Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, Almoço Comemorativo do aniversário do PCP «101 anos ao serviço do povo e dos trabalhadores»

«É preciso travar este percurso inflacionário, agravado pelas sanções. É preciso e é urgente tomar medidas no sector da energia e dos combustíveis»

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A todos uma fraterna saudação!

Comemoramos aqui o 101º aniversário do PCP e ainda soa o eco desse magnífico e monumental Comício do passado dia 6 de Março com que encerrámos também as comemorações do Centenário deste nosso Partido Comunista Português.

Deste Partido que continua de cabeça levantada e determinado a prosseguir a luta e a travar em todas as frentes os combates que se impõem na defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País.

Combates que passaram por todos estes territórios envolventes dos concelhos da Península de Setúbal e atravessaram todos os tempos de uma história sem paralelo deste Partido, feita com a dedicação, a coragem, a determinação pelo nosso colectivo partidário, sempre com os trabalhadores e o povo, presente nas suas lutas e nos momentos decisivos da vida do nosso País.

Deste Partido que, desde a sua criação, nesse longínquo 6 de Março de 1921, foi sempre capaz de ultrapassar os mais sérios obstáculos, as mais perigosas situações, os mais sérios desafios, as mais complexas conjunturas e de colocar todas as suas forças, o saber e a dedicação dos seus militantes na concretização dos objectivos que melhor serviam os trabalhadores e o nosso povo.

Não há período ou fase da vida do País em todos estes anos de existência do PCP que nele não se veja a marca positiva da sua intervenção e da sua acção a favor dos trabalhadores, do povo e do País, num percurso onde os comunistas portugueses tomaram e tomam posição nas primeiras linhas de combate pela liberdade, a democracia, o progresso social, a paz e a independência nacional.

O único partido que se manteve ao longo de quase meio século de fascismo agindo e lutando ininterruptamente. O único que não capitulou, não cedeu, nem renunciou à luta.

O Partido que deu um contributo inigualável no exaltante processo da Revolução de Abril e no desenvolvimento da poderosa intervenção da classe operária e das massas populares, transformando a acção militar em Revolução, liquidando o poder dos monopólios e dos latifundiários e a concretização das extraordinárias conquistas da revolução, das nacionalizações à Reforma Agrária e aos direitos políticos, sociais e laborais.
O Partido que esteve na frente da luta, como nenhum outro contra a política de direita e contra o poder reconstituído dos monopólios e em defesa do regime democrático consagrado na Constituição da República.

O Partido das grandes causas e de todos os combates contra a exploração, a opressão e as desigualdades, as discriminações, o racismo e a xenofobia.

Nos muitos combates travados em defesa da valorização do trabalho e dos trabalhadores. Na defesa da igualdade entre homens e mulheres, no trabalho e na vida. Na grande batalha política que permanece pelo direito de Portugal a produzir e em defesa da produção nacional e do emprego. Na luta pelo desenvolvimento regional e local. Nos muitos e múltiplos combates que por todo o País travámos pela concretização do direito das populações à saúde, à educação, à habitação, à cultura e à mobilidade e pelo direito a viver num ambiente saudável. Nos grandes combates em defesa da soberania e independência nacionais.

Não houve luta em defesa do povo e do País que o PCP não tivesse travado. Não houve e não há avanço, conquista, progresso que não tenha contado com as ideias, o esforço, a luta dos comunistas, do Partido Comunista Português guiado que foi sempre por esses ideais de liberdade, justiça, paz, solidariedade, fraternidade e progresso social que transporta o ideal comunista e se inscrevem na nossa acção e projecto.

O Partido com que os trabalhadores e o povo sempre podem contar em todas as circunstâncias. O Partido de palavra que não trai os seus compromissos com os trabalhadores, com o povo e com o País.

Por isso dizemos que o futuro se constrói com este Partido Comunista Português!

Estamos a comemorar o aniversário do Partido, num novo quadro político-institucional, marcado pela obtenção da maioria absoluta do PS que esta semana viu o seu Governo tomar posse.

Um quadro político mais desfavorável à defesa dos interesses populares e arrastando novas dificuldades e resistências à resolução dos grandes problemas nacionais.

Dificuldades e resistências que experimentámos nos anteriores Governos minoritários do PS para dar solução aos problemas de fundo do País e mesmo na resolução dos problemas mais imediatos e prementes, onde cada avanço, de que o PS se apropriou com vantagens eleitorais, exigiu uma persistente e combativa intervenção do PCP para os consagrar e concretizar.

Dificuldades e resistências que são inseparáveis das opções do PS e dos seus Governos a favor dos grandes interesses económicos e financeiros e da sua submissão à União Europeia.

Opções que não se vêem alteradas, como nos mostram as posições e as decisões que têm vindo a ser tomadas nestas últimas semanas, nomeadamente sobre o futuro das políticas económicas e orçamentais inscritas no Programa de Estabilidade e que nos dizem, porque os protagonistas são os mesmos e as políticas no que é essencial não diferem, que as soluções que o País precisa não só vão ficar mais uma vez em “banho-maria”, como as condições de vida do povo conhecerão novos agravamentos.
Não é inocente o discurso da tormenta tantas vezes pronunciada e chamada à liça pelo Primeiro-ministro António Costa, no seu discurso de tomada de posse do novo Governo. Da tormenta da pandemia que tem servido de desculpa para muita coisa e agora a da guerra que já começa a servir de desculpa antecipada e pretexto para não se fazer e adiar o que deve ser feito.

Diz-nos que estamos a viver tempos difíceis, tempos de tormenta, com impactos nas nossas vidas.

Não sabemos de que vidas fala, mas não estará a falar das vidas dos que ganham com a guerra lá fora e cá dentro, nem tão pouco das vidas dos accionistas das empresas cotadas na bolsa de Lisboa, que no ano passado viram os lucros das suas empresas crescer 50%, com algumas a duplicá-los à guisa da proclamada tormenta da pandemia.

Em relação aos salários é o que se sabe, as percentagens vão do zero, vírgula qualquer coisa ao um vírgula pouco e, em geral, a descer o seu valor real nesse mesmo período, comidos pelo a inflação e pressionados em baixa pelo aumento do desemprego e da precariedade.

E escândalo dos escândalos, mesmo quando o aumento do salário acontece, são os dinheiros públicos que suportam encargos que deveriam ser das empresas e dos grupos privados, como foi o caso do Salário Mínimo Nacional. Cerca de 100 milhões de euros em apoios, foram parar às mãos de 10 empresas, que tem fabulosos lucros. Seis são empresas de trabalho temporário e duas da grande distribuição, uma delas a Sonae.

É preciso começar a ver quando falamos de tormenta e de vidas, de que vidas falamos e de tormenta para quem! A palavra que se impunha sobre salários, precariedade, direitos laborais, condições de vida de quem trabalha não se viu.

Parece que os apelos da CIP e das restantes confederações patronais foram devidamente acolhidas de maior flexibilização do mercado de trabalho ou seja regressão nos direitos laborais, travagem e contenção da valorização de salários, com o questionamento das limitadas propostas de Salário Mínimo.

Em tempo de eleições a promessa do PS da melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo era já para o imediato, anuncia-se agora essa melhoria e à conta das tormentas para o médio e longo prazo, ou seja, para aquele prazo que todos os governos de política de direita costumam anunciar no primeiro dia que tomam posse, o prazo longo, de um futuro que raramente acontece e quando acontece é porque a luta assim os obriga.

Anunciam preocupações com impactos da guerra na Ucrânia, mas aqueles que nunca deixaram as cadeiras do poder e que agora continuam, o que até agora fizeram não foi para tornar mais fácil a vida do povo, foi o contrário, caucionando a política das sanções que atingem fortemente os povos em nome da guerra.

Dessa guerra que não deveria ter começado e a que urge pôr termo, dando prioridade ao desenvolvimento de iniciativas e medidas que possibilitem um cessar-fogo, uma solução política do conflito, com a necessária resposta aos problemas comuns de segurança na Europa, do desanuviamento e do desarmamento, no respeito pelos princípios da Carta da ONU e do direito internacional.
Não é isso, entretanto, o que se vê. O Governo que se devia empenhar para que seja posto fim à escala do conflito e à não confrontação, faz coro na política das ameaças e sanções decretadas que o povo dolorosamente paga com novos aumentos da energia e dos bens alimentares, como pagam os MPME que vêem acrescidas as suas dificuldades no desenvolvimento das suas actividades.

O que se vê é o rigoroso seguidismo e de submissão em todos os planos político, militar e económico do Governo do PS/António Costa em relação a Bruxelas e aos projectos da administração norte-americana, nomeadamente em relação à guerra.

As recentes conclusões do Conselho Europeu, alinhadas com as conclusões da Cimeira da NATO com a activa participação do Governo português falam por si, apontando no sentido da política de confrontação que está na origem da grave situação actual.

Em vez de esforços para o desanuviamento e para parar a guerra, as medidas aprovadas são objectivamente de sentido contrário, insistindo num reforçado impulso belicista, promovendo um novo e mais grave salto na instalação de meios e contingentes militares no continente europeu e de mais sanções económicas e financeiras, com novos e mais gravosos impactos na vida dos povos, incluindo no brutal aumento da inflação.

A escalada armamentista, a política de sanções económicas, comerciais, financeiras não servem a causa da paz, nem os interesses dos povos.

Servem, como já é evidente, os lucros da indústria de armamento. Servem os que se aproveitam das sanções para aumentar lucros. Servem os beneficiários directos do redireccionamento da dependência energética de diversos países na União Europeia, nomeadamente para os EUA.

Mas o que se vê, também nestes últimos tempos, é a preparação para o futuro da aplicação da esdrúxula tese, tornada pública pelo governador do Banco Portugal sobre salários face à inflacção que salta em galope, que nos diz que o aumento dos salários não podem acompanhar o aumento da inflação. Tese há muito praticada por Governos anteriores do PSD e PS e que os trabalhadores, nomeadamente da Administração Pública bem sentiram e sentem.

Neste mês de Março que findou a inflação cresceu 5,3%, sendo certo que este ano de 2022 os salários e as pensões perdem muito do seu valor. Querem que trabalhadores e pensionistas fiquem mais pobres.

Por isso é preciso travar este percurso inflacionário, agravado pelas sanções. É preciso e é urgente tomar medidas no sector da energia e dos combustíveis. Desde logo com medidas de regulação e controlo dos preços que contenham a gula das petrolíferas.

No plano fiscal é preciso acabar com o adicional do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e com a dupla tributação do IVA.

No sector da electricidade ou do gás, é preciso a par da indispensável redução do IVA para 6%, estabelecer uma tabela de preços máximos, que garanta a contenção da especulação, tal como aliás deve acontecer nos combustíveis.

Foi com esse objectivo de travar e responder a esse preocupante problema que o PCP apresentou na Assembleia da República um conjunto de propostas, nas quais se incluem não só as relativas à fiscalidade, quer em relação aos combustíveis, quer em relação à energia, mas também propostas de medidas para garantir a fixação de margens máximas, com vista à redução dos preços finais.

O mesmo em relação aos produtos alimentares, também eles alvo de especulação e para assegurar a soberania alimentar de Portugal.

Neste âmbito se incluem, entre outras, as dirigidas à melhoria do funcionamento da cadeia alimentar de forma a garantir preços justos à produção e do preço a cobrar ao consumidor e à promoção da produção de cereais.

Não podem ser os salários dos trabalhadores a pagar a factura da inflação, se a valorização dos salários está na ordem do dia, a luta em sua defesa assume agora uma ainda maior centralidade e urgência.

Mas o que se viu também nestes últimos dias foi a preparação do terreno com o novo Programa de Estabilidade que o Governo do PS apresentou em Bruxelas para a retoma da política da ditadura do défice a todo o vapor e da aplicação dos critérios da dívida, assumidos, um e outro, como a prioridade das prioridades.

Fá-lo, passando por cima da imperiosa necessidade de promover a rápida recuperação económica e do emprego, do aumento do investimento que mais uma vez neste último ano ficou aquém da meta anunciada, não só para resolver os graves problemas dos serviços públicos, nomeadamente da saúde e da educação, mas dar solução aos défices estruturais do País, como o produtivo, o energético e tecnológico.

Programa que, com tais prioridades, passa por cima também dessa imperativa necessidade de promover políticas dirigidas à afirmação da independência alimentar nacional, da superação do défice de produtos industriais, que a política de direita promoveu com a sua opção de desindustrialização do País, para cumprir as ordens de Bruxelas e servir os interesses do grande capital nacional e transnacional.

Não é este o momento de uma apreciação detalhada e aprofundada do programa do novo governo que foi entregue anteontem na Assembleia da República, mas do que já se viu e conhece, confirma-se que mantém a intenção de prosseguir a manutenção das negativas opções, o que significa a insistência na recusa da resposta necessária aos problemas estruturais do País e que diariamente atingem o povo, como as desigualdades e as injustiças sociais, a dependência externa, a falta de aposta na produção nacional.

Lutaremos neste quadro político alterado com a maioria absoluta do PS para dar solução aos problemas, abrir perspectivas de uma outra política, afirmar a alternativa e o projecto que o Programa do PCP inscreve.

É essa a intervenção a que o PCP é chamado e que não deixará de assumir honrando os compromissos que tomou com os trabalhadores e o povo, na defesa dos seus interesses e na melhoria das condições de vida.

Tínhamos anunciado que daríamos imediata prioridade ao aumento dos salários e reformas, pela revogação das normas gravosas da legislação laboral, em defesa do Serviço Nacional de Saúde, pelo direito à habitação, pela valorização da Escola Pública, pelo acesso universal à creche gratuita e dando força à luta dos trabalhadores e do povo.

Foi para iniciar o seu cumprimento que, no primeiro dia de trabalhos na Assembleia da República, o PCP apresentou um conjunto de iniciativas com o objectivo de aumentar os salários no sector público e no sector privado, outras se seguiram noutros domínios.
Desde logo as iniciativas para o aumento do Salário Mínimo Nacional para 850 euros; da defesa da contratação colectiva e da revogação da sua caducidade; da valorização do trabalho prestado em regime de trabalho noturno e por turnos; da valorização dos salários incluindo dos trabalhadores da Administração Pública, que permita a recuperação do poder de compra, entre outras.

Sim, é no PCP que os trabalhadores vão encontrar a força que estará com eles todos os dias com iniciativa, com propostas e soluções, não desperdiçando nenhuma oportunidade para melhorar as condições de vida dos trabalhadores e do povo e com uma intervenção que tem no desenvolvimento da luta de massas e na convergência dos democratas o suporte para avançar.

Sabemos do quadro difícil que enfrentamos, mas este Partido Comunista Português nunca se deteve perante adversidades e dificuldades.

Sabemos que os desafios são enormes, mas cá estamos decididos a enfrentá-los convictos da justeza da nossa razão e com a força que ela nos dá!

Cá estamos com a coragem e determinação de sempre! Com aquela coragem que nunca faltou às gerações de comunistas que nos precederam!

Cá estamos afirmando o PCP como a força de oposição à política de direita, ao Governo do PS e à sua agenda de subordinação aos interesses do capital e de submissão à União Europeia, e prontos para enfrentar e combater a acção e projectos retrógrados e reaccionários.

Sim, cá está e estará este Partido Comunista Português que queremos e precisamos de reforçar. Reforçar com mais camaradas a assumirem responsabilidades e tarefas regulares, com o recrutamento de novos militantes, dinamizando a Campanha Nacional, integrando e responsabilizando cada um dos novos militantes. Reforçar com uma mais decidida intervenção e organização nas empresas e locais de trabalho. Reforçar com o fortalecimento da JCP e da acção junto da juventude. Reforçar aprofundando o trabalho das organizações locais e sua ligação às populações. Reforçar com uma profunda ligação aos trabalhadores, às massas populares. Reforçar com a difusão do Avante!, o trabalho de propaganda e a garantia da independência financeira, em que a campanha de aumento da quota e a quota em dia assume particular destaque. Reforçar em todas as dimensões e áreas da nossa intervenção.

Reforçar para com mais e melhores condições de intervenção, prosseguindo o nosso caminho e seguir em frente com uma política distinta, patriótica e de esquerda, a lutar com os olhos postos no futuro, com o objectivo da concretização de uma democracia avançada e do socialismo.

Sim, saberemos encontrar as soluções para seguir em frente e com a nossa acção e intervenção reforçadas garantir uma vida melhor para quem trabalha, porque queremos um Portugal desenvolvido, de progresso, independente, onde seja o povo a decidir.

Foi assim no passado, será assim no futuro, como força imprescindível e decisiva de transformação social que somos e com a qual os trabalhadores e o povo podem contar!