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Documento «Um forte sector público, universal e de qualidade de Telecomunicações »
Sábado, 16 Junho 2007

 

«Um forte sector público, universal
e de qualidade de Telecomunicações - Condição de desenvolvimento»
Coordenadora Nacional  do PCP para o Sector das Telecomunicações

1.1. ENQUADRAMENTO DAS TELECOMUNICAÇÕES

 

1.1.      A realização doa presente Reunião - Debate/Audição, enquadrandondo-se na dinâmica preparatória da Conferência Económica e Social do PCP a realizar no próximo mês de Novembro, tem como objectivo a efectivação de um levantamento inicial da caracterização da situação do sector de telecomunicações no nosso País, face à política de direita que tem sido conduzida pelos sucessivos governos do PSD e PS, que tem tido um aprofundamento agravamento acentuado nos últimos tempos e a definição de propostas que consagre um sector de telecomunicações público, universal e de qualidade, no quadro de uma nova política ao serviço do povo e do País. 


1.2.      Está-se em presença de um sector cuja importância para a Sociedade e para o desenvolvimento da sua Economia continua a crescer com grande intensidade, registando-se nomeadamente o papel que os serviços móveis e o acesso à Iinternet têm desempenhado na alteração qualitativa do impacto das telecomunicações em geral na vida dos cidadãos e da Sociedade. Em Particularmente, tal é visível na actividade dos trabalhadores ao potenciar novas e acrescidas possibilidades para a acumulação do conhecimento e para o desenvolvimento do saber fazer, quer através da comunicação entre as outras pessoas e entre estas e as instituições, quer, especificamente, no domínio das actividades económicas, enquanto factor destacado para a produtividade do Trabalho.

 

1.3.  Além disso, o sector das telecomunicações constitui um factor ímpar e indispensável de na contribuição para o triunfar triunfo dos desafios de inovação e de qualificação do trabalho com que, em particular, se confronta o nosso País. De facto, é conhecido que, durante décadas, primeiro no seio do Estado e posteriormente no Sector Público, desenvolveu uma intensa actividade de I&D, que foi e continua a ser fundamental, e praticamente também caso único numa eEconomia pPortuguesa dependente e, por tão assente em baixos de custos de do factor trabalho, em geral muito ausente da problemática da inovação. 

 

1.4.            Ora, o sector de telecomunicações tem estado submetido, na fase presente, a factores determinantes de duas ordens principais:

1.4.             

i)1.4.1       Uma evolução profunda e continuada em termos tecnológicos, dela decorrendo inovações tanto ao nível dos serviços prestados como ao nível das infra-estruturas que os suportam. Uma evolução enquadrada pela combinação dos processos de convergência fixo-móvel; de convergência de serviços de voz, de serviços de acesso à Internet e de serviços de distribuição de TV; e, ao nível tecnológico, pela convergência «"digital"» das tecnologias das comunicações e das tecnologias da informação nas TIC.

 

1.4.2           E, na sequência de uma fase de privatização dos operadores de telecomunicações nacionais e de liberalização da oferta dos serviços fixos, nomeadamente o serviço telefónico e, na área empresarial, o serviço de circuitos alugados, regista-se a existência do quadro de regulação das telecomunicações para a áreao espaço  da UE, que se pretende estruturante de um mercado de oferta de operadores e fornecedores de serviços concorrencial, entretanto criado e aplicável nos diversos países desta área. O quadro regulamentar, transposto para as legislações nacionais, permite geralmenteis, dentro de certos limites e cumpridos certos princípios, uma aplicação diferenciada por cada um dos reguladores nacionais de acordo com as especificidades de cada país. O quadro de regulação do sector das telecomunicações - designadas na legislação por comunicações electrónicas-encontra-se actualmente em fase de revisão.   

1.5.            Relativamente à vertente da evolução tecnológica e ao seu impacto ao nível dos serviços, na actualidade e a médio prazo, as suas linhas de força incluem:

 

1.5.1           i)  Consolidação da perda de peso do serviço público de telefónico telefone público fixo para uma parte significativa dos seus utentes e do seu tráfego, devido à transferência para o serviço móvel, para outros meios de comunicação da área da iInternet, nomeadamente o correio electrónico, e, ainda, para a VoIP (voz sobre IP[1]), quer na versão computador a computador quer através de acessos de banda da larga.

 

1.5.2           ii) Manutenção de uma faixa - se bem que em declínio mas sempre importante - de utentes do serviço público de telefone telefónico público fixo, em particular na área dos reformados, pensionistas e idosos, como, se bem que para quantidades de tráfego significativamente menores, nas residências familiares utilizando a mesma linha para o telefone e para a banda larga e nas instituições e empresas. O serviço público de telefone público fixo continua a constituir uma área para a qual a condição de «"serviço universal"» é imprescindível.

 

1.5.3           iii) Aumento significativo da utilização do acesso de banda larga à iInternet, além disso, requerendo capacidades de transmissão cada vez mais elevadas.

 

1.5.4           iv) Generalização do emprego pelos utilizadores da Internet do modo "nómada", utilizando acessos rádio (WiFi) nos lugares públicos. 

 

1.5.5           v) Utilização crescente, em alternativa, de acessos de banda larga à Iinternet em linha com a expansão da penetração da terceira geração móvel (3G).

 

1.5.6           vi) Desenvolvimento de ofertas de feixes de serviços de telecomunicações ditos triplos (voz, televisão, Iinternet) e quádruplos (triplos + serviços móveis), o que está a conduzir à convergência e mesmo à integração empresarial dos operadores de serviços fixos e móveis. Além disso, estas ofertas, tanto as triplas como as quádruplas, basear-se-ão tanto nas plataformas criadas inicialmente para o telefone («"redes de cobre"») como a distribuição de televisão («"redes de cabo»").  

 

 

1.6.  Relativamente ainda à vertente da evolução tecnológica e ao seu impacto ao nível das infra-estruturas, na actualidade e a médio prazo, as suas linhas de força incluem:

1.6.1           Mudança das redes de telecomunicações (fixas e móveis, redes de cobre e redes de cabo, etc.) estruturadas secularmente com base nos parâmetros do serviço telefónico para redes estruturadas na sua totalidade com base nos princípios próprios da Iinternet (all IP[2]), as chamadas "«redes da próxima geração"» (NGN[3]).

 

iii)1.6.2    Transição progressiva das redes de acesso existentes, nomeadamente as "«redes de cobre"», para acessos em fibra óptica, com vista a servir os requisitos de capacidades de transmissão de banda larga crescentes.

 

iv)1.6.3   Simultaneamente às transformações acabadas de referir, em particular em 1.5.1 i), registar-se, devido à esperada simplificação das infra-estruturas e das operações envolvidas, uma correspondente diminuição dos custos de exploração.

 

1.7.            As mudanças referidas em 1.5. implicam um esforço muito elevado de investimento no médio prazo, superior ao que é habitual na actualidade, mesmo entrando em conta com os montantes que têm sido empregues na expansão da banda larga e na implementação da 3G na área móvel. Um esforço difícil para operadores privados e cotados em Bolsa, muito obrigados a um crescimento contiínuo dos seus resultados financeiros e a uma remuneração «"adequada"» dos seus accionistas, com vista não só a prevenir a «"fuga"» de capital accionista, mas ainda devido à necessidade de conseguir libertar os meios suficientes para os investimentos requeridos. No entanto, o processo já começou nos casos em que já se tornou inevitável.

 

 

1.8.            O resultado da transformação referida em 1.5., com as correspondentes diminuição dos custos de exploração, constituirá um argumento de peso, por parte do Ccapital, para uma ulterior diminuição dos custos de trabalho e representará, com certeza, mais uma pressão negativa sobre o emprego no sector das telecomunicações.

 

 

1.9.            Ainda sobre a transformação referida em 1.5., deverá ser notada a possível dificuldade em levar a bom termo projectos de tal envergadura, com a eficiência devida, em resultado das imensas sangrias indiscriminadas de trabalhadores, incluindo as situações de pré-reforma e de suspensão de contratos de trabalho, de grande experiência e capacidade profissionais, perdas de capacidades de trabalho entretanto havidas na generalidade das operadoras que vão ser chamadas a protagonistas principais de tais mudanças, isto é, as operadoras incumbentes dos diversos países, a Portugal Telecom no caso do nosso País.

 

1.10.        Relativamente ao quadro de regulação das telecomunicações na área da UE, relembra-se que ele foi estabelecido subsequentemente aos processos de privatização em diversos graus dos operadores de telecomunicações incumbentes, a partir da segunda metade dos anos 90 e consequente entrada em Bolsa, bem como da liberalização dos respectivos mercados das telecomunicações nacionais em 1998 (nalguns países da UE mais tarde, no caso de Portugal, com base na derrogação obtida pelo nosso País, a liberalização foi estabelecida muito pouco tempo depois, no ano 2000).

 

1.11.        Posteriormente, cerca de uma década mais tarde, em 1999, procedeu-se a um processo de avaliação da aplicação do quadro de regulação existente para as telecomunicações e áà sua revisão. Entretanto, o sector tinha mudado completamente, não só tendo as telecomunicações móveis adquirido uma grande influência, como tinha já aparecido a Iinternet como fenómeno relevante, se bem que fundamentalmente acedida através da rede telefónica puública fixa. Adquiria já peso a convergência com o sector da distribuição de TV por cabo. Um dos resultados foi o da mudança da designação do sector de "«telecomunicações"» para "«comunicações electrónicas"». A regulação passou também a ser mais minuciosa em termos das quase duas dezenas de mercados considerados. Não foi considerada a criação de um regulador a nível da UE, passando, no entanto, a Comissão Europeia a dispor de uma maior possibilidade de intervenção com o proclamado objectivo da harmonização da aplicação da regulação dos diversos países.

 

1.12.        O quadro de regulamentação das comunicações electrónicas para a área da EUE, actualmente em vigência, encontra-se de novo em fase de revisão desde 2006, agora num ambiente de telecomunicações ainda mais radicalmente alterado do que em 1999. Espera-se a apresentação de uma proposta por parte da Comissão Europeia, ainda em 2007. A tendência para remendar o existente, cuja base foi criada numa situação em que o serviço telefónico fixo determinava tudo, arrisca tornar o processo em algo que dificilmente chegará a um resultado adequado.

 

1.13.        Entre as diversas questões que estão em exame, a Comissão Europeia tem dado a entender apontar para duas de grande envergadura institucional, que deveriam ser incluídas como resultante doa actual processo de revisão do quadro regulamentar para as comunicações electrónicas: (i) a criação de uma entidade reguladora a nível do conjunto da UE, com perda relativa de soberania nacional; (ii) a separação dita «"vertical"» nas operadoras incumbentes (no nosso País, na Portugal Telecom) entre a actividade grossista - fornecimento de meios e serviços a outros operadores de telecomunicações - e a actividade retalhista de oferta de serviços aos clientes finais -, portanto, neste caso, com o proclamado sentido de tornar o mercado grossista mais equitativo para todos os operadores, acabando com as vantagens do operador incumbente.

 

1.14.        Destaca-se, ainda, uma outra questão presente na revisão do actual quadro regulamentar: a da procura da obtenção de poderes alargados, por parte da Comissão Europeia, na gestão do espectro radioeléctricos, até ao presente considerada uma área inalienável das soberanias nacionais dos Estados-mMembros, com o objectivo de criar um estímulo decisivo a um mercado único europeu de licenças de espectros de frequências.

 

1.15.        Os resultados da aplicação das políticas regulamentares instituídas pela EUE, desde a década, de 90, apontando inicialmente para o investimento de novos operadores em novas infra-estruturas de telecomunicações, o que poderia ser benéfico para os fabricantes do sector, foram muito magros, com excepção das chamadas para tráfego de longa distância. Inclusivamente, a atribuição generalizada de licenças de acessos fixos rádios aos novos operadores (ao mesmo tempo que aos operadores incumbentes não eram atribuídas licenças, a não ser para o cumprimento das obrigações destes em termos de serviço universal, uma área na qual os novos operadores não quiseram entrar).

 

1.16.        Perante este fracasso de uma política voluntarista de construção de um mercado concorrencial nas telecomunicações, baseada em decisões administrativas - uma contradição nos termos -, desde logo no serviço telefónico fixo, os Estados-Mmembros e a Comissão Europeia decidiram avançar com uma outra estratégia, uma vez que os operadores incumbentes, então privatizados, tinham sido transformados em entidades monopolistas. A solução encontrada foi a de promover a obrigatoriedade dos operadores incumbentes alugarem os acessos das plataformas das «"redes de cobre»" por eles detidas em determinadas condições de preço grossista, ubiquidade de disponibilização, reserva de espaços nas instalações das centrais para os novos operadores. Nesta nova situação, a situação de mercado começou sensivelmente a mudar em detrimento das cotas de mercado dos operadores incumbentes.

 

1.17.        Numa situação como a descrita, os operadores incumbentes, que detéêm as infra-estruturas de telecomunicações, perante as necessidades de grandes investimentos decorrentes das evoluções tecnológicas e do panorama de serviços acima referido, perante ainda a necessidade de assegurar uma permanente baixa de custos (uma contiínua elevação de competitividade), afirmam que uma regulação pesada e detalhada, bem como demasiado imprevisível, do tipo a que em geral estão submetidos, os operadores incumbentes, cotados em Bolsa, controlados pelos requisitos de maximização de lucros e de consequente remuneração dos seus accionistas, exprimem, nesta nova situação, a sua dificuldade em disponibilizarem os investimentos requeridos pela nova fase das telecomunicações.    

 

1.18.        Além disso, os operadores incumbentes agora privatizados, encontrando-se numa situação de difícil crescimento nos seus países de origem, consideram ser, em geral, demasiado oneroso o «"recrutamento"» de novos clientes ou mesmo a «"recuperação"» de clientes perdidos. Numa conjuntura destas têm preferido crescer com base na presença nos mercados de outros países que apresentem ainda um crescimento razoável, na Europa ou noutros continentes.

 

1.19.         Os novos operadores, com frequência filiais dos operadores incumbentes de outros países, aproveitando as infra-estruturas existentes no ppaís onde se instalam, indo buscar capacidade tecnológica e apoio de saber fazer a parceiros de outros países, podendo dispor ondo de forças laborais muito restritas, jogam tudo por tudo na competitividade ao nível de preço.

 

1.20.        Os utentes têm sido sacrificados em preços e em qualidade de serviço pela implementação desta leviana e voluntarista política experimental de regulamentação. Uma implementação dirigida, numa primeira e falhada fase, ao estabelecimento de um ambiente propício à construção de infra-estruturas alternativas e, portanto, às perspectivas de grandes encomendas aos fabricantes por parte dos novos operadores; e, na fase actual, confessando o falhanço inicial, consistindo na imposição do aluguer das infra-estruturas existentes, propriedade dos operadores incumbentes. Com efeito, neste caso a solução encontrada é a da garantia de uma margem de lucro aos operadores alternativos deduzindo do seu preço de retalho uma margem para calcular o preço grossista dos incumbentes aos novos operadores. Quer dizer, o objectivo não é calculado a partir do preço adequado aos utentes mas a partir da margem adequada para os novos operadores se manterem nos mercados. Toda a operação, funcionando administrativamente com a justificação da manutenção do livre jogo das forças de mercado. Até quando esta contraditória utilização do aparelho estatal de regulação para garantir via administrativa os lucros das diversas entidades, de acordo com a teoria económica liberal?

 

1.21.        Uma ordem de impactos socialmente iníqua tem consistido mundialmente quer na perda de muitas dezenas milhares de postos de trabalho efectivos, substituídos pelo aumento significativo de trabalho precário,  a nível do sector das telecomunicações, dos quais alguns milhares no nosso País, com destaque para a PT, oue tem constituído, também, uma quer numa maior exploração nos postos de trabalho restantes. Com efeito, a palavra de ordem redução continuada nos custos implica sobretudo os custos do trabalho que são exactamente os dedicados à criação de valor. Assim:

 

(i)1.21.1      No caso dos operadores, nomeadamente nos incumbentes, o aumento das margens de lucros, dos resultados, para além da remuneração dos accionistas, teêm servido para o seu crescimento orgânico nos mercados de outros países, conduzindo a perda crescente de importância relativa dos utentes no mercado do seu país de origem. Um argumento importante usado para esta expansão tem sido o de ganhar dimensão para aumentar poder negocial com os fornecedores, virtuosamente implicando no decréscimo dos custos dos operadores e assim por diante. E, claro está, ainda o contínuo crescer da remuneração accionista.

(ii)1.21.11.21.2            No caso dos fabricantes, tem-se assistido a uma brutal concentração, nomeadamente na fase actual, por um conjunto de fusões de que são exemplo os casos recentes Nokia / Siemens e Alcatel / Lucent[4].

1.21.1             

 

                

 

 

 

2.          IMPACTOS específicOs DEVIDOS à política DE DIREITA SEGUIDA PELOS SUCESSIVOS governoS

 

 

 

2.1.      Em Portugal, os sucessivos governos do PS e PSD, prosseguindo uma política de direita responsabilizaram-se, com todo o ânimo de bons e deslumbrados discípulos, desde praticamente do início do processo na segunda metade dos anos 80, quando da entrada do nosso País para a CEE, na concretização deste tipo de "«inovações»". AquelasOs governos portugueses, sempre têm estado, de acordo com as suas limitações de competências e em face dos limites derivados das concretas situações sócio - políticas e da resistência e lutas dos trabalhadores, na vanguarda dos processos de privatização e de liberalização na área das telecomunicações.

 

2.2.      Com efeito, o governo português foi mesmo dos primeiros a criar antecipadamente - em 1981, bem antes da entrada de Portugal para a CEE -, um regulador para o sector das comunicações e telecomunicações, o Instituto das Comunicações de Portugal, ICP, mais tarde rebaptizado como Autoridade Nacional para as Comunicações, ANACOM.

 

2.3.      De modo semelhante, e se bem que tendo de implementar um processo mais complexo que a maioria dos países da UE - o País dispunha de uma estrutura de operadores fragmentada: CPRM (Marconi), Telecom Portugal (sector de telecomunicações dos CTT), TLP, TDP (infra-estruturas de telecomunicações da RTP) -, o Ggoverno português, na altura tendo Cavaco Silva como Primeiro Ministro, foi particularmente expedito na fusão, numa única empresa, das empresas existentes e na sua privatização, tendo vendido a então novel PT por um terço do valor por que tinha sido avaliada, com o objectivo de estimular e concretizar todo o ulterior processo de privatizações.

 

2.4.      Em Dezembro de 2000, é realizada a quinta e última fase do processo de privatização, mantendo o Estado a Golden Share golden share, constituída por um conjunto de 500 acções, com poderes especiais que, entre outras coisas, permitem ao Estado uma palavra decisiva sobre a alteração dos EEstatutos da PT na parte em que estes não permitem que qualquer dos seus accionistas, que exerça directa ou indirectamente actividade concorrente, detenha individualmente mais de 10% do seu capital. Pelo seu lado, a propriedade das infra-estruturas básicas da rede de telecomunicações continuou dada ao domínio público.

 

2.5.            Com esta radicalidade do processo de privatização da PT, para mais num período tão curto, o governo português, ultrapassou claramente a grande maioria dos outros países, em profundidade e ritmos de privatização.

2.6.            A privatização teve, desde logo, também como consequência a retirada de muitos milhões de Euros às receitas do Orçamento de Estado.

2.7.            Tal como referido atrás em 1.21., a PT foi especialmente sacrificada em termos de impacto sobre os postos de trabalho existente. Com efeito, para além do que aconteceu com a maior parte dos seus congéneres europeus, a PT resultou de uma fusão de operadores, o que, por si só, já conduziria a uma diminuição de postos de trabalho considerados redundantes. Juntando a este facto a privatização e o sobrepujar de critérios de "eficiência" aos objectivos de qualidade de serviço mais baixos, caiu-se na eliminação de milhares de postos de trabalho e na substituição de trabalho com direitos por trabalho precário, em muitos casos, mal remunerado, um processo que ainda se desenrola actualmente.       

2.8.      De notar que, pela mesma altura, o governo português, relativamente ao processo de liberalização do sector, num lance que pretendeu fazer passar por patriótico «"rebate de consciência"», tal como alguns outros países na altura ainda considerados no mesmo nível de desenvolvimento na «"Europa dos 15"» (Grécia, Espanha, Irlanda), alcançou uma derrogação dos objectivos de liberalização de 1998 para 2003, para ter tempo para se preparar para o «"big bang"». Então, com uma PT criada havia pouco, acabada de, no essencial, ter sido privatizada, tendo portanto passado tecnicamente a funcionar como monopólio «"protegido"» à boa maneira de um clássico capitalismo monopolista de Estado em recomposição, a derrogação jogou, sobretudo, quer a favor do crescimento orgânico da PT no Brasil quer dos lucros dos novos accionistas privados que já tinham adquirido a mesma quase ao preço da chuva. Na prática, o final da utilização da derrogação foi antecipado para 2000, como noutros casos, uma vez que foi considerado que quanto mais tarde se iniciasse a liberalização tanto mais tarde se iniciariam as práticas respectivas, acabando assim, esta medida de defesa por poder redundar num fragilizar das perspectivas de competitividade da PT quando os novos operadores entrassem no mercado correspondente.

 

2.9.      Posteriormente, em 2002, o governo português, com o objectivo de resolver a questão de excesso de défice do Orçamento de Estado, resolveu alienar para o domínio privado, no caso à PT, as infra-estruturas básicas da rede de telecomunicações. Ao fazê-lo, o governo PSD / Durão Barroso deu um sinal claro e decisivo, do pouco que para ele valia uma infra-estrutura de tão elevada importância, em termos de soberania estratégica para o desenvolvimento do País. Ao tempo, era já um sinal dramático de financeirização, de desprezo por todos os outros valores de civilização, agora já não apenas no domínio da economia e da força de trabalho, agora já como um processo a alargar-se a todos os domínios, culminando na obra de destruição em curso a ser levada a cabo pelo governo PS / Sócrates.

 

2.10. Mais recentemente viveu-se uma situação muito difícil no sector de telecomunicações, com a OPA à PT por parte da Sonae. Uma situação que, para além de apontar para uma brutal concentração de poder da sobre os mercados móvel e fixo, com o beneplácito de uma aAutoridade «dita» da cConcorrência, configurava um perigoso ataque ao sector de telecomunicações nacional através do desmantelamento indiscriminado da PT. Uma destruição justificada com base num palavreado surrealista de aumento da concorrência! Um processo de aquisição que a Sonae pretendia efectuar vendendo partes da PT. Um processo que indicava a Sonae, uma participada da France Telecom / Orange, mediadora de uma partilha dos activos mais importantes do sector de telecomunicações como são os da PT, entre operadores internacionais poderosos, dos quais a Telefónica deu explicitamente a cara.

2.11.    A OPA da Sonae à PT acabou por não vingar, devido aos seus accionistas terem preferido o plano de remuneração, que lhes foi proposto pelo Conselho de Administração da PT, ao preço final proposto pela Sonae. Com efeito, o que esteve em jogo foi a Sonae a apropriar-se das sinergias que a concentração empresarial e de mercado lhe iria proporcionar, sobretudo, através da eliminação de milhares de postos de trabalho e dos preços de mercado que um superior domínio deste lhe permitiria praticar, com o beneplácito da Autoridade da Concorrência entretanto sobejamente demonstrado.

 

2.12.    Mas tal desastre para o sector das telecomunicações só foi evitado à custa de uma remuneração dos accionistas da PT brutalmente acrescida. Tratou-se de um efeito muito perverso da privatização e da PT estar cotada ontada na Bolsa. Com efeito, são mais de 6 mil milhões de eEuros que estão serão distribuídos de 2007 a 2009, um valor equivalente a mais de metade do valor da PT no mercado bolsista, uns 80% já em 2007. Meios que deveriam ser aplicados em investimento na inadiável transformação radical das infra-estruturas de telecomunicações que está aí à porta, uma transformação indispensável para a competitividade não apenas deste ou daquele operador de telecomunicações, mas para o desenvolvimento do País. Além disso, a aplicação de tais meios pela PT serviria também para resolver o défice do Fundo de Pensões e para evitar a degradação que tem vindo a ser prosseguida ao nível do Plano de Saúde e das restantes prestações sociais dos trabalhadores.

 

2.13.    Tal como referido em 2.6., já com a privatização da PT, como de tantas outras empresas públicas, ficou o Orçamento de Estado privado de importantes receitas. Ora, se tivesse ido avante a OPA da Sonae à PT, o que aconteceria com o endividamento enorme com que a nova entidade resultante da aquisição da PT pela Sonae ficaria, libertá-la-ia de ter que pagar impostos durante longos anos. Enfim, querido tido como um negócio da China.  

 

2.14.    Perante todas estas perspectivas que logo ficaram à vista, o gGoverno ficou de imediato desde logo impressionado muito positivamente - a Eeconomia dava um grande sinal de vitalidade. À medida que, do seu lado, lhe foi parecendo que a correlação de forças se alterava deixou de tomar partido, não obstante tudo o que de gravíssimo se estava a passar. Chegado o processo ao fim, foi mesmo criticado por uma Sonae que vira gorados os seus propósitos. Já no tempo do governo PSD / Durão Barroso, tinha este levado o eEstado a abdicar do domínio público das infra-estruturas básicas de telecomunicações do País. Agora, com o gGoverno PS / Sócrates, persistindo numa política de direita de abdicação dos interesses nacionais, voltámos a ter um governo a não desempenhar a sua obrigação, perante um jogo financeiro destrutivo que tinha como objecto «"apenas»" um instrumento básico para o desenvolvimento do nosso País. O Ggoverno, assumiu um «falso» papel de imparcialidade, perante o incerto combate entre fracções poderosíssimas do capital financeiro global.

 

2.15.    Finalmente, e por ocasião da presidência portuguesa da UE no segundo semestre de 2007, tem o gGoverno português, numa clara vontade de continuar a alienar a soberania do povo português, o objectivo de favorecer a constituição de um regulador europeu para o sector das telecomunicações. Mesmo mantendo o regulador português, a ANACOM, numa posição subordinada de organismo desconcentrado, e para além da implicação do aumento de burocracia que tal solução talvez julgada pelos seus proponentes politicamente menos inaceitável que a supressão pura e simples dos reguladores nacionais, tal posição do gGoverno português tem de ser repudiada como absolutamente inaceitável.   

 

2.16.    Os efeitos negativos genéricos referidos atrás noa secção de enquadramento dos sectores de telecomunicações, nomeadamente os sectores dos países da UE, quer sobre os utentes quer sobre os trabalhadores das empresas do sector, têm-se feito sentir de forma agravada no caso do nosso País, devido às suas fragilidades e dependências, como já se mostra no texto anterior relativo a esta secção.

2.17.    Nesse sentido, um dos fenómenos típicos observados mais perversos tem a ver com as ilações retiradas de uma comparação desfavorável real dos preços no nosso País, de uma pior qualidade de serviço praticada e de uma atrasada e menor penetração genérica de boa parte das inovações relativamente aos países mais avançados da UE e do Mmundo (exceptuando-se o exemplo conhecido dos serviços móveis, ligado à inovação mundial dos pré-pagos, concebida e lançada no Grupo PT). Notando, assim, no caso das telecomunicações, que a apreciação de princípio negativa, em parte, se baseia num factor subjectivo persistente de que lá fora é tudo melhor por definição, e, por outro lado, que essa mesma apreciação tem razão de ser na parte que se refere àás consequências dos limites objectivos impostos pelao baixo nível genérico de desenvolvimento do nosso País, chama-se a atenção para o erro básico de erigir os mais países mais avançados como meta absoluta a atingir. Esta atitude obscurece a detecção das raízes do mal profundo também presentes nesses países modelo e, para muitos, países ídolos, uma vez que a política e orientações seguidas são genericamente as mesmas e não é portanto verdadeira, a tese de que falham no nosso país porque são mal aplicadas.

 

 

 

 

3. PROPOSTAS OUTRO RUMO - NOVA POLÍTICA PARA O SECTOR DAS TELECOMUNICAÇÕES

 

 

O PCP considera que o País precisa, como condição do seu desenvolvimento, da existência de um forte sector público, universal e de qualidade de telecomunicações, para o que é necessário uma ruptura de esquerda com a política de direita e de uma nova política para um Portugal com futuro.

 

Em consequência, o PCP propõe -seuma nova política para o sector das telecomunicações que consagre  baseada nos seguintes aspectos:

 de 2005, o qual, de um modo geral, se mantém válido:

 

(i)3.1     Garantia de um papel determinante do sector público, o que implica:

3.1.1 A detenção pelo Estado da maioria do capital do operador que detém as  infra-estruturas básicas das telecomunicações;

3.1.2 A detenção pelo Estado da maioria do capital no(s) operador(es) principais das diversas áreas e actividades do sector;

3.1.3 A manutenção dase golden share(s) do Estado Português nas entidades empresariais relativas aos dois pontos anteriores.

 

(ii)3.2   Elaboração de uma nova Lei-Quadro para as comunicações electrónicas, no sentido de as consragrar como serviço público essencial, salvaguardar a defesa do interesse nacional, incluindo os direitos dos utentes, e inverter a forma  de liberalização consagrada pelas políticas presentes favorecedoras dos grupos económicos monopolistas.

 

(iii)3.3  Desenvolvimento do Sector com estímulo e máxima utilização de I&D nacional em articulação com o sistema educativo, designadamente através de:

3.3.1  Promoção estratégica da tecnologia digital a todos os níveis, enquanto princípio básico de flexibilidade e interactividade, fundamental para propiciar a custos decrescentes o acesso universal rápido aos serviços de comunicações electrónicas, para as capacidades de transmissão requeridas em cada momento e em cada local;

3.3.2 Transformação das infra-estruturas básicas de telecomunicações estruturadas na sua totalidade com base nos princípios da Internet (all IP), nas chamadas "«redes da próxima geração"» (NGN);

3.3.3   Transição progressiva das redes de acesso existentes, nomeadamente as "redes de cobre", para acessos em fibra óptica, com vista a servir os requisitos de capacidades de transmissão de banda larga crescentes;

3.3.4  Modernização e inovação sustentadas, nomeadamente nas áreas das comunicações móveis, do acesso á Internet e da televisão sobre IP, incluindo a integração fixo-móvel e as ofertas triplas (voz, acesso de banda larga, televisão) e quádruplas (triplas + móvel);

3.3.5  Apoio a projectos e respectiva implantação concreta de sistemas visando melhorar as condições de vida das pessoas com necessidades especiais (idosos e pessoas com deficiência) e pugnando para que a acessibilidade electrónica se torne numa realidade para este sector dos portugueses;

3.3.6 Alargamento da legislação contemplando o emprego das TIC enquanto processo corrente entre pessoas e entre instituições;

3.3.7 Inclusão nos diversos graus de ensino e formação profissional das  diversas áreas das comunicações electrónicas.         

3.4           Entendimento da internacionalização sobretudo na base da celebração de parcerias.

 

(v)3.5   Garantia de um serviço público com exigência crescente de qualidade para todas as áreas das comunicações electrónicas, com acessibilidade e universalidade asseguradas, implicando:

3.5.1 A definição alargada à banda larga de um serviço universal de Internet, incluindo a disponibilização de Centros Públicos de acesso gratuito (incluindo as aplicações "nómadas" tipo WiFi), a consolidação em número de pontos de acesso para todo o sistema de ensino, a promoção do acesso nas áreas sociais e de saúde, às camadas sociais de fracos recursos, às pessoas com necessidades especiais, a inclusão das zonas interiores, insulares e outras de qualquer modo periféricas;

3.5.2 A salvaguarda dos direitos dos utentes, incluindo a qualidade dos serviços prestados, a informação detalhada e gratuita sobre as condições de prestação e facturação e sobre a garantia do sigilo das comunicações, não cedendo a pressões securitárias;

3.5.3 No caso dos padrões de qualidade dos serviços definidos  em base negociada com os utentes, que o seu controlo seja exercido por uma entidade de facto independente dos lobbysóbis de operadores e / ou fabricantes;

3.5.4 O estabelecimento de uma orientação tarifária em apoio dos utentes residenciais e das médias, pequenas e micro-empresaspequenas e microempresas;

3.5.5 A consolidação de um esquema de compensações aos operadores de serviço universal pelos custos acrescidos decorrentes das obrigações correspondentes.                 

3.6          (vi)  Acompanhamento e participação adequada nos programas europeus de telecomunicações baseadas no espaço exterior, tendo em vista contribuir para a realização e partilha plena das suas virtualidades nos domínios de localização e navegação, da logística, dos sistemas de informação geográfica, de obras públicas, de protecção ambiental, de monitarizaçãomonitorização de riscos e catástrofes, de protecção civil e de operações de salvamento.

 



[1] IP - Internet Protocol                    

[2] All IP - Protocolo Internet na totalidade

[3] NGN - Next Generation Network

[4] A Lucent era o antigo braço fabricante do antigo maior grupo empresarial do mundo, a americana AT&T, agora parcialmente reconstituído e em fase de ataque ao maior grupo operador de telecomunicações do mundo (sem contar com a China), a Vodafone, actualmente a passar por uma crise profunda.