Inicio
Intervenções e Artigos
Posições Políticas sobre IVG
PCP na AR sobre IVG
Tempos de Antena do PCP
Fotos da Campanha
Apelo do Comité Central do PCP
Questões Legais sobre Referendo
 Folheto IVG -2ª Fase
Folheto em PDF
Depoimentos em video



Início arrow Posições Políticas sobre IVG
Jerónimo de Sousa defende SNS
Terça, 28 Novembro 2006
Foto: Jerónimo de SousaNa sessão pública realizada no Seixal, no âmbito da campanha do PCP em defesa do Serviço Nacional de Saúde, Jerónimo de Sousa chamou a atenção para o drama vivido por centenas de milhar de utentes na Península de Setúbal, com a falta de médicos de família, com meses e anos à espera de uma cirurgia, os custos cada vez mais elevados e a falta de qualidade que se começa a fazer sentir na prestação de cuidados. O Secretário-geral do PCP, depois de referir um conjunto de propostas nomeadamente a defesa do alargamento do mercado dos genéricos, com o aumento da sua divulgação e incentivando a sua prescrição e o alargamento da lista de medicamentos para doenças crónicas e degenerativas, comparticipados a 100%, sublinhou a injustiça do modelo de cuidados de saúde, dando como exemplo «o que se está a passar com as prioridades da construção de novos hospitais, em que os resultados dos estudos encomendados concluem de forma diversa, dando cobertura desta forma ao vazio de decisão de construir, como é o caso do novo Hospital aqui no Seixal, mas simultaneamente um conjunto de grandes hospitais e clínicas de grupos privados, vão nascendo como cogumelos na Área Metropolitana de Lisboa. Daqui por algum tempo vamos ter certamente o governo a dizer que não vale a pena investir na construção de hospitais do serviço público porque já existem camas suficientes».som

Nesta sessão pública que se integra na campanha do PCP em defesa do Serviço Nacional de Saúde, com o lema “A saúde é um direito, não é um negócio”, fica claro, mais uma vez, a contradição entre o discurso do governo e o drama vivido por centenas de milhar de utentes que habitam aqui na Península de Setúbal.

O governo diz que está a resolver os problemas e que não há alternativa à sua política para a saúde. Os utentes, como ficou claro no conjunto dos relatos aqui trazidos nas várias intervenções que me antecederam, falam na falta de médicos de família, nos meses e anos à espera de uma cirurgia, nos custos cada vez mais elevados com a saúde, na falta de qualidade que se começa a fazer sentir na prestação de cuidados, nas consequências para os utentes com os encerramentos de serviços públicos de saúde concretizados e previstos.

Estamos no meio de uma persistente ofensiva contra o SNS, que ao longo destes mais de 25 anos, causou danos no funcionamento dos serviços públicos, que só a dedicação e o profissionalismo da grande maioria dos trabalhadores de saúde, impediu, não só que tivessem consequências ainda mais graves, como até há bem pouco tempo o tornaram no 12º melhor a nível mundial, à frente de outros como os EUA, a Inglaterra ou o Canadá, de acordo com a classificação atribuída pela Organização Mundial de Saúde.

Hoje podemos afirmar que não tivesse sido este empenhamento e a luta das populações que exigiram na rua a construção dos Hospitais de Almada e do Barreiro e de muitos dos Centros e Extensões de Saúde que hoje estão em funcionamento, a situação seria bem mais difícil.

O que se está a passar na saúde é o resultado dos ataques a que tem sido sujeito o Serviço Nacional de Saúde desde a sua criação, quer por parte da direita política em muitos momentos acompanhada pelo PS, quer de interesses localizados e de grupos. Não satisfeitos com os danos causados ao povo português, hoje vão ainda mais longe e já falam em erro histórico quando se referem ao SNS, ignorando propositadamente os ganhos em saúde, como os 75 anos de esperança de vida à nascença ou uma das mais baixas taxas a de mortalidade infantil a nível mundial (5/1000), sendo verdade que para estes indicadores não contribuiu apenas o Serviço Nacional de Saúde.

Os números não enganam. Mais de 20% da população da Península de Setúbal não tem médico de família e milhares de utentes estão entre os mais de 230 mil portugueses que aguardam uma cirurgia.
Não estamos nem perante uma inevitabilidade, nem numa situação irreversível. Este é o resultado de uma política que procurou, ao longo destes anos de SNS e agora mais abertamente, criar dificuldades ao funcionamento dos serviços públicos de saúde, subfinanciando-os, realizando uma política de gestão de recursos humanos errada, com restrições ao nível da formação e ausência de incentivos na fixação de profissionais nos cuidados primários, cujas consequências já se fazem sentir no plano da qualidade, tudo isto acompanhado de uma injusta adopção do princípio do utilizador/pagador.

A receita é muito simples - primeiro cria-se um ambiente hostil aos serviços públicos de saúde, para depois aparecerem as medidas suportadas na tese do primado do privado sobre o público.

Estamos pois perante uma situação em que os detractores do SNS fazem “o mal e a caramunha”. Primeiro criam dificuldades ao SNS e depois vêm dizer que a solução, a alternativa está nas Parceria Público-Privadas, coisa que os grandes grupos privados já consideram insuficiente, defendendo que o Estado exerça apenas o papel de regulador, invista na promoção da saúde e deixe aos privados a medicina curativa, que é a parte mais rentável de um mercado que está em construção e que lhes vai permitir, caso não se inverta o caminho, ter acesso a lucros fabulosos.

Há quem diga que estamos perante um política de rigor orçamental, que os recursos do país não são inesgotáveis, que o Estado não sabe gerir. Nada mais falso. As opções deste governo, tal como já tinha acontecido com anteriores governos, quer do PS, quer da direita, são ideológicas, cuja matriz assenta na desresponsabilização do Estado e na mercantilização desta importante função social do Estado. Já hoje é inequívoco o sentido das decisões que têm vindo a ser tomadas, apesar da bondade do discurso ainda deixar muita gente na expectativa, que são o resultado dos compromissos assumidos entre o poder político e os grupos privados da saúde.
 
O Governo procura sistematicamente justificar as suas medidas com estatísticas manipuladas, com “relatórios técnicos” feitos à medida das suas opções e, sobretudo, com a cega obsessão pela redução do défice das contas públicas.

É assim que se justificam os encerramentos de dezenas de SAP's por todo o país, deixando as populações, particularmente as do interior, suficientemente longe de uma urgência que, em alguns casos, pode representar a diferença entre a vida e a morte. Foi assim que se justificou o encerramento de maternidades, numa atitude inaceitável de imposição de princípios e critérios aos organismos públicos que não se aplicam aos privados. O mesmo acontece com a proposta de reestruturação das urgências hospitalares. Sem que se tenha criado uma alternativa credível deixando mais de 1 milhão de portugueses a mais de 60 minutos de uma urgência polivalente.

Estamos perante um modelo de cuidados de saúde que é injusto e profundamente desumano. Veja-se por exemplo o que se está a passar com as prioridades da construção de novos hospitais, em que os resultados dos estudos encomendados concluem de forma diversa, dando cobertura desta forma ao vazio de decisão de construir, como é o caso do novo Hospital aqui no Seixal, mas simultaneamente um conjunto de grandes hospitais e clínicas de grupos privados, vão nascendo como cogumelos na Área Metropolitana de Lisboa. Daqui por algum tempo vamos ter certamente o governo a dizer que não vale a pena investir na construção de hospitais do serviço público porque já existem camas suficientes. Algumas delas estão certamente integradas nas 2000 que o grupo Mello quer ter em funcionamento em 2010.

Podemos encontrar os mesmos objectivos nas decisões que têm vindo a ser tomadas para os cuidados primários, nomeadamente na criação das USF (Unidades de Saúde Familiar). Nós tivemos oportunidade de afirmar (quando muitos viam nesta medida a solução para todos os males de que padecem os cuidados primários) que a decisão de avançar no actual quadro político, vai permitir que os privados substituam o serviço público candidatando-se a estas Unidades a partir de Dezembro de 2006.

Os números não enganam. As propostas entradas até à data de hoje são 117 com ganho em utentes que passam a ter médico de família serão mais 162 mil. Mas se considerarmos que apenas 105 foram aprovadas isto significa que os ganhos andarão na ordem dos 130.000 /140.000 para cerca de 1 milhão de portugueses que não têm médico de família. Estão pois criadas as condições para que em Dezembro o Governo venha justificar a possibilidade de entidades privadas se candidatarem à abertura de USF.

Desta forma encontra-se a resposta para uma grande ambição dos grandes grupos privados que é terem na área de influência dos seus hospitais as suas unidades de cuidados primários.

Os portugueses têm vindo a ser penalizados com custos cada vez mais elevados dos medicamentos, quer para o Estado quer para os utentes, como se pode verificar no facto de em 2004 as despesas com medicamentos atingirem mais de 23%  das despesas de saúde. No Orçamento de Estado para 2007, o Governo afirma que o balanço entre a baixa de 6% nos medicamentos e a diminuição das comparticipações mais o aumento das taxas moderadoras, traz uma vantagem de 120 milhões de euros para os utentes. Mesmo que assim fosse, o que é duvidoso, nos anos seguintes não teremos certamente diminuições de 6% e no entanto as taxas moderadoras continuarão a aumentar e não se recuará na política de descomparticipação. Mas o que o Governo não diz é que o Estado e os portugueses em 2005 pagaram a mais cerca de 203 milhões de euros em medicamentos vendidos nas farmácias, pelo facto de os 100 medicamentos mais vendidos que representam 33% do mercado nacional de medicamentos, custarem em média mais 18% do que a legislação permite.
 
Por mais elaborada que seja a retórica do Primeiro-ministro e do Ministro da Saúde, já não lhes é possível esconder o que há muito temos vindo a denunciar: a sua política de saúde está ideologicamente marcada pelo compromisso de destruir o Serviço Nacional de Saúde e abrir o espaço para que os grupos privados o substituam.

Não venham com a estafada tese de que defendemos tudo tal como está!

O quadro está muito claro. De um lado estão os que defendem uma reforma democrática do SNS, como garante do acesso em equidade aos cuidados de saúde por parte de todos os portugueses, do outro os que o querem pura e simplesmente destruir para que desta forma o acesso e a qualidade dos cuidados de saúde fiquem dependentes das regras do mercado, ou seja quem quer saúde paga. Pela nossa parte defendemos um Serviço Público que garanta o princípio da equidade de acesso, o que passa pela gratuitidade da prestação de cuidados de saúde, eliminando as taxas moderadoras ou de utilização que, como está confirmado, não moderam nada e acrescentam muito pouco às receitas.

Neste contexto a luta das populações contra as políticas neoliberais na saúde é fundamental para a defesa do SNS. A prova da importância destas lutas está na resposta agressiva do discurso de membros do Governo e outros dirigentes do PS, acusando aquelas de servirem estratégias partidárias, leia-se do PCP. Apoiar as populações na defesa dos seus legítimos interesses não é manipular. Manipular é vender «gato por lebre» nas campanhas eleitorais e assumir compromissos que se sabe à partida não quererem assumir.

Pelo movimento de protesto, de opinião, reivindicativo e de luta a que dão forma, pelas possibilidades que têm, por informais, poderem envolver amplas massas, as Comissões de Utentes são no momento presente o mais seguro instrumento da luta popular em defesa do Serviço Nacional de Saúde de qualidade. Por isso realçamos as lutas das populações que, afectadas pelas actuais políticas, promoveram abaixo-assinados (com centenas de milhar de aderentes a nível nacional), manifestações, concentrações e outras iniciativas. Valorizamos o crescimento do número de Comissões de Utentes dos diversos Serviços de Saúde viradas para a resolução de diversos problemas de Saúde no plano local e/ou regional. No entanto, dado o agravamento da crise no Serviço Nacional de Saúde, são ainda claramente insuficientes para a necessária luta a travar.

Pela nossa parte temos continuadamente apresentado propostas para a defesa e desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde que garantam o direito constitucional do acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde em equidade, independentemente do seu estatuto económico e social.

Defendemos que uma verdadeira reforma dos cuidados de saúde primários – em ruptura com a política que tem sido seguida – deve integrar medidas de gestão e administração, de preenchimento e alargamento dos quadros de pessoal, de instalações e equipamentos que lhes permitam autonomia diagnóstica e terapêutica, com a duplicação dos recursos financeiros para os Centros de Saúde no prazo de uma legislatura. É indispensável a articulação entre os centros de saúde e os hospitais para a prestação de cuidados de saúde de qualidade e em tempo.

A gestão de todas as unidades de saúde do SNS deve ser de carácter público, não aceitando qualquer legislação que permita a privatização dos Centros de Saúde e pondo fim aos contratos de gestão privada de estabelecimentos públicos, abandonando as Parcerias Público Privadas (PPP) no Serviço Nacional de Saúde e reintegrando os actuais Hospitais EPE (Entidade Pública Empresarial) no Sector Público Administrativo (SPA).

Na perspectiva de uma melhor articulação dos Serviços Públicos de Saúde, há muito que consideramos ser necessária uma nova lei de gestão dos Serviços de Saúde, democrática e participada pelo Poder Local, no âmbito dos Sistemas Locais de Saúde, com novas regras, técnicas e de competência, sendo a selecção dos órgãos de gestão feita por concurso público.

Muitos dos problemas com que o SNS se confronta hoje são o resultado de uma errada política de recursos humanos. Para obviar a esta situação é urgente concretizar um programa de formação de profissionais de saúde, nomeadamente em áreas de especialização de Cuidados de Saúde Primários, obstetrícia e outras, que ponha fim à depauperação em meios humanos que se está a verificar no Serviço Nacional de Saúde e que garanta a sua sustentabilidade no futuro.

Fundamental para a resolução deste problema é abolir os numerus clausus no acesso aos cursos de Medicina e Enfermagem. Deve promover-se a estabilidade de emprego e das carreiras nos Serviços de Saúde, essenciais à qualidade dos serviços prestados, com o consequente fim dos contratos a termo certo para trabalho permanente e outras formas de precariedade, e acabar com os contratos individuais de trabalho, integrando os trabalhadores nestas condições, nos quadros de pessoal.

A racionalização da despesa com medicamentos está na ordem do dia. Como forma de reduzir a despesa do Estado e sobretudo dos utentes com medicamentos o PCP defende, entre outras medidas, que os medicamentos prescritos nos Hospitais e Centros de Saúde - genéricos ou de marca – devem ser aí dispensados gratuitamente, sempre que o seu custo para os estabelecimentos do SNS seja menor que a comparticipação na compra em farmácias.

Na prossecução do objectivo de racionalizar a despesa com medicamentos defendemos ainda:

- A necessidade de alargar o mercado dos genéricos, com o aumento da sua divulgação e incentivando a sua prescrição. Enquanto se mantiver o sistema de preço de referência, que pensamos dever ser abolido, propomos a implementação de uma cláusula de salvaguarda para garantir que o utente não é prejudicado na comparticipação, pelo facto de o médico não autorizar a utilização de genéricos.

- Ser imperioso o alargamento da lista de medicamentos para doenças crónicas e degenerativas, comparticipados a 100%, bem como devem ser adoptados sistemas de comparticipação pelo SNS que garantam às pessoas com recursos económicos mais limitados, a comparticipação especial de mais 15%, sem os entraves burocráticos como os que foram criados pelo actual Governo, para que dela beneficiem todos os que têm direito.

Por fim exigimos que se pare com o encerramento de serviços de saúde, reabrindo-os ao serviço das populações, realizando uma planificação dos serviços segundo os princípios de proximidade e racionalidade, avaliando as condições de instalações e equipamentos, dotando-os de meios técnicos e de profissionais para cumprirem a sua função com eficiência.

E aqui chegámos a uma encruzilhada:
-    com as nossas propostas a saúde continuará a ser um direito;
-    com os planos e as políticas do Governo a saúde será um negócio.

Tudo faremos para que as populações possam um dia julgar e decidir qual o caminho politicamente necessário e socialmente mais justo!



 

Jornal «Avante!»
«O Militante»
Edições «Avante!»
Comunic, a rádio do PCP na Internet