Partido Comunista Portugu�s
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"Verdadeiras listas de espera"
Bernardino Soares no "Jornal de Notícias"
Sexta, 04 Julho 2003

As listas de espera são uma das questões que, no campo da saúde, mais afectam a população portuguesa, exigindo uma resposta eficaz e célere. Por isso, a Assembleia da República aprovou, em 1999 (por proposta do PCP), a criação de um programa especial de acesso aos cuidados de saúde. Lembre-se que há no nosso país listas de espera para cirurgias, mas também para consultas de especialidade, tratamentos, ou para ter médico de família.

Também por isso o artigo assinado pelo ministro da Saúde, no JN (30/06/03), merece comentário. A realidade actual está longe de ser satisfatória. Mesmo aceitando os números apresentados pelo Governo, é uma realidade indesmentível que aumentou o número de portugueses à espera de uma intervenção cirúrgica. Tendo sido realizadas 58 mil cirurgias, desde 1 de Novembro de 2002, o certo é que entraram para a lista de espera mais 70 mil utentes, sendo hoje mais 12 mil os portugueses em lista de espera. É significativo que de 4 para 30 de Junho, entre a apresentação dos dados no Parlamento e o artigo publicado no JN, as novas entradas em lista de espera tenham passado de 55 para 70 mil, enquanto a recuperação de cirurgias atrasadas aumentou apenas cerca de metade daquele valor (de 51 200 para 58 mil).

Valorizamos o facto de 58 mil portugueses terem visto o seu problema resolvido, mas escusa o ministro Luís Filipe Pereira de desvalorizar o aumento real da lista existente. É uma verdade de La Palisse dizer que as cirurgias efectuadas resolveram situações mais antigas do que as que agora surgiram. Sempre assim foi.

Esperamos que o ministro da Saúde torne públicos os dados sobre as listas de espera por hospital e patologia, essenciais para verificar a fiabilidade dos números totais apresentados e para avaliar se o recurso ao Programa Especial de Combate às Listas de Espera Cirúrgicas se fez à custa da produtividade normal dos hospitais. Para além da fé do ministro da Saúde, não se demonstrou que essa produtividade esteja a aumentar de forma significativa. Os próprios Hospitais S.A. continuam a não ter contratos-programa com metas de produtividade, estando o Governo fundamentalmente preocupado com a contenção dos seus gastos.

A realidade demonstra de forma implacável que estamos a afastar-nos da erradicação das listas de espera cirúrgicas no nosso país. Esse objectivo só pode ser alcançado com o aumento da produção dos hospitais do SNS, rentabilizando os meios existentes, prolongando o funcionamento dos blocos operatórios e agilizando os mecanismos burocráticos envolvidos. E isto sem prejuízo da necessidade de um programa especial que possa contribuir para uma mais rápida solução dos problemas das pessoas, mas que seja um acréscimo e não um substituto da actividade normal.

Mas, como diz o nosso povo, não se fazem omeletas sem ovos, ou neste caso, cirurgias sem bisturis. É um facto que a política do Governo dificulta a resolução deste e de outros problemas. Uma política que despreza a urgência na formação de recursos humanos para responder à carência que temos e que se agravará nos próximos anos, que despede milhares de funcionários do SNS, com funções indispensáveis, que lança os hospitais, nomeadamente os que são sociedades anónimas, numa situação de grave carência financeira, que permite que nestes hospitais os blocos operatórios sejam nalguns casos concessionados à actividade privada, limitando assim a capacidade de realizar cirurgias, é uma política que conduz em linha recta ao perpetuar das listas de espera.

O grave problema das listas de espera e do sofrimento das pessoas por elas prejudicadas deve ser tratado com toda a seriedade. Não é boa política esconder debaixo do tapete a realidade que salta aos olhos de todos. E é cada vez mais evidente que ao acentuar-se a degradação do Serviço Nacional de Saúde, como consequência da política do Governo, as condições para recuperar as listas de espera em atraso vão sendo cada vez mais difíceis.