Soberania, Defesa Nacional e Forças Armadas
Declaração de Jerónimo de Sousa, Candidato à Presidencia da República
23 de Novembro de 2005

 


No quadro da minha candidatura, vou hoje abordar uma vertente particularmente importante, das competências constitucionais do Presidente da República, respeitante à Soberania, Defesa Nacional e às Forças Armadas.

O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado, o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, o Comandante Supremo das Forças Armadas, com a responsabilidade de nomear e exonerar os Altos Comandos Militares, de presidir ao Conselho Superior de Defesa Nacional e de declarar a guerra e a paz.

Neste quadro, importa sublinhar que, tal como em relação à política externa, cabe ao Governo a condução da política de defesa nacional, mas este não a pode conduzir sem o Presidente da República e muito menos contra a sua vontade. É ao Governo que cumpre decidir sobre o emprego das Forças Armadas mas é ao Presidente da República que compete autorizá-lo.

A independência e soberania nacionais são valores inalienáveis, por isso, a minha candidatura rejeita, com firmeza, o espartilho em que as grandes potências da NATO e da União Europeia pretendem aprisioná-las e assume a participação empenhada do nosso País na solução pacífica dos problemas internacionais, com base em critérios de igualdade, respeito mútuo e não ingerência.

Na sequência dos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 e a pretexto de uma alegada “guerra contra o terrorismo”, os EUA lançaram, à escala mundial, uma nova ofensiva militar, económica e ideológica, no sentido de aprofundar a sua política expansionista, de subverter a ordem internacional e de hegemonizar e instrumentalizar instâncias internacionais como a ONU e a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).

Entretanto, vai-se concretizando a política de militarização da União Europeia, como pilar Europeu da NATO, e a sua estratégia de segurança, tendo como referência o Conceito Estratégico da Aliança Atlântica, num caminho contrário ao interesse dos povos, indesejável para a paz e para Portugal, num quadro em que o Conceito Estratégico de Defesa Nacional não projecta, nem garante, uma estratégia assente no primado da defesa dos interesses nacionais.

Portugal deverá, em todas as situações, ser parte activa e impulsionadora do processo de desarmamento e de reforço dos mecanismos internacionais de segurança colectiva, processo que deverá ser orientado no sentido da dissolução da NATO e do impedimento da criação de novos blocos político-militares.

O nosso País deve também limitar a sua participação militar no estrangeiro a missões que se desenvolvam no quadro da ONU e da Organização de Segurança e Cooperação Europeia, no rigoroso respeito pelo direito internacional e ponderadas caso a caso.

Diz-se, aliás, que o nosso envolvimento militar no exterior, que não é atingido pelas restrições orçamentais, projecta a imagem de Portugal além fronteiras. Curiosamente o mesmo argumento já não se aplica quando se trata, por exemplo, do ensino e divulgação da língua e cultura portuguesas no estrangeiro.

É neste quadro que a minha candidatura assume como pilar estratégico da política de Defesa Nacional a doutrina constitucional que circunscreve defesa nacional e segurança interna como realidades diferentes e se assume frontalmente contra teses que, pondo em causa o quadro constitucional, procuram substituir conceito de defesa nacional pelo de segurança nacional.

A minha candidatura assume a necessidade de uma nova visão estratégica para as Forças Armadas, de carácter nacional e democrática, que favoreça os princípios da coesão e do desenvolvimento de uma consciência nacional em torno dos novos problemas que envolvem a Defesa Nacional. Ao mesmo tempo que consideramos óbvia a ideia de que Portugal não é nem pode ser auto-suficiente em matéria de defesa, não aceitamos teses segundo as quais o nosso país não deve ou não necessita de assegurar nenhuma capacidade autónoma de defesa e que os sistemas de defesa colectivos devem prevalecer sobre os sistemas nacionais de defesa.

A minha candidatura assume a necessidade de um verdadeiro projecto de reestruturação e redimensionamento das Forças Armadas, onde o critério prioritário para o seu reequipamento seja o cumprimento das missões que constitucionalmente lhe estão atribuídas, rejeitando, no entanto, gastos como os da aquisição de aviões F 16 para constituir uma 2ª esquadra, quando todos sabiam das dificuldades financeiras para assegurar a manutenção plena da 1ª esquadra. Mas rejeitando também uma Lei da Programação Militar como aquela que o PS e os partidos da direita viabilizaram, com o altíssimo valor de 215 milhões de contos para seis anos e a previsão de mais 263 milhões para os seis anos seguintes, uma LPM que não tem em conta a realidade económico-financeira do nosso país, nem contempla uma visão estratégica realista para Portugal, mas tão só os compromissos externos nomeadamente com a NATO.

Ao Presidente da República, enquanto Comandante Supremo das Forças Armadas, compete uma intervenção potenciadora de consensos e um magistério de influência no sentido de contribuir para a resolução dos principais problemas, alguns dos quais com carácter de urgência, com que as Forças Armadas e os militares se debatem.

De resto, nos últimos anos vimos assistindo a uma permanente situação de mal estar no seio das Forças Armadas resultante da não resolução de problemas, nomeadamente a concretização de aspirações e expectativas em relação às carreiras e ao sistema retributivo, agravada pelas medidas do actual Governo que põem em causa os direitos de cidadania dos militares e degradam o Estatuto da Condição Militar.

É útil recordar, que foi nos governos de Cavaco Silva que se operou a alteração no método de escolha das chefias militares no sentido governamentalizador de que hoje alguns falam; que foi inventado e mal aplicado um Novo Sistema Retributivo cujos negativos efeitos ainda hoje perduram; que se desenvolveram linhas, com o então Ministério do Mar, que visavam retirar à Marinha vastas competências em matéria de Autoridade Marítima; que inúmeros militares foram punidos por pretenderem a consagração do associativismo militar.

Defendo que a actual composição do Conselho Superior de Defesa Nacional necessita de alterações que o tornem num órgão plural em matéria de reflexão no que concerne a esta matéria, ao invés de ser, como é, um órgão quase inteiramente composto por membros do governo. A experiência e a riqueza de trabalho, discussão e reflexão da Comissão Parlamentar de Defesa é, nesta matéria, um quadro de referência que deve ser tomado em conta.

A relação com os PALOP no que diz respeito à cooperação técnico-militar continua a ser um importante elemento a potenciar. Uma cooperação para a paz. Uma cooperação para o desenvolvimento. Uma cooperação que reforce, também por esta via, os laços que unem países que falam a mesma língua. Neste sentido, preocupam-nos opiniões e decisões que visam baixar o grau de empenhamento de Portugal nessa cooperação, substituindo-a por dinâmicas tendentes à constituição de forças de reacção rápida para intervir em teatros de operações africanos, assumindo Portugal junto da NATO e da União Europeia o papel de testa de ponte destas junto dos países africanos. Não é esta cooperação que queremos e defendemos! Não é este o caminho que serve Portugal !

Igualmente importante, é uma acção determinada que potencie as capacidades nacionais em matéria de Indústrias de Defesa. Não numa concepção passadista que ignora a realidade actual. Mas não se compreende e não se aceita que sejam construídos noutros países meios que podiam ser construídos cá. Não se compreende e não se aceita que o investimento em Investigação e Desenvolvimento não tenha nas Forças Armadas um importante vector impulsionador.

Pela minha parte, assumo o compromisso de projectar uma nova visão nacional para o problema das nossas Forças Armadas, que combata a precariedade de meios e a falta de noção da realidade, em resultado das opções políticas sucessivamente tomadas, que tem conduzido à acumulação de problemas, contribuindo assim decisivamente, para a diluição de tensões como as que vimos assistindo nos últimos tempos, com situações de intensa inquietude, expressa em variadas iniciativas promovidas pelas associações militares, que têm movimentado oficiais, sargentos e praças dos três ramos das Forças Armadas.