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A agricultura nacional - Intervenção de Agostinho Lopes
Quinta, 15 Janeiro 2009

Ver imagem em tamanho realEm Declaração Politica, Agostinho Lopes denunciou o gravíssimo estado de desastre em que se encontra a agricultura nacional, "desastre que atinge os interesses nacionais no presente, mas que, fere a sustentabilidade agro-alimentar do País, no futuro. Desastre que agrava drasticamente a situação económica e social da generalidade dos agricultores portugueses, das suas estruturas cooperativas e associativas".

 

Declaração política de critica à política agrícola do Governo, que reduz a capacidade produtiva do país e empobrece os agricultores

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Queria falar-vos, hoje, da agricultura nacional.

Queria falar do enorme desastre que está, continua, em marcha acelerada. Desastre que atinge os interesses nacionais. Desastre que agrava drasticamente a situação económica e social da generalidade dos agricultores portugueses, das suas estruturas cooperativas e associativas.

Um desastre que tem como ponto de partida quatro principais factores:

Erradas opções de política, com a exclusividade atribuída à «competitividade» das fileiras e empresas agrícolas sem questionar sequer a complexidade desse objectivo no complexo contexto do mundo agrícola e rural português e dos mercados financeiros internacionais.

A continuidade da subserviência à União Europeia, isto é, aos interesses das grandes potências agrícolas e multinacionais agro-alimentares da Europa, como sucedeu nas reformas da Organização Comum de Mercado (OCM) dos hortofrutícolas, açúcar e vinho e no ámen à recente reforma da política agrícola comum (PAC), um êxito que só o Ministro da Agricultura consegue enxergar.

Uma política orçamental sob a ditadura do Pacto de Estabilidade, mas responsável pela perda e não utilização de milhões de euros de fundos comunitários não aproveitados ou devolvidos à procedência, como o escândalo da perda de 247 milhões de euros no Plano de Desenvolvimento Rural (RURIS), de seguramente mais de 100 milhões de euros no Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural (AGRO) e na medida Agricultura e Desenvolvimento Rural (AGRIS), de dezenas de milhões por não aproveitamento de todos os direitos do Regime de Pagamento Único, escândalo quando nos lembramos da reprovação de projectos pelo Ministério com o argumento da falta de verbas!

Política orçamental, principal causa do quarto factor, o desmantelamento do Ministério da Agricultura, via Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE), com a «expulsão» de milhares de trabalhadores, independentemente da sua qualificação, experiência e importância dos trabalhos que prestavam.

É um desmantelamento de serviços disfarçado de reestruturação, sem qualquer projecto ou plano definidos, lógica ou coerência de política agrícola, pura e simplesmente com o único tacanho e economicista objectivo de reduzir a despesa pública.

Srs. Deputados, a gravidade da situação, a dimensão do desastre que o Ministro agora procura esconder por trás da evolução dos rendimentos agrícolas em 2008 - para lá da leitura simplista ou simplória de um dado estatístico, esquece 2007 e o conjunto de quatro anos de governo! -, está bem presente na velocidade de substituição de responsáveis, transformados em peças descartáveis, bodes expiatórios dos falhanços da política agrícola, bem presente na velocidade com que se alteram leis orgânicas e outra legislação, às vezes com mudanças de 180.º.

As consequências são por demais evidentes.

Nenhuma propaganda o consegue esconder.

Em matéria do novo quadro comunitário de fundos agrícolas, depois da forma defeituosa como se trataram os últimos anos do III QCA, é difícil descobrir algo que esteja a correr bem: um Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER) atrasado dois anos na sua regulamentação e aplicação efectivas; 70% dos projectos de investimento do primeiro concurso eliminados liminarmente e a abertura de segundo concurso sem se conhecerem integralmente os resultados do primeiro; o não cumprimento dos prazos de emissão de pareceres sobre as candidaturas; critérios, como os do valor acrescentado líquido, que ninguém sabe bem como se calculam; exigências absurdas e contraditórias nas candidaturas jovem agricultor, com possível perda de apoios dos investimentos feitos em 2007 e em 2008, enquanto não se responde ao problema dos que ultrapassaram a idade de 45 anos; agricultores à espera de pagamentos desde a campanha 2006/2007, porque foram controlados e os dados do controlo não foram introduzidos no sistema por atraso dos procedimentos administrativos decorrentes do caos dos serviços e da falta de funcionários levados pela mobilidade especial; medidas agro-ambientais que deixaram de fora milhares de pequenos agricultores; a não consideração das áreas chamadas «pastagens pobres» no cálculo das indemnizações compensatórias; a promessa do Ministro do pagamento de adiantamentos das medidas agro-ambientais que foi esquecida; a farronca da imposição da modulação aos grandes beneficiários, mais uma vez rapidamente posta de lado.

O Governo pode bater o record, Srs. Deputados, de iniciar e acabar uma Legislatura sem ter aprovado e pago um único euro em novos projectos de investimento estruturante!

Ou seja, atrasos, falta de rigor, trapalhadas, desespero dos agricultores, associações agrícolas e funcionários, prejuízos para a agricultura e para o País.

Em matéria de política florestal, não bastava a responsabilidade do Ministério pela expansão do nemátodo, como a Comissão Europeia regista.

Outra praga avança rapidamente e em força: a da privatização de tudo o que ainda mexe no sector, de onde nada sobrará a não ser uma autoridade florestal, que terá talvez muita autoridade, mas nada de florestal, esvaziada por concessões, vendas, destruição pura e simples de serviços, estruturas, património público.

Não nos cansaremos de denunciar o crime político, económico e social que representa a entrega de matas públicas, como o Pinhal de Leiria, o Viveiro do Marão, o Centro Nacional de Sementes Florestais de Amarante ou os Viveiros de Valverde ou ainda os núcleos de raças autóctones, a que se acrescenta a tentativa de novo assalto aos baldios, através de subterfúgios legislativos, como os presentes na nova legislação das zonas de intervenção florestal (ZIF), ontem publicada em Diário da República.

Srs. Deputados, em matéria de estratégia da fileira do leite - bem alimentar essencial -, o Governo está, claramente, empenhado na sua destruição: começou na completa cedência à liquidação, em curso, das quotas leiteiras perpetrada pela Comissão Europeia; passa pelo arrastamento do errado processo de licenciamento das explorações pecuárias; contém uma política fiscal, nunca esclarecida, que atribui a taxa reduzida do IVA a produtos «lácteos» importados, de baixa qualidade; destaca-se pela exclusão da fileira, até hoje, dos apoios ditos «estratégicos» do PRODER; e, para culminar, mantém-se passivo ou cúmplice face ao abuso da posição dominante das grandes cadeias de distribuição, favorecendo a importação e produzindo stocks gigantescos de leite nacional.

Srs. Deputados, o Ministério da Agricultura e o Governo do PS prosseguem, com afinco e de forma sistemática, uma política de redução generalizada dos apoios nacionais à agricultura, com particular incidência na pequena e média exploração.

De facto, pode alguém informar-nos de algo que corra bem na política agrícola e rural para um sector estratégico da vida nacional, como é a nossa agricultura?

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Ricardo Martins,

Gostaria de começar por referir a tentativa de negar a realidade por parte do Ministro da Agricultura quando procura esconder a gravidade da situação com a evolução de 4,8% do rendimento agrícola em 2008 esquecendo que compensa, e mal, a perda de rendimento de 4,3% em 2007 e, particularmente, esquecendo que, no conjunto dos quatro anos, há uma perda de rendimento superior a 16%, o que dá uma média de 6% por ano durante a governação do Partido Socialista.

O PRODER é o caos completo e absoluto. Só quem não ouve as associações de agricultores, os agricultores, os funcionários do Ministério da Agricultura é que pode dizer, como o Sr. Ministro da Agricultura, que tudo está a correr pelo melhor, gabando-se, inclusive, de não sei quantos milhões de euros aprovados na base do PRODER.

É o caos porque o Ministério da Agricultura está a ser desmantelado, permanentemente, há cerca de três anos, através do PRACE - e esta é uma questão central, em relação à qual a direita tem também sérias responsabilidades, na medida em que sempre defendeu a redução do número de funcionários do Ministério da Agricultura.

É o caos porque uma política orçamental, subordinada ao défice orçamental, ao Pacto de Estabilidade, tem cortado as verbas necessárias à aplicação dos fundos comunitários, traduzindo-se neste desastre que esta Assembleia e o País deviam registar bem.

Ou seja, um País com as carências como o nosso, com os problemas no sector agrícola como o nosso tem, dos mais pobres da União Europeia, devolveu à União Europeia cerca de 300 ou 400 milhões de euros por falta de contrapartidas de verbas no orçamento nacional, enquanto se reprovaram dezenas de candidaturas ao programa AGRO e à medida AGRIS alegadamente por falta de verbas.

Penso que é isto que é preciso destacar na abordagem deste problema.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada  Alda Macedo,

Evidentemente, pode ter de haver novas devoluções de fundos, como aconteceu nos fundos do III Quadro Comunitário de Apoio, e não por falta de candidaturas.

É que o Sr. Ministro da Agricultura teve a «lata» de dizer que devolveu fundos por falta de candidaturas dos agricultores e das associações agrícolas.

Pode ter de os devolver pelo caos em que está mergulhado o Ministério da Agricultura, pela desorientação completa que, neste momento, está instalada em matéria de aplicação de fundos comunitários.

Gostaria que não ficássemos apenas pelos fundos e que lembrássemos também outros aspectos da «notável» política agrícola deste Governo, como, por exemplo, a liquidação das ajudas à electricidade verde; a burocracia no acesso ao gasóleo agrícola - pelos vistos, o Simplex não existe para a agricultura nem, no sector agrícola, os ministérios conseguem pôr a circular os dados entre eles -; a subida dos custos da água; a eliminação do pagamento de indemnizações compensatórias abaixo de 1 ha; a liquidação das medidas agro-ambientais para milhares de agricultores; a expulsão do sistema público de segurança social de centenas de agricultores porque não têm rendimentos suficientes para continuar nesse sistema.

Estamos a regressar a um período não imediatamente antes do 25 de Abril mas a meados do período da ditadura de Salazar!

Todos sabemos que a segurança social para os agricultores foi criada em vésperas do 25 de Abril.

Ora, com a actual política, estamos a regressar a um período anterior a esse. Podemos dizer que este Governo nem sequer implementou as promessas feitas acerca de um seguro agrícola capaz. Depois de quatro a prometer este seguro, o Governo continua a entregar, todos os anos, milhões de euros às companhias de seguros sem que os agricultores tenham um seguro agrícola capaz.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado,

Diz que temos o discurso da desgraça, da crise. Foi exactamente para esse discurso que os senhores deviam ter estado mais atentos durante 2007 e 2008, para não estarem agora a responder com atraso aos problemas que o País enfrenta.

Sr. Deputado Jorge Almeida, se faço o discurso da desgraça, gostaria que o Ministro da Agricultura, na audição de há oito dias, o Sr. Primeiro-Ministro, ontem, ou o Sr. Deputado, hoje, me dessem resposta às questões colocadas ao Ministério da Agricultura e às quais ele não responde.

Certamente, não é por qualquer desgraça mas porque não têm respostas, Sr. Deputado Jorge Almeida!

Relativamente ao PRODER e ao referido atraso, Bruxelas «tem as costas largas», mas os problemas de hoje não são das costas largas de Bruxelas, são da responsabilidade do aparelho do Ministério da Agricultura, que não consegue responder a tempo e horas àquilo que está colocado, para lá de uma legislação manifestamente desadequada nos seus critérios, nos seus objectivos e nos procedimentos estabelecidos.

Não há perda de milhões, agora? Vamos ver! Relativamente ao anterior, houve perda de milhões.

E não foi só este Governo, o anterior também fez perder milhões...

Referi-me ao III Quadro Comunitário de Apoio, Sr. Deputado Jorge Almeida.

Mas posso dizer-lhe que os senhores perderam, do anterior Quadro Comunitário de Apoio, muitas dezenas de milhões de euros do RURIS, como o senhor sabe, pela suspensão das medidas agro-ambientais.

Ou será que o senhor se esquece de tudo aquilo que foi debatido nesta Câmara sobre esta matéria?

Sr. Presidente,
Sr. Deputado,

Quanto à questão da modulação, quem aqui diz umas vezes umas coisas e, sobretudo, depois faz o contrário, não é o PCP.

É o Grupo Parlamentar do Partido Socialista! Mais uma vez vou contar-lhe a história, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado não encontra uma única declaração contra a modulação. Desafio-o a encontrar nos Diários da Assembleia da República de há 10 ou 20 anos qualquer palavra do PCP contra a modulação, bem pelo contrário, defendemos sempre a modulação.

Agora, os governos do PS, os Ministros da Agricultura e os Deputados do Partido Socialista é que fazem exactamente o contrário.

O senhor esquece-se que o Ministro Capoulas Santos aprovou, com o nosso apoio, nesta Câmara, uma lei de modulação, em Março, e que, em Setembro, a suspendeu?

O senhor esquece-se que este Ministro passou meses a fazer discursos a favor da modulação, contra os grandes beneficiários, e que agora suspendeu a modulação, Sr. Deputado?!

Não é o PCP que muda de opinião acerca desta matéria. No Partido Socialista é que «a cara não diz com a careta», ou seja, não é capaz de fazer aquilo que diz ou, pelo menos, que indicia nos discursos.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Abel Baptista,

Obrigado pelas questões que colocou.

Tive oportunidade de referir que o Sr. Ministro da Agricultura e, ontem, o Sr. Primeiro-Ministro fizeram uma leitura simplista, diria mesmo simplória, de um dado estatístico, esquecendo todo o contexto do número que estão a utilizar.

Já referi aqui que os dados conhecidos esquecem o ano 2008, em que houve uma quebra significativa, e, sobretudo, todo o período de quatro anos do mandato deste Governo.

Há que dizer ainda que, do ponto de vista do cálculo do rendimento que é anunciado, esquece-se a diminuição, por liquidação, do número de explorações agrícolas e da própria população activa agrícola, exactamente em consequência da desastrosa política agrícola, o que acaba por dar os resultados que são conhecidos.

O que está em cima da mesa é esta redução de população e de explorações agrícolas ligada a uma ligeira subida dos subsídios comunitários.

No fundo, é isso que está na base daquele número.

Estranho seria que fosse diferente quando, como tive oportunidade de dizer, com estas políticas governamentais, os custos de produção subiram brutalmente - sementes, adubos, gasóleo, a electricidade sem a tal ajuda e, agora, também a taxa da água - enquanto, contrariamente ao que diz o Governo, estão a cair, e profundamente, os preços de praticamente todos os produtos agrícolas, como o azeite e a própria cortiça, que, recentemente, sofreu uma brutal queda de preço, arriscando-nos a que, este ano, grande parte da cortiça deixe de ser extraída.

Em conclusão, o verdadeiro rendimento das explorações agrícolas, se é que não se manteve estagnado, como é minha ideia e os resultados irão demonstrá-lo, sofreu mesmo uma queda real.

Todas as políticas relativamente a 2009, inclusive os dados do Orçamento do Estado que são conhecidos, apontam para que, infelizmente, vai continuar a situação de ruína da agricultura portuguesa.