Partido Comunista Portugu�s
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Debate na Assembleia da República (Projecto
Interven??o do deputado Ant?nio Filipe
Quarta, 03 Abril 1996

O suic?dio de tr?s jovens que, h? unsmeses, em Lisboa, se lan?aram do viaduto Duarte Pacheco sobre aavenida de Ceuta por causas que - ao que tudo indica - se ficarama dever ao desespero da toxicodepend?ncia, foi mais umtestemunho chocante daquele que ? um dos mais tem?veis flageloscom que as sociedades contempor?neas se confrontam e contra oqual ? indispens?vel definir e executar pol?ticas maisconcretas e eficazes.

Chamar a aten??o para a enorme gravidadesocial que o consumo e tr?fico de drogas assumem no nosso pa?sest? longe de ser uma atitude alarmista. Muito pior seria, semsombra de d?vida, optar pelo sil?ncio ou por vis?es falsamenteoptimistas sobre um fen?meno cuja gravidade e cujo agravamenton?o podem responsavelmente ser ignorados.

Apesar de n?o existirem dados segurossobre a real dimens?o da toxicodepend?ncia, n?o ? precisofrequentar os chamados hipermercados da droga para ter uma ideiada sua gravidade. Basta andar na rua. Basta saber da inseguran?aem que se vive perante a margi- nalidade crescente que decorre doconsumo e tr?fico de drogas. Sabe-se que n?o h? dia que passaem que n?o haja mortes provocadas pela droga, seja poroverdoses, seja por suic?dio, seja por ataques card?acos.Sabe-se da impunidade com que o tr?fico de drogas se processa emlocais p?blicos de forma muitas vezes assumida e at? arrogante.Sabe-se das listas de espera de longos meses para obter uma con-sulta num centro de atendimento de toxicodependentes. Conhecem-seos casos de aut?ntica espolia??o e m?s- mo de charlatanicepraticados sob o r?tulo de pseudo-cl?nic- as ou comunidadesterap?uticas que prometem trata- mentos infal?veis e que,perante a in?rcia do Estado ainda se apresentam como virtuosascria??es da sociedade civil. E sobretudo n?o h? ningu?m quen?o conte entre os seus familiares, amigos, ou conhecidos,algu?m que n?o sinta na sua pr?pria vida as consequ?nciasdram?ticas da toxico- depend?ncia.

Est?o hoje claramente desacreditadasalgumas teses re- centes que apontavam para a conten??o oumesmo para o retrocesso do consumo de drogas em Portugal. Tudoaponta, infelizmente, para o contr?rio. ? um factoinquestion?vel que a droga ? hoje em dia, justamente, uma dasmaiores preocupa??es para a generalidade dos cidad?os.

Num passado recente, a dimens?o dofen?meno da toxi- codepend?ncia chegou a ser minimizada, comafir- ma??es injustificadamente optimistas acerca de umasuposta conten??o do crescimento do consumo de dro- gas. Taisafirma??es, que os factos conhecidos cate- goricamentedesmentem, visavam sobretudo criar a ilus?o de que as pol?ticasgovernamentais de combate ? droga eram eficazes e estavam aproduzir resul- tados vis?veis. Quando a verdade ? que essaspol?ticas se t?m caracterizado sobretudo, at? ? data, por umaforte presen?a medi?tica a contrastar com uma manifesta in-sufici?ncia de interven??o real.

Em todos os anos s?o prometidos os mesmos centros de atendimento para o ano seguinte, em todas as semanas europeias contra a droga se proclama a conten- ??o do fen?meno; e periodicamente, l? se alteram nomi- nalmente as f?rmulas e estruturas do Projecto Vida reco- nhecendo o fracasso - por demais evidente - das f?rmulas e estruturas anteriores. Entretanto, o tr?fico continua a processar-se com larga margem de impunidade a todos os n?veis; os centros de atendimento t?o prometidos continuam por abrir; continuam a faltar os meios e a coordena??o no combate ? droga.

A falta de meios acess?veis para otratamento e a reinser??o social de toxicodependentes no nossopa?s, ? uma vergonha nacional com que n?o nos conformamos.

N?o podemos permanecer indiferentesperante listas de espera de meio ano para obter uma consulta numcentro de atendimento da Grande Lisboa.

N?o podemos aceitar que existam em todo opa?s, em institui??es p?blicas, apenas 50 camas em unidadesde desintoxica??o.

N?o nos resignamos perante a inexist?nciade centros de atendimento de toxicodependentes nos distritos deBragan?a, de Vila Real, da Guarda, de Portalegre e de Beja.

N?o aceitamos que ao desespero de milharesde toxicode- pendentes e das suas fam?lias se acrescente o dramade procura, em v?o, solu??es de tratamento id?neas eacess?veis.

N?o aceitamos que, perante a in?rcia deGovernos que n?o assumem as suas responsabilidades, opseudo-tratamento de toxicodependentes apare?a como um neg?cioparalelo ao tr?fico de droga.

N?o aceitamos que milhares de toxicodependentes sejam acantonados em estabelecimentos prisionais por falta de institui??es onde possam encontrar solu??es de tratamento e reinser??o social que a pr?pria lei prev? e incentiva.

A rede de servi?os p?blicos que propomos,integra uma unidade de atendimento de toxicodependentes por cadadistrito do pa?s, seis novas unidades de internamento de curtadura??o, uma rede de comunidades terap?uticas dimensionada nabase de uma cama para cada dez mil habitantes.

N?o propomos portanto nada de exorbitante,de incomport?vel ou de dif?cil concretiza??o. Propomos apenasque haja um pouco de vontade pol?tica para assegurar algumas dasrespon- sabilidades de que o Estado n?o se pode demitir.

Aqueles que nos acusam de estatizantes e deinimigos da iniciativa privada por propor-mos que o estado assumaas suas responsabilidades no tratamento de toxicodependentes,n?o est?o mais do que a procurar subterf?gios para pactuar coma desgra?ada situa??o existente.

O que prop?em afinal, os que contestameste Projecto de Lei?

esquecem porventura que, perante a in?rciado estado, o tratamento de toxicodependentes tem sido quaseexclusi- vamente entregue ? iniciativa privada, onde seconfundem institui??es merit?rias com aut?nticasassocia??es de malfei- tores?

? este o liberalismo que defendem?

Esquecem porventura que, de entre osmilhares de camas para tratamento de toxicodependentes que pora? se diz que existem, nem uma s? se encontra devidamentelicenciada?

? este o papel do Estado que defendem? E quem defende os toxicodependentes e as suas fam?lias?

Negar o investimento p?blico no tratamento e reinser??o social de toxicodependentes ? pactuar com aqueles que vivem da explora??o do desespero dos toxicodependentes e das suas fam?lias, num neg?cio que por vezes assume contornos quase t?o s?rdidos como o tr?fico de droga e que em casos j? se confunde com ele.

N?o assumam a responsabilidade de pactuarcom este estado de coisas. N?o ponham o vosso fundamentalismoneo-liberal ? frente de valores humanit?rios essenciais.

N?o ignoramos que o combate ? droga temde ser travado em v?rias frentes, complementares eindissoci?veis. N?o ? possivel desligar o combate primordialao tr?fico de droga, da preven??o prim?ria, da preven??osecund?ria e da reinser??o social. Em qualquer destas ?reas? necess?rio actuar mais e melhor.

Por?m, sem subestimar a import?ncia dasrestantes vertentes do combate ? droga, para as quais temosvindo a contribuir com a nossa iniciativa, reflex?o e propostas,entendemos que esta proposta concreta, num dom?nio t?ogritantemente carenciado como a preven??o secund?ria, n?o s?se justifica ple- namente, como ? absolutamente urgente.

Para suportar financeiramente aexequibilidade deste Projecto de Lei bastaria utilizar para esseefeito apenas uma parte das verbas que anualmente s?odisponibilizadas pelo Joker e que s?o distribu?das semcrit?rios que se conhe?am.

N?o podemos permitir que os cidad?os que,por vicissitudes da sua vida, caem nas malhas do consumo dedrogas e se tornam dele dependentes, fiquem entregues apenas ?sua falta de sorte. ? nosso dever assegurar-lhes um m?nimo depossibilidades de apoio, de tratamento e de reinser??o. Aoapresentar o pre- sente Projecto de Lei, assumimos as nossasresponsabilidades. Convidamos cada um a assumir as suas.