Declaração de Ângelo Alves, membro da Comissão Política do Comité Central, Conferência de Imprensa

Hiroshima e Nagasaki: recordar o crime nuclear, prevenir o futuro

6 de Agosto de 1945, 8h15m. O bombardeiro B29 “Enola Gay” da Força Aérea Norte Americana lançava sobre a cidade “escolhida” de Hiroshima, a “Litlle Boy”, uma bomba atómica de Urânio-235 com uma potência equivalente a 13 Kilo-Toneladas de TNT que causaria a morte imediata a cerca de 80 mil pessoas e destruiria cerca de 90% dos edifícios e infra-estruturas de uma cidade que à data tinha uma população de cerca de 300.000 mil pessoas.

9 de Agosto, 11h02m. Depois de sobrevoar o objectivo primário – Kokura – salvo pelas nuvens que não permitiam a visualização correcta do alvo e a observação e filmagem dos efeitos da arma atómica – um B29 Superfortess acompanhado por duas aeronaves que tinham como missão documentar e filmar os efeitos da bomba, lançava sobre Nagasaki a Fat Man uma bomba de 6,4Kg de Plutónio239 que causaria a morte imediata a 40.000 pessoas e nos dias seguintes a pelo menos 80.000 por envenenamento radioactivo.

O mundo assistia assim pela primeira vez na História e num espaço de três dias a dois dos mais hediondos crimes contra a humanidade jamais cometidos e que até hoje são responsáveis pela morte de cerca de 400.000 vítimas e por efeitos indirectos em centenas de milhar de pessoas.

O PCP, ao assinalar mais uma vez estas datas negras da História, associa-se assim a todos aqueles que em Portugal e no mundo não deixam que a Humanidade e em especial as gerações mais jovens desconheçam ou esqueçam o terror da arma nuclear, prestando simultaneamente a sua sentida homenagem a todos aqueles que pereceram vítimas deste crime e reafirmando a sua solidariedade àqueles que ainda hoje sofrem os seus efeitos.

O lançamento da bomba atómica sobre populações civis é em si um acto de cobardia e de desumanidade, completamente injustificável em qualquer situação. Mas ainda assim nunca é demais lembrar que tal crime não correspondeu a qualquer estratégia militar para a vitória dos aliados na II guerra mundial. A rendição da Alemanha Nazi estava já assinada e a derrota militar do Japão era já um dado adquirido. As razões de tão hediondo massacre residem sim em objectivos de afirmação imperialista hegemónica dos EUA que pretendiam mostrar a todo o mundo, e em especial à União Soviética, a sua supremacia militar, testando simultaneamente o real poder de destruição e morte da bomba atómica.

Nestas datas negras a Humanidade conheceu os terríveis efeitos da sede de poder e de dominação imperialista conjugada com o recurso sistemático à guerra e à adopção do militarismo como doutrina política do imperialismo.

Passados que são 61 anos de Hiroshima e Nagasaki o sistema económico, político e ideológico que esteve na origem da morte das centenas de milhar de vítimas inocentes japonesas é o mesmo que empurra milhares de milhões de seres humanos para uma situação cada vez mais incomportável nos planos económico e social e o mesmo que confrontado com os seus próprios limites históricos e contradições recorre mais uma vez à afirmação da sua supremacia militar, à corrida aos armamentos e à guerra para tentar prosseguir o perverso projecto de dominação de países e recursos, tentando submeter os povos e procurando eliminar resistências emergentes.

Relembrar o passado é portanto e também neste caso alertar para o presente e prevenir o futuro.

Contrariamente aos cantos de sereia do capitalismo de há anos atrás, o mundo não está nem mais justo nem mais seguro. Sucedem-se as ameaças, os conflitos, as manobras de desestabilização e ingerência e as guerras imperialistas um pouco por todo o mundo; os valores de gastos militares por parte das principais potências atingem recordes históricos e continuam a subir; o comércio legal e ilegal de armamento é hoje responsável por um dos maiores volumes de trocas comerciais a nível mundial; a NATO, outrora apresentada hipocritamente como aliança defensiva contra o perigo comunista, revela a sua própria essência: assume-se como uma aliança político-militar agressiva com intenções hegemónicas que no seu conceito estratégico assume claramente a possibilidade do uso da arma nuclear em qualquer quadro de conflito militar e alarga-se a leste num processo de chantagem coordenado com o alargamento da União Europeia.

Apenas no último ano, e a somarem-se aos projectos do falcões norte-americanos de destruição de tratados de não proliferação e de desenvolvimento de novas armas de destruição massiva, os governantes de países como a França e a Grã-Bretanha, falam abertamente da possibilidade do uso do seu arsenal nuclear em conflitos militares e os círculos dirigentes da União Europeia tentam a todo o custo institucionalizar a militarização, apostando cada vez mais claramente na afirmação da UE como um bloco político-militar de cariz imperialista.

O PCP, ao assinalar os 61 anos dos crimes de Hiroshima e Nagasaki, não pode ainda deixar de, mais uma vez, alertar os trabalhadores e o povo português para os perigos que comporta toda a actuação de Israel, das principais potências mundiais e da NATO no Médio Oriente e Ásia Central. É cada vez mais evidente que a coberto de uma pretensa “guerra contra o terrorismo” se desenvolvem conflitos que visam a dominação da região do ponto de vista geo-estratégico e do controlo da produção e fluxo dos recursos energéticos com destaque para o petróleo. Está em curso todo um plano que pretende afirmar Israel como grande potência militar regional ao serviço dos EUA e submeter todos os outros países aos ditames das potências ocidentais que negoceiam agora entre si a divisão do “bolo” do Médio Oriente. Se provas faltassem bastaria relembrar as dezenas de bases militares dos EUA e da NATO que foram estabelecidas nestas regiões nos últimos 4 anos, o envolvimento das multinacionais petrolíferas nos chamados “processos de reconstrução” e a declarada vontade de potências como a Alemanha e a França de estacionar tropas suas na região. É um verdadeiro ciclo de guerras iniciado com a ocupação do Afeganistão, responsável pela morte de milhares e milhares de pessoas e em que o uso de armas de destruição massiva, os massacres contra populações civis e o recurso à tortura são exemplos bem demonstrativos do carácter criminoso deste plano.

No Líbano a reocupação, os massacres e a destruição levados a cabo pelo exército israelita prosseguem impunemente e todos os dados apontam para uma ofensiva ainda em mais larga escala que deixará o Líbano pura e simplesmente destruído. Os crimes cometidos por Israel no Líbano e agora de forma ainda mais intensa na Palestina parecem não existir aos olhos da chamada “comunidade internacional” e da ONU. As recentes negociações entre potências europeias e os EUA demonstram bem a hipocrisia que está a determinar o ritmo das negociações diplomáticas. Os inaceitáveis termos do chamado texto “franco-norte-americano” apresentado ao Conselho de Segurança vem dar ainda mais tempo a Israel para prosseguir a matança. A ser aprovada, essa proposta de resolução branquearia a invasão do Líbano e os ataques contra a Palestina e avançaria um conjunto de medidas que, de forma quase impensável, pretendem salvaguardar os interesses do ocupante e ignoram as posições e propostas já expressas por Fuad Siniora, Primeiro-Ministro do legítimo governo do país ocupado.

A confirmarem-se as intenções das grandes potências relativamente à reocupação do Líbano; a continuar-se numa escalada de ameaças à Síria e ao Irão; a manterem-se por um lado as posições de objectivo apoio a Israel na definição unilateral de fronteiras com a consequente ocupação de territórios palestinianos e por outro a ocupação do Iraque e Afeganistão, a manterem-se todos estes factores de tensão, o alastramento e generalização de conflitos na região assume um grau de probabilidade assustador que, a acontecer, terá consequências devastadoras para os povos da região e de todo o mundo.

Ao arrepio dos princípios enunciados na Constituição da República Portuguesa o Governo Português, pela mão do Ministro dos Negócios Estrangeiros, tem adoptado uma dupla postura de silêncio relativamente ao essencial – ou seja a condenação dos crimes israelitas no Líbano e Palestina e a exigência de um cessar-fogo imediato e do fim da ocupação do Líbano – e de activa participação nas manobras que no seio da União Europeia continuam a dar tempo e cobertura à invasão e aos massacres. É tempo de o Governo Português, pela voz do Primeiro-ministro clarificar a sua posição. É tempo de, em cumprimento com os preceitos constitucionais, condenar a agressão ao Líbano e à Palestina, exigir o imediato cessar-fogo incondicional e contribuir construtivamente para uma solução política para o Médio Oriente.

Solução essa que não passa pelo envio de mais tropas estrangeiras para a região mas sim pelo reconhecimento do direito de todos os povos do Médio Oriente à sua soberania e independência, livres de ingerências externas. Uma solução que no quadro da retirada do exército israelita de todos os territórios ocupados no Líbano e Palestina terá que ser baseada no respeito pelas fronteiras israelitas de 1967, decididas pela ONU; no reconhecimento ao povo palestiniano do direito à edificação do seu Estado, independente, soberano e viável com Capital em Jerusalém Leste; no desmantelamento de todos os colonatos na Cisjordânia; na solução do problema dos refugiados de acordo com as resoluções internacionais; na libertação dos presos políticos das cadeias de Israel e consequente troca de prisioneiros e por fim na retirada dos exércitos ocupantes do Iraque e Afeganistão. Só assim será possível iniciar o caminho da paz no Médio Oriente.

O PCP, num momento extremamente doloroso para os povos desta região e no dia em que recorda os crimes de Hiroshima e Nagasaki reafirma a sua posição de sempre de defesa do direito dos povos à sua autodeterminação e à resistência pelos meios ao seu alcance contra a agressão e ocupação. Expressa a sua sentida solidariedade para com as famílias, amigos e companheiros de luta das vítimas libanesas e palestinianas da invasão e agressão israelitas e de forma muito especial para com o Partido Comunista Libanês que viu nos últimos dias tombar vários militantes seus que na frente de combate contra o exército sionista deram a sua vida pela independência e soberania do seu país.

Apelamos aos trabalhadores e ao povo português, que mesmo num merecido período de descanso de um ano de trabalho, mantenham erguida a bandeira da solidariedade para com estes povos e que se juntem às acções de esclarecimento e denúncia que várias organizações, incluindo o PCP, estão a preparar para a próxima quinta-feira dia 10 de Agosto.

O PCP, recordando a sua posição de forte oposição à participação de Portugal em missões militares de agressão e ocupação como é o caso do Afeganistão e do Iraque – cuja luta contra a sua ocupação não deve ficar esquecida neste novo quadro – reafirma a sua posição de frontal desacordo à participação portuguesa numa chamada “força internacional de interposição” no Líbano.

Evocando as vítimas de Hiroshima e Nagasaki e conscientes dos perigos que a humanidade continua a enfrentar – nomeadamente com o recurso sistemático às armas de destruição massiva e às ameaças do uso do terror nuclear – os comunistas portugueses reiteram o seu compromisso junto do povo português e de todas as forças progressistas e de paz do mundo, de dar continuidade à luta de gerações e gerações de comunistas e democratas, pela paz justa e duradoura em todo um mundo que, fruto da luta dos trabalhadores e dos povos, caminhará um dia para a convivência pacífica e a cooperação entre os povos. Um mundo livre de armas nucleares e de outras armas de destruição massiva. Um mundo mais justo e fraterno onde a justiça social, o bem-estar e a felicidade humana possam ser realidades para cada um dos homens e mulheres que em cada dia constroem o nosso mundo e fazem a sua História.

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