro institucional da União Europeia (Quadros 1 a 7)

Parlamento Europeu
(Artigo I-19º)
. Assunção da sua função legislativa e orçamental, assim como de controlo político e função consultiva quando previstas;
. Elege o Presidente da Comissão Europeia. Através de uma moção de censura pode demitir a Comissão;
. O número de deputados aumenta de 732 para 736 (corrigindo o Tratado de Nice), com uma distribuição degressivamente proporcional, com um novo limiar mínimo de 4 deputados por Estado-membro;
. Prevê a adopção de uma nova redistribuição para as eleições de 2009 - e sempre que necessário - adoptada por unanimidade no Conselho Europeu, com base numa proposta do PE;
Conselho Europeu
(Artigo I-20º e I-21º)
. Passa a integrar formalmente as instituições da UE. Define orientações e não exerce funções legislativas;
. Decide por consenso, salvo disposições em contrário;
. Integra os Chefes de Estado e de Governo dos Estados-membros, o seu Presidente (sem direito de voto), o Presidente da Comissão (sem direito de voto). O Ministro dos Negócios Estrangeiros participa nos trabalhos;
. Reúne-se trimestralmente e extraordinariamente;
. O Presidente do Conselho é eleito (ou demitido) por maioria qualificada, por dois anos e meio renováveis. Este dirige os trabalhos do Conselho Europeu, em cooperação com o Presidente da Comissão e as conclusões do Conselho de Assuntos Gerais. Assegura a representação externa da UE no âmbito da PESC (tal como o Ministro de Negócios Estrangeiros). Não pode exercer qualquer mandato nacional ao mesmo tempo;
Conselho de Ministros (Artigo I-22º a I-24º)
. Exerce a função legisladora e orçamental com o PE, assim como funções de definição de políticas e de coordenação;
. É composto por um representante ministerial de cada Estado-membro;
. Delibera por maioria qualificada, salvo disposição em contrário;
. A partir de 1 de Novembro de 2009 a maioria qualifica é definida como uma maioria de Estados-membros que representem no mínimo 3/5 da "população da UE" (cerca de 60%);
. Quando a decisão do Conselho não é tomada na base de uma proposta da Comissão ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros, a maioria qualificada é definida por uma maioria de 2/3 dos Estados-membros que representem no mínimo 3/5 da população (cerca de 60%);
- O Conselho pode, por unanimidade, passar a decidir por maioria qualificada ou por co-decisão numa matéria em que a "constituição" preveja que a decisão seja tomada por unanimidade no Conselho;
. Formações do Conselho: Conselho Legislativo e de Assuntos Gerais. Conselho dos Negócios Estrangeiros (é presidido pelo Ministro de Negócios Estrangeiros). São possíveis outras formações do Conselho (Economia e Finanças,...);
. A Presidência de uma formação do Conselho é assegurada num sistema de rotação equitativo entre os Estados-membros, com duração mínima de um ano;
Comissão Europeia
(Artigo I-25º e I-26º)
. Tem funções de coordenação, execução e gestão. Assegura a representação externa da UE com excepção da PESC. Salvo disposição em contrario, os actos legislativos só podem ser propostos pela Comissão. Tem um mandato de cinco anos;
. A partir de 1 de Novembro de 2009, é composta por um Presidente, o Ministro de Negócios Estrangeiros (que é Vice-presidente) e por treze Comissários Europeus, com base num sistema de rotação equitativo. Todos os países sem Comissário Europeu têm direito a ter um Comissário (sem direito a voto na Comissão);
. Os Comissários Europeus e os Comissários são escolhidos pelo Presidente da Comissão de entre listas de três pessoas apresentadas por cada Estado-membro. Estes serão sujeitos a um voto de aprovação pelo PE;
. O Presidente da Comissão é proposto por maioria qualificada pelo Conselho Europeu (tendo em conta os resultados das eleições ao PE) e após consultas adequadas, que o elege por maioria dos seus membros;
. O Presidente decide das orientações gerais e da organização interna da Comissão. Nomeia Vice-presidentes e pode exigir a demissão de um Comissário Europeu ou Comissário;
Ministro dos Negócios Estrangeiros (Artigo I-27º)
. É nomeado pelo Conselho Europeu, por maioria qualificada, com o acordo do Presidente da Comissão;
. Conduz a Política Externa e de Segurança Comum e a Política de Segurança e Defesa Comum, sob mandato do Conselho;
. É um dos Vice-presidentes da Comissão e é mandatado por esta nas áreas de acção externa sob competência desta;

 

Projecto de "constituição" (1) - Disposições especificas sobre a Política Externa e de Segurança Comum - PESC (Artigo I-39º)

. O Conselho Europeu fixará os objectivos estratégicos da PESC;
. O Conselho de Ministros elaborará as políticas no quadro das orientações estratégicas definidas pelo Conselho Europeu;
. Ambos adoptam decisões por unanimidade, salvo excepções previstas. O Conselho Europeu pode decidir que o Conselho delibere por maioria qualificada em casos não previstos;
. Têm capacidade de iniciativa os Estados-membros e o Ministro de Negócios Estrangeiros ou deste com o apoio da Comissão;
. Esta será executada pelo Ministro de Negócios Estrangeiros e pelos Estados-membros;
. O PE será consultado informado sobre os principais aspectos da PESC;

 

Projecto de "constituição" (1) - Disposições especificas sobre a Política de Segurança e Defesa Comum - PSDC (Artigo I-40º)

. É parte integrante da PESC e inclui a definição gradual de uma política de defesa comum da UE, que conduza a uma defesa comum, logo que o Conselho Europeu decida por unanimidade. Enquanto assim não acontecer os Estados-membros serão solidários (incluindo com meios militares) com um Estado-membro alvo de uma agressão armada no seu território. Ao desenvolver-se a cooperação no domínio da defesa, os Estados-membros participantes cooperarão com a NATO;
. Esta não afecta a especificidade da política de defesa e de segurança de alguns Estados-membros. Respeita as obrigações decorrentes da NATO para outros Estados-membros, sendo compatível com a política de segurança e defesa adoptada nesse âmbito;
. Garante capacidade operacional apoiada em meios civis e militares fornecidos pelos Estados-membros;
. Possibilidade da utilização destes meios em missões exteriores para “assegurar a manutenção da paz, a prevenção de conflitos e o reforço da segurança internacional, de acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas”;
. As decisões são tomadas por unanimidade pelo Conselho, por proposta de um Estado-membro ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros;
. É instituída a Agência Europeia de Armamento, de Investigação e de Capacidades Militares com o objectivo de identificar as necessidades, promover as medidas para as satisfazer e para reforçar a base industrial e tecnológica do sector da defesa e participar na definição de uma política europeia de capacidades e de armamento;
. É previsto o estabelecimento de um cooperação estruturada entre diversos Estados-membros;
. O PE será consultado e informado sobre os principais aspectos da PSDC;

 

Projecto de "constituição" (1) - Cooperações reforçadas (Artigo I-43º)

. Aplicadas às competências não exclusivas da UE, com o objectivo de reforçar o processo de integração;
. É solução de recurso, decidida pelo Conselho, com a condição que reúna 1/3 dos Estados-membros;
. Só os Estados-membros que a integram têm direito a voto e só a estes vincula, os restantes apenas participam nas deliberações;
. A unanimidade aplica-se apenas aos Estados-membros que a integram. A maioria qualificada é definida como uma maioria dos votos dos Estados que a integrem, representando, no mínimo, 3/5 da população desses Estados (cerca de 60%). Quando a decisão não tem origem numa proposta da Comissão ou no Ministro dos Negócios Estrangeiros, a maioria qualificada exige 2/3 dos Estados que a integram, representando 2/5 da população desses Estados;

 

(1) In projecto de constituição apresentado pela "Convenção sobre o futuro da Europa": CONV 797/1/03 REV 1 VOLUME 1 Bruxelas, 12 de Junho de 2003 (13.06) Parte I e Parte II da Constituição PT


Portugal e a UE - Nº 42 - Agosto de 2003