A 1 de Janeiro de 2002 as notas e moedas de euro "verão a luz
do dia". Cerca de 50 mil milhões de moedas e 15 mil milhões
notas entrarão em circulação progressivamente. A Cimeira
de Madrid em 1995 definiu o calendário da transição para
o Euro - o período de dupla circulação com as moedas nacionais
deverá estar concluído o mais tardar até Junho de 2002.
Nove Estados-membros da zona euro já decidiram antecipar essa data para
Fevereiro de 2002.
A transição levanta muitos problemas - da produção de notas e de moedas, a mudança da facturação e contabilidade das empresas, a transformação de todos os sistemas informáticos públicos e privados, a mudança das contas bancárias e a introdução das notas nos terminais ATM (1), o pagamento dos impostos e dos serviços públicos - mas, a dificuldade maior, será o passar a usar diariamente uma nova moeda.
A implementação do Euro em 2000
A um ano da entrada em circulação das notas e moedas de euro,
a maioria dos agentes económicos e particulares continuam a laborar como
se o euro "não existisse". Segundo o relatório anual
de avaliação da Comissão Europeia, em 2000 houve uma regressão
dos volumes transaccionados em euros pelas empresas e particulares, assim com
uma redução do número de abertura de novas contas bancárias
em euros - menos de 1% das contas bancárias dos particulares são
em euros.
Por outro lado, se retirarmos Portugal, Luxemburgo e a Bélgica, menos
de 1% das empresas modificaram os seus sistemas de contabilidade. As pequenas
e médias empresas (PME) são aquelas com maiores atrasos na adaptação.
As empresas multinacionais, grandes beneficiárias da moeda única,
estão mais avançadas - mais de 20% já efectuaram uma mudança
total para o euro e 40% esperam fazê-lo antes do final de 2001. Só
as administrações públicas parecem estar a fazer maiores
progressos na adaptação, sobretudo ao nível de suportes
informáticos e da possibilidade de pagamento dos impostos em euros.
Esta avaliação negativa traduz uma falta de confiança no euro. Sem esta confiança, o projecto da moeda única europeia pode correr sérios riscos. Esta confiança foi abalada pela desvalorização do euro em cerca de 30% face ao dólar, desde da sua introdução a 1 de Janeiro de 1999. Contudo, de Dezembro de 2000 a Janeiro de 2001, o euro começou a recuperar devido ao "arrefecimento" da economia dos EUA..
Por outro lado, como afirma a Comissão, traduz também uma grande falta de informação das empresas e dos particulares, sobretudo sobre o calendário de implementação. Segundo a Comissão, muitos agentes económicos pensam que ainda terão o ano de 2002 para efectuar a transição para o euro.
Algumas dificuldades para os particulares
Uma dificuldade à partida é ter a noção do valor da nova moeda. Os particulares durante muito tempo irão fazer a conversão do euro na sua moeda nacional. Terão também de se habituar a novas denominações de notas e moedas. Alguns "grupos" terão maiores dificuldades de adaptação - as pessoas mais idosas, as pessoas analfabetas, as pessoas portadoras de deficiência visual, etc.
O Euro terá 7 denominações em moedas (1, 2, 5, 10, 20 e 50 cents; 1 e 2 euros) e 7 denominações notas (5, 10, 20, 50, 100, 200 e 500 euros). Em Portugal, passaremos a funcionar com valores faciais mais baixos - 50 euros serão equivalentes a nossa nota de 10 mil escudos e a nota de 500 euros representará o rendimento médio mensal para milhares de portugueses.
Outro motivo de preocupação, será o arredondamento dos preços. A moeda mais pequena, de 1 cent, valerá cerca de 2 escudos. Os bens que custem menos de 2 escudos passarão a custar 2 escudos. Um bem que custe, por exemplo, 21 escudos tenderá a ser arredondados para o seu par mais próximo, não sendo de acreditar que o arredondamento seja para baixo.
O surgimento de uma nova moeda, poderá acarretar problemas de falsificação e de aumento da fraude, devido aos problemas de identificação da nova moeda. Este risco aumenta, quando faltam implementar medidas de identificação do dinheiro falsificado, como existem para as restantes 12 moedas nacionais na zona euro. Sem os esclarecimentos apropriados, os "grupos" de risco e com menor acesso à informação poderão ser vítimas de práticas fraudulentas e comportamentos abusivos.
Ao nível do período de transição, é necessário
referir, que apesar da fixação das taxas de câmbio das várias
moedas nacionais em euros, ainda não se vislumbrou a tão famigerada
redução dos custos de transacção e de conversão.
No fundo, desde 1 de Janeiro de 1999, as moedas nacionais representam denominações
diferentes do euro. Sendo assim, não se justifica que na zona euro transacções
em Estados-Membros diferentes (com cartões de débito, cartões
de crédito ou cheques), operações de conversão cambial
e operações de transferência continuem a ter os custos que
têm, muitas vezes para além da simples taxa de serviço.
A maioria dos bancos continuam a cobrar comissões de conversão
baseadas em percentagem do montante transaccionado. Sendo assim, os particulares
não ganharam, pois os bancos transferiram os lucros da "especulação"
cambial, para outras comissões e taxas de serviços prestados.
Será de perguntar, após o período de dupla circulação,
como reagirão as instituições bancárias?
Neste contexto, é de lembrar, no final de 1997, um estudo "famoso",
do Gabinete Europeu das Uniões de Consumidores, que apresentou o exemplo
de "um viajante europeu que desse uma volta à União Europeia
cambiando em todas as fronteiras a totalidade do seu dinheiro perderia 40% em
custos de conversão". Apesar das manipulações técnicas,
este exemplo pretendia mostrar uma das vantagens da moeda única. Hoje
em dia, a situação não é muito diferente.
O mesmo "viajante europeu" continua "a pagar" - um turista
português que fosse à Bélgica e convertesse uma quantia
de dinheiro em francos belgas, poderia pagar entre um mínimo 600 escudos
por comissão de serviço a um 1% do valor do montante convertido
(à ida e à vinda). Se utilizasse o seu cartão de crédito
numa compra, pagaria uma taxa de serviço mínima, quando não
mesmo uma percentagem. O mesmo se passaria se levantasse dinheiro numa máquina
ATM.
Ainda em relação ao sector bancário, as instâncias comunitárias não conseguiram esclarecer quem pagará o custo de retirada das moedas nacionais do mercado, durante e após o período de dupla circulação. Poderão ser os particulares a assumirem este custos, apesar dos pareceres contrários das instâncias comunitárias.
Algumas dificuldades para as empresas
Desde 1 de Janeiro de 1999, existe um custo transitório para o sector
retalhista que implementou de um sistema de dupla fixação dos
preços em euros/moeda nacional (que não é obrigatório
na grande maioria dos Estados-membros da zona euro). A dupla fixação
dos preços deriva de uma recomendação comunitária
de 1998 que visava a informação e sensibilização
dos consumidores para o euro.
A maioria das cadeias comerciais multinacionais já introduziram um sistema
de dupla fixação de preços. Ao nível dos Estados-membros,
a percentagem do sector retalhista que "passou" à dupla fixação
dos preços varia dos 31% em Portugal aos 60% na Bélgica.
Outro custo ocorrerá na transformação dos sistemas de
contabilidade/facturação e do suporte informático. Apesar
de parecer simples - uma mera operação de dividir - esta modificação
acarretará custos e dificuldades, sobretudo para as PME que desenvolveram
software próprio (como acontece muitas vezes no ramo industrial) e para
aquelas que terão de adquirir novo software.
Haverá outros custos, ainda não totalmente mensuráveis,
ao nível da adaptação e da logística decorrentes
desta transição. Por exemplo, as empresas operadoras de máquinas
de venda automática, deverão fazer uma adaptação
técnica em todas elas, para garantir o uso de moedas e notas de euro.
Neste caso, o custo será bastante elevado.
Mas o principal custo para as empresas será de natureza económica e financeira, onde a maioria das PMEs "perdem" e as multinacionais "ganham". O acréscimo de concorrência, a execução da política monetária por parte do Banco Central Europeu e a política cambial no âmbito da UEM, serão os factores que definirão num determinado momento os perdedores e vencedores.
Notas:
(1) Automatic Teller Machine, maquinas de levantamento automático, usualmente apelidadas de multibanco em Portugal
Fonte: Comissão Europeia, Euro Papers, n.º 41 -
Agosto 2000, COM (2000) 443 e a nota trimestral do desenvolvimento da utilização
do Euro, n.º 4, 13/11/2000.