Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP

Homenagem a Ruben de Carvalho

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Quero começar por saudar e agradecer a iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa e da Direcção do Museu do Fado por esta significativa homenagem que decidiram prestar ao meu camarada Ruben de Carvalho, atribuindo o seu nome ao Auditório do Museu do Fado, casa para cuja existência deu um importante contributo.

Passados dois anos que o Ruben nos deixou, destaco nesta homenagem o homem, o intelectual, o político, o lutador antifascista, o homem de cultura, o jornalista, o amante da música.

Intelectual Comunista, assumiu desde muito cedo uma intervenção destacada na luta estudantil e de luta na resistência antifascista pela liberdade e a democracia, tendo sido preso pela PIDE seis vezes.

Estávamos no ano de 1970, tinha então 26 anos, quando aderiu ao PCP, tendo desenvolvido a sua actividade como funcionário do Partido desde 1974 até 1997, período em que assumiu responsabilidades de direcção. Foi membro do Comité Central, da Comissão Executiva e do Conselho Nacional. Entre 1974 e 1997 foi chefe de redacção do Avante!.

No plano da sua intervenção institucional destacamos a sua intervenção como deputado na Assembleia da República, vereador na Câmara Municipal de Setúbal e vereador na Câmara Municipal de Lisboa entre 2005 e 2013 eleito pela CDU.

Ruben de Carvalho foi um construtor de Abril, do Avante! e da Festa do Avante!.

No sector da comunicação social teve uma actividade multifacetada: foi repórter, redactor, coordenador, editor-paginador, chefe de redacção em diversos órgãos de comunicação social. Colaborou em numerosas publicações. Foi produtor, realizador e coordenador de diversos programas de rádio e na televisão. Foi membro do Conselho de Opinião da RTP em 2002. Produziu desde 2009 a 2018, o programa “Crónicas da Idade Mídia” e participava no programa “Os Radicais Livres”, na Antena 1.
Como jornalista, desde a década de 1960 até ao fim da vida, escreveu inúmeros artigos sobre música, muitos deles dedicados ao fado. O seu interesse pela música tem início em 1965 no Século Ilustrado com uma coluna semanal de crítica musical.

Foi autor de diversas obras e de prefácios, particularmente nos domínios da política e da música. Deixou-nos um enorme contributo para a história da música na sua dimensão artística, cultural e social.

No plano cultural assumiu várias responsabilidades, das quais destacamos, na Lisboa 94 – Capital Europeia da Cultura e como membro do Conselho Directivo do Centro Cultural de Belém.

Mas foi como programador cultural que Ruben de Carvalho teve a sua primeira responsabilidade directa na valorização e promoção do Fado.

Na Festa do Avante!, desde 1976 até à última que organizou em 2019, os espectáculos de fado estiveram sempre presentes nos elencos artísticos apresentados aos visitantes. Ao longo de 43 anos a longa listagem de espectáculos de fado realizados na Festa do Avante!, com a presença de artistas consagrados e a revelação de outros, foi por si só, um contributo significativo para a defesa da tradição popular de Lisboa e de Coimbra, dessa música urbana, para a recuperação da sua popularidade, para a modernização que os tempos entretanto impuseram.

Preocupação que reforçou enquanto membro da Comissão Organizadora das Festas de Lisboa, envolvendo-se num planeamento onde a música da cidade esteve presente em inúmeros eventos.

Mas esta caminhada do Ruben com o fado tem um ponto alto quando é nomeado Comissário de Lisboa 94 – Capital Europeia da Cultura, onde se responsabiliza pelo pelouro da música popular. Nesse contexto lança e dirige o Projecto Fado, que se concretiza numa série de iniciativas e publicações.

Nesta época, Ruben de Carvalho teve uma intervenção fundamental para a verdadeira recuperação do prestigio do Fado junto das camadas intelectuais que se tinham afastado dele, contribuindo para o fim de alguma estagnação em que se encontrava.

Para além do trabalho de investigação que realizou, Ruben de Carvalho deu um importante contributo para que o mundo académico revelasse ao grande público resultados de investigações e estudos que estavam a ser feitos, tendo apadrinhado igualmente o lançamento de novas investigações. Neste contexto quero destacar a organização no Museu Nacional de Etnologia da exposição “Fado: Vozes e Sombras”.

É nesta altura que o próprio Ruben escreve e publica uma importante obra “As Músicas do Fado”, onde investiga e debate hipóteses sobre as origens do fado e anuncia as suas evoluções no século XIX e no início do século XX.

Ruben de Carvalho tem assim a sua contribuição associada ao processo que conduziu a que o Fado fosse reconhecido pela UNESCO como Património Cultural Imaterial da Humanidade.

Como Álvaro Cunhal afirmou, referindo-se aos intelectuais, «Portugal democrático precisa deles. Precisa da sua obra, como parte integrante da democracia. Como factor de elevação cultural do povo. Como elemento de formação do homem. Como motivo de alegria e felicidade. Portugal democrático, para se defender e progredir, precisa da acção, do trabalho e da obra dos intelectuais»

No processo histórico português contemporâneo, são muitos os momentos em que podemos destacar a importância da intervenção dos intelectuais comunistas, onde incluímos Ruben de Carvalho, na luta pelo progresso e a transformação social.

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