Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Audição Pública

Redução dos horários de trabalho e emprego com direitos

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Saúdo todos os presentes e agradeço a resposta positiva que deram ao convite do Grupo Parlamentar do PCP na Assembleia da República para participar nesta Audição Pública que tem como tema “Desenvolvimento científico e tecnológico ao serviço do progresso social: redução dos horários de trabalho e emprego com direitos”.

Os avanços civilizacionais nos domínios técnico e científico - que permitem que hoje se possa produzir mais, com melhor qualidade e em menos tempo - são uma conquista da Humanidade e dos trabalhadores e não do capital. É, assim, inadmissível que sejam postos ao serviço do agravamento da exploração e da acumulação dos lucros e não dos trabalhadores, da melhoria das suas condições de vida, da compatibilização da vida profissional com a vida privada e familiar, do progresso e da justiça social.

O PCP considera, quando tanto se fala de desenvolvimento tecnológico, economia digital, inteligência artificial, indústria 4.0, para justificar novos ataques, prolongamentos de horário e até para não haver regras nos horários de trabalho, que então é ainda mais a hora de assumir a redução dos horários de trabalho e o seu respeito.

A questão dos horários de trabalho é de grande importância e significado, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respectivas condições de pagamento e de compensação, e a sua articulação com a vida familiar, pessoal e profissional são matérias que assumem uma enorme actualidade. Nos dias de hoje, estas matérias representam mesmo, um dos alvos de maior ataque por parte do grande capital e por consequência de mais firme e corajosa luta e reivindicação dos trabalhadores.

Quando assinalamos o segundo centenário de nascimento de Karl Marx é oportuno lembrar que há mais de 150 anos, a Associação Internacional dos trabalhadores apresentou a reivindicação universal dos três oitos - 8x8x8 – oito horas de trabalho diário, oito para lazer, convívio familiar e cultura, oito para dormir e descansar – que teve profundos reflexos na diminuição progressiva do horário de trabalho que conduziu em Portugal, no final do século XX, às 35 horas semanais para a Administração Pública e ao limite de 40 horas semanais para o conjunto dos trabalhadores.

No entanto, o capital procurou sempre inverter este processo. Usou os mais diversos expedientes para desrespeitar a lei, transformando todo o período normal de trabalho em tempo de trabalho efectivo, eliminando pausas, inventando as mais diversas “flexibilizações” e aumentando, por esta via, a intensidade e ritmos de trabalho. E recorreu mesmo à alteração da lei para aumentar o horário de trabalho semanal, procurando inverter o processo histórico da sua redução que se verificou desde o século XIX. Foi assim que o Governo PSD/CDS impôs na lei a passagem do horário de trabalho na Administração Pública de 35 para 40 horas semanais, ao mesmo tempo que se preparava para prolongar o horário para todos os trabalhadores.

O PCP tem uma intervenção persistente e determinada sobre os direitos dos trabalhadores e os horários de trabalho.

Intervém no combate à desregulação do horário de trabalho, pelo respeito pelos seus limites diários e semanais, a garantia de dois dias de descanso semanal e a revogação das normas que instituem sistemas de bancos de horas e de adaptabilidade, grupal ou individual, e o combate ao prolongamento da jornada diária com o abuso do trabalho extraordinário, muitas vezes não remunerado. Sobre estas matérias ainda recentemente, dia 14 de Março, foram discutidas e votadas iniciativas do PCP que o PS, PSD e CDS rejeitaram.

O PCP intervém para a melhoria legal do trabalho em regime de turnos, atendendo aos seus riscos para a saúde dos trabalhadores, tendo apresentado um Projecto-lei que foi discutido no plenário da Assembleia da República, baixou à Comissão de Trabalho, onde se encontra para que tenha consequências na elaboração de nova legislação.

E, em associação com o combate à desregulação dos horários e a prevenção e protecção do trabalho por turnos, o PCP intervém para a redução do horário de trabalho. Estamos aqui hoje para vos ouvir sobre as questões dos horários de trabalho em geral e a problemática do desenvolvimento científico e tecnológico e suas consequências e, em particular, sobre a redução do horário de trabalho, neste momento, no âmbito do agendamento proposto pelo PCP e que terá lugar na próxima sexta-feira, dia 18, em que será discutido o Projecto-lei do PCP para a redução do horário de trabalho para as 35 horas semanais para todos os trabalhadores.

Alcançou-se a grande vitória que foi reposição do horário de 35 horas semanais e está-se a caminho da sua efectivação para trabalhadores com contrato individual de trabalho na Administração Pública, trabalhadores de vários sectores estão a conseguir a redução progressiva do horário no âmbito da contratação colectiva e de reivindicações de sector e empresa, e impõe-se a redução dos horários de trabalho para as 35 horas semanais, sem perda de remuneração nem de outros direitos, no sector privado, para todos os trabalhadores.

A redução do horário de trabalho é necessária e impõe-se por muitas razões.

É contributo para criar postos de trabalho e combater o desemprego. Importa aliás aqui sublinhar que a redução do horário de trabalho para as 35 horas semanais, para todos os trabalhadores, coloca a necessidade de mais 440 mil trabalhadores para cumprir as mesmas horas de trabalho anuais, com igual produtividade. Não é aspecto pouco importante no combate ao desemprego e na criação de postos de trabalho.

É tanto mais necessária face ao desenvolvimento científico e tecnológico. É um elemento essencial na compatibilização da vida profissional, com a vida pessoal e familiar.

É um factor de realização humana, de melhoria das condições de trabalho e protecção da saúde. Inscreve-se no necessário processo de avanço civilizacional.

A redução do horário de trabalho, as 35 horas de trabalho semanal, a prevenção e protecção quanto aos turnos e ao trabalho nocturno, bem como o combate à desregulação dos horários, são aspectos que inserimos na política patriótica e de esquerda, na valorização do trabalho e dos trabalhadores, um eixo essencial de uma política alternativa, objecto e condição do desenvolvimento e do progresso social.

A sua concretização exige, a par de avanços relativos ao horário de trabalho, outras importantes medidas: criar postos de trabalho, travar a sua destruição e combater os despedimentos; assegurar a protecção no desemprego; melhorar o poder de compra dos salários, com o aumento geral dos salários e o aumento do salário mínimo nacional para os 650 euros em Janeiro de 2019; acabar com os bloqueios à negociação colectiva e repor os direitos postos em causa pelo Código do Trabalho e pela legislação laboral da Administração Pública; assegurar a estabilidade e a segurança e eliminar a precariedade; garantir condições de trabalho dignas, incluindo a qualidade do emprego, a formação profissional; garantir um combate efectivo à violação da legislação laboral seja pelo reforço da eficácia da acção da ACT seja pela agilização da justiça no plano laboral; promover o investimento num perfil económico assente em mão-de- obra qualificada; ter direitos individuais e colectivos desenvolvidos e efectivos; combater as políticas anti-laborais da União Europeia.

É possível e necessário ir mais longe! É urgente dar combate às injustiças.

São os trabalhadores que produzem a riqueza, mas são outros que se apropriam exclusivamente do seu esforço e dos resultados do seu trabalho. Hoje mesmo ouvimos, lemos e tomámos conhecimento que os salários dos principais administradores das grandes empresas e grupos económicos cotados em bolsa, aumentaram nos últimos 3 anos mais de 40% e os lucros dessas empresas acumulados nesse mesmo período subiram ainda mais, cerca de 50%, enquanto os salários médios permaneciam praticamente estagnados, aumentando escandalosamente o fosso entre os rendimentos do capital e de quem o serve e o conjunto dos trabalhadores dessas empresas e grupos.

Sim, basta de injustiças! É preciso valorizar o trabalho e os trabalhadores!

Para isso é decisiva a intervenção do PCP, Partido dos trabalhadores, com quem estes sempre podem contar e é decisivo o desenvolvimento da acção reivindicativa, da luta dos trabalhadores, pois é a unidade, organização e luta dos trabalhadores que decide da defesa dos seus interesses de classe, que decide na actual situação de prosseguir e levar mais longe a defesa, reposição e conquista de direitos, que permite concretizar a política necessária, a política patriótica e de esquerda, a democracia avançada com os valores de Abril no futuro de Portugal, que assegura o processo de transformação da sociedade para a emancipação dos trabalhadores de todas as formas de exploração e opressão.

O PCP cumprirá sempre o seu papel, os trabalhadores podem contar com o PCP, ao mesmo tempo que saúda as organizações dos trabalhadores e reafirma a sua confiança na unidade,organização e luta dos trabalhadores, na defesa dos seus interesses de classe, na luta por uma sociedade nova, liberta da exploração e da opressão.

Estamos agora à vossa disposição para ouvir as vossas opiniões e contributos.

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