Projecto de Resolução N.º 1246/XIV/2.ª

Pela Preservação da Serra de Carnaxide e do seu usufruto pelas populações

Exposição de motivos

A Serra de Carnaxide localiza-se entre Sintra e Monsanto e é uma das poucas manchas verdes da Área Metropolitana de Lisboa. Tem cerca de 600 hectares que abarcam maioritariamente o concelho de Oeiras, mas também os concelhos da Amadora e de Sintra. Localizada na bacia hidrográfica do rio Jamor, afluente do rio Tejo, esta Serra cumpre diversas funções ambientais, sociais e culturais.

Constituindo o único espaço verde entre o Parque Florestal do Monsanto e a Serra de Sintra, a Serra de Carnaxide é componente fundamental de um corredor ecológico nesta zona urbana.

A Serra possui solos de origem vulcânica bastante férteis que, não sendo compactados e impermeabilizados, têm grande capacidade de armazenamento de água que previnem fenómenos extremos, em que se incluem as cheias.

De facto, num contexto de necessária mitigação e adaptação às alterações climáticas este espaço determinante para a regulação hídrica e climática, é também um pulmão para várias cidades, contribuindo para a retenção de carbono e melhoria geral da qualidade do ar.

A Serra de Carnaxide oferece bons locais de alimentação para as aves de rapina, como o Falcão Peregrino (estatuto vulnerável em Portugal) e a Águia de Asa Redonda. Na vegetação, encontram-se a Armeria pseudoarmeria (endémica e com estatuto de conservação de “vulnerável”), a Lonopsidium acaule (protegida por legislação nacional e europeia), o pinheiro manso, o sobreiro, o freixo ou o zambujeiro, entre outros tipos de flora, como a orquídea selvagem.

É também inegável o valor histórico e cultural da Serra de Carnaxide uma vez que aloja variados vestígios do período paleolítico, assim como os aquedutos de Carnaxide e das Francesas (ambos subsidiários das Águas Livres), as suas claraboias e a Mãe d’Água, património do séc. XVIII e do reinado de D. José I.

Apesar dos valores ambientais e culturais que comporta, a Serra de Carnaxide não se encontra abrangida por qualquer regime que consiga preservar o respetivo património natural e cultural e conter os projetos de urbanização em curso e em projeto que a ameaçam. Nem o PROTAML, nem os PDM, nem a classificação REN e RAN estão a ser suficientes para que a Serra não seja predada pelos interesses imobiliários.

Foi por esse motivo que um grupo de cidadãos, entre os quais destacados nomes da ciência, constituiu o Movimento Preservar a Serra de Carnaxide que tem desenvolvido variadas ações. Pode ler-se na petição homónima lançada pelo movimento que “neste momento existem projetos de urbanização que ameaçam a Serra de Carnaxide, estando alguns em curso e outros em fase de plano ou projeto. A sua implementação iria destruir a Serra, causando impactos significativos a curto, médio e longo prazo, tanto para as populações como para o ambiente o qual integra interessantes dimensões a nível de solos, água, flora e fauna, além de património arquitetónico classificado.”

O documento também lançado por este movimento, “A Preservação da Serra de Carnaxide - Um Imperativo em Prol da Qualidade de Vida das Populações, da Redução de Riscos Climáticos e do Desenvolvimento Sustentável”, suscita-se ainda a importância do usufruto dessa área para a qualidade de vida das populações:

“A importância de ter espaço verde perto dos locais de residência das pessoas e a associação da curta distância com o aumento do uso são mencionados em várias políticas de saúde e de planeamento urbano, tornando-se uma questão contemporânea” (Schipperijn et al., 2010, cit. por Figueiredo, 2014). Inclusive, no período de quarentena que decorreu entre março e abril de 2020 e que requereu isolamento social e ainda atualmente, foi notório o aumento do número de pessoas que usufruíram da Serra, evidenciando a progressiva valorização deste espaço verde por parte da população.

O PCP entende que se a proteção e valorização dos recursos hídricos, dos solos e do património são fatores fundamentais para a coesão de um território proporcionando vidas mais saudáveis, então não pode ser ignorada a situação da Serra de Carnaxide.

A crescente urbanização traz impactos inegáveis, de curto, médio e longo prazo, tanto para as populações como para o ambiente e contraria todos os desígnios de sustentabilidade tantas vezes proclamados.

Pelo contrário, a preservação da Serra e uma gestão integrada e sustentável desta mancha verde salvaguarda um valor ambiental e paisagístico importante. A sua preservação contribuirá para a melhoria da qualidade do ar, a sustentabilidade do meio hídrico (águas superficiais e subterrâneas), a preservação dos ecossistemas a ela associados, para a mitigação e adaptação às alterações climáticas e para a fruição e melhoria da qualidade de vida das populações das áreas urbanas envolventes. A salvaguarda deste valor insere-se numa política que se deseja efetiva na proteção da natureza e dos ecossistemas e não apenas proclamatória.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do art.º 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

  1. Conceda à Serra de Carnaxide um estatuto legal de proteção adequado à sua salvaguarda, enquanto área terrestre em que a biodiversidade e outras ocorrências naturais apresentam, pela sua raridade, valor científico, ecológico, social e cénico, uma relevância especial que exige medidas específicas de conservação e gestão, em ordem a promover a gestão racional dos recursos naturais e a valorização do património natural e cultural, regulamentando as intervenções artificiais suscetíveis de as degradar, tal como dispõe o Decreto-Lei n.º 142/2008 no Regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade.
  2. Promova, através do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P., um estudo específico que melhor caracterize os valores da Serra de Carnaxide e que desenhe um plano de gestão que, mantendo o seu livre acesso e carácter público, tire partido do seu imenso valor ambiental e socioeconómico, de turístico e lazer.
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