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Sobre justiça - João Oliveira, deputado da Assembleia da República
Sábado, 24 Novembro 2007

 

joao-oliveira


Camaradas,

No contexto de grave crise económica e social que vivemos, perante a ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e do povo, o sistema de justiça é chamado a desempenhar um papel de acrescida importância.

 


Os conflitos sociais e de classe são frequentemente levados aos tribunais ou solicitam a intervenção do sistema de justiça. O recurso à luta no plano judicial é muitas vezes um complemento bem sucedido da luta de massas desenvolvida pelos trabalhadores e pelas populações na tentativa de travar ou impedir a concretização de gravíssimas medidas no plano social.


Os exemplos da suspensão de encerramentos de maternidades e serviços de urgências, do reconhecimento de direitos laborais dos funcionários públicos quando o Governo os procura torpedear ou da defesa do direito à greve, ilustram esta realidade e a importância que o sistema judicial pode assumir.
No entanto, a situação que se vive na justiça em Portugal é preocupante, constituindo mesmo um factor que potencia e agrava desigualdades e injustiças sociais. Esta realidade verifica-se, quer pelo encerramento de serviços públicos de justiça e sua privatização, quando há interesse económico na sua exploração e o lucro é garantido, quer pelo agravamento das desigualdades e limitações no acesso ao direito e aos tribunais.


Por um lado, sujeita-se o aparelho judicial a um processo de degradação, não dotando os serviços do Estado dos meios necessários para cumprirem a sua função e limitando a sua capacidade de resposta ou a qualidade do seu funcionamento.


Encerram-se tribunais, com particular destaque para os tribunais de trabalho, escasseiam juízes, procuradores e funcionários judiciais, faltam equipamentos e pessoal para a investigação criminal. Aumenta a pendência nos tribunais, continuam a prescrever processos e cresce o sentimento de descrédito no sistema de justiça.
Assim se vão criando as condições para que a lógica de «gestão empresarial» de serviços ou a sua privatização sejam apresentadas como as soluções para todos os problemas, como aconteceu com a privatização do notariado e da acção executiva.
Aliás, no que diz respeito à acção executiva para cobrança de dívidas as consequências da privatização são hoje bem visíveis. Enquanto as grandes empresas e grupos económicos monopolizam o sistema, os pequenos e médios empresários e os trabalhadores vêem crescer as dificuldades para execução de créditos de menor montante mas que assumem por vezes maior importância para a sua subsistência.

Por outro lado, agravam-se as desigualdades e limitações no acesso ao direito e aos tribunais impedindo, por motivos económicos, o acesso de muitos milhares de portugueses ao sistema de justiça.
Esta realidade resulta da existência de um regime de apoio judiciário fortemente restritivo e do progressivo encarecimento da justiça. Um trabalhador que aufere o Salário Mínimo Nacional não tem direito a apoio judiciário mas tem que suportar as custas judiciais e outros custos com o processo que nunca param de aumentar.


O PS e o seu Governo não hesitaram em rejeitar as propostas do PCP de criação de um Instituto de Serviço Público de Acesso ao Direito e de alargamento do apoio judiciário a todos quantos dele necessitam, mas rapidamente promoveram o aumento brutal das custas judiciais. O Orçamento de Estado para 2008 reflecte já este aumento, prevendo que o montante de taxas pagas na área da justiça cresça para mais do dobro relativamente a 2007, passando de cerca de 35 milhões de euros para 77,5 milhões.

Camaradas,
Enfrentamos uma clara tentativa de transformação do sistema judicial num instrumento de dominação de classe, colocado ao serviço de grandes interesses económicos em prejuízo dos trabalhadores, do povo e do país.
As forças que, no plano político e económico, desenvolvem o ataque aos direitos dos trabalhadores, às conquistas sociais do povo português e à democracia de Abril, não deixarão de tentar controlar e manietar o sistema de justiça e pô-lo ao serviço daquela ofensiva.
Não é por acaso que se alteram os códigos penal e de processo penal, dificultando o combate à criminalidade económica e altamente organizada ou o combate à corrupção e o tráfico de influências.
Não é por acaso que prescrevem processos relativos à criminalidade mais complexa, perante a insuficiência de meios humanos e materiais disponíveis para a investigação.
Não é por acaso que se ataca a independência dos juízes ou a autonomia dos magistrados do Ministério Público.


A verdade, camaradas, é que a existência de um poder judicial de facto independente do poder político e económico, que assegure a investigação e o combate eficazes à criminalidade económica e à corrupção, e que dê condições aos trabalhadores e ao povo para a defesa dos seus legítimos direitos, será sempre uma ameaça para as forças dominantes de uma sociedade baseada na exploração e na desigualdade.
É pela construção de um sistema de justiça mais democrático e independente que continuaremos a lutar.

Viva a Conferência Nacional!
Viva o PCP!