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Encontro Nacional do PCP sobre a situação da Educação em Portugal
-Interv. de abertura - Jorge Pires
I
O AVANÇO DAS POLÍTICAS DE DIREITA E
AS CONSEQUÊNCIAS NA ÁREA DA EDUCAÇÃO
O Encontro Nacional do PCP sobre a situação da educação
em Portugal realiza-se num quadro político marcado por uma prolongada
ofensiva de matriz neoliberal, sustentada numa profunda limitação
das funções sociais do Estado, restringindo severamente o seu
papel como instrumento para a promoção da igualdade entre os portugueses,
em mais um ajuste de contas com as conquistas alcançadas com o 25 de
Abril.
Os últimos anos na área da educação foram, fundamentalmente,
de continuidade da política de direita, mantendo-se como linhas condutoras
da intervenção governativa a crescente desresponsabilização
do Estado, o financiamento público do ensino privado e a subalternização
de critérios pedagógicos em prol de critérios economicistas
e elitistas.
O prolongamento da crise na educação tem a sua expressão
mais aguda no insucesso educativo e no abandono escolar precoce, cujos indicadores
oficiais não deixam qualquer dúvida. Portugal é o segundo
país da União Europeia com o maior índice de analfabetismo
e baixos níveis de literacia, com baixas qualificações
académicas e profissionais, com os maiores índices de abandono
e insucesso no 3º ciclo do ensino básico e no ensino secundário
e com a maior taxa de abandono dos estudantes entre os 18 e os 24 anos. Uma
muito grave expressão de real insucesso, da maior importância a
médio e longo prazo, é a falta de qualidade das aprendizagens
realizadas, logo a falta de qualidade do sucesso obtido.
Esta é uma realidade indissociável das políticas neoliberais
que pretendem desresponsabilizar o Estado pela garantia de direitos fundamentais
e universais que se traduzem na crescente mercantilização da educação,
com expressão concreta no também crescente desrespeito pelo preceito
constitucional que obriga o Estado a democratizar a educação e
a garantir a progressiva gratuitidade do ensino público. As políticas
neoliberais desenvolvidas pelos governos PSD/CDS-PP têm contribuído,
ainda, para aumentar a selectividade e elitizar o ensino e o pleno acesso à
educação, particularmente nos níveis secundário
e superior, para além de se orientarem para o aumento dos privilégios
e das benesses concedidas ao ensino privado.
A esta crise não é estranha a reforma educativa da responsabilidade
do Governo PSD de Cavaco Silva, prosseguida e aprofundada pelos governos PS
de António Guterres, cuja «paixão pela educação»
feneceu rapidamente. A crise agudizou-se com a formação do Governo
da direita, após as eleições de 2002, registando um dos
pontos altos na tentativa de imposição de uma nova Lei de Bases.
Esta proposta de Lei constituiria um enorme retrocesso no direito à educação,
se fosse retomada nos seus princípios mais gravosos.
Para o PCP um projecto de desenvolvimento credível e sustentado para
o país deve assentar, numa época em que se desenvolvem novas tecnologias
(num quadro de envelhecimento da população e de uma acentuada
quebra demográfica), numa época em que se desenvolvem e expandem
novas tecnologias, sobretudo no desenvolvimento e enriquecimento do ser humano,
apostando na educação e na formação. Ao invés,
os sucessivos Governos apostaram sobretudo num sistema educativo ao serviço
dos interesses do grande capital, num quadro mais geral de abandono do princípio
básico e constitucional da subordinação do poder económico
ao poder político.
É o próprio Conselho Nacional de Educação, que
no seu parecer sobre a proposta de lei de Bases do Governo PSD/CDS-PP, afirmou
que “Importa que o poder político (...) veja a educação
como um factor estrutural ao desenvolvimento do país e à valorização
dos portugueses”.
A ofensiva de direita nesta área pode caracterizar-se, no fundamental,
pela não aplicação ou desrespeito de um conjunto significativo
de postulados da Lei de Bases do Sistema Educativo. O Conselho Nacional de Educação
foi ignorado de forma sistemática, não sendo considerados os respectivos
pareceres elaborados ao longo de mais de 15 anos, apesar da expressiva representatividade
deste órgão.
Por um lado afirma-se que o Estado não pode ser omnipresente, que não
tem meios financeiros para resolver todos os problemas e depois impõe-se
legislação e um conjunto de medidas avulsas, cuja matriz neoliberal
não engana nos seus objectivos essenciais. Financiar o ensino privado
à custa dos dinheiros públicos e criar mão-de-obra barata,
para desta forma ajudar a aumentar os lucros privados, não se inibindo
de trocar a nossa soberania por compromissos internacionais, como se prepara
para fazer ao nível do ensino superior.
A tentativa de substituir o ensino público pelo ensino em escolas privadas,
financiadas pelo Estado tem constituído a principal linha privatizadora
da educação e não pode deixar de ser vivamente combatida.
A iniciativa privada mantém o direito de se constituir como alternativa
para os cidadãos que por ela, de livre vontade, queiram optar, não
podendo, no entanto, ser potenciada pelo constrangimento da rede pública.
Para o PCP, o direito à educação e ao ensino é
o direito de todos e de cada um ao conhecimento e à criatividade, ao
pleno e harmonioso desenvolvimento das suas potencialidades, vocações
e consciência cívica. Direito este que deve ser assegurado por
uma política que igualmente assuma a educação, a ciência
e a cultura como vectores estratégicos para o desenvolvimento integrado
do nosso país; que atenda à multiplicidade dos processos educativos
e formativos contemporâneos e às dimensões que estes necessitam
de dar resposta, desde a competência profissional e a qualificação,
à cultura humanista e científico-técnica, à inovação
e à criação.
O atraso escandaloso no processo da colocação de professores,
da responsabilidade do Governo PSD/CDS-PP, comprometendo o ano lectivo e causando
prejuízos irreparáveis para o percurso educativo de milhares de
estudantes, bem como graves perturbações sociais e profissionais
aos professores e aos pais, tende a descredibilizar o ensino público
e a facilitar linhas de ofensiva ideológica favoráveis ao ensino
privado. O PCP exige, desde a primeira hora, a resolução deste
problema, com respeito pelos direitos laborais dos professores, bem como a garantia
da igualdade de todos os estudantes, nos momentos de avaliação.
Portugal tem a mais baixa taxa de licenciados da União Europeia, forma
anualmente poucos licenciados e mesmo uma parte destes não está
consonante com as necessidades do desenvolvimento económico, social e
cultural do País, uma vez que as qualificações prioritárias
actualmente para um melhor desenvolvimento são as que têm menores
saídas de licenciados e muitas vezes não correspondem às
reais aspirações dos jovens. O Estado Português deve responsabilizar-se
por um ensino superior diversificado que preserve as nossas especificidades
culturais, que contemple o nível de desenvolvimento do sistema de ensino
e que rompa com opções do grande capital de desintegração
sócio-económica e de uniformização do ensino superior
no âmbito da União Europeia.
Os últimos governos, do PS e da direita, têm introduzido alterações
nas principais leis do nosso sistema de Ensino Superior, como o Regime de Acesso
(1998), Lei de Financiamento (1997 e 2003), a Lei de Ordenamento e Organização
do Ensino Superior e o Regime Jurídico de Ensino Superior (2000 e 2003).
Nesta legislatura a maioria de direita pretende aprovar na Assembleia da Republica
uma nova Lei de Autonomia do Ensino Superior e uma nova Lei de Bases da Educação,
entretanto vetada pelo Presidente da República.
O investimento muito aquém das necessidades do ensino superior público
e a fixação de numeri clausi nos respectivos cursos, mais a liberalização
das condições legais de acesso ao ensino superior privado determinaram
o rápido crescimento de “oferta” deste. A transformação
deu-se sobretudo no curto período de cinco anos, de 1988-1993. Simultaneamente,
o Estado não tem assegurado os seus deveres de fiscalização
a que está obrigado pela Constituição, não garantindo
assim a qualidade do ensino das instituições privadas.
Continua em marcha uma política recorrente de debilitação
do ensino superior público e de promoção de condições
facilitadoras (e até de privilégio ao ensino superior privado)
e de privação do direito universal de acesso a esse grau de ensino
a todos os que demonstrem capacidade para a sua frequência. As “reformas”
em curso têm procurado claramente abrir caminho ao cumprimento das grandes
linhas de orientação neoliberal: desregulamentação,
privatização, abertura de “mercado” a “operadores”
de “serviços” de ensino incluindo “franchising”,
mercantilização, transnacionalização, etc.
A designada “Constituição Europeia” comporta igualmente
um perigo para a educação e o ensino no nosso País e para
a diversidade e riqueza dos sistemas europeus ao incluir a Educação
entre as áreas em que à União é permitido tomar,
por maioria, decisões sobre acções de apoio, sem que os
estados membros possam exercer direito de veto. Além de ser uma ameaça
de uniformização dos sistemas nacionais, significará que,
a valer o texto proposto, em futuras negociações no âmbito
do Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (GATS), a liberalização
de “serviços públicos”, incluindo a educação
em toda a União ficará à mercê da decisão
de maiorias de Estados membros, ameaçando a soberania de cada um dos
Estados.
Existe na sociedade portuguesa um forte sentimento de cepticismo e de preocupação,
face ao estado actual da educação, que os recentes episódios
relativos à abertura do ano lectivo vieram agravar. Mas existe também,
paralelamente, uma participação crescente de professores, pais,
estudantes e trabalhadores não docentes. Só é possível
inverter a situação, se a frustração e a descrença,
derem lugar à intervenção determinada e consciente para
alterar a situação caótica que se vive nesta área
em Portugal.
O Encontro Nacional do PCP tem também como objectivo a consciencialização
de todo o Partido sobre a importância estrutural e transversal da educação
e é um contributo para que os comunistas, onde quer que estejam, possam
intervir mobilizando a sociedade portuguesa em torno do objectivo de colocar
a educação ao serviço do desenvolvimento do país
e dos portugueses.
É determinante para o êxito da intervenção do Partido,
articular de forma eficaz o trabalho político e reivindicativo de massas,
com a nossa intervenção institucional e o esclarecimento e afirmação
das nossas propostas. Este é o caminho para reforçar a ligação
do Partido com a sociedade e desta forma aumentar o número daqueles que
estão com as nossas propostas e estão disponíveis, connosco,
a lutar por elas.
II
A ESCOLA PÚBLICA, GRATUITA E DE QUALIDADE: ELEMENTO CENTRAL PARA A DEMOCRATIZAÇÃO
DA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DA ALTERNATIVA DE ESQUERDA PARA DESENVOLVIMENTO
O PAÍS
1. Articulação entre níveis de ensino e sucesso
escolar
A articulação entre os diversos níveis do sistema de ensino
é condição essencial para a qualidade da formação
e para o sucesso escolar, nomeadamente para se alcançar uma elevada taxa
de permanência e de sucesso na escolaridade obrigatória.
No plano curricular e pedagógico é urgente que as reformas a
serem realizadas tenham em conta a necessária continuidade do percurso
educativo dos estudantes, dando especial atenção aos anos de transição
entre ciclos, nomeadamente no 5º, 7º e 10º anos e no 1º
do ensino superior, bem como o desenvolvimento de currículos e programas
nacionais com garantias e margens de autonomia das escolas para consideração
das realidades das respectivas comunidades. É fundamental que qualquer
reforma seja antecedida de uma avaliação dos processos anteriores
e seja participada pelos seus intervenientes.
Na prossecução de objectivos como a elevação das
taxas de sucesso escolar e educativo ou a elevação do nível
de escolaridade dos portugueses e contribuindo para uma melhor preparação
para a vida activa, o PCP considera muito importante que se coordenem e articulem
os diferentes níveis e graus de ensino e educação (da Educação
Pré-Escolar ao Ensino Secundário e, no Ensino Básico, dentro
de cada ciclo de escolaridade), que se alargue a rede pública de Educação
Pré-Escolar garantindo a frequência por parte de todas as crianças
de 5 anos e a generalização do acesso e frequência nos restante
grupos etários. Já no ensino superior, a eliminação
do numeri clausi no acesso aos diferentes cursos é um objectivo de sempre,
assumido pelo PCP.
O PCP defende uma profunda remodelação do Ensino Superior. Nesse
quadro, considera de grande importância o combate que urge desenvolver
para superar as elevadíssimas taxas de insucesso e abandono que, em alguns
casos, se aproxima dos 50%. Esta situação é prejudicial
para o país e traduz-se num desperdício de meios e recursos importantes
e qualificados. Este é um combate que não tem lugar apenas no
ensino superior e para ser ganho exige profundas alterações na
actual política educativa, de forma a ter consequências positivas
em todos os graus de ensino. Portugal é o país da U.E. com as
taxas mais elevadas de abandono e insucesso escolar, não podendo, por
isso, ser adiada a aprovação de medidas adequadas que as reduzam
significativamente, objectivo ainda mais pertinente com o pretendido aumento
da escolaridade obrigatória para 12 anos, objectivo esse que o PCP foi
o primeiro partido a propor.
O desenvolvimento do sistema de avaliação dos estudantes, no
sentido de o tornar um instrumento pedagógico na monitorização
de dificuldades e insuficiências das aprendizagens, com o objectivo da
sua superação, é também fundamental para a concretização
do objectivo de aumentar o sucesso educativo.
É indispensável que o Governo assuma um real investimento na
rede pública de estabelecimentos de ensino de forma a garantir a resposta
adequada às necessidades efectivas das populações, a criar
condições de estabilidade ao corpo docente, a criar incentivos
à fixação de professores e educadores em zonas desfavorecidas,
a criar e/ou alargar os serviços especializados de orientação
psicopedagógica e vocacional e de serviço social. São também
indispensáveis o reforço e a diversificação dos
apoios, a criação de condições para a diferenciação
pedagógica e a redução do número de estudantes por
turma e do número de turmas e de níveis por professor em várias
disciplinas.
2. Autonomia e Gestão Escolar
Os últimos anos foram marcados por sucessivos ataques aos princípios
da colegialidade e da eleição dos órgãos de gestão
dos estabelecimentos de ensino, dos quais é exemplo mais flagrante a
proposta de Lei de Bases da Educação aprovada pela maioria de
direita na Assembleia da República e vetada pelo Presidente da República.
A ofensiva contra a gestão democrática das escolas tem-se acentuado
sempre que os Governos pretendem introduzir na escola as designadas dinâmicas
de empresarialização. A concretização desse objectivo
da direita seria um primeiro mas, eventualmente, decisivo passo no sentido da
privatização. Esta ofensiva tem vindo a ganhar contornos mais
acentuados ao longo da última década, com a actual maioria PSD/CDS-PP
a não disfarçar sequer a intenção de acabar com
qualquer laivo de gestão democrática, estabelecendo uma direcção
e administração de carreira, entregue a um gestor nomeado que
fará prevalecer os interesses economicistas e burocráticos, desvalorizando
o primado do pedagógico na vida dos estabelecimentos de educação
e ensino. Esta situação agrava-se ainda mais devido à crescente
falta de participação nas várias entidades que constituem
a comunidade escolar, principalmente a nível dos encarregados de educação
e dos próprios estudantes.
Aspecto fundamental para a concretização do modelo de gestão
pretendido pelo Governo e pela sua maioria é a constituição
de grandes unidades orgânicas que justifiquem a existência de um
gestor de carreira. Nesse sentido, a opção foi a de constituir
mega-agrupamentos, tendo, por essa razão, no último ano, ocorrido
uma alteração que importa sublinhar e se prende com a constituição
de agrupamentos verticais de escolas, em muitos casos impostos pelo Governo,
através das suas Direcções Regionais de Educação,
à revelia da legislação em vigor, contrariando pareceres
das escolas, das autarquias e das associações de pais e os interesses
das próprias populações.
No que respeita ao ensino secundário é também clara a
intenção de integrar as escolas secundárias em agrupamentos
de escola, criando assim superestruturas orgânicas, com vários
estabelecimentos de ensino e um número alargado de estudantes, tornando
a gestão cada vez mais distante de cada uma das escolas, do seu projecto
educativo e das necessidades pedagógicas aí sentidas.
Na direcção destes mega agrupamentos de escolas o Governo pretende
ter gestores de carreira, por si designados, numa lógica de empresarialização
/ privatização da educação – à semelhança
do que se tem vindo a assistir na área da saúde, nomeadamente
na gestão dos hospitais, com as nefastas consequências que daí
resultariam.
“No ensino superior, a proposta de Lei de Autonomia da maioria de direita
e o projecto similar do PS, substituem o carácter democrático
e autónomo da gestão das instituições, (com participação
colegial de todos os intervenientes na vida escolar e paritária entre
professores e estudantes), e o primado da pedagogia e competência científica,
pela intromissão do poder económico nas decisões centrais
de gestão (pedagógicas, científicas ou administrativas).
É imperioso defender o princípio constitucional da gestão
democrática, segundo o qual os órgãos directivos devem
legitimar-se democraticamente, de forma a acolher o pluralismo de interesses
e opções dos elementos constituintes da comunidade escolar e garantir
a autonomia dos estabelecimentos de ensino.
3. Financiamento e acção social escolar
O Ensino é um bem público, corresponde a uma necessidade de qualificação
geradora de maiores níveis de desenvolvimento e bem-estar social. E,
por isso, o Estado enquanto garante da prossecução desses fins
e do direito básico à Educação, é responsável
pela sua existência, não se resignando a que ela possa também
ser – como já o é – uma área de negócio,
em que os saberes e os diplomas se compram e vendem num “mercado da educação”.
O Estado não pode adoptar a atitude dos que a encaram como benefício
privado, privilégio de quem a ela acede ou, simplesmente, pode comprar.
De acordo com a Constituição da República, sendo Portugal
um Estado de direito democrático, compete ao Estado estabelecer progressivamente
a gratuitidade de todos os graus de ensino, assegurando deste modo o acesso
do povo à cultura e ao conhecimento, condição fundamental
para a existência de uma democracia consciente e consequente.
As políticas de financiamento para a Educação têm-se
vindo a afastar da garantia constitucional de um ensino tendencialmente gratuito.
Não só se estrangula financeiramente o funcionamento das escolas
– com particulares reflexos na instabilidade do corpo docente, na degradação
das condições materiais e humanas e na degradação
da qualidade de ensino e aprendizagem – como se transfere para os estudantes
e suas famílias, parte significativa dos custos do funcionamento do sistema
de ensino.
A lógica do utilizador-pagador, que ignora as profundas injustiças
na distribuição da riqueza e no sistema fiscal vigente, agrava
a elitização do ensino e compromete a recuperação
de anos de atraso estrutural do nosso país na qualificação
da sua população.
No entanto a situação difere entre os vários níveis
de ensino. De uma forma geral, o investimento (e não a despesa) na educação
continua muito aquém das necessidades educativas do país. A ausência
de uma lei que enquadre o financiamento do ensino básico e secundário,
a transferência para as autarquias locais de um conjunto de competências
sem a correspondente entrega de meios financeiros tem proporcionado uma assinalável
degradação do parque escolar, encerramento de escolas, instabilidade
do corpo docente, falta de equipamentos básicos – salas de aula,
aquecimento, laboratórios, pavilhões desportivos bibliotecas,
computadores, instrumentos musicais –, manutenção de um
elevado número de estudantes por turma, insuficiências nos transportes
escolares, custos insuportáveis com manuais e material escolar, etc.
Sem prejuízo da existência de outras fontes de financiamento,
o funcionamento das escolas públicas deve depender, essencialmente, de
financiamento público proveniente do Orçamento de Estado. A existência
de propinas ou de qualquer tipo de taxas ou emolumentos será sempre uma
tributação dupla imposta às famílias, pelo que deverão
ser abolidas.
No plano do ensino artístico, o financiamento deve ser reforçado
tendo em vista a gratuitidade do acesso, desde o nível básico
ao superior, a criação de uma rede pública de escolas do
ensino artístico especializado, actualmente assegurado quase na totalidade
por escolas do ensino particular e cooperativo, e a sua efectiva democratização.
No plano do Ensino Superior, a prática de propinas tem servido para
reduzir o financiamento pelo Estado, ao contrário do que foi invocado
aquando da sua introdução. O valor que representam está
muito aquém do que seria recuperado com um sistema fiscal socialmente
justo e com o combate eficaz à fuga e fraude fiscal.
As propinas contrariam a disposição constitucional que afirma
a progressiva gratuitidade de todos os graus de ensino. A sua existência
é socialmente injusta, contribui para aumentar a desigualdade de oportunidades
e constitui um sério obstáculo ao necessário aumento da
taxa de frequência e ao sucesso no Ensino Superior.
A intenção de introduzir o recurso ao cheque-ensino ou empréstimos,
vem hipotecar o futuro dos estudantes, ameaçando ainda mais a sustentabilidade
da vida profissional.
As diferentes condições económicas dos estudantes devem
ser motivo para discriminações positivas ao nível da acção
social escolar que cubra o conjunto das despesas com a frequência escolar
no ensino público.
Não é o sistema educativo que corrige por si só as profundas
desigualdades e injustiças a que assistimos no nosso país, nem
tão pouco existe modelo de acção social escolar capaz de
desempenhar este papel. Cabe no entanto ao Estado criar as condições
mínimas para que, independentemente da origem sócio-económica
do estudante e do nível de ensino em que se encontram, os estudantes
possam realizar normalmente o seu percurso escolar até tão longe
quanto o desejem.
A realidade é que, em Portugal, existe um modelo de Acção
Social Escolar que não corrige as assimetrias económico-sociais
existentes e não promove a igualdade de oportunidades. Não consegue
eliminar as barreiras que se levantam a milhares de estudantes em todo o país
e tem uma base distributiva assente num sistema perfeitamente obsoleto, desadequado
face às exigências, e padece da mesma atrofia orçamental
que atinge o restante sistema.
4. Educação pré-escolar
A Educação pré-escolar conseguiu, sobretudo a partir do
final dos anos 90, uma significativa visibilidade resultante de uma crescente
tomada de consciência colectiva sobre o importante contributo que esta
dá ao nível do desenvolvimento integral do indivíduo e
como primeira etapa de uma Educação Básica, essencial para
que cada cidadão possa enfrentar com maior igualdade de oportunidades
os desafios do presente e aqueles que o futuro irá colocar.
O facto de na maioria dos países europeus a Educação pré-escolar
atingir taxas de frequência muito superiores às do nosso país
(alguns deles com uma cobertura próxima dos 100% para as crianças
de 5 anos), obrigou o governo PS a defini-la no seu Programa (1995-99) como
uma das suas Opções Estratégicas enunciando a Educação
pré-escolar e o Ensino Básico como alicerces fundamentais da qualidade
em educação.
Com a publicação da Lei Quadro da Educação Pré-Escolar
(Lei n.º 5/97), o Governo iniciou um processo de profundas alterações
legislativas neste sector do Sistema Educativo ao mesmo tempo que lançava
o Programa de Expansão e Desenvolvimento da Educação Pré-Escolar.
Sendo certo que durante o período de governação PS a rede
pública registou algum crescimento, ficou contudo muito aquém
dos objectivos traçados e principalmente das necessidades.
O carácter globalmente positivo desta lei teve o insubstituível
contributo do PCP no âmbito da Comissão de Educação
da Assembleia da República. Um dos aspectos mais inovadores da Lei Quadro
resulta mesmo de uma alteração proposta pelo PCP no sentido de
assegurar a gratuitidade da componente educativa, quer na rede pública
quer na rede privada.
A aplicação desta medida é justa e necessária num
contexto em que a rede pública ainda não assegura uma cobertura
total, mas deve revestir-se de carácter transitório, como medida
de apoio às famílias que têm os seus filhos a frequentar
o ensino privado, por falta de vagas no público. No entanto esta medida
tem sido usada, quer pelos governos PS, quer PSD/PP para estagnar o crescimento
da rede pública ao mesmo tempo que justifica o acréscimo do financiamento
da rede privada
Até à saída da Lei Quadro e do DL 147/97, só as
IPSS e o ensino privado asseguravam a realização da componente
sócio-educativa. Ou seja, apenas nestas (e nalguns estabelecimentos públicos
por iniciativa local, pais ou outros) existiam serviço de refeições
e complemento de horário, antes e após as actividades pedagógicas/componente
educativa e nos períodos de interrupção lectiva, consoante
as solicitações das famílias. Convém referir, no
entanto, que as IPSS por questões de sobrevivência e os privados
pelo lucro aplicam critérios de selecção e preços
que estão longe de permitir o acesso à educação
pré-escolar a todas as crianças que a procuram.
Correspondendo a uma necessidade social incontestável, o governo PS
legislou no sentido de que este tipo de resposta fosse também assegurado
na rede pública de educação pré-escolar. Parecendo
uma medida de grande alcance social, e por isso mesmo muito positiva, é
na implementação da mesma que os escolhos são mais que
muitos.
A definição pouco clara de um quadro legislativo que sustentasse
a intervenção das autarquias, as dificuldades de planeamento dessa
mesma intervenção resultantes quer da insuficiência, quer
da precariedade dos processos de financiamento definidos anualmente através
de Acordos de Colaboração (correndo mesmo o risco de assumirem
compromissos que poderiam não ter condições de cumprir),
a dificuldade na contratação de pessoal por falta de suporte legal,
e muitas outras razões, levaram um numero significativo de autarquias
a não avançar ou a avançar com muita cautela na concretização
desta componente.
Com a publicação do Decreto-lei 147/97 de 11 Junho, relativo
ao ordenamento jurídico do desenvolvimento e expansão da rede
nacional de educação pré-escolar e definição
do respectivo sistema de organização e financiamento, o Governo
introduz um novo conceito – a Rede Nacional de Educação
Pré-Escolar – na qual inclui em pé de igualdade as redes
pública e privada, o que não havia conseguido aquando da discussão
da Lei Quadro na Assembleia da República, nomeadamente por oposição
do PCP.
Com este passe de mágica, o Governo PS subverteu o determinado pela
Constituição, pela Lei de Bases do Sistema Educativo e pela própria
Lei Quadro relativamente ao papel estratégico do Estado de assumir o
compromisso de criar uma rede pública de educação pré-escolar
que garantisse a universalidade da oferta, constituindo-se, à posteriori,
as restantes redes (solidária e privada) como alternativas nas opções
a serem feitas pelas famílias.
Pode assim afirmar-se que a Rede Nacional de Educação Pré
– Escolar do Governo PS serviu de tubo de ensaio para as profundas alterações
que o Governo PSD/CDS-PP procura implementar em todo o sistema educativo, nomeadamente
através da sua proposta de Lei de Bases da Educação. Ao
tentar criar uma “rede de estabelecimentos de serviço público
de educação e de ensino”, que mais não é do
que uma rede nacional e única de ensino público e privado, o Governo
PSD/CDS-PP estará a violar a Constituição da República
Portuguesa que claramente prevê a criação de “uma
rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades
de toda a população”.
No final do mandato do Governo PS e com os Governos PSD/CDS-PP este sector
educativo, para além de lhe ser aplicado um calendário escolar
específico, reforçador de uma componente assistencialista e vivamente
contestado pelos educadores de infância, sofreu uma forte retracção
no processo de expansão que vinha tendo desde a publicação
da Lei Quadro da Educação Pré-Escolar, deixando por cumprir
o papel estratégico do Estado na criação de uma rede pública
que garanta a universalidade da oferta.
Com a Lei de Bases da Educação, vetada pelo Presidente da República,
a Educação pré-escolar viu ameaçado o seu carácter
público e gratuito e o seu objectivo de generalizar esta resposta a todas
as crianças dos 3 aos 5 anos, passando o Estado a assumir, apenas, que
a iria promover prioritariamente para as crianças de 5 anos. Ainda neste
âmbito o texto defendido pela maioria de direita transformaria a educação
pré-escolar em assistência materno-infantil, negligenciando o seu
carácter educativo e ignorando a obrigação constitucional
de criar e desenvolver um sistema público de educação pré-escolar,
capaz de responder às necessidades da população.
5. Ensino Básico
A importância do alargamento da escolaridade obrigatória para
12 anos não pode fazer esquecer a necessidade de efectivar todas as acções
indispensáveis ao cumprimento da actual escolaridade obrigatória
de 9 anos, tendo em conta que os níveis de abandono precoce e de insucesso
são ainda muito preocupantes.
A estrutura organizativa da educação básica deve conceber
a educação pré-escolar como sua primeira etapa da educação
básica, em articulação com o 1º ciclo do ensino básico.
O 1º ciclo, de 4 anos deve ser assegurado por um trabalho em equipa educativa
que inclua, entre outros, docentes com habilitação para as áreas
artísticas. O 2º ciclo, de 2 anos, deve ser assegurado por professores
por áreas disciplinares. E ainda um 3º ciclo, de 3 anos, de consolidação
de saberes e competências, através de um plano curricular unificado
que integre componentes de formação técnica, tecnológica
e artística, assegurado por um regime de professor por disciplina ou
grupo de disciplinas. Neste último ciclo do ensino básico devem
realizar-se acções de orientação escolar e profissional,
com vista a um conhecimento adequado das opções posteriores de
formação e de inserção na vida activa, por forma
a que ninguém entre no mercado de trabalho enquanto não tiver
formação adequada numa área específica.
De igual modo, o Estado deve assumir plenamente a importância do ensino
artístico, de forma coerente e estruturada formalmente, desde o 1º
ano, dotando todas as escolas da rede pública dos meios humanos e materiais
necessários à sua concretização, quer no ensino
regular, quer no especializado.
Desde o 1º ano do Ensino Básico o Estado deve assumir plenamente
a importância das tecnologias de informação e comunicação,
dotando todas as escolas da rede pública com os meios materiais e humanos
necessários à sua aplicação.
O 1º Ciclo do Ensino Básico é dos três ciclos que
constituem o Ensino Básico o que se encontra em situação
mais desfavorecida no que concerne aos recursos que lhe são atribuídos
para o cabal desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem.
A política educativa prosseguida ao longo de décadas reduziu
a uma expressão ínfima o investimento neste sector fulcral do
sistema de ensino português. Na grande maioria das escolas do 1º
Ciclo do ensino básico é nítida a penúria de equipamentos
educativos, tais como a falta de instalações diversificadas para
a concretização de actividades educativas específicas,
de espaços de apoio devidamente qualificados (bibliotecas, salas de trabalho
para reuniões, recreios devidamente protegidos e vigiados, refeitórios,
etc.) e a enorme carência de recursos materiais. Acresce a tudo isto a
falta de pessoal auxiliar e administrativo com implicações preponderantes
nas condições de higiene e segurança das escolas. Sem a
intervenção do Poder Local, principalmente das Câmaras CDU,
o parque escolar estaria muito mais degradado, apesar não ter contado
com as devidas contrapartidas financeiras do Poder Central.
Com o Decreto-Lei 115A/98 – Regime de Autonomia e Gestão das Escolas
e apesar de este ter como objectivos nomeadamente: salvaguardar a identidade
própria das escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico, “superar
situações de isolamento, reforçar a capacidade pedagógica”
tal não se verifica, visto este modelo assentar numa matriz que inviabiliza
tais objectivos bem como num lógica administrativa e economicista que
não se faz acompanhar da afectação dos recursos mínimos
necessários às escolas, nem as dotou sequer de orçamento
próprio.
A esta extrema falta de condições alia-se o inadequado dimensionamento
das escolas e dos quadros de escola, a instabilidade do corpo docente, o isolamento
pessoal e profissional dos docentes, a falta de apoio aos alunos – nomeadamente
a quase inexistência de refeitórios, de serviços de psicologia
e orientação e o deficiente funcionamento da Educação
Especial, a que acresce uma precária política de Acção
Social Escolar.
É pois urgente e inadiável a dignificação do 1º
Ciclo do Ensino Básico enquanto suporte fundamental de aprendizagens
futuras.
No que se refere à reorganização curricular do Ensino Básico,
feita sem qualquer avaliação, mantém-se a falta de articulação
entre áreas e ciclos. A excessiva carga horária dos alunos resultante
da ausência de interdisciplinaridade e da descoordenação
dos curricula, aliada ao elevado número de alunos por turma, prejudicam
a concretização do projecto curricular de turma em algumas disciplinas.
6. Ensino Secundário
Os modelos organizacionais e curriculares que têm servido de base aos
cursos gerais e tecnológicos do ensino secundário, não
dão resposta às necessidades actuais da formação
dos jovens e constituem factores de insucesso. Aprofunda-se a divisão
e estratificação de saberes, a excessiva valorização
dos conhecimentos abstractos, a ausência de qualquer interdisciplinaridade
nos diversos saberes e áreas e a total subordinação aos
exames nacionais, dos ritmos, práticas pedagógicas e aprendizagens,
com graves distorções nos resultados comparativos entre o público
e o privado. Acresce-se a esta situação a existência de
provas eliminatórias no sistema de avaliação das aprendizagens
(exames do 9º ano em Português e Matemática), que vai acentuar
os requisitos de selecção já existentes para o ensino secundário.
O Ensino Secundário deve ter como prioridade preparar o indivíduo
para assumir a sua própria formação permanente, o que define
a sua finalidade essencial. Na sua articulação com o Ensino Superior
não deve ser concebido exclusivamente como propedêutico para este
último e deve constituir-se como um ciclo terminal de estudos. Deve ter
em vista os jovens que terminam a sua escolaridade e a sua preparação
para uma entrada imediata na vida activa, organizando-se num só ciclo
de 3 anos com vias diferenciadas, contemplando a oferta de cursos tecnológicos,
profissionais ou orientados para o ingresso no ensino superior. Estas diferentes
vias devem ter igual dignidade e qualidade, o que implica serem acauteladas
as condições necessárias para uma efectiva permeabilidade
dos diversos percursos escolares neste nível de ensino. Só assim
poderá haver a garantia de que todos os estudantes, ao terminarem o Secundário,
estarão preparados, também, para prosseguir os seus estudos.
O ensino secundário deve caracterizar-se por ser um “ensino activo”
através da utilização sistemática de práticas
de ensino experimental (em escolas apetrechadas para tal, com um corpo docente
preparado e pessoal auxiliar especializado), com o recurso à observação
e à demonstração, tendo em vista um saber cada vez mais
aprofundado, assente no estudo e na reflexão crítica, bem como
a aquisição de conhecimentos relevantes social e profissionalmente.
O parque escolar não corresponde aos requisitos de uma escola de sucesso,
com escolas provisórias há mais de 30 anos, falta de laboratórios
e instalações desportivas, o que exige medidas urgentes para a
sua resolução.
Os rankings de escolas promovidos pelo Ministério da Educação
consideram todas escolas num plano de igualdade, sem atender à às
especificidades sociais e económicas de cada uma. São exactamente
essas especificidades que determinam o sucesso das respectivas populações
escolares.
A revisão curricular no Ensino Secundário
Entra em vigor no actual ano lectivo a Revisão Curricular no Ensino
Secundário, após um ano em que se iniciaram os novos programas
no 10º ano (na maioria das disciplinas), mantendo-se a estrutura curricular
anterior.
Esta solução “original” criou uma situação
de instabilidade, descoordenação e perturbação,
pela necessidade de cumprir estes programas com cargas lectivas desajustadas,
e com soluções de “remedeio”, prejudiciais às
aprendizagens e ao funcionamento quotidiano das escolas, que visam, no essencial,
o desinvestimento no sector.
Tem sido sucessivamente afirmada, quer por parte dos professores quer pelo
M. E., a necessidade de uma maior ligação entre o Ensino Básico
e o Ensino Secundário, mas não se preconizam as medidas que permitiriam
concretizar este objectivo. Pelo contrário, note-se que a reforma no
Ensino Básico no 7º Ano de escolaridade se aplicou em 2002/03; a
Revisão Curricular no Ensino Secundário em 2004/05 significa que
a mesma se inicia sem a primeira estar concluída, sem um balanço
real da situação, sem uma sequência lógica entre
os dois ciclos de estudo.
Esta revisão prevê a diversidade de ofertas de formação,
umas visando a continuação de estudos a um nível superior,
outras a inserção no mundo do trabalho. Esta diversidade não
pode traduzir-se numa discriminação assente em razões de
ordem económica e social, devendo ser tomadas medidas que o evitem e
é indispensável, desde já, definir as condições
que permitam a todo o estudante assumir responsavelmente uma escolha vocacional
e de aptidão em igualdade de acesso e oportunidade de prosseguimento
de estudos.
A Revisão Curricular vai iniciar-se sem estarem definidas as condições
de permeabilidade entre os diferentes percursos; sabe-se como é difícil
(ou mesmo impossível) a um jovem de 14/15 anos ter certezas quanto às
suas escolhas e ao seu futuro, pelo que deve ser acautelada a possibilidade
de refazer esse percurso, sem atrasos desnecessários ou mesmo prejuízos
decorrentes de eventuais repetições de ano de escolaridade, que
são geradores de ansiedade e dificuldades para os estudantes e suas famílias.
Os estudantes que agora iniciam o 10º ano desconhecem as condições
que lhes serão exigidas para o acesso ao Ensino Superior, quando terminarem
o secundário. Nesta Revisão Curricular há uma diminuição
das disciplinas específicas e as disciplinas estruturantes deixam de
ser obrigatórias. No ensino artístico especializado, a possibilidade
de ingresso em qualquer dos ciclos deve ser assegurada, salvaguardando as especificidades
de cada área.
Constata-se uma falta de clareza e de clarificação, em simultâneo
com alguma contradição entre o enunciado teórico e as medidas
concretas apresentadas. Embora haja uma oferta de formação diferenciada,
conduz a uma especialização precoce e excessiva, que pode ser
bastante negativa. O Curso de Línguas e Literaturas é um dos exemplos
aberrantes do que se disse anteriormente a propósito das disciplinas
estruturantes. Um aluno pode concluir este curso sem ter frequentado a disciplina
de literatura portuguesa, que deveria ser de estudo obrigatório para
as outras áreas.
Não estão clarificados quais os critérios que presidiram
à selecção dos cursos para as escolas, nomeadamente nos
cursos tecnológicos. Não houve preocupação com as
necessidades reais de desenvolvimento do país, nem com os recursos materiais
e humanos deixando até ao abandono e à degradação
tais recursos materiais existentes nas escolas públicas.
No que diz respeito aos cursos tecnológicos, saliente-se a importância
que os estágios aí assumem. No entanto, e para que esta disposição
possa ser levada a bom termo, é fundamental que o Estado estabeleça
protocolos com as empresas, fornecendo-lhes incentivos que garantam a exequibilidade
dos estágios, de forma a não estarem dependentes de boas vontades,
ou, no oposto, a questões de compadrio, nem gerando a exploração
do trabalho do estagiário.
A reforma curricular do ensino secundário reproduz a estratificação
social do país. Com esta revisão curricular pretende-se elitizar
o ensino secundário, criando mais barreiras à sua conclusão.
A pluralidade de saídas, impraticável em cada escola, pode levar,
no melhor dos casos, à deslocação dos estudantes para escolas
longe do seu local de residência, aumentando os custos de frequência.
Estes custos elevados e esta deslocação conduzirão, certamente,
a um aumento do abandono e do insucesso escolar, permitindo, por outro lado,
a proliferação de escolas privadas que respondam a estas necessidades
a que o ensino público passará a não responder. Ao mesmo
tempo criam-se escolas de primeira e de segunda, tal como durante o fascismo,
separando claramente o prosseguimento dos estudos do encaminhamento para o mundo
do trabalho.
Numa sociedade dominada pelas tecnologias de informação e comunicação,
num mundo em aceleradas mudanças, também tecnológicas,
é fundamental que a Escola forneça a todos os estudantes estas
ferramentas mínimas, possibilitadoras de melhor apreensão e compreensão
do que nos rodeia. No entanto estas competências deveriam ser adquiridas
mais precocemente (no Ensino Básico), cabendo ao Secundário um
aprofundamento destas matérias.
7. Ensino profissional
Em relação aos cursos profissionais, as respostas de oferta têm
sido, até aqui, maioritariamente, ou quase exclusivamente, da iniciativa
privada, através das escolas profissionais. Tal facto deve-se à
sistemática demissão e desresponsabilização dos
sucessivos governos em relação a este tipo de ensino. O que é
certo é que o subsistema do ensino profissional cresceu, consolidou-se
e constituiu-se como uma alternativa de opção e de formação
para muitos milhares de jovens. O número de escolas profissionais públicas
é de cerca de uma dezena, no entanto o universo de escolas profissionais
contempla mais de duas centenas. Este facto é revelador do que tem sido
a opção estratégica dos últimos Governos no que
respeita ao ensino profissional.
Com a entrada em vigor da revisão curricular, os cursos profissionais
de nível secundário tornaram-se, finalmente, uma realidade nas
escolas públicas. No entanto, o número de ofertas é muito
insuficiente e muito aquém da procura, o que veio acrescentar novos e
gravíssimos problemas aos já existentes. Falamos concretamente
das condições de acesso dos jovens aos cursos profissionais e
do direito à educação que está, neste momento, a
ser posto em causa.
Na verdade, a revisão curricular do ensino secundário veio introduzir,
embora em regime de experiência, um novo modelo de financiamento nas escolas
profissionais da região de Lisboa e Vale do Tejo, que mais tarde será
generalizado a todas as escolas profissionais do país. É uma forma
de financiamento indirecto às escolas, com a atribuição
de bolsas de frequência aos alunos com melhores resultados escolares.
Os alunos com mais dificuldades de aprendizagem, não tendo direito a
essa bolsa, têm que suportar os custos de frequência desses cursos,
com o pagamento, muitas vezes, de propinas altíssimas. Aos que não
conseguem pagar, poucas ou nenhumas alternativas restam, senão abandonar
o sistema escolar e serem irremediavelmente atirados para o mercado de trabalho
sem qualquer tipo de qualificação.
As opções políticas assumidas pelo Governo são
bastante claras: o desinvestimento no ensino profissional, a continuidade das
baixas qualificações académicas e profissionais, a continuação
das discriminações sociais, a selectividade e a elitização
do ensino, com fortes e incalculáveis prejuízos para o desenvolvimento
sustentado do país, significando um claro retrocesso em termos sociais,
políticos e ideológicos.
8. Ensino Superior
O Ensino Superior é uma questão nacional e não meramente
individual. Constitucionalmente o ensino público é um direito
universal e tendencialmente gratuito e o ensino de iniciativa privada é
uma liberdade.
O sistema público de ensino superior deve assegurar: a concretização
da democratização do acesso e da fruição de níveis
superiores de instrução e cultura; a garantia de liberdade de
ensino e de aprendizagem; a oferta coerente de ensinos diversificados, relevantes
e de qualidade e que cubram o território nacional; a existência
de grandes infra-estruturas estratégicas e do seu financiamento.
A proporção da população jovem que frequenta o
ensino superior no nosso país é a mais baixa da Europa. Recorde-se
que em 2001, entre a população activa, 63% tinha no máximo
cumprido a escolaridade básica (correspondente a 9 anos), 21% possuía
escolarização secundária (completa ou incompleta) e apenas
11,8% possuía qualificação superior. Ora em média,
nos países da União Europeia, a população activa
com escolarização secundária representa 46% e com qualificações
superiores 24%. A diferença é enorme sendo urgente recuperar o
atraso de Portugal no que se refere à qualificação da sua
população activa, alargando a frequência também do
ensino superior.
O sistema de ensino superior deve ser unificado, eliminando a divisão
legislativa e administrativa ainda hoje existente entre os sistemas universitário
e politécnico, permitindo a criação de um sistema integrado
e diversificado, de ensino superior público, em que as instituições
se distingam pelos objectivos e missões que definem no exercício
da respectiva autonomia.
A Investigação e Desenvolvimento (I&D) é parte integrante
da missão das instituições e do conteúdo funcional
quotidiano dos docentes. A investigação científica deve
estar intimamente ligada com o ensino, de forma que o envolvimento dos docentes
nas duas vertentes da sua actividade seja estimulante e útil, quer para
o seu trabalho, quer para o trabalho dos alunos. A política para o ensino
superior deve considerar explicitamente as actividades de I&D, o seu quadro
legal, os recursos humanos (incluindo quadro de investigadores), físicos
e financeiros requeridos e a avaliação dessas actividades.
A Declaração de Bolonha tem dois objectivos óbvios mas
não declarados: a elitização económica do Ensino
Superior condicionando-o assim aos interesses do grande capital e a privatização
progressiva do ensino superior público.
A fragmentação do ensino superior em ciclos com custos acrescidos
das propinas de cada ciclo possibilitará uma maior coincidência
entre as elites intelectuais e as elites económicas: o acesso ao conhecimento
será, ainda mais, um privilégio dos ricos.
Àqueles cujos escassos recursos económicos não permitirem
a passagem ao segundo ciclo será negada a formação integral
que lhes poderia conferir as capacidades para assumir uma posição
consciente no controlo da economia e, ao mesmo tempo, as capacidades profissionais
para as tarefas do desenvolvimento e da inovação.
Por outro lado, através da estratificação do Ensino Superior
em ciclos pretende-se acelerar o processo da sua privatização.
Com efeito, quanto mais os cursos forem estratificados mais fácil se
tornará a «produção» de tais pacotes pelo sector
privado da educação. A ajudar ao processo está a inviabilização
do ensino superior público por subfinanciamento.
As declarações conjuntas dos ministros da educação
da U E são assim uma verdadeira declaração de guerra ao
ensino superior europeu, a pretexto de «uma optimização
do mesmo, de forma a responder aos desafios da globalização».
A rede pública de Ensino Superior abrange hoje praticamente todas as
regiões do país. Porém, apresenta enormes assimetrias,
distorções e irracionalidades porque a sua expansão mais
recente tem sido usada para satisfazer clientelas partidárias, quer da
direita quer do PS. Na necessária reorganização do conjunto
das instituições públicas de ensino superior, a articulação
em rede deve ser encorajada, seja no plano territorial seja no plano temático.
Isto é, estabelecimentos próximos devem ser encorajados na procura
de complementaridade de objectivos e na partilha de recursos, até numa
óptica de regionalização. Tal como estabelecimentos distantes,
activos em domínios idênticos ou afins, devem ser encorajados a
partilhar objectivos e recursos de interesse comum.
9. Educação Especial
A integração/inclusão na escola das crianças com
necessidades educativas especiais (e, em particular, as que decorrem da presença
de deficiências), representou uma alteração profunda no
nosso sistema educativo e acabou por se tornar um dos principais indicadores
do seu grau de democraticidade. De facto, uma Escola inclusiva só é
viável numa sociedade democrática e supõe sempre uma cultura
onde os princípios do respeito pela diferença e da igualdade de
oportunidades e os direitos gerais de cidadania são plenamente assegurados.
Razões bastantes para concluir que só uma Escola pública,
gratuita e de qualidade pode ser verdadeiramente inclusiva.
É à luz deste pressuposto que se devem analisar as políticas
educativas para esta área, prosseguidas ao longo dos últimos dez
anos. Este é um período que se pode caracterizar, grosso modo,
por um enorme esforço de marcha-atrás, apesar de em 1994 o Estado
Português se assumir como um dos subscritores da Declaração
de Salamanca, que ditou as grandes bases teóricas da Escola Inclusiva
e a própria Lei de Bases do Sistema Educativo, desde 1986, consagrar
os princípios gerais de uma educação integrada.
Contraditoriamente, ao mesmo tempo que assumiam uma tão avançada
declaração de princípios, os Governos PSD, PS e PSD/CDS-PP
enveredaram por uma política de desinvestimento na Escola Pública,
visando inequivocamente o seu enfraquecimento e degradação, tendo
em vista a sua ulterior privatização. Nessa base, são de
assinalar os “efeitos colaterais” na Educação Especial
de uma tal linha de ataque: diversas tentativas de impor drásticas reduções
do número de professores a trabalhar na área dos Apoios Educativos;
desinvestimento na formação especializada de professores para
esta área; cortes substanciais nos recursos financeiros, físicos
e técnico-pedagógicos destinados à Educação
Especial; desinvestimento na adaptação dos espaços, designadamente
na resolução do grave problema das acessibilidades em muitas escolas;
insuficiência do pessoal auxiliar de acção educativa nesta
área e o abusivo (e cada vez mais sistemático) recurso aos chamados
“tarefeiros” para colmatar necessidades permanentes do sistema,
neste domínio.
Com o Governo de Durão Barroso assistimos a uma nova fase no desenvolvimento
deste ataque, que se traduziu na sua proposta de Lei de Bases da Educação
e em dois projectos de diploma com o objectivo explícito de liquidar
as bases da Escola Inclusiva, assumindo como letra morta a Declaração
de Salamanca.
Tal “reforma” que a luta dos professores e das organizações
representativas das pessoas com deficiência, para já, conseguiu
suster, afastaria da Escola Pública mais de cinquenta mil estudantes
com necessidades educativas especiais, que seriam impedidos de aceder ao sistema
de ensino ou que iriam engrossar as fileiras de frequência de instituições
e colégios de educação especial privados, na linha geral
de privatização do sistema educativo. É de prever que o
actual Governo tente prosseguir e aprofundar este caminho: o Programa de Governo
é o mesmo; as políticas gerais estão afinadas pelo mesmo
diapasão de classe e a equipa ministerial do ME tem vindo a ser crescentemente
dominada por agentes do ensino privado. Mas, não é menos verdade
que os professores continuam em condições de derrotar este projecto
de regresso ao passado.
10. Educação e formação de adultos
A sociedade portuguesa caracteriza-se, ainda hoje, por baixos níveis
de escolaridade e de qualificação profissional. Os dados oficiais
do censo de 2001 revelam-nos uma realidade dramática: 31,1% da população
empregada continua a possuir apenas o 1º ciclo do ensino básico
ou ainda menos; 62,6% tem o 3º ciclo ou menos; 11,5% da população
empregada possui o ensino secundário completo; apenas 7,3% têm
uma licenciatura completa.
Esta situação remete-nos para os piores índices no âmbito
dos países da União Europeia. A resposta aos baixos níveis
de escolaridade da nossa população deve assentar numa gama alargada
de oportunidades de aprendizagem, com diferentes ofertas e uma adequada interligação
entre elas de modo a permitir as permutas ou escolhas que melhor correspondam
às necessidades manifestadas.
As últimas medidas do Ministério da Educação (algumas
tomadas ainda no ano lectivo 2002/03), no Ensino Recorrente vão ao arrepio
de qualquer tentativa de alterar positivamente a situação nomeadamente:
o encerramento dos cursos nocturnos, verificado em dezenas de escolas em todo
o País, chegando só na Grande Lisboa ao número de 34 escolas
e atingindo mais de 5000 alunos; o impedimento da matrícula aos jovens
dos 16 aos 18 anos que, por trabalharem, não o podem fazer no ensino
regular; a diminuição da verba no Orçamento de Estado,
para a educação de adultos.
No presente ano lectivo, a reforma do ensino recorrente no secundário
não foi acompanhada das urgentes alterações no 3º
ciclo, onde se mantém o Sistema de Ensino por Unidades Capitalizáveis
(SEUC), o qual se transformou, por ser o único modelo, na principal causa
de insucesso (com taxas acima dos 90%).
Quanto à reforma agora iniciada no secundário não se conhecem
quaisquer medidas que permitam a permeabilidade entre os diferentes sistemas
de ensino, assim como o regime de equivalências face à coexistência
dos diferentes modelos – por unidades capitalizáveis, por módulos,
ensino regular, ensino profissional, sistema de reconhecimento, validação
e certificação de competências (RVCC) e cursos de educação
e formação.
Por outro lado, as alterações nos horários, com 15 unidades
de 90m conduzirão, se não se verificarem adaptações,
a um aumento da carga horária semanal de tal ordem que se torna incomportável
para qualquer estudante que trabalhe, conduzindo ao abandono de algumas, se
não todas, disciplinas, inviabilizando a modalidade presencial.
A existência de diferentes públicos-alvo exige a criação
de soluções que possam ir ao encontro das respectivas necessidades.
Não pode continuar a considerar-se o ensino recorrente como uma segunda
versão adaptada do ensino diurno, centrando as equivalências em
conteúdos e subestimando ou ignorando patamares de competências.
A experiência anterior aponta-nos para a possibilidade de oferta de, pelo
menos, duas opções, independentemente das diferentes estruturas
curriculares: a opção presencial/grupo turma e a não presencial,
com progressão mais individualizada. O erro verificado nos últimos
anos, da insistência num único modelo, conduziu a um aumento abrupto
do abandono dos jovens e dos adultos que procuravam uma segunda oportunidade
de concluir ou continuar os seus estudos.
Para o sucesso deste tipo de ensino é, ainda, fundamental eliminar as
medidas punitivas da assiduidade, geradoras de profundas discriminações
dada a especificidade do ensino de adultos e as características desta
população escolar, o alargamento da rede de escolas públicas
com oferta diversificada de ensino recorrente, que facilite a sua frequência,
a criação de uma comissão de acompanhamento, que possibilite
uma avaliação regular e alterações que se revelem
adequadas.
11. A Educação e o Poder Local
A Conferência Nacional «O PCP e o Poder Local» realizada
em Maio de 2003 assinalou que “o reconhecimento do papel da escola na
sua ligação com a comunidade educativa tem contribuído
para uma intervenção crescente por parte das autarquias na sua
relação com o espaço e os agentes escolares”.
Sendo clara a separação que deve existir entre os aspectos pedagógicos
do ensino e os aspectos funcionais das diferentes actividades inerentes ao funcionamento
das escolas, as enormes ambiguidades que se têm multiplicado, com expressão
mais recente na criação dos agrupamentos escolares, são
bem evidentes e profundamente negativas.
As autarquias locais, pela sua proximidade às populações
e pela sua função essencial de melhorar as condições
de vida das comunidades que representam, têm vindo, algumas vezes de “motu
proprio”, mas quase sempre “empurradas” pelo Governo e as
estruturas regionais do M.E., a ficarem com cada vez mais responsabilidades
e despesas inerentes a aspectos fulcrais do funcionamento das escolas que vão
para além das previstas na Lei e sem que, contudo, sejam regularmente
definidas as suas competências e atribuídos os meios financeiros
que lhes devem ser conexos.
Os Conselhos Municipais de Educação poderiam ser instrumentos
do processo de descentralização da administração
educativa. Mas tal como foram consagrados em Lei são autênticos
instrumentos de tutela das escolas, cometida abusivamente ao poder local que
passaria a ter competências inaceitáveis como, por exemplo, a avaliação
do desempenho do pessoal docente e não docente e a tutela deste último.
É também inaceitável que o parecer do Conselho Municipal
sobre os projectos educativos das escolas seja vinculativo. Na sequência
de anteriores “passagens” para as autarquias de responsabilidades
na área do Ensino Básico que as políticas de direita têm
vindo a proceder, não se concretiza nenhuma previsão de transferência
de verbas para as novas responsabilidades.
III
A INTERVENÇÃO DA COMUNIDADE EDUCATIVA NA DEFESA DE UMA ESCOLA
DEMOCRÁTICA AO SERVIÇO DO PAÍS E DOS PORTUGUESES
Defender a escola pública e democrática
A defesa de uma escola pública, gratuita, de qualidade e para todos
é uma luta que deverá envolver toda a sociedade portuguesa.
A maioria de direita PSD/PP tem procurado desvalorizar a escola pública
portuguesa com medidas que não contribuem para que aumente a qualidade
das suas respostas. Cortes sucessivos de financiamento, falta de investimento
nas condições de trabalho de alunos, professores e pessoal não
docente, aprovação de medidas restritivas no que respeita às
respostas de natureza inclusiva ou a criação de focos de grande
instabilidade, como a que resultou dos atrasos na colocação de
professores e educadores para o ano lectivo 2004/2005, são situações
que fragilizam a escola pública perante a população. Paralelamente
a direita concretiza medidas que promovem o ensino privado, quer com o argumento
de que este pode também prestar serviço público, quer confrontando
as escolas públicas com as privadas através da divulgação
de rankings.
Ao mesmo tempo que maltratam a escola pública, os últimos governos
do país têm vindo a aumentar os privilégios e os subsídios
que concedem aos colégios privados, chegando ao ponto de desrespeitarem
o quadro legal vigente sobre apoios a conceder aos colégios, designadamente
sob a forma de celebração de contratos de associação.
São diversos os exemplos em que os apoios atribuídos aos colégios,
alguns ilegais, contribuem directamente para o esvaziamento de escolas públicas,
situando-se na região centro os casos mais graves.
As pressões para que aumentem os benefícios dos privados têm
duas origens: por um lado os patrões dos colégios privados que
já criaram diversas associações que funcionam como grupos
de pressão (a AEPP, a ACCA, entre outras em que os mesmos se repetem),
por outro, um difuso mas não abstracto Fórum pela Liberdade de
Educação dirigido por um dos principais administradores do Grupo
BCP, o que deixa perceber dos grandes interesses do capital financeiro em investir
na educação como já faz na saúde. Contudo, para
concretizar esse interesse, a banca necessita que se altere o quadro legal vigente
tendo a maioria parlamentar de direita tentado satisfazer-lhe aquele desejo.
Primeiro procurou alterar a Constituição da República Portuguesa,
depois, como não conseguiu, construiu uma Lei de Bases da Educação
onde introduziu disposições que não obedecem ao preceito
constitucional. A Lei de Bases da Educação foi vetada pelo Presidente
da República sendo necessário recomeçar todo o debate em
torno da nova Lei uma vez que a aprovada pela direita não serve sequer
como ponto de partida para a discussão.
Dos portugueses e, em especial de todos os trabalhadores e estudantes, exige-se
uma atitude firme de luta em defesa da escola pública, a única
capaz de responder às necessidades e solicitações de todos
e de proporcionar condições de igualdade no acesso e no sucesso
escolar e educativo a todas as crianças e jovens.
A marcha da educação, promovida em Maio deste ano, foi muito
importante para a defesa de uma escola e de uma sociedade mais democrática
e de justiça social, luta que é de toda a sociedade portuguesa.
Estabilizar e melhorar as condições de exercício
da profissão docente
O desemprego entre os profissionais docentes cresce de forma abrupta, atingindo
já cerca de 40 000 professores profissionalizados. Tal decorre, essencialmente,
de políticas que não se orientam para a satisfação
das necessidades efectivas das escolas, para a concretização de
programas de combate efectivo ao abandono e insucesso escolares, à iliteracia
e ao analfabetismo e para que se construam soluções capazes de
tornar a escola verdadeiramente inclusiva.
No que respeita aos que conseguiram entrar na profissão, as condições
do seu exercício carecem de melhorias significativas. É necessário
dar estabilidade aos milhares de docentes contratados que, a qualquer momento,
podem ficar sem emprego, criando mecanismos que transformem em definitivo o
seu vínculo precário, de acordo com o tempo de serviço
prestado. Mas as intenções do governo PSD/PP são de sentido
contrário, pois pretende precarizar ainda mais os vínculos laborais,
com o recurso aos contratos individuais de trabalho, o que, numa profissão
com tão elevada taxa de desemprego, teria consequências muito negativas.
Confirmando-se agora, através de recente estudo divulgado pela OCDE,
que os professores portugueses são dos que menos ganham de entre os países
ditos desenvolvidos, evidencia-se cada vez mais indispensável a valorização
material das carreiras docentes. Cai, assim, uma mistificação
sustentada nos últimos anos por sucessivos governos sempre que pretendiam
denegrir os profissionais docentes. Este baixo nível salarial tem especial
incidência no grupo dos contratados e até cerca de metade da carreira.
A desvalorização dos salários dos professores, tal como
os restantes trabalhadores da administração pública nos
últimos dois anos foi superior à dos restantes trabalhadores portugueses,
uma vez que não tiveram qualquer aumento por imposição
dos governos da maioria de direita PSD/PP.
A formação dos professores é um aspecto fundamental do
sistema educativo, que não tem merecido dos mais diversos governos, quer
do PS, quer do PSD, qualquer medida valorizadora. O actual regime de formação
de professores carece de uma profunda alteração. Desadequada em
relação às necessidades do tempo e da escola actual, a
formação inicial de professores deve merecer uma profunda reflexão
que envolva Ministério da Educação, escolas, associações
profissionais e científicas, organizações sindicais e,
também, especialistas e investigadores desta área. Para além
da formação inicial, outras vertentes há que merecem uma
atenção muito especial, as da formação contínua,
especializada e complementar de professores.
A formação contínua mantém o seu carácter
fundamentalmente burocrático, alheia à adequação
dos conteúdos às necessidades dos professores e das escolas. Relevante,
na formação contínua, só mesmo os créditos
(horas de formação) adquiridos não importa em quê,
pois sem eles não haverá progressão na carreira. A revisão
profunda do modelo é urgente, sob pena deste se tornar inútil.
No que respeita à formação especializada é necessário
que ela se organize e responda a necessidades efectivas do sistema educativo
e das escolas, designadamente em áreas como a Educação
Especial. Por fim, a formação complementar deverá abranger
os professores dos 2º e 3º Ciclos, bem como do Secundário,
para quem nunca foram organizados os cursos adequados às necessidades.
É necessário, ainda, garantir o acesso à conclusão
da formação complementar por parte de todos os educadores de infância
e professores do 1º Ciclo que ainda não o fizeram.
A carreira dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico
e secundário continua, entretanto, a apresentar aspectos que devem ser
resolvidos. Por exemplo, é necessário regulamentar os incentivos
à fixação de professores em zonas isoladas e desfavorecidas
(matéria por regulamentar há mais de uma década). Essa
medida seria muito importante para as escolas e as comunidades educativas de
tais zonas, por norma fustigadas por permanentes alterações do
seu corpo docente e pela instabilidade que daí resulta.
No que se refere à carreira outros aspectos há a merecerem uma
atenção particular, como acontece com a sua duração.
É excessivo o tempo necessário para se atingir o topo, como excessivo
é o que se impõe para que se reunam as condições
para aposentação. Provado que está, através de diversos
estudos nacionais e internacionais, que a profissão docente é
de elevado desgaste físico e psíquico, há que encontrar
forma de evitar que tal aconteça, reduzindo o número de anos indispensável
para a aposentação voluntária. No imediato há que
revogar a norma introduzida pelo governo anterior que agravou as regras de aposentação
e de encontrar novas soluções de exercício da actividade
docente para os últimos anos de serviço.
Pela situação vivida recentemente, ainda não completamente
solucionada, confirma-se a necessidade de aprovar um modelo de concurso de professores
que, consagrando princípios como o da anuidade do concurso, bem como
o seu carácter público e nacional, se oriente para a estabilidade
dos professores, condição indispensável para que estabilizem
as escolas e as suas condições de funcionamento. Valorizar os
quadros das escolas fixando neles os professores, abrir vagas de acordo com
as necessidades efectivas do sistema educativo, criar um regime dinâmico
de vinculação de docentes contratados e revogar normas que subvertem
as graduações profissionais e criam profundas injustiças,
são aspectos fundamentais a atender na legislação a aprovar
e que deve aplicar-se já nos concursos que decorrerão no presente
ano lectivo.
Também os professores dos ensinos particular e cooperativo têm
sido vítimas das políticas de benefício ao patronato e
de ataque aos trabalhadores, sendo estes docentes os que de imediato ficaram
sujeitos às regras do código de trabalho. A aplicação,
a estes professores, das regras gerais do estatuto da carreira docente, a sua
equiparação salarial aos professores do ensino público
e a criação de condições de estabilidade no seu
exercício profissional são aspectos essenciais a merecerem consagração.
É neste sector que surgem algumas das maiores ilegalidades praticadas
pelos patrões e em que a discricionariedade mais se faz sentir, devido
à arrogância e à ganância de empresários que
só pensam no seu lucro e que sabem poder recrutar trabalhadores num universo
de dezenas de milhar de desempregados.
No Ensino Superior, actualmente urge superar as situações de
bloqueamento das promoções que afecta a generalidade das escolas
devido à ausência de vagas nos quadros e a insegurança de
emprego que afecta sobretudo os docentes do politécnico.
Estão a ser dispensados docentes que acabaram de concluir mestrados
e doutoramentos financiados através de bolsas obtidas pela própria
escola para elevar a qualificação do seu corpo docente. A inexistência
de um instrumento regulador da contratação e da carreira dos docentes
do Ensino Superior Particular e Cooperativo é um importante obstáculo
às expectativas de muitos docentes. O nível remuneratório
no acesso às carreiras do ensino superior continua desvalorizado, comparativamente
a outras com nível idêntico de exigência de ingresso.
O direito dos professores à colocação por concurso em
lugares de Educação Especial a criar nos quadros de Escola ou
de Zona Pedagógica; o alargamento do número de vagas para professores
e auxiliares de acção educativa, de modo a assegurar um atendimento
de qualidade a todos os alunos com necessidades especiais; o direito ao acesso
à formação especializada, assegurada pelo Estado através
de modelos de formação em serviço que valorizem a experiência
e as formações já adquiridas; a criação de
condições de trabalho adequadas.
O reforço da FENPROF e dos seus Sindicatos e o empenhamento dos militantes
comunistas no seu trabalho, é essencial para que se mantenha a natureza
de classe e a atitude, simultaneamente reflexiva, exigente e combativa, que
possibilite a concretização dos objectivos reivindicativos e as
aspirações dos docentes.
A luta dos trabalhadores não docentes
A instabilidade vivida na escola pública decorre em muito da falta de
pessoal, da ausência de quadros que satisfaçam as necessidades
dos trabalhadores, da qualidade da resposta, da escassez dos meios, do desconhecimento
objectivo da realidade, suportada na análise continuada e sustentada
pela obtenção de rácios que tenham como vector fundamental
a real inserção da escola no meio, tudo isto servindo para pôr
em causa o bem-estar de todos os agentes e o cumprimento necessário,
porque constitucional, desta determinante função social do Estado.
É, pois, pelo futuro, porque o interesse público é sempre
posto em causa, que mantém toda a actualidade a defesa do vínculo
de emprego público, como forma de defender a escola pública de
qualidade e dar combate à política deste Governo, que tem como
princípio, embora não explicitamente assumido e, por isso, mais
perigoso, a elitização do ensino, a denegação dos
direitos dos trabalhadores e a incapacidade de a escola ser “motor”
na criação de uma sociedade mais justa, solidária e inclusiva.
Por outro lado, a precariedade do trabalho neste importante sector de actividade
é cada vez maior. A par de um cada vez menor número de trabalhadores
com vínculo de emprego público, proliferam trabalhadores com contrato
a termo, com contrato individual de trabalho e catorze mil com contrato administrativo
de provimento que, na condição de agentes da Administração
Pública, adquiriram direitos e deveres.
Porém, o direito mais elementar – o ingresso na carreira –
foi-lhes coarctado com a revogação do Decreto-lei 515/99, gorando-se-lhes
as expectativas entretanto criadas.
Só a luta fez com que vissem este ano os seus contratos prorrogados
por um ano, até ao final do ano lectivo, como forma de não piorar
ainda mais as condições de abertura do ano lectivo.
Existem escolas (e não são poucas), que funcionam maioritariamente
com trabalhadores em situação de emprego precário.
A desregulamentação da relação de emprego público
e a desvalorização, em termos funcionais e salariais, das carreiras,
a par da desigualdade de tratamento entre trabalhadores, enquanto no exercício
do mesmo cargo, está a semear injustiças e a gerar um enorme descontentamento,
que teria sido atenuado se o Decreto-lei 515/99 não tivesse sido revogado
pelo 1.º Governo da coligação da direita ou se os Governos
do Partido Socialista o tivessem regulamentado, conforme decorria da sua própria
aplicação, se atempada.
O estatuto do pessoal não docente das escolas, que revogou o Decreto-lei
atrás citado e que, curiosamente, foi aplicado na Região Autónoma
dos Açores e nos organismos dependentes das autarquias do continente,
mais não é do que uma operação de cosmética
que visa embaratecer o produto final, com sérios prejuízos para
todos.
Extingue e desvaloriza carreiras, acentua a polivalência e quebra a confiança
dos trabalhadores na Administração, gora expectativas criadas
pela anterior legislação, nega direitos e interesses protegidos
pela Constituição da República e pela lei ordinária
e prejudica, nunca sendo demais reafirmá-lo, o interesse público.
Todas as formas de luta foram usadas e bem participadas, sendo justo salientar
que os trabalhadores não docentes não esquecerão a posição
assumida pelo senhor Presidente da República, ao promulgar o Decreto-lei
184/2004, contrariamente ao que reivindicavam os trabalhadores, cuja posição
saíra reforçada pelo parecer emitido pelo senhor Provedor de Justiça
sobre uma exposição que lhe tinha sido dirigida. O passado recente
provou o seu empenho na luta mais geral de todos os trabalhadores da Administração
Pública ou no quadro específico das lutas sectoriais.
A luta pelo direito à dignidade, pela defesa dos valores e pela conquista
de uma melhor qualidade de vida é o caminho certo a percorrer.
A luta dos estudantes
Os estudantes sempre foram uma camada social com características e potencialidades
para se assumirem como agentes activos da mudança e do progresso a diversos
níveis, em particular no domínio da Educação e do
sistema educativo. De facto, todos os avanços verificados no domínio
da Educação foram antecedidos da crítica, da proposta e
da luta desenvolvida pelos estudantes a vários níveis.
A luta dos estudantes tem-se pautado pela afirmação de objectivos
e pela luta para alcançá-los. Não obstante, a luta tem
sido travada também no sentido de impedir/travar rumos nefastos para
a Educação, na sua qualidade, democraticidade, universalidade
e gratuitidade. Luta essa que apesar de muitos jovens já terem nascido
depois da revolução está, na prática, consagrada
à defesa das conquistas de Abril.
Nem sempre atingindo a plenitude dos seus objectivos, a luta estudantil foi
e é decisiva para a introdução na discussão e decisão
– do poder político e das Instituições – de
questões tão importantes como a função social da
Educação (promotora da igualdade e do progresso social, cultural
e económico), o financiamento, o modelo de acesso ao ensino superior,
os modelos pedagógicos vigentes, a qualidade/quantidade das infra-estruturas,
o sistema de acção social escolar, o insucesso escolar, o apoio
ao estudante carenciado ou simplesmente deslocado, a educação
sexual nas escolas, etc.
É assim que, no ensino superior, compreendemos a luta contra as propinas
e pela revogação da Lei de Financiamento, a luta pela implementação
da educação sexual, a luta contra a revisão curricular
no ensino secundário e profissional, pelo investimento público
e pela gratuitidade na sua frequência, levadas a cabo a par de muitas
outras a um nível mais concreto/local, também elas merecedoras
de registo, que ampliaram um importante movimento social contrário à
política de direita e que, à sua medida, também contribuíram
para a descredibilizar.
A luta estudantil tem objectivos, conteúdos e dinâmicas que são
próprias desta camada e, independentemente do nível de ensino,
tem nas associações de estudantes o seu principal suporte orgânico
como elemento aglutinador e organizado da luta estudantil (aliás com
características únicas em todo o mundo).
A importância deste amplo movimento social que esteve centrado em torno
de propostas alternativas para a educação em Portugal é
também relevante, por ter permitido a muitos milhares de jovens a participação
na defesa das suas convicções e pela resolução dos
seus próprios problemas. Para muitos jovens trata-se da sua primeira
experiência de luta, um espaço privilegiado para a formação
da sua consciência social e política.
A intervenção do Movimento Associativo de Pais
O Movimento Associativo de Pais (MAP) tem características particulares
que lhe criam dificuldades de consolidação. Aos problemas que
advêm da situação laboral de grande precariedade e insegurança,
somam-se os limites dos percursos escolares dos educandos, em cada nível
de ensino. A mudança de escola do estudante implica para o seu encarregado
de educação a mudança de associação. Este
facto cria alguma instabilidade às associações de pais
nomeadamente ao nível dos seus órgãos sociais. A esta situação
acresce a ausência de apoios às famílias.
As limitações quanto ao crédito de horas para um encarregado
de educação poder acompanhar a vida escolar do seu educando –
4 horas por trimestre – constituem um grave entrave à participação
dos encarregados de educação nas questões da comunidade
educativa. De igual modo, as faltas para a actividade associativa, previstas
no Estatuto do Dirigente Associativo Voluntário não se encontram
regulamentadas.
Recentemente, com a constituição dos agrupamentos de escolas,
a participação dos pais ficou restringida à sua representação
na Assembleia do Agrupamento e no seu conselho pedagógico, dado que deixaram
de existir os conselhos escolares no 1º ciclo e o conselho pedagógico
no pré-escolar. Para além, do facto de, na grande maioria dos
agrupamentos, ainda não ter sido eleita a respectiva Assembleia, e assim
se passou um ano lectivo no qual os pais se viram excluídos de participarem
nos órgãos das escolas do ensino básico, com graves reflexos
na qualidade dos projectos educativos de muitas escolas.
Estas características, se por um lado lhe trazem riqueza e heterogeneidade,
originam grandes dificuldades na mobilização dos encarregados
de educação para uma participação regular e empenhada
no MAP, e conduzem a que haja uma intervenção centralizada nos
seus corpos sociais.
A participação organizada dos pais nas escolas é um factor
positivo e imprescindível para o cumprimento das funções
da escola na educação. O papel da família como educadora
é insubstituível e não pode ser remetido às quatro
paredes da habitação do agregado familiar. Por este motivo é
fundamental criarem-se condições objectivas para os pais participarem
participarem na educação e acompanharem os projectos educativos
das escolas.
Os militantes comunistas, de acordo com o projecto humanista do PCP, no qual
a Educação e a Cultura ocupam lugar de destaque na formação
integral do indivíduo como ser humano, devem ter um papel activo e dinamizador,
quer na formação e reactivação de associações
de pais, batendo-se pelo princípio de uma associação por
escola, quer no contributo para a mobilização dos pais e famílias
nas questões do ensino e da educação. No plano das estruturas
regionais e nacional do MAP, os comunistas devem defender uma postura interveniente,
reivindicativa e combativa, com estruturas ligadas às associações,
combatendo a sua burocratização.
IV
A INTERVENÇÃO DO PARTIDO
NA DEFESA DO ENSINO PÚBLICO,
GRATUITO E DE QUALIDADE PARA TODOS
A articulação entre o trabalho orgânico, político
e institucional
Num quadro político marcado pelo avanço das políticas
de direita, com consequências políticas, económicas, sociais
e culturais que se repercutem negativamente a todos os níveis da vida
nacional, mas também marcado pela resistência dos trabalhadores,
o reforço da organização e da intervenção
do Partido nesta área, são duas tarefas decisivas e urgentes,
que são possíveis de concretizar com êxito, na prossecução
do objectivo de reforçar a nossa influência orgânica e política
e desta forma inverter a tendência dos últimos anos para algum
recuo em termos orgânicos em muitas organizações do Partido.
Com o reforço da organização partidária é
possível enfrentar a complexidade e as dificuldades da situação
política, ampliando as condições de luta em torno dos problemas
da área da Educação.
Esse reforço passa pela intervenção dos militantes comunistas
e particularmente dos professores comunistas: através da sua intervenção
activa na vida das escolas, em particular nos seus órgãos e estruturas;
através da intervenção activa nas discussões públicas
sobre as questões da educação; quando eles se afirmam como
intérpretes e defensores de uma visão progressista da Escola democrática,
inclusiva e de qualidade. Faz-se também através da intervenção
activa no importantíssimo campo da acção sindical, activos,
mobilizados e mobilizadores!
A luta do nosso Partido pelo direito de todos e de cada um ao conhecimento
e à criatividade, por uma política que assuma a educação
e o ensino, como vectores estratégicos decisivos para o desenvolvimento
integrado do nosso País, exige que, a todos os níveis da estrutura
de direcção do Partido, com particular atenção nas
Direcções Regionais e Concelhias, coloquem nas suas preocupações
a necessidade de criarem as condições para que os nossos camaradas
possam preparar e coordenar a sua intervenção, em torno de objectivos
comuns e específicos.
As condições concretas do meio onde as organizações
estão inseridas, o número de camaradas a organizar e os objectivos
que se colocam a cada uma das organizações, devem determinar a
forma mais adequada de organização, sempre com a preocupação
de que a organização existe para intervir, não constituindo
um fim em si mesma e que uma organização deve ser um corpo vivo
com iniciativa própria.
O importante é encontrar um espaço onde os camaradas possam preparar
a sua intervenção, discutirem colectivamente a vida política,
social e partidária, os problemas do sector, construírem e decidirem
colectivamente as orientações para a intervenção
partidária. Não sendo realista qualquer orientação
no sentido de uniformizar formas de organização no conjunto das
organizações regionais, tendo presente as diferenças substanciais
existentes, o Encontro Nacional coloca como objectivo prioritário o privilegiar
a intervenção directa do Partido no espaço Escola.
Foi também com este objectivo que se procedeu recentemente a uma reestruturação
da estrutura central de acompanhamento desta frente, de acordo com as necessidades
de direcção central e de articulação entre as várias
organizações regionais e, também, para se poder articular
com eficácia a intervenção entre os vários sectores
do Partido que intervêm neste sector e a JCP, nomeadamente com o alargamento
da Comissão Nacional para as questões da Educação,
a todos os níveis de ensino, pais, autarquias, Grupo Parlamentar e JCP.
Uma intervenção própria que não se dilua, nem esgote,
na intervenção unitária dos membros do Partido, ou na intervenção
institucional, quer na Assembleia da República, quer nas Autarquias Locais.
A intervenção das organizações do Partido, a sua
ligação ao meio onde estão inseridas e a sua capacidade
de iniciativa política, são determinantes para o êxito da
luta dos professores, trabalhadores não docentes, estudantes e pais e
da articulação entre a luta de massas e a intervenção
política e institucional.
Os membros do Partido que participam em organizações e movimentos
de massas, respeitando, defendendo e observando a autonomia, o carácter
unitário e a vida democrática das organizações e
movimentos, têm um papel determinante na elevação da consciência
dos problemas que atravessam a área da Educação actuam
e devem actuar na defesa dos interesses dos associados e das massas estimulando
a sua participação e mobilização.
Neste quadro de crise estrutural, com profundas repercussões no estado
da educação em Portugal, o PCP, como sempre o fez, assume com
os portugueses o compromisso de tudo fazer para que a escola pública,
gratuita e de qualidade para todos, seja uma realidade no nosso País.
A concretização deste compromisso é sustentada
num conjunto de propostas do PCP, das quais se sublinham:
1. O desenvolvimento de uma política educativa que assuma a Educação
como um valor estratégico fundamental para o desenvolvimento do País
e para o reforço da identidade nacional, com prioridade para um efectivo
combate ao abandono escolar e ao insucesso escolar e educativo e à exclusão
social e escolar.
2. O investimento numa Escola Pública de Qualidade, com a gratuitidade
de todo o ensino público como prioridade estratégica.
3. A expansão da rede pública de estabelecimentos de educação
e ensino, a generalização da oferta pública e a consequente
adequação da rede escolar de forma a assegurar a concretização
do direito à educação, independentemente de iniciativas
de entidades particulares ou cooperativas.
4. A aprovação de uma Lei sobre o Financiamento da Educação
Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário que clarifique
responsáveis e responsabilidades e garanta o normal funcionamento das
escolas públicas financiadas, essencialmente, por verbas consagradas
em Orçamento de Estado.
5. O incremento do apoio social escolar em todos os níveis de escolaridade
com crescimento considerável das capitações para atribuição
dos respectivos apoios e dos montantes limite previstos para as diversas áreas.
6. A garantia de transportes, alojamento e alimentação para os
estudantes que, vivendo afastados da escola ou por outros motivos, careçam
total ou parcialmente desses benefícios sociais.
7. A expansão do sistema público de educação pré-escolar,
articulado com a rede escolar do 1º ciclo, dando cumprimento à obrigação
que a Constituição impõe ao Estado, garantindo a frequência
universal, gratuita e obrigatória no ano que anteceda o ingresso das
crianças no ensino básico, bem como as condições
para a universalidade da frequência a partir dos 3 anos e garantindo a
curto prazo uma resposta de qualidade para a faixa dos 0 anos 3 anos.
8. No primeiro ciclo do Ensino Básico deve proceder-se: a uma reorganização
da rede escolar com criação de centros escolares de média
dimensão, quando necessários, à elaboração
de um Plano de Emergência para recuperação do parque escolar
e construção de novas escolas, permitindo acabar com os desdobramentos
de horários e dotando-as com novos espaços, equipamentos e materiais
adequados, na base de um programa específico de financiamento.
9. A expansão da rede pública de escolas do ensino artístico
especializado, tendo em atenção uma distribuição
geográfica equilibrada.
10. O alargamento da escolaridade obrigatória para doze anos, mantendo-se
a duração de nove anos para o ensino básico..
11. A gratuitidade dos manuais escolares no ensino obrigatório.
12. O desenvolvimento da resposta pública às necessidades de
educação especial numa perspectiva de escola inclusiva, com incidência
na formação especializada dos professores.
13. A promoção da multiculturalidade nas escolas, com o respeito
e valorização das diferentes origens das comunidades imigrantes,
no sentido da sua integração na sociedade.
14. A promoção da educação de adolescentes e adultos
numa perspectiva de formação permanente e recorrente, visando
o combate ao analfabetismo e à iliteracia e a qualificação
profissional, social e pessoal.
15. A promoção do ensino da língua portuguesa no estrangeiro,
designadamente no quadro da valorização e reforço do ensino
português no estrangeiro.
16. A revisão dos curricula de modo a corresponder às necessidades
do desenvolvimento actual da sociedade e da formação integral
dos estudantes, segundo o princípio da igual dignificação
das diversas vias do ensino secundário.
17. A aprovação de novos modelos de avaliação dos
alunos, assentes em princípios de avaliação contínua,
incompatíveis com a existência de exames decisivos e determinantes
na selecção.
18. A profunda remodelação do actual regime de formação
de professores, com incidência em todas as suas vertentes: inicial, contínua
e especializada, de maneira a contribuir, com esta intervenção,
para a elevação da qualidade educativa e do ensino. A formação
deve também ser uma preocupação na preparação
e adequação de outro pessoal técnico e de apoio que, por
esta via, deverá ver valorizado o seu exercício profissional.
19. A valorização e dignificação das carreiras
docentes e a aprovação de carreiras específicas para outros
técnicos de educação, através de processos negociais
a desenvolver com as respectivas organizações sindicais e a resolução
de incongruências legislativas ao nível das habilitações.
20. A dotação das escolas de pessoal docente, de pessoal administrativo,
técnico e auxiliar de acção educativa em número
suficiente e com formação adequada, para garantir o seu bom funcionamento.
21. Afectação ao Ensino Profissional dos meios necessários
ao cumprimento dos seus objectivos, o que implica: suspensão da revisão
curricular e abertura de novo processo de discussão participada; sistema
de financiamento que garanta a igualdade de oportunidades para todos no seu
acesso; um claro e sério investimento público nesta via.
22. O estabelecimento de um novo e mais justo regime de acesso ao ensino superior
e rápida expansão do ensino superior público, com a abolição
das restrições quantitativas globais (numeri clausi). Este regime
deve harmonizar as necessidades de desenvolvimento do país com as opções
e preferências dos candidatos através de um sistema de acesso que
considere como fundamental a avaliação contínua no ensino
secundário, complementada com a realização de provas nacionais
de capacidade.
23. A integração num único sistema organizado de ensino
superior de todas as universidades e institutos politécnicos, com respeito
pela identidade, especificidade e criatividade de cada instituição
e a definição de um quadro geral de áreas científicas
no ensino superior, ainda que flexível e não definitivo.
24. Defender e aperfeiçoar a autonomia do ensino superior público
consagrada na Constituição e defender a gestão democrática
e transparente das instituições.
25. A revogação da lei de financiamento do ensino superior e
a aprovação de novas regras, mais justas, contidas num novo diploma
legal. Os níveis de financiamento deverão ser os adequados de
forma a garantir um ensino e uma investigação de qualidade e que
se afirmem autónomas do poder político e independentes do poder
económico.
26. Ampliar a frequência do ensino superior público, através
de uma política que assegure, de facto, o acesso a todos os portugueses
que tendo capacidades e motivação, desejem adquirir novos saberes
ou competências.
27. O envolvimento da comunidade educativa no debate e definição
das opções e objectivos da política educativa das autarquias
e a sua articulação com outras políticas sectoriais.
28. O investimento na modernização dos equipamentos da responsabilidade
das autarquias.
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