Declaração de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral, Conferência de Imprensa

Sobre o ataque à Jugoslávia

Senhoras e Senhores Jornalistas

O PCP reafirma a sua firme condenação aos bombardeamentos contra a Jugoslávia, considerando-os da maior gravidade para a paz nos Balcãs e na Europa.

Estamos firmemente convencidos que as reservas ou a oposição a este ataque militar da NATO contra a República da Jugoslávia, e ao respectivo envolvimento de Portugal, não conhecem fronteiras partidárias.

E estamos sobretudo firmemente convencidos que muitos portugueses que se identificam com o PS sentirão uma grande mágoa e indignação perante o tristíssimo facto de ser, por decisão e responsabilidade de um governo do PS que, 25 anos depois do 25 de Abril que nos trouxe a paz, militares portugueses são directamente envolvidos na agressão armada a um país soberano do nosso continente.

Ao contrário do que todo o comportamento do Governo indicou, não é uma pequena coisa que, 54 anos decorridos sobre o fim da II Guerra Mundial, os Estados Unidos e um conjunto de Estados europeus desencadeiem, em solo europeu, acções de guerra contra um Estado soberano.

E, ao contrário do que também todo o comportamento do Governo testemunhou, não é um simples assunto de administração corrente a grave decisão de envolver Portugal e as suas Forças Armadas numa operação de indiscutível agressão militar que, sem contestação possível, faz tábua rasa de elementares princípios do direito internacional e representa uma descarada ultrapassagem e marginalização da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Europeia de Cooperação e Segurança (OSCE).

O primeiro-ministro deve explicações públicas ao País e não se pode refugiar em actos pios ou em expressões jesuíticas. Deve explicar porque é que Portugal, País soberano – e o facto de ser membro da NATO não o obrigava – alinhou nesta agressão, à margem da ONU e do direito internacional, porque é que a Assembleia da República não foi chamada a debater e a tomar uma posição, e em que é que a chamada «tragédia humanitária» do Kosovo é mais grave do que a «tragédia humanitária» dos curdos na Turquia, dos timorenses em Timor, dos irlandeses na Irlanda, dos angolanos em Angola, dos palestinianos na Palestina.

Pela nossa parte, reiteramos a nossa forte reclamação do fim imediato dos bombardeamentos da Jugoslávia que, além do mais, não oferecem qualquer perspectiva de solução dos problemas políticos efectivamente existentes, e só podem desestabilizar perigosamente toda a região balcânica, causar escusados sofrimentos às populações e pôr em causa uma solução política.

Mas nesta hora, o que sobretudo queremos é dirigir um premente apelo ao Presidente da República, para que proceda a uma urgentíssima reponderação da posição assumida por Portugal, retirando-se desta criminosa agressão, e para que, juntamente com o primeiro-ministro, empenhe os seus esforços nas instâncias internacionais, designadamente na NATO e na União Europeia, no sentido de se pôr fim aos bombardeamentos e regressar a uma negociação política séria.

Os compromissos maiores e mais sagrados de Portugal têm de ser com o que é mais justo e humano, ou seja, com a necessidade de pôr fim ao inútil mas trágico derramamento de sangue e perda de vidas, e de salvar a paz numa conturbada região da Europa.

Portugal não se prestigia com uma postura subserviente e de cego alinhamento face aos ditames dos Estados Unidos.

E aqueles que na União Europeia tanto aspiram a que esta tenha uma voz forte e autónoma na cena mundial deviam reflectir sobre o vexame de, no próprio dia em que os chefes de Estado e de governo se reuniam em Berlim, fora dos seus países, os Estados Unidos tenham imposto os bombardeamentos a um país soberano.

A nova atitude que hoje reclamamos do Presidente da República e do primeiro-ministro prestigiaria Portugal, aos olhos dos próprios portugueses e de milhões de outros cidadãos europeus, que seguem os dramáticos acontecimentos em curso com profunda preocupação e angústia.

E, finalmente, dirigimos também um forte apelo a todas as organizações de massas e a todos os cidadãos, independentemente das suas simpatias partidárias e opções ideológicas, para que, no exercício das liberdades conquistadas com o 25 de Abril, intervenham com a sua própria voz e iniciativa, pelo fim dos actos de guerra contra a Jugoslávia, pelo fim da participação portuguesa na agressão em curso, pela paz e pela pacífica convivência entre os povos dos Balcãs. E para que, segunda-feira, 29 de Março, se incorporem na manifestação convocada pelo Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC).

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