Segundo aniversário do Referendo que pôs fim à criminalização das mulheres

Assinala-se amanhã o segundo aniversário do fim da criminalização das mulheres pela prática do aborto até às 10 semanas, no seguimento do resultado alcançado no 2.º referendo, realizado em 2007, e que - culminando um longo processo de luta para o qual o PCP deu o mais longo, coerente e sólido contributo - constituiu uma inequívoca vitória das mulheres.

Este facto não apaga as responsabilidades do actual Governo PS/Sócrates na ofensiva geral que acentua desigualdades e discriminações das mulheres em resultado do ataque ao Serviço Nacional de Saúde e que põe em causa a promoção dos direitos sexuais e reprodutivos assim como não disfarça a ausência da educação sexual das escolas e o aumento dos constrangimentos ao direito de decidir o momento e o número de filhos, pondo em causa os direitos de maternidade e paternidade.

Saúde Sexual e Reprodutiva

Dois anos após a realização do referendo que permitiu a vitória do Sim à despenalização da IVG até às 10 semanas, o PCP considera que, não obstante a informação disponível destacar que 67% das IVG foram realizadas no âmbito do Sistema Público de Saúde (entre Julho de 2007 a Julho de 2008), se registam diversos constrangimentos que impedem a cabal organização de muitos serviços públicos para o cumprimento da Lei 16/2007, o que origina o encaminhamento de mulheres para outros serviços públicos ou privados fora da sua área de residência.

A fragilização dos Cuidados Primários de Saúde, que o actual Governo acentuou, reduz a capacidade de resposta na promoção da saúde sexual e reprodutiva das mulheres, não obstante este objectivo ser parte integrante do Serviço Nacional de Saúde desde a sua consagração em 1979, e compromete o cabal cumprimento das novas obrigações resultantes da nova lei da IVG.

O encerramento de maternidades em diversos pontos do País, o fecho de serviços de saúde de proximidade e a falta de técnicos de saúde nos cuidados primários, num quadro em que mais de 25% dos serviços de saúde estão hoje nas mãos do sector privado, avolumam as insuficiências em matéria de saúde sexual e reprodutiva.

Crescem assim, em muitas zonas do País, as dificuldades de acesso a cuidados médicos qualificados na gravidez, parto e pós-parto; à prevenção de patologias ligadas ao aparelho reprodutor; a consultas de planeamento familiar que permitam assegurar uma escolha informada sobre método contraceptivo, ou facultar apoio a casais com problemas de infertilidade.

É em resultado desta política que acabam por ser desperdiçadas as capacidades do SNS na aplicação da Lei 16/2007 quanto ao alargamento do número de serviços públicos organizados para cumprir a lei, assegurando um atendimento humanizado, celeridade no processo, condições de privacidade às mulheres e que, ao mesmo tempo, incentive práticas contraceptivas que evitem futuras gravidezes indesejadas; e quanto à ampliação do número de centros de saúde com capacidade de intervenção nesta área, através da realização da IVG medicamentosa, favorecendo a proximidade de acompanhamento da mulher.

Educação Sexual

Vinte cinco anos passados sobre a aprovação de uma lei sobre educação sexual, o actual Governo continua sem adoptar as medidas adequadas para a implementação da Educação Sexual nas escolas e sem concretizar as propostas realizadas por um Grupo de Trabalho por si incumbido de analisar esta questão.

É neste quadro que o PCP apresentou, a 15 de Janeiro deste ano, um Projecto-lei sobre educação sexual das escolas (n.º 634/X) assente em dois objectivos: por um lado, o aperfeiçoamento da lei no sentido de assegurar a sua adaptação à realidade e ao aprofundamento dos direitos; por outro, exigindo do poder executivo o seu cumprimento, estabelecendo um processo concreto de implementação de um modelo de educação sexual transversal e interdisciplinar que coloque a sexualidade e a saúde reprodutiva como um conteúdo nuclear em cada disciplina e que não permita o isolamento teórico da matéria em causa.

Maternidade e Paternidade

A situação actual é marcada por um aparente paradoxo: por um lado, a publicitação por parte do actual Governo de medidas de apoio à maternidade e paternidade e, por outro, o agravamento brutal dos factores laborais e económicos que negam aos trabalhadores o direito a decidirem em liberdade sobre o momento e o número de filhos que desejam.

Ao desemprego, à precariedade laboral e aos baixos salários acresce a opção do actual Governo em sede de Código de Trabalho pela desregulação dos horários, dando condições aos patrões para determinar unilateralmente os horários de trabalho (podendo chegar às 12 horas por dia e 60 semanais), criando novas e abissais dificuldades no direito ao tempo em família e para acompanhamento dos filhos.

Aumenta o número de trabalhadoras e trabalhadores que não gozam a licença de maternidade e paternidade face à pressão que é exercida no mercado de trabalho, enquanto se vai fomentando a ideia de incompatibilidade de exercício destes direitos com a actividade profissional e progressão na carreira, o que, objectivamente, lesa os direitos das crianças, o direito de ser mãe e trabalhadora com direitos e anula a função social da maternidade e paternidade.

Prometendo mais investimento público na rede de equipamentos sociais, o actual Governo impõe um modelo de gestão que não garante a igualdade de acesso de todos a estes equipamentos, decorrente, designadamente, dos elevados custos para as famílias e num quadro em que privilegia a extensão dos seus horários, tendo em vista garantir a desregulamentação de horários dos trabalhadores e em detrimento dos direitos das crianças e do tempo em família.

O PCP continuará a sua intervenção em defesa dos direitos das mulheres, ao mesmo tempo que destaca a importância da luta das mulheres pelo direito a ser trabalhadora e mãe com direitos.

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