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Política Económica - Octávio Teixeira, Comissão dos Assuntos Económicos junto do CC
Sábado, 24 Novembro 2007
octavio teixeira



Camaradas e amigos,
Uma análise séria da realidade económica do País mostra-nos que a questão nodal da economia portuguesa continua a ser o défice externo.
Primeiro, porque ele espelha as deficiências da nossa estrutura produtiva, a sua incapacidade para produzir um valor de bens e serviços suficiente para satisfazer as necessidades da sociedade portuguesa. E aí temos um défice da Balança de Transacções Correntes da ordem dos 10% do Produto, o que, neste âmbito e gravosamente, nos coloca no pelotão da frente dos 27 Estados da União Europeia.
Segundo, porque esse défice de produção significa menos possibilidades de emprego para os trabalhadores portugueses. E aí temos uma taxa de desemprego na ordem dos 8%, que não dá sinais de querer diminuir e igualmente nos coloca no pelotão da frente da UE.
E em terceiro lugar porque esse défice gera um crescimento permanente da dívida externa do País e, mais cedo ou mais tarde, essa dívida terá de ser paga. E se não o é com o aumento da produção, terá de o ser pela venda de activos nacionais, sejam eles empresas ou bens imóveis, ou através da redução do nível de vida da população portuguesa. E a dívida externa bruta do país tem vindo a aumentar a galope, com destaque para o endividamento do sistema bancário e os respectivos juros anuais são já equivalentes aos encargos totais com o Serviço Nacional de Saúde.
A constatação de que a questão central da economia portuguesa é qualitativamente a mesma que, há trinta anos atrás, e quantitativamente mais grave, suscita a questão de saber o porquê. Pois o facto de nos encontrarmos numa situação mais gravosa não é uma inevitabilidade, antes tem causas objectivas e responsáveis identificáveis.


As causas são muitas, mas há três que avultam.
A primeira tem a ver com o “modelo económico” dos baixos salários que, por responsabilidade da generalidade dos empresários e dos governos que se foram revezando no poder, tem imperado no nosso país
Tendo podido impor esse “modelo” para garantir a competitividade pelos preços no confronto com produções externas, o empresariado que temos não sentiu a necessidade, nem a isso foi pressionada pelos governos, de investir na eficiência, na inovação, em processos produtivos e organizativos mais eficientes, no aumento do valor acrescentado das produções ou em novas especializações produtivas.
È evidente, designadamente após os últimos alargamentos da UE, que este “modelo”, principal responsável pelo atraso económico do País, está esgotado. Embora haja quem, incluindo o Governo, propugne por maior facilitação dos despedimentos individuais e redução dos salários nominais com o objectivo de garantir a competitividade das empresas.
Mas é estúpido e irresponsável pretender aprofundar um “modelo” demonstradamente sem futuro e fortemente penalizador para os trabalhadores.
A segunda causa que me importo relevar foi a decisão de atrelar Portugal à moeda única nos idos de 90. Decisão economicamente irresponsável, que não teve em conta o nosso estádio de subdesenvolvimento relativo, a nossa especialização produtiva mais próxima dos países subdesenvolvidos que dos países da zona euro, as nossas necessidades de crescimento económico a níveis mais elevados. Que ostensivamente olvidou os efeitos nefastos que a perda das políticas monetária e cambial teriam sobre a possibilidade de modernizar e desenvolver a economia portuguesa.
Os resultados são hoje visíveis. Um exemplo, por todos. A taxa de câmbio efectiva real tem-se degradado à média de 2% ao ano sem que possa ser compensada, ainda que transitoriamente, com uma alteração da taxa de câmbio nominal, já que os ridículos aumentos de produtividade que temos tido não chegam, sequer, para manter o baixo nível de partida. Por isso as nossas exportações continuam a registar perda de quotas nos mercados externos, e as importações não cessam de aumentar. E a recente revalorização contínua do euro face ao dólar só agrava a situação.
A verdade é que os constrangimentos ditados pela moeda única continuam a ser obstáculo a que Portugal possa ter um crescimento económico equilibrado e sustentado a níveis elevados, facto que se agrava com os decorrentes do Pacto de Estabilidade, que penalizam a aplicação de políticas orçamentais de relançamento da economia em fases de recessão ou marasmo económico, como é a situação que Portugal vive desde 2001.
A terceira causa da gravosa situação económica e social do País, que aliás está na génese das duas anteriores, é a orientação neoliberal que tem marcado as políticas económicas e sociais, e que com o actual Governo assume um fundamentalismo nunca antes conseguido.
Bebendo sofregamente da vulgata dominante que pretende fazer crer que existe uma só política económica universal, o neoliberalismo,  o Governo de Sócrates pretende impingir aos portugueses que a resolução dos problemas económicos e sociais passa pela redução da alegada rigidez do mercado de trabalho, pelo aumento da alcunhada flexibilidade dos salários e por machadadas nas áreas sociais, visando colocar as condições de trabalho, os níveis salariais e o sistema social portugueses em concorrência com os que vigoram nos países asiáticos, sul-americanos e africanos.
A experiência não autorizava a ingenuidade de esperar que o PS e o seu Governo defendessem e executassem políticas socialistas. Mas exige-se-lhes, pelo menos, que não sejam mais neoliberais e mais socialmente retrógrados que os partidos conservadores dos países sociais-democratas do norte da Europa.

Camaradas e amigos,
A ultrapassagem da crise profunda e estrutural que afecta a economia portuguesa, mesmo no contexto dos constrangimentos externos existentes, passa por três vectores essenciais.
No âmbito das orientações económicas, ter a consciência de que a prioridade é o combate eficaz às debilidades estruturais da economia, que o défice mais grave e preocupante é o défice externo, e que só esse combate permitirá promover o crescimento económico e do emprego e, simultaneamente, controlar de forma sustentada e socialmente aceitável as finanças públicas.
No âmbito da prática governativa, assumir que a promoção do crescimento e a redução do défice externo exige a orientação da produção para os bens internacionalmente transaccionáveis, visando quer o aumento das exportações quer a substituição competitiva de importações, e que a competitividade deve sustentar-se em ganhos de produtividade e não na regressão das condições de vida e laborais dos trabalhadores.
Por último e acima de tudo, é necessária uma vontade política real de assumir a dimensão social da economia, de assumir que o crescimento económico não é o um fim em si mesmo, antes é um instrumento que deve estar subordinado aos objectivos da criação de novos e melhores empregos, à promoção de uma maior justiça na distribuição do rendimento e à melhoria permanente do bem estar social.
E é essa vontade política que continua a impregnar os ideais e a determinar a acção do Partido Comunista Português.