Partido Comunista Portugu�s
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Preços dos bens essenciais - Intervenção de José Soeiro na AR
Quinta, 11 Janeiro 2007

Evolução dos preços dos bens essenciais

 

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados,
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares,

Na primeira intervenção que foi proferida foram avançados números muito concretos no que diz respeito ao aumento das portagens, 4%, e dos transportes públicos (os da Carris, em concreto), 8%. Podia ter-se falado da previsão de aumentos nas SCUT, que passam de zero para qualquer coisa que vamos ver quanto será. O Orçamento do Estado aponta para alguns milhões de euros de receita, o que, naturalmente, será um custo a transferir para os utentes, que, até hoje, estavam isentos de portagens.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares disse, e bem, que só até aos 50 km é que, pelos vistos, o Governo tem capacidade de intervenção. E o resto do País, Sr. Ministro?

Seria interessante conhecer, por parte do Governo, quais foram os aumentos que se verificaram nos outros transportes. Inclusivamente, na altura, formulei um requerimento ao Governo nesse sentido. Não se tratava nem de 5%, nem de 10%, nem de 15%, nem de 20% de aumento... Esses cidadãos são o quê?

Cidadãos de primeira, de segunda, de terceira, de quarta classe? Deste país? De outro país?

A verdade é que já foram aqui avançados números em relação aos aumentos e, comparados com a inflação que o Governo anuncia sempre em vésperas de negociações salariais (em que é sempre invocado um número baixo para conter os salários, mas depois, quando se chega à hora da verdade, e decorrido um ano, a inflação é superior, não havendo correcção dos salários nem dos rendimentos das famílias), verificase que os preços aumentam mais do que os salários, do que as reformas, do que os rendimentos das famílias, o que acaba por degradar cada vez mais as condições de vida da generalidade das portuguesas e dos portugueses.

Por isso, entendemos que, tendo os transportes um peso tão significativo, em particular na bolsa dos trabalhadores, na medida em que são eles que fazem esse vaivém no quotidiano (sendo reconhecida a importância dos transportes, sobretudo a dos transportes públicos, para resolver um conjunto de problemas de mobilidade não apenas nos grandes centros urbanos mas no País em geral), a questão que se coloca é a seguinte: o Governo deve dizer-nos se considera que este aumento de preços é compatível com os objectivos que proclama, em teoria, de melhorar os transportes públicos e de incentivar os portugueses e as portuguesas à sua utilização.

Estes aumentos de preços estão, manifestamente, acima daquilo que poderiam e deveriam ser, porque debaixo de tudo isto, nalguns casos, escondem-se os lucros e os resultados dos sectores que, pouco a pouco, se vão privatizando. Aí, não só os aumentos não estão contidos como, nas concessões feitas, se permitem margens de aumentos muito acima da inflação.

Gostaria ainda de saber, em concreto, quanto é que a Fertagus pode aumentar e se mantém os aumentos que tem vindo a fazer e vai fazer, tendo em conta o nível dos valores de inflação que são anunciados.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:


Creio que, quanto à importância do tema que o Grupo Parlamentar do PCP hoje trouxe a debate da Assembleia da República, melhor do que ninguém poderão pronunciar-se os milhões de portugueses que sofrem no dia-a-dia as consequências desta política que, no essencial, se tem traduzido no agravamento constante dos preços e que pesa sobretudo na bolsa dos trabalhadores e das famílias de menores rendimentos, entre os quais os reformados.

O Governo preferiu um discurso que traduz o optimismo do Sr. Primeiro-Ministro e, por isso, «está tudo bem»... Só não se compreende por que é que tanta «bondade» não se traduz efectivamente na melhoria das condições de vida das portuguesas e dos portugueses...!

Disse o Sr. Ministro que o Governo procura ter uma intervenção no sentido de induzir nos preços os lucros das empresas. Ora, creio que se o Sr. Ministro reflectisse relativamente às áreas de combustíveis, energia, auto-estradas, enfim, os sectores que foram sendo privatizados ao longo dos anos e que, actualmente, apresentam lucros de milhões e milhões de euros, interrogar-se-ia sobre se tais lucros não poderiam ser utilizados para termos preços mais baixos em sectores essenciais, para garantir a qualidade de vida dos portugueses e das portuguesas.

Falou-se aqui - o Sr. Ministro admitiu-o, disse-o claramente a bancada da maioria que suporta o Governo e a própria direita o admitiu - no efeito nefasto dos impostos indirectos na composição dos preços. Nós perguntamos: isto é uma fatalidade? Não haveria possibilidade de uma outra política fiscal que evitasse o gravíssimo inconveniente de termos impostos «cegos», como o IVA ou o imposto sobre os produtos petrolíferos, que agravam brutalmente os preços e que se repercutem directamente na vida das portuguesas e dos portugueses?

Então, se houvesse uma preocupação séria em fazer uma política fiscal mais justa, que garantisse mais equidade na distribuição dos custos provenientes do pagamento da dívida resultante das más políticas que temos tido ao longo dos anos, não seria mais justo que se fizessem incidir esses custos sobre os rendimentos e o património, como o PCP tem proposto nesta Casa e sistematicamente o Partido Socialista tem recusado?

Perguntamos, Sr. Ministro, se os portugueses que vivem ao longo da fronteira estarão loucos quando, hoje, correm ao mercado espanhol para comprar produtos de primeira necessidade, apesar de, em Espanha, se ganhar quase o dobro do que se ganha em Portugal. Que fenómeno será este? Como é que o Governo explica esta situação? Não será porque temos uma má política, que se traduz no agravamento do custo de vida, devido, nomeadamente, ao aumento do preço de bens essenciais, a saber, da energia, dos transportes, da saúde, do ensino, da água, etc.? Isto já para não falar da habitação, ou seja, dos juros dos empréstimos contraídos para a sua aquisição, que estão sempre a aumentar, e das rendas, que a nova lei do arrendamento vai permitir aumentar.

Sr. Ministro, Portugal pode vangloriar-se de estar no pelotão da frente de entre os países mais desenvolvidos no que respeita ao custo de vida, aos preços.

Só que, pergunto, quais são os salários nesses países, Sr. Ministro?

De quanto são as reformas nesses países, Sr. Ministro? E quais são os rendimentos das famílias nesses países, Sr. Ministro?

O Governo tem a táctica certa: quando se trata de preços, até é capaz de invocar países como a Áustria ou o Luxemburgo para dizer «olhem para ali! Os preços até são mais elevados do que em Portugal! Estamos bem!»; e quando se trata de salários, de reformas ou de rendimentos, provavelmente o Governo aponta países do Terceiro Mundo e diz «olhem para ali e vejam como estão bem!». De facto, o Governo, assim como a maioria que o apoia, tem sempre razão enquanto usar estes critérios para avaliar as reais condições de vida com que se debatem as famílias portuguesas.

Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: na verdade, por este andar e olhando para a situação em que já se encontram hoje as famílias portuguesas em termos de endividamento, não vamos lá! E se não há mais queixas é porque, eticamente, vamos fazendo o quê? Há alguns anos, quando recorríamos à banca, pedíamos empréstimos a um ano; depois, esse período foi aumentando e, agora, pedem-se empréstimos a 40 e 50 anos. Diz-se aos jovens que recorram à banca para pagarem os seus estudos e qualquer dia teremos um anúncio de um banco qualquer onde se vê um bebé com uma fralda na mão e onde se diz «use agora e pague daqui a 30 anos se conseguir emprego»!

Por este caminho, não vamos lá! Esta não é certamente a esquerda preocupada com o combate às desigualdades sociais.

Vou concluir, Sr. Presidente, e agradeço, desde já, a sua compreensão.

Há pouco, o Sr. Deputado que usou da palavra em nome da bancada do PS, parafraseando o Sr. Primeiro- Ministro, também do PS, e dirigindo-se à bancada do PSD, disse nesta Sala o seguinte: «O PSD fala, fala, fala, mas nós, Governo do Partido Socialista, fazemos a política que a direita não é capaz de fazer!».

Bravo, Sr. Ministro!... Mas, por este caminho, não vamos lá!! Por este caminho, não vamos seguramente melhorar as condições de vida de quem trabalha!!