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Intervenção de José Calçada na AR
Cemitério de resíduos nucleares em Aldeadávila de la Ribera
Quinta, 28 Maio 1998
Como é hoje comummente aceite, a energia nuclear não é apenas mais uma forma de energia, mas uma forma de energia qualitativamente diferente. Diferentemente de todas as restantes, a energia nuclear e a sua utilização colocam problemas à espécie humana, que não apenas ao indivíduo, à Humanidade, que não apenas a cada homem, e à Terra, que não apenas a uma região ou a um país. A energia nuclear e a sua utilização colocam-nos assim perante problemas que extrava o domínio meramente quantitativo e nos conduzem naturalmente à área mais nobre, ou mais perversa, do comportamento humano, à área das opções políticas e ético-políticas. De tal modo assim é que, a pretexto da sua utilização militar, a energia nuclear se transformou num palco privilegiado para a afirmação quer da consciência social e ético-política do cientista, quer do carácter não-neutral da própria investigação científica e tecnológica. Hoje, a utilização pacífica da energia nuclear, e particularmente a edificação de centrais para a produção de electricidade, com todas as questões que se levantam a jusante e a montante dessa edificação, têm vindo a contribuir para uma outra construção, a da consciência social, cada vez mais ampla, em torno da gravidade do problema. Neste quadro, são exemplares as manifestações das populações e dos responsáveis autárquicos de um e de outro lado da fronteira contra a hipótese de instalação pelo Governo espanhol de um cemitério de detritos nucleares na zona de Aldeadávila de La Ribera, na bacia hidrográfica do Douro e próximo da fronteira portuguesa. É preciso que se diga claramente, e de uma vez por todas, que, no presente estádio de desenvolvimento dos nossos conhecimentos científicos, tecnológicos e industriais, todos os cemitérios de resíduos nucleares são provisórios, isto é, envolvem um elevado risco potencial, pois a verdade é que, de forma definitiva e segura, ninguém sabe ainda o que fazer com esses resíduos. É que não estamos a falar de uma "lixeira"(!) comum - mas de resíduos que se mantêm perigosamente radioactivos por centenas ou mesmo por milhares de anos. Daí a elevadíssima responsabilidade técnica e política que se deve exigir a quem tenha de lidar com estas situações. É fácil ceder a voluntarismos mediáticos, seja com o espectáculo do sobrevoo da região em helicóptero, seja com a sensata sugestão de que se impõe negociar com a Espanha "à bruta" - e estou a citar, a expressão não é minha. Como também é fácil, por outro lado, para esconder inoperâncias e incapacidades técnicas e diplomáticas, vir defender a tese de que o "segredo é a alma do negócio", ou de que a questão está a ser excessivamente ampliada. A questão é outra, e é séria, e é grave. Independentemente de um ou outro recúo circunstancial, ditados pela própria sensibilidade política, social e diplomática do problema, a verdade é que, já com projecto formal ou ainda sem ele, existem vários documentos oficiais espanhóis que apresentam a zona de Aldeadávila como uma daquelas em que poderá vir a instalar-se um cemitério nuclear. Ninguém quer que as garrafas do nosso maravilhoso, e único, "vinho fino do Douro" se vejam um dia obrigadas a ostentar o aviso "Beber este vinho prejudica gravemente a saúde", à semelhança do que acontece já hoje com as embalagens do tabaco. O Governo português não pode neste domínio - de afirmação estratégica da independência nacional - manter-se numa atitude de "esperar-para-ver". Aqui, o segredo não é a alma do negócio - quer porque nenhum negócio é possível, quer porque é fundamental o máximo de informação clara, rigorosa e mobilizadora.

Não somos daqueles que subscrevem o adágio de que "de Espanha, nem bom vento nem bom casamento". Na luta comum contra os dois fascismos ibéricos, o desaparecimento do franquismo e o 25 de Abril constituem passos fundamentais propiciadores do reforço da amizade e da cooperação entre os povos de Espanha e o povo português. As manifestações populares em torno da questão de Aldeadávila têm sido transfronteiriças - e isso mostra bem como têm sabido separar o essencial do acessório. O Governo português tem a mais estrita obrigação de demonstrar igual capacidade - o que, de todo, até agora não mostrou. Não queremos que trate destas coisas com a Espanha "à bruta". Queremos apenas que as trate, e que as trate com seriedade e com transparência - e que o faça em defesa dos interesses legítimos do povo português e, permita-se-me o excesso, dos povos de Espanha. Disse.
 

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