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Debate sobre Telecomunicações
Sábado, 16 Junho 2007
vasco-cardoso.jpgNo debate-audição sobre Telecomunicações, realizado no âmbito da preparação da Conferência Nacional do PCP sobre questões económicas e sociais, Vasco Cardoso, da Comissão Política, sublinhou que o «desenvolvimento científico e tecnológico que deve estar ao serviço do país e do povo. Daqui emerge uma questão central, que alias é abordada no próprio lema da iniciativa, isto é, não é possível defender o interesse nacional, os direitos dos trabalhadores e das populações e garantir o desenvolvimento do país sem um forte sector público, universal e de qualidade nas telecomunicações.»
Intervenção de Vasco Cardoso, da Comissão Política do PCP



Camaradas e amigos

O debate-audição que hoje aqui se realizou insere-se na preparação da Conferência Nacional do PCP sobre questões económicas e sociais, que se realizará nos dias 24 e 25 de Novembro sob o lema Outro Rumo. Nova política ao serviço do Povo e do país.

Quando o Comité Central do PCP, decidiu em Novembro de 2006 levar por diante a realização  desta conferência nacional,  vinte e dois anos depois da última que realizámos sobre o mesmo tema, assumimos o compromisso colectivo de aprofundar não só o diagnóstico da realidade económica e social do nosso país, mas também projectar para a intervenção do Partido e para a sociedade o conjunto de propostas para uma nova política que rompa com o espartilho das políticas de direita e garanta um Portugal com futuro.

É certo que a preparação da nossa conferência nacional se realiza num contexto económico e social muito diferente do que se verificava quando se realizaram as outras duas Conferências Nacionais, daí o desafio que se coloca ao Partido para discutir o país que temos e o país que queremos no início deste novo século.

Nesta Conferência Nacional pretendemos realizar uma análise global e integrada dos problemas económicos e sociais do país, a partir do aprofundamento do conhecimento das suas estruturas socioeconómicas e das suas actuais dinâmicas, bem como os problemas do enquadramento internacional, em particular o processo de integração comunitária e as suas consequências no nosso desenvolvimento.

A persistência de uma grave situação económica e social que faz com que, nos últimos cinco anos, o crescimento económico do nosso país venha sistematicamente divergindo da média da União Europeia e estejamos perante o mais longo período de muito baixo crescimento económico (quase estagnação) das últimas décadas – de tal forma que após um período de 15 anos de aproximação à média europeia só nos últimos cinco anos retrocedemos para níveis dos finais dos anos 80 – tornou-se incontornável, inadiável e inquestionável a necessidade de aprofundar e confrontar a sociedade portuguesa com a existência e a real possibilidade de concretização de uma política económica e social alternativa a esta política de direita, capaz de construir um país mais justo e mais desenvolvido.

As consequências sociais e económicas das políticas seguidas nas últimas duas décadas, após a adesão de Portugal à CEE, em particular das políticas de distribuição de rendimento, das políticas de emprego, das políticas de educação, das políticas de saúde, das políticas de habitação, mas também a realidade que hoje marca não só os sectores produtivos, mas também toda a área de prestação de serviços e o desenvolvimento cientifico e tecnológico.

Um modelo de desenvolvimento económico que gera contínua estagnação económica, com a destruição de grande parte do seu aparelho produtivo, que faz com que o nosso país tenha hoje o maior défice externo do mundo, em termos relativos, que permite que as principais alavancas económicas – as suas maiores empresas – possam estar nas mãos de estrangeiros, que apresenta um nível de desemprego em sentido lato que ultrapassa já os 10% da sua população activa, que tem o maior desequilíbrio na distribuição da riqueza dos países da União Europeia, que tem dos salários mais baixos, que tem das maiores taxas de pobreza, que tem dos mais baixos níveis de educação da sua população e que tem das mais elevadas taxas de desemprego de longa duração, não pode ser um modelo de desenvolvimento que sirva para o presente e muito menos para o futuro.

A Conferência Económica Social do PCP, que se irá realizar no final do corrente ano, irá demonstrar que existe um caminho alternativo a esta política de direita, um caminho que garanta o desenvolvimento económico, sustentado e equilibrado do nosso país, que tem como matriz de referência a nossa Constituição da República e que, a ser trilhado, trará melhores condições de vida aos portugueses.

Se não temos dúvidas quanto aos objectivos que pretendemos atingir com a realização desta  importante Conferência Nacional do Partido, não deixamos de ter muito trabalho a fazer nos próximos meses, num permanente exercício de discussão e reflexão colectiva, característica ímpar do nosso Partido. Queremos uma Conferência desenhada no encontro e no diálogo com o país real, que parta da vida, que identifique e analise os seus principais bloqueios e as suas principais potencialidades, que não se curve perante as injustiças e as desigualdades, que perspective uma efectiva mudança no nosso modelo de desenvolvimento.

Camaradas e amigos

Ao longo desta manhã aprofundámos o debate sobre o sector das telecomunicações. Os contributos e as intervenções que aqui se realizaram, assim como, o documento que apoiou a discussão revelam um profundo conhecimento do nosso Partido sobre o sector. Um sector que, tal como temos afirmado, constitui um sector estratégico para o desenvolvimento do país, parte integrante de um projecto de modernização, desenvolvimento e coesão social que queremos para Portugal.

Tendo em conta os dados do INE de 2003, o sector integra cerca de 240 empresas às quais correspondem aproximadamente 17.000 postos de trabalho e que foi responsável por 3,160 mil milhões de euros de VABpm, qualquer coisa como 2,6% do valor acrescentado bruto em termos nacionais. Números que - embora ocultando a situação de monopólio que a PT detém em relação ao número de empresas, bem como, o elevado número de trabalhadores contratados por via de empresas de trabalho temporário e outros expedientes – revelam o peso significativo que o sector tem em termos económicos no plano nacional.

Mas este sector, aliás como qualquer outro, deve merecer uma análise que vá para além de meras referências contabilísticas. A importância estratégica para a vida nacional -  falamos do Estado, das empresas, dos trabalhadores, dos utentes e clientes, das forças armadas, da vida económica e também cultural do nosso país - confere às telecomunicações uma dimensão de interesse nacional que está para além dos interesses dos grandes grupos económicos que dominam e controlam este sector. Acresce ainda, a dimensão profundamente tecnológica deste sector, desde sempre associada ao desenvolvimento e investigação – o que infelizmente é quase caso único no nosso país - num quadro de continua evolução quer ao nível dos serviços prestados, quer ao nível das infra-estruturas  que o suportam e que lhe conferem um papel acrescido quando falamos do presente e do futuro.

O sector das telecomunicações está hoje colocado perante enormes desafios quanto à sua modernização e que terão uma enorme projecção no futuro do país.
-    A combinação dos processos de convergência fixo-móvel.
-    Integração dos serviços de voz, acesso à internet e de serviço de distribuição de TV.
-    Pela convergência digital das tecnologias das comunicações e das TIC.

Alterações tecnológicas, que o país reclama e que o PCP, virado para o futuro, acompanha. Desenvolvimento científico e tecnológico que deve estar ao serviço do país e do povo.

Daqui emerge uma questão central, que alias é abordada no próprio lema da iniciativa, isto é, não é possível defender o interesse nacional, os direitos dos trabalhadores e das populações e garantir o desenvolvimento do país sem um forte sector público, universal e de qualidade nas telecomunicações.

O sector das telecomunicações em Portugal é marcado pela existência de um monopólio privado, com tudo o que daí decorre. Monopólio traduzido pela posição hegemónica da Portugal Telecom no sector, no nosso país, com consequências negativas no que diz respeito aos trabalhadores, aos utentes, ao investimento, às empresas, e também ao próprio Estado. Situação de monopólio que decorre do aprofundamento do carácter capitalista da nossa economia, registando-se quer à escala nacional, quer à escala internacional.

Os interesses dos accionistas privados não são os interesses, nem dos trabalhadores, nem do país. Se assim fosse não teríamos assistido ao longo dos últimos anos à progressiva redução do número de trabalhadores e ao desaproveitamento das suas capacidades e conhecimentos; Se assim fosse não estaríamos hoje com atrasos na mudança de redes de telecomunicações (fixas e móveis, redes de cobre e redes de cabo, etc.) para as chamadas redes de nova geração. Se assim fosse o carácter universal do acesso à Internet em banda larga não continuaria a sofrer dos constrangimentos e limitações que são conhecidas.

Interesses privados, que no quadro da crescente subordinação do poder político ao poder económico, têm tido por parte dos diferentes governos, PSD e PS, todas as facilidades e todas as condições não apenas para o domínio do sector ao sabor dos seus interesses, mas também, para  a obtenção de fabulosos lucros, que quando comparados com os salários dos trabalhadores assumem a dimensão de escândalo.

Interesses privados a quem o Governo PSD do actual presidente da República Cavaco Silva, durante a década de 90 entregou por um terço do seu valor, a Portugal Telecom, e que mais adiante, por acção do actual presidente da União Europeia Durão Barroso, na altura primeiro ministro do nosso país, receberam de mão beijada as infra-estruturas da rede básica de telecomunicações, operações estas que constituíram actos lesivos do interesse nacional, na senda da criminosa política de privatizações que as políticas de direita têm imposto ao nosso país.

Interesses privados que tiveram da parte do actual Governo PS, uma atitude de submissão dos interesses nacionais aos objectivos do grande capital nacional e estrangeiro no processo da OPA da Sonaecom sobre a PT.

Sobre esta matéria importa registar que a não concretização da OPA lançada pela Sonaecom à PT impediu no imediato o desmembramento da empresa e a mais que certa liquidação de mais de três mil postos de trabalho directos. No entanto, o resultado deste processo não pode ser entendido como a legitimação das medidas implementadas pela actual Administração da PT que utilizou a OPA para desferir, entre outros aspectos, um violento ataque ao Serviço de Saúde dos seus trabalhadores.

Importa referir que num quadro de grandes dificuldades económicas para a maioria dos trabalhadores e do povo português, esta operação alimentou diversas manobras de especulação bolsista que, sem nada criar, se traduziram em novas concentrações de capital e em linhas de financeirização da economia que se projectarão no futuro. E, independentemente deste desfecho, o facto é que a mesma se tem traduzido num agravamento das condições dos trabalhadores, patente nomeadamente nos 6000 milhões de euros que estão previstos distribuir até 2009 em dividendos aos accionistas.

O PCP reafirma que o Governo podia e devia ter tido outra atitude neste negócio, nomeadamente através do accionamento dos direitos conferidos pela posição de Golden Share que o Estado detém enquanto accionista, e que, ao tentar esconder-se atrás da posição de quem “deixa funcionar o mercado”, na prática aquilo que permitiu, foi a especulação bolsista e a apropriação de mais valias por parte do grande capital. A actual estratégia de internacionalização do Grupo PT, encerra perigos que, independentemente de negócios bem medidos não podem ser ignorados. Desde logo, é visível o aumento do número de trabalhadores no Grupo PT em termos gerais, em contraponto com a quebra do número de trabalhadores no nosso país, mas também o desvio de fundos para investimentos no estrangeiro, ou mesmo a possibilidade que é real de grandes negócios e do impacto que poderá ter em termos nacionais.

Uma palavra ainda para o papel da Anacom como entidade reguladora neste como em outros processos. Entidade cujo o objectivo é pugnar pelo funcionamento do mercado e garantir as condições de concorrência mas que na prática se comporta como um seguro de vida para a actividade e os interesses dos monopólios.
 
Esta como outras entidades reguladoras, que assumem um papel crescente no funcionamento dos  diversos mercados nacionais e comunitários, são estruturas que independentemente  da necessidade de aprofundarmos a nossa reflexão, têm concorrido para os objectivos de concentração capitalista que dominam a vida económica nacional e internacional, e com o perigo acrescido, de carimbarem esses negócios, de um carácter anti-monopolista que a realidade não confirma. Os objectivos conhecidos quanto à criação de um regulador europeu confirmam as nossas preocupações quanto à soberania e à segurança nacional, que poderão vir a estar em causa.

No sector das telecomunicações importa ter presente as fortíssimas pressões do grande capital estrangeiro, que tem na União Europeia um instrumento ao serviço dos seus objectivos. Quer isto dizer que a estratégia que está desenhada passa pela concentração dos diferentes operadores nacionais nos chamados gigantes das telecomunicações à escala internacional, que funcionam completamente à margem dos interesses e da soberania nacional.

É por isso que será de esperar, no futuro, fortíssimas pressões no sentido da integração das operadoras nacionais e, neste caso concreto da PT, por parte de operadores estrangeiros.

Camaradas

As propostas do PCP para o sector há muito que são conhecidas e acompanham em nosso entender o conjunto de prioridades que a realidade reclama.

Defendemos um papel determinante do sector público, quer no plano da prestação de serviços quer estendido à rede de infra-estruturas básicas das telecomunicações, assim como, o investimento inadiável nas mesmas.

Defendemos uma nova Lei quadro para as comunicações electrónicas que vá ao encontro  da defesa do interesse nacional e dos direitos das populações.

Defendemos o desenvolvimento do sector, integrado na expansão da capacidade de investigação do país e articulado com o nosso sistema de ensino.

Defendemos um sector nacional público de telecomunicações, soberano face aos interesses do grande capital nacional e estrangeiro, que se desenvolva num quadro de parcerias com sectores estrangeiros.

Mas também defendemos a valorização dos trabalhadores do sector – dos programadores, dos que instalam e fazem a manutenção das redes, dos operadores, dos comerciais, dos investigadores, dos administrativos, no fundo, de todos aqueles que fazem com que o mesmo funcione. O que implica, o combate ao desemprego, o combate à precariedade, a valorização dos salários, o combate à substituição de trabalhadores efectivos por empresas de trabalho temporário, a resolução na PT do défice do fundo de pensões, a defesa do direito à greve, a defesa do serviço nacional de saúde, a defesa do ensino público, gratuito e de qualidade, da defesa de uma segurança social pública e universal, da defesa do regime democrático alcançado com Abril.

Defendendo os direitos de quem trabalha, defendemos o futuro do país. Foi isso que fizeram um milhão e quatrocentos mil trabalhadores no passado dia 30 de Abril, na Greve Geral convocada pela CGTP-IN, naquele que foi o mais poderoso protesto com que alguma vez um Governo do PS se confrontou, exigindo um novo rumo, dizendo Basta à política de direita, naquele que foi também, um sério aviso, quanto à disponibilidade para a continuação da luta contra esta política.

Para o PCP, são os trabalhadores aqueles que, honrando as muitas lutas travadas ao longo dos últimos anos, estão em melhores condições de garantirem o desenvolvimento do sector das telecomunicações no futuro. Ao nosso Partido, cabe o papel de organizar, de esclarecer e mobilizar os trabalhadores para defenderem aquilo que é seu por direito. Cabe também o papel de como Partido de classe, Partido patriótico, de  aprofundar propostas capazes de materializar a exigência de mudança que o sector reclama.

É por isso que estando vinculados ao desenvolvimento da luta de massas contra a política deste governo, estamos também comprometidos com a preparação da nossa Conferência Nacional para que daí possa sair um proposta de modelo de desenvolvimento económico e social que constitua uma ruptura com o actual modelo de exploração capitalista, rompendo com a estagnação económica, com a divergência e o atraso em relação à União Europeia, que assuma a defesa da soberania nacional como questão central e estratégica, que defenda um papel mais activo do Estado nos sectores estratégicos da nossa economia, uma modernização do nosso aparelho produtivo nacional, um combate dos défices externos, que rompa com o espartilho do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) e promova o investimento público, dinamize o investimento privado e desenvolva as políticas sociais

Estamos certos de que com trabalho, confiança e determinação alcançaremos os objectivos a que nos propomos. Um outro rumo, uma nova política ao serviço do Povo e do país.