Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

«A situação em que se encontra a floresta portuguesa é dramática»

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo,

“Percorrendo concelhos como a Lousã, Góis ou Pampilhosa da Serra, entre outros, é dantesca a visão que o horizonte abarca durante dezenas de quilómetros, em que a repetição sucessiva de incêndios florestais está a levar à rápida erosão e à destruição de todo o ecossistema. A destruição de formas seculares de povoamento e de economias serranas (…) estão na origem da multiplicação das áreas incendiadas e na progressiva e preocupante erosão dos solos e desertificação do meio serrano.

É por isso necessário intervir de uma forma eficaz na criação de um quadro legal que permita promover a rearborização ordenada, o que não está a ser feito, das áreas percorridas por incêndios, compartimentando-as, diversificando as espécies, dando especial atenção à plantação de folhosas.”

Estas palavras tão actuais foram escritas em novembro de 1990 no preâmbulo de um projecto lei do PCP para criação de um Programa de rearborização das áreas percorridas por incêndios florestais. É revoltante constatar como há 27 anos já sabíamos o que era preciso fazer e, entretanto, nada ou muito pouco, foi feito.

A situação em que se encontra a floresta portuguesa é dramática porque não serve o interesse nacional, porque não é um activo ao serviço do desenvolvimento do país e ainda por cima se tornou uma ameaça às populações, à sua vida e à actividade económica.

Tudo consequências da falta de ordenamento florestal, do abandono da produção e do mundo rural, do despovoamento do interior do país. Tudo consequências das opções da política de direita e da promiscuidade entre as decisões políticas e os interesses económicos (nomeadamente os da exploração florestal) , tão patente na liberalização do eucalipto, promovida por PSD/CDS que responderam ao caderno reivindicativo das celuloses.

Consequências também das opções da política de direita e da UE de desmantelamento dos serviços públicos e funções do Estado.

Não! Não foi a Estado que falhou. A responsabilidade é das políticas de direita. Com outras políticas, o Estado é fundamental para resolver o problema.

Os problemas fundamentais da floresta portuguesa são de ordenamento, da monocultura, da floresta contínua, da falta nos territórios de pessoas que promovam os mosaicos de culturas, da falta de gestão florestal, do baixo preço da madeira, refém das situações de monopólio, da não promoção das espécies autóctones e de madeiras nobres, da falta de meios nos serviços descentralizados da agricultura e florestas, da falta dos recursos financeiros necessários à realização do cadastro, à promoção do ordenamento e ao estimulo à gestão.

Para haver alterações de fundo em matéria florestal, é preciso vontade política e investimento público.
O PCP dará os seus contributos para concretizar as medidas estruturais que se impõem e as medidas urgentes de apoio às vítimas e de reforço da prevenção e do combate aos incêndios florestais.

Já apresentámos as nossas propostas ao Governo e tomámos a iniciativa de desencadear o processo para uma iniciativa legislativa a ser votada até ao final da sessão legislativa.

Lamentamos que não tenha havido apoio unânime a essa iniciativa e que o BE tenha mesmo votado contra mas estamos determinados em vencer todas as resistências e aprovar a lei urgente de que as populações e o país necessitam.

São necessárias medidas imediatas de apoio às vítimas mas também, na prevenção de incêndios, entre outras a contratação de 50 vigilantes da natureza; medidas para o cumprimento das regras do Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios relativamente às redes de faixas de gestão de combustível, à defesa de pessoas e bens e à defesa da floresta; a criação, ainda em 2017, de 70 novas equipas de sapadores florestais; medidas para assegurar o funcionamento, com cobertura integral, das telecomunicações no âmbito da protecção civil.

Adiantámos ainda outras propostas como a garantia das 500 equipas de sapadores florestais no prazo de três anos; a reconstituição do corpo de Guardas Florestais com um efectivo mínimo de 1500 agentes; a recomposição das estruturas descentralizadas do Ministério da Agricultura; a limitação rigorosa da plantação de eucalipto, proibindo-a explicitamente em zonas de regadio; a valorização da arborização com espécies autóctones; a afectação de meios para concretização do cadastro florestal até 2020; a conclusão da revisão dos Planos Regionais de Ordenamento Florestal.

O PCP não só tem propostas para promover essas mudanças como tem sido muitas vezes pioneiro.
Em 1980, o PCP propunha a primeira Lei de Defesa da Floresta Contra Incêndios assente na definição progressiva e instalação de Zonas de Intervenção Florestal. As mesmas ZIF que só seriam criadas 25 anos mais tarde. Já nessa altura, o PCP apontava, imagine-se, para a importância dos rebanhos nos espaços florestais.

Em 1990 propusemos a criação de polígonos com planos integrados de defesa e desenvolvimento florestal. Em 1994, era apresentada pela primeira vez e pela mão do PCP, uma Lei de Bases do Desenvolvimento Florestal. Em 1996 da mesma proposta, com outros projectos, nasceu a Lei de Bases da Política Florestal.

Em 2002 o PCP volta a insistir na necessidade de um programa de rearborização das áreas percorridas por incêndios e em 2012 no reforço dos meios de prevenção estrutural dos incêndios florestais e redução da carga de biomassa. Em 2013, propusemos a retoma dos serviços de extensão rural e a reconstituição do corpo de guardas florestais.

Propostas do PCP nunca faltaram. Faltaram isso sim maiorias que as aprovassem no tempo certo e vontades politicas para fazer o que era preciso.

Mais do que mudanças cosméticas, o País precisa de mudanças de fundo na política florestal que enfrentem os interesses instalados e as políticas que os têm promovido, que afectem à floresta os recursos financeiros e humanos fundamentais a uma política diferente.

O PCP continuará a contar para essa mudança, para construir uma floresta em Portugal ao serviço do desenvolvimento sustentável, das populações e do futuro do nosso país.

Disse.

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