Intervenção de Agostinho Lopes, membro do Comité Central, Sessão pública «Produção, emprego, soberania. Libertar Portugal da submissão ao Euro»

Produção nacional. Limites e constrangimentos dentro do Euro e a necessária libertação de que o País precisa

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Não se pode acrescentar muito ao que já dissemos antes e depois da adesão ao euro, no tocante às suas consequências para a produção nacional. O euro não tem as culpas todas, mas tem responsabilidades irrecusáveis. E era uma história previsível, a não ser para aqueles que não a quisessem ver…como fizeram os governos de Portugal do PS, PSD e CDS. Mas taparam os olhos, porque outros interesses os guiavam. A consolidação da recuperação capitalista e monopolista.

Há os que continuam a afirmar que a culpa não é do euro…pois não! É das políticas financeiras e económicas que lhe estão associadas, nomeadamente do BCE! De políticas que garantem um euro sobrevalorizado para economias como a portuguesa mas conforme as necessidades da economia alemã! E também da perda, que lhe está associada, de instrumentos essenciais do Estado para gerir a economia nacional. (Houve quem um dia destes argumentasse: “Quanto às culpas do euro, se um tipo tem um desastre com um carro porque não o sabe guiar, de quem é a culpa?” Mira Amaral, o autor do dito, não sabe ainda que o carro perdeu o volante…

Aliás uma das coisas mais notáveis de alguns adeptos do euro, é argumentarem como se não existisse na zona euro uma economia e um mercado únicos com uma moeda única. Como se essa funda imbricação das economias de vários países continuasse a permitir a gestão autónoma de cada país - cada um a conduzir o seu carro! Como se os défices de uns não tivessem nada a ver com os excedentes de outros…(Ver a Balança de Transacções Correntes ou os saldos da Plataforma Tarjet 2! Julgam que se podem corrigir esses desequilíbrios por simples opções políticas internas…

A moeda única “esqueceu”, a diversidade das economias. As enormes diferenças nos níveis desenvolvimento, nas especializações produtivas, nos índices de produtividade, nos stocks e disponibilidade de capitais de investimento. Significou vestir o mesmo fato, de facto um espartilho, (taxas de câmbio, de juros e saldos orçamentais) a países com economias diferentes…

Mas havia uma justificação para esse “esquecimento”. Como dizia o Argumentário Euro “Um mercado único dotado de uma moeda única permitirá mais transparência, mais concorrência e uma melhor divisão do trabalho”. A que se seguia a parábola do Picasso e dos pintores da construção civil: “Uma divisão de trabalho mais eficaz permite: 1º) assegurar que cada um se especialize no domínio onde dispõe de vantagens comparativas mais significativas (…); 2º) libertar um rendimento suplementar que poderá ser repartido entre os parceiros da troca. (…)” A especialização aconteceu, a Alemanha ficou com os picassos e Portugal com os pintores da construção civil. Não foi por caso que Merkel considerou termos doutores a mais… Da repartição do “rendimento suplementar” é que se esqueceram! (Um dia destes alguém terá de exumar o dito Argumentário das catacumbas de Bruxelas, para construir um monumento à sua presciência…)

Seguindo O. Teixeira, Sem capacidade de adequar o câmbio da sua moeda, um país fica com a sua “especialização produtiva” congelada, cristalizada, em função das suas vantagens comparativas”.

"A crise da zona Euro é a crise estrutural decorrente das diferenças de competitividade acumuladas pela impossibilidade, (…) de as compensar através de desvalorizações cambiais. O que se traduziu por défices crescentes das balanças comerciais, designadamente em relação à Alemanha, o grande beneficiário do Euro forte, do novo “marco alemão". (OT)

As consequências do Euro para a economia portuguesa foram o desastre que se sabe, onde avulta como desastre maior a desindustrializção.

A perda de competitividade na exportação com uma moeda sobrevalorizada. No mercado interno pelos preços baixos dos produtos importados de países terceiros. Que impulsionou também a deslocalização de empresas.

Com consequências dramáticas para as MPME que predominam no nosso tecido produtivo. Quer para as exportadoras quer para a maioria, as que vivem do mercado interno. Um mercado interno que foi sistematicamente corroído pela redução do poder de compra dos portugueses, sob a permanente pressão em baixa de salários - no tempo do Euro, 3 reformas das leis laborais – a dita desvalorização interna, que procurava atenuar as perdas de competitividade causadas pelo euro. A que se juntava a estagnação/redução de pensões, desemprego e pobreza e a crescente carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e o consumo.

Tudo isto foi coadjuvado e ampliado pelas consequências directas e indirectas das políticas orçamentais para tentar cumprir as regras do PEC do Tratado de Amesterdão, agravado pelo Tratado Orçamental.

A síntese é conhecida. Degradação da produção nacional, em quantidade e qualidade. Agravamento dos défices externos. Mais e maior endividamento, do Estado, das empresas e das famílias, nomeadamente externo. Mais e maior dependência, pela dívida, pelo controlo do capital estrangeiro de empresas
estratégicas, nomeadamente do sector financeiro, pela maior subordinação a mecanismos e decisões comunitários. Estagnação do crescimento económico e períodos de recessão de que ainda não recuperamos.

Como é da agenda dos dias que correm, é grande a esperança em Macron para salvar o Euro e a UE. Parece que Schauble terá descoberto (correspondendo às salvíficas medidas de Macron), a União Económica e Monetária como uma união de transferências entre países ricos e países pobres. Macron, como também é sabido, fez suas, as velhas medidas federalistas de Hollande e de outros como Piketty: um Parlamento e um Ministro das Finanças da Zona Euro. Isto é, tudo
junto, mais federalismo…

Ou, trocado por miúdos, menos soberania, menos governo pelos portugueses e mais ditadura e exploração pelos alemães e & C.ia! Mais centralização e concentração do capital europeu. Mais domínio do capital financeiro. Ou seja, a continuação em versão ampliada da tal “divisão europeia do trabalho” da tal “especialização produtiva”. Talvez com mais turismo, talvez com mais presença de capital estrangeiro, talvez com mais emigração…mas de certeza com menos país!

Mas porque diabo, haveríamos de suspeitar, que as coisas daqui em diante vão ser diferentes? Porquê a mesma gente (mesmo se alguns mudaram de nome), vai agora estar preocupada e solidária com a nossa convergência e aproximação…aos seus níveis de desenvolvimento?

E não será um orçamento comunitário reforçado, e mais transferências financeiras, avultadas sejam elas, e incondicionais, elas fossem, que não nos resolveriam os problemas. Poderão atenuar alguns. Eliminá-los, não. É que todo o exemplo de países federais, com orçamentos, que nem os mais optimistas europeístas, se atrevem a sonhar para a UE, demonstra, que a lei capitalista do desenvolvimento desigual, é uma lei de ferro na conservação e mesmo cavar do fosso das desigualdades regionais…

E há mais. Ou antes houve, o Pacote Delors, que às vésperas da adesão ao euro, duplicou os fundos comunitários, e o resultado foi o que sabemos…

E porquê? simplesmente porque não se não se alteraram nem vão alterar os mecanismos, e processos económicos, financeiros e sociais, que estão na base dos actuais desequilíbrios. Nomeadamente com o uso de uma moeda sobrevalorizada face à nossa estrutura e produtividade económicas. Nomeadamente com a imposição de uma gestão orçamental desadequada das necessidades nacionais. Nada vai corrigir o acumular dos diferenciais de competitividade!

A velocidade de recuperação da nossa economia e os nºs que vão sendo conhecidos sobre o investimento, sem o qual não há mais nem melhor produção, nem mais produtividade, nem mais valor acrescentado, nem crescimento, nem mais e melhor emprego, são elucidativos.

Apesar dos empurrões à economia, pelo aumento (mesmo que insuficiente) de rendimentos e direitos dos portugueses decorrentes da solução política concretizada pós eleições de 2015, num quadro externo favorável, os constrangimentos da UEM/Tratado Orçamental/PE pesam de forma determinante na limitação do investimento público (e também por arrastamento, mas não só, no investimento privado) e numa mais ampla recuperação do poder de compra, e por essa via num sustentável crescimento do mercado interno.

Os nºs oficiais conhecidos evidenciam que Portugal em 2016 está na faixa inferior do investimento público e investimento total da UE e da Zona Euro. A FBCF, segundo os nºs do PE, até 2020, continuará a ser insuficiente para compensar desgaste e desvalorização de infraestruturas e equipamentos. Os apertos da gestão orçamental continuarão até a dificultar a boa aplicação pública e privada dos fundos comunitários disponíveis. E sem investimento, estamos conversados…

Travamos o combate pela produção nacional, com a clarividência de que não há caminho dentro do euro…mesmo se não é o único pedregulho no caminho. Muitas outras políticas são decisivas. E em todas elas temos vindo a intervir.

Sabemos da importância das regras do comércio externo, e como essa política está condicionada também pelos interesses do Directório comunitário. Sabemos da importância da acessibilidade e preços da energia para a competitividade de muitas nossas produções. Sabemos do papel crucial do sector financeiro, banca e seguros, e de como boas condições de acesso ao crédito e aos seguros estão no fio da navalha decorrente do desastre a que a banca e os banqueiros do regime conduziram o sector, fazendo cair sobre o Estado os custos dos prejuízos, absorvendo recursos que de outra forma poderiam suportar investimento.
Sabemos dos estrangulamentos e predação provenientes de uma estrutura monopolista de grupos económicos privados, falseando as regras do mercado determinando abusos de poder dominante e de dependência económica sobre quase todas as MPME, praticando preços de monopólio, que alguns dizem rendas excessivas, quer como fornecedoras quer como clientes de bens e serviços.

Sabemos como é central para a produtividade e a produção a valorização do trabalho e dos trabalhadores. Como deve ser central, ganhar os pequenos e médios empresários para a batalha da produção nacional, pela sua presença dominante no tecido económico.

Sabemos como é importante o poder político ter uma visão estratégica sólida, na defesa do sistema produtivo e da produção nacional, enfrentando condicionamentos externos, nomeadamente comunitários e os interesses da oligarquia monopolista interna.

Mas sabendo tudo isso e actuando em conformidade, sabemos mais. Sabemos que não haverá resposta à produção nacional, nomeadamente na competição externa, com a sobrevalorização monetária do euro. Que não haverá o investimento público de que necessitamos, com os constrangimentos que a UEM impõe à gestão pública e a total dependência dos mercados financeiros. O que não significa complacência com o descontrolo das contas públicas. Que não haverá a intervenção pública que as políticas de educação e formação profissional, de investigação e inovação que o aparelho produtivo exige. Que não haverá o desenvolvimento dos mercados públicos e do mercado interno assegurando a procura crítica para muitas das actividades industriais estratégicas. O que não significa autarcia ou subestimação do mercado externo e exportações.

E que sem essa produção material, avançada em valor e inovação, não haverá emprego qualificado e valorizado. E os jovens portugueses bem formados e preparados de diversos níveis profissionais, não ajudarão a colmatar o vazio demográfico e as carências técnicas do país, porque continuarão a emigrar…em pura e total perda para o país.

Portugal poderá continuar a ser um país, sem produzir ou com uma produção residual, com largas áreas do seu território desertificadas? Poder pode, mas será um território, uma região, talvez um estado regional de um super estado europeu. Poder pode, mas não será o país soberano e independente que conhecemos.

Assegurar um país, só com um país a produzir, o que exige que nos libertemos do euro.

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