Declaração de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral, Conferência de Imprensa

Sobre a reunião do Comité Central de 10 de Maio de 2004

1. O Comité Central do PCP analisou a situação política e social e a preparação das eleições para o Parlamento Europeu.

Apesar do discurso optimista, apesar das afirmações de que o pior já passou, a verdade é que os diversos inquéritos de opinião, dos consumidores e dos empresários, bem assim como os indicadores da OCDE continuam a apresentar más perspectivas para a economia portuguesa.

A quebra de investimento público e privado, o rápido crescimento do desemprego, a subida de preços de bens de primeira necessidade, a subida dos combustíveis tem vindo a agravar a situação de milhares de famílias.

Neste quadro é com grande cepticismo que olhamos por exemplo, para o chamado programa de combate ao abandono escolar.

Na verdade não se terá êxito no combate ao abandono escolar se não se der combate a um dos seus principais factores, a degradação da situação socioeconómica de milhares de famílias e a expansão dos níveis de pobreza.

Uma outra questão que tem estado em análise no Comité Central é a das privatizações. Têm sido denunciadas por exemplo, as ligações pouco claras entre o governo e um dos concorrentes na privatização da Galp. O PCP exige o total esclarecimento das zonas de sombra que envolvem este processo. Mas ao contrário de outros o PCP não se fica por aqui, pois o que está em causa é a privatização da Galp Energia, uma empresa estratégica independentemente de ela ficar nas mãos da Carlyle/Espírito Santo, ou nas mãos do José M. Mello, ou da VIACER.

Um outro escândalo que está em andamento é o da venda da Companhia das Lezírias. Um crime que deve exigir de todos os democratas uma firme condenação.

O Comité Central do PCP chama também a atenção para o facto de que, enquanto aumentam as falências, os encerramentos de empresas, as dificuldades para as pequenas e médias empresas e a aceleração do desemprego, a Banca apresentou no último trimestre lucros de 10 a 15%, pagando um IRC baixíssimo e discriminatório em relação às taxas aplicadas a outras empresas.

O anúncio de alterações ao subsídio de desemprego por parte do Governo é a continuação da escalada contra os direitos dos trabalhadores de novo com o estafado argumento de que se está a “moralizar” o sistema.

Para este Governo a “moralização” é sempre feita à custa de quem trabalha e da redução das prestações sociais, substitutivas do rendimento do trabalho. Assim foi com a redução dos valores do subsídio de doença para as baixas de curta duração com penalização da grande maioria dos trabalhadores. E, agora visa atingir os trabalhadores que venham a ser afectados por situações de desemprego.

No plano da agricultura, a aplicação da Política Agrícola Comum pelos governos de cada país, com o desligamento das ajudas comunitárias, tenderá cada vez mais ao abandono da terra nas pequenas e médias explorações.

No plano social, o aumento do desemprego é uma das expressões mais visíveis da destruição e desvalorização do aparelho produtivo e da produção nacional, havendo o risco de em alguns distritos se criarem situações de desemprego e salários em atraso idênticas às verificadas na década de 80.

Em articulação e complementaridade com esta ofensiva no terreno, o Governo e a maioria PSD-CDS/PP prepara-se para fazer aprovar na Assembleia da República, no próximo dia 13 de Maio, a lei Regulamentadora do Código do Trabalho, que tem como objectivo principal dar um novo golpe nos direitos colectivos, designadamente no direito à acção sindical e das Comissões de Trabalhadores, de greve e de contratação colectiva.

O Comité Central do PCP considera de grande valor e significado as lutas em curso e já perspectivadas, designadamente a luta na Sorefame/Bombardier, na Carris, no Metro, na Administração Pública, contra a Lei Regulamentadora do Código do Trabalho, às quais expressa a sua activa solidariedade. E apela a todos os trabalhadores para que, em correspondência com os seus interesses e aspirações, transformem o acto eleitoral de 13 de Junho num momento de luta, votando na CDU, unindo e levando a luta ao voto.

2. Ainda no quadro da análise à situação política e aos seus desenvolvimentos, o Comité Central analisou a sexta revisão constitucional, levada a cabo por PSD, PS e CDS-PP nas vésperas do 30º aniversário do 25 de Abril que, na sequência da aprovação há um ano da inaceitável e antidemocrática legislação sobre os partidos, representa um grave golpe na soberania nacional do povo português. O processo, iniciado pelo Partido Socialista – que apesar das peremptórias declarações iniciais voltou a acordar com a direita graves alterações ao texto fundamental – decorreu, no fundamental, à margem da Assembleia da República, sendo negociado entre aqueles três partidos, com as alterações a serem entregues poucas horas antes da sua votação, aprovadas em marcha acelerada e praticamente sem discussão pública.

A revisão constitucional teve como alteração central a admissão da submissão da própria Constituição ao direito da União Europeia e à dita «Constituição Europeia». Tal admissão, bem como a rejeição da proposta do PCP que visava retirar entraves constitucionais à realização de um referendo sobre a vinculação do Estado português à «Constituição Europeia», contrastam vivamente com sucessivos discursos de PSD, PS e CDS-PP, em que se pronunciavam pela necessidade da realização de uma consulta referendária sobre o novo tratado da União Europeia, que agora pretendem aceitar como superior à Constituição, sem que sequer o seu conteúdo esteja definitivamente acordado.

O Comité Central do PCP reafirma a sua convicção de que a Constituição é um elemento fundamental da soberania nacional, e de que nenhuma norma ou tratado europeu, (nem sequer a dita «Constituição Europeia»), se lhe pode sobrepor. O Comité Central do PCP reafirma de igual forma a exigência de que os portugueses se possam pronunciar em referendo sobre o novo tratado da União Europeia, designadamente se ele mantiver a inaceitável institucionalização do neoliberalismo, do federalismo e da militarização que está projectado.

Embora registando como positivas algumas das alterações constitucionais relativas ao aperfeiçoamento das autonomias regionais, acolhendo em vários aspectos as propostas do PCP, o Comité Central do PCP assinala, no entanto, como profundamente negativa a aprovação, pelo PSD, PS e CDS-PP, de uma norma que abre caminho a uma drástica redução do número de Deputados na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, agravando problemas de proporcionalidade já existentes e favorecendo o partido maioritário. Como igualmente negativo é também o facto de não terem sido criadas condições, como defendia o PCP, para que se produzissem alterações na lei eleitoral para a Região Autónoma dos Açores antes das eleições de Outubro próximo, tendo em conta o risco de os resultados eleitorais nesta região poderem conduzir a uma grave perversidade democrática, decorrente do facto de um partido menos votado poder vir a ter a maioria dos deputados eleitos.

Registe-se ainda, a par de uma alteração positiva, como a consagração constitucional do acompanhamento obrigatório pela Assembleia da República dos processos de deslocação de contingentes militares ou de forças de segurança para o estrangeiro, a alteração negativa que constitui a introdução da possibilidade de limitação legal de mandatos executivos sucessivos, que se anuncia já de aplicação discriminatoriamente restrita aos eleitos locais.

3. No plano internacional, a situação continua marcada pela ofensiva exploradora e agressiva do imperialismo, de que a guerra de ocupação do Iraque é a mais grave expressão.

No Iraque, apesar do enorme poderio militar e da violência da repressão contra as forças da resistência e as populações, cresce a resistência armada e popular e são infligidas pesadas baixas às forças de ocupação. Perante o atoleiro em que se meteram os EUA, ao mesmo tempo que desencadeiam terríveis acções de retaliação terrorista contra as populações civis, como em Falluja, e aumentam os efectivos militares e mercenários no terreno, manobram activamente para um simulacro de «transferência de poderes», que tenha o aval da ONU, facilite o envolvimento de novos países na guerra e dê cobertura à manutenção sine die das tropas norte-americanas. As revelações dos chocantes casos de tortura que a administração Bush há muito conhecia e que, segundo a Cruz Vermelha não são ocasionais, tornam evidente a falsidade das razões invocadas – direitos humanos, democracia – pelos Estados Unidos para justificar a invasão e ocupação do Iraque.

Reiterando a sua exigência de ser posto termo imediato à ocupação do Iraque, o Comité Central do PCP condena frontalmente os crimes praticados contra as populações, exige a retirada das forças invasoras e a devolução ao povo iraquiano do direito de decidir do seu próprio destino. O PCP continuará a lutar para que a força da GNR que se encontra no Iraque regresse o mais prontamente possível a Portugal, e para que cesse de vez a vergonhosa política de submissão ao imperialismo do Governo de Durão Barroso, que foi ao ponto de atacar publicamente o novo governo de Espanha por, em cumprimento de uma promessa eleitoral, retirar o contingente militar espanhol do teatro de operações.

O Comité Central do PCP expressa simultaneamente a sua activa solidariedade ao povo mártir da Palestina, alvo da continuada política de terrorismo de Estado do governo de Ariel Sharon e exige que, a nível da ONU, e também da União Europeia e outras entidades internacionais, sejam adoptadas medidas enérgicas para deter a mão criminosa dos sionistas de Israel, desmantelar o muro do «apartheid», e relançar o processo visando implementar as resoluções da ONU relativas aos direitos nacionais do povo palestiniano e à edificação do seu próprio Estado independente e soberano em território da Palestina.

4. O Comité Central do PCP avaliou o estado de preparação e desenvolvimento da campanha eleitoral da CDU para as eleições de 13 de Junho e tomou um conjunto de medidas para a sua dinamização.

Num quadro político que continua dominado pela violenta ofensiva do Governo de direita, e com diversas situações e acontecimentos (corrupção, pedofilia, futebol) de particular impacto mediático a concentrar as atenções da opinião pública, as organizações do PCP concretizaram, a par do seu envolvimento na resposta dos trabalhadores e outras camadas à política governamental e na campanha de reforço orgânico do Partido, uma intensa actividade de esclarecimento sobre os temas da União Europeia, de prestação de contas pelo trabalho feito no Parlamento Europeu nos últimos cinco anos, de contacto com os difíceis problemas hoje enfrentados pelos portugueses. O número de iniciativas, a sua qualidade e abrangência, permitiu o encontro com milhares de cidadãos e dezenas de organizações e instituições, dando um importante contributo para o esclarecimento e mobilização dos portugueses para o voto a 13 de Junho.

O reconhecimento da valia e seriedade do trabalho realizado, e a receptividade às propostas avançadas, são uma importante base de partida para, com confiança e entusiasmo, se iniciar a nova fase da batalha eleitoral. Para o sucesso eleitoral da CDU continuará a ser decisivo um elevado nível de mobilização e militância dos membros e organizações do Partido, um adequado trabalho de direcção e uma desenvolvida planificação e programação das diversas iniciativas eleitorais. Uma campanha que permita que, partindo do valioso património de trabalho realizado pelos deputados comunistas em defesa dos interesses nacionais e do reconhecido trabalho do PCP na organização da intervenção e luta contra a direita, dar expressão eleitoral às movimentações populares de resistência e protesto às políticas de direita, que culminaram nas grandiosas comemorações do 25 de Abril e do 1º de Maio, através de uma intensa campanha de informação, diálogo e esclarecimento dos eleitores para o voto na CDU.

O Comité Central examinou e definiu os eixos essenciais que darão corpo à Declaração programática «Outro caminho para Portugal e para a Europa» a apresentar pelo PCP, que afirmam o papel do PCP para a defesa dos interesses dos trabalhadores e do país, e para a luta afirmação por uma outra Europa, designadamente: a exigência de uma Europa social, solidária e de coesão que, sustentada em nome dos interesses e da soberania nacionais, tenha por objectivo assegurar o progresso de Portugal, com mais e melhor desenvolvimento, emprego com direitos e a defesa da produção nacional; a defesa de uma Europa de cooperação entre países soberanos e iguais em direitos, condição para a salvaguarda da democracia e para a efectiva participação dos cidadãos, e o combate a qualquer directório de grandes potências; a luta por uma Europa de paz e de cooperação no mundo e a recusa à militarização da União Europeia.

O Comité Central do PCP renova o seu apelo para um generoso empenhamento dos militantes e simpatizantes do PCP, dos activistas da CDU e de milhares de democratas independentes, para uma participação activa na campanha eleitoral, centrando o debate e o esclarecimento eleitoral nos problemas mais vivos e mais sentidos pelos trabalhadores e outras camadas da população, valorizando e informando do trabalho e das propostas do PCP, mobilizando activamente os eleitores para o voto na CDU.

O Comité Central do PCP destaca a ideia central de que uma expressiva votação na CDU é a melhor opção para afirmar eleitoralmente a exigência de outro rumo para a política nacional e para a integração europeia, e é sempre, inquestionavelmente, uma contribuição útil, segura e certa para a derrota eleitoral da coligação PSD/CDS-PP.

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