Intervenção de Margarida Botelho, Membro do Secretariado do Comité Central do PCP, Sessão «O PCP e a emancipação da mulher - Luta secular do presente e do futuro»

A igualdade entre a mulher e o homem na família

A igualdade entre a mulher e o homem na família

Se é indesmentível que as alterações do papel da mulher na família são enormes e em geral de sentido positivo, também é claro que para atingir a igualdade plena nas famílias há muito caminho a fazer. A alteração das mentalidades é fundamental mas há condições objectivas que têm de ser garantidas:
– Por um lado, a independência económica da mulher, profundamente ligada ao direito ao emprego, ao salário e aos direitos.

– Por outro lado, a libertação da mulher do encargo exclusivo ou maioritário das responsabilidades domésticas. Neste plano, o reforço de equipamentos sociais é essencial, desde a garantia a todas as crianças de creches gratuitas, à criação de uma rede pública de lares de terceira idade. Até 1974, a taxa de actividade feminina só era superior a 50% até aos 30 anos – a maioria das mulheres deixava de trabalhar cedo para se dedicar à família. Hoje, as mulheres portuguesas têm das mais altas taxas de actividade do mundo, são a maioria dos trabalhadores, dão ao trabalho um carácter central no seu projecto de vida.

As famílias também mudaram muito. O censos de 2011 indicava a existência de cerca de 4 milhões de famílias, o dobro das que existiam nos anos 60. Se é verdade que a população aumentou neste período, também é verdade que as famílias diminuíram de tamanho: de agregados de cinco pessoas em média, para uma média de 2,5 pessoas por família.
Em 2013, um quinto das famílias com filhos eram monoparentais. O número de famílias monoparentais duplicou em vinte anos. Como em mais de 80% dos casos de regulação do poder paternal a guarda das crianças é entregue à mãe, a família monoparental é sobretudo feminina. A taxa de divorcialidade hoje é de 70 em 100 casamentos. Para as crianças nascidas em 2011, a probabilidade de ainda viverem hoje com o pai e com a mãe é inferior a 50%. Os filhos nascidos fora do casamento no fascismo eram ilegítimos. Em 2013, 45% dos bebés nascidos nesse ano eram filhos de pessoas não casadas - o que não quer dizer que não vivam juntas.

As mulheres têm filhos mais tarde, e menos filhos: em 1980, o primeiro filho nascia em média aos 23 anos da mãe, em 2014 aos 30. E se este valor indica que as mulheres controlam os nascimentos e os planeiam para mais tarde, também tem um enorme impacto na natalidade, que em Portugal é das mais baixas do mundo e tem levado o nosso Partido a analisar que o nosso país tem um défice demográfico.

Todas estas alterações revelam que as famílias são muito diferentes hoje daquilo que eram há poucas décadas atrás. É por isso que nos parece mais correcto falar em famílias, no plural, do que em família, no singular. Há famílias com o pai e a mãe casados e com filhos, mas também há muitas monoparentais, reconstruídas, com as crianças em guarda partilhada, com várias gerações na mesma casa, com casais heterossexuais ou homossexuais, em que os pais emigraram e as crianças ficaram com os avós, etc.

Para o PCP, a família deve ser «constituída na base da decisão livre, do amor, do afecto e da solidariedade recíprocas».

Tem sido esse o sentido da intervenção do Partido ao longo dos anos, desde a sua participação nas alterações ao direito da família – legalização do divórcio, igualdade das crianças nascidas dentro ou fora do casamento, direitos para os casais em união de facto, independentemente do sexo - à criação de condições para o exercício dos direitos, passando pelo combate à violência doméstica.

A luta do Partido após a Revolução de Abril em defesa dos direitos de maternidade, pelo planeamento familiar e pela educação sexual, contra o aborto clandestino, materializada nos projectos-lei de 1982, parte da análise da situação que então se vivia.
«Quem pode ignorar quantos partos sem assistência, quantos abortos clandestinos e quantas crianças morrem ou nascem deficientes todos os anos em Portugal?», perguntava-se no preâmbulo desses projectos.
As vitórias alcançadas nesse campo são notáveis: os dados relativos à saúde materna e infantil colocam Portugal no lote dos países mais desenvolvidos do mundo, indissociáveis das conquistas de Abril e, sobretudo, da construção do Serviço Nacional de Saúde.

Mas no que diz respeito aos direitos de maternidade e paternidade, temos muitas batalhas ainda a travar, sobretudo para garantir que os direitos saem da lei para a vida, e sobretudo da lei para os locais de trabalho. Defender e garantir que a parte biológica da maternidade está protegida (a gravidez, o parto, o puerpério, a amamentação), mas também o direito a acompanhar as crianças, seja a mãe, seja o pai.

Nos anos 80 foi uma pedrada no charco o PCP afirmar o direito a ser mãe e ser feliz. Porque afirmava que ser mãe era uma escolha, não uma fatalidade do destino, e que era perfeitamente compatível com trabalhar, participar e viver em igualdade.

Nos nossos dias, quando usamos a frase «Crianças e pais com direitos, Portugal com futuro», associamos os direitos das crianças e os dos seus pais à construção de um país desenvolvido. Porque o caminho de baixos salários, desemprego e precariedade penaliza sobretudo as famílias com crianças. Porque a desregulação dos horários de trabalho, o trabalho por turnos e aos fins de semana impede que as famílias convivam, empurram as crianças para horas a fio na creche ou na escola, não deixa tempo para brincar, transforma a vida numa correria infernal e desgastante. Porque esta situação também está na raiz do adiamento da maternidade, da decisão de ter só um filho quando se queria ter mais e, portanto, tem consequências directas no tal défice demográfico de que falávamos há pouco.

As mulheres têm direito a decidir ter filhos e a acompanhá-los ao longo do seu crescimento. A maternidade não é um capricho nem um luxo. É um projecto de vida pessoal, claro, mas que também cumpre um papel social indispensável e que nesse quadro deve ser protegido e apoiado. As mulheres têm direito a ter tempo para o trabalho, para si e para a família. A serem felizes e livres em todas as esferas da vida.

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