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Lei da Estabilidade Orçamental, que altera a Lei n.º 91/2001 - Intervenção de Lino de Carvalho
Quarta, 10 Julho 2002

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,

Disciplina nas finanças públicas, controle da despesa, rigor orçamental, luta contra o desperdício e a má despesa, dever de solidariedade entre todos os subsectores do Sector Público Administrativo, capacidade do Ministro das Finanças em obter informação adequada de todo o SPA incluindo informação do Banco de Portugal e demais instituições financeiras, são objectivos que seguramente não sofrem contestação e que, desde sempre, deveriam enquadrar toda a disciplina e execução orçamental. O que espanta é que este conjunto de objectivos não fizessem ainda parte da nossa ordem jurídico - financeira e, sobretudo, da ordem de preocupações primeiras de todos os responsáveis pela gestão dos dinheiros públicos. O que surpreende e se critica severamente é que tal só tenha sido agora proposto por imposição de Bruxelas e por respeito para com o Pacto de Estabilidade. E o que não se compreende é que para prosseguir objectivos respeitáveis o Governo, mais uma vez e desnecessariamente, se tenha precipitado por atalhos que questionam a constitucionalidade da Proposta de Lei; tenha optado por soluções que penalizam os que menos contribuem para o desequilíbrio das finanças públicas, designadamente as autarquias locais, em prejuízo de adopção de medidas no âmbito do aumento da receita fiscal através de uma maior eficiência da Administração Fiscal e do combate á fraude e à evasão.

Vejamos estes argumentos, um a um:

1.º - Dispõe o art.º 92.º da Proposta de Lei que as medidas visando um maior controle das finanças e da despesa pública só vigoram "até á plena realização do Pacto de Estabilidade". Porquê ? Fora do Pacto de Estabilidade já pode vigorar a indisciplina e o descontrole ? Esta disposição é bem o exemplo da total dependência dos mecanismos de raciocínio e de decisão do Governo em relação a Bruxelas. Aparenta mesmo ser um sinal de irresponsabilidade e de manifesta falta de confiança dos Governos portugueses nas suas próprias capacidades e vontade para assumirem medidas de controle orçamental e financeiro que devem ser sempre um objectivo em si mesmo, independentemente das ordens do exterior.

Mas mais. O Governo define, no art.º 81.º n.º 2, a estabilidade orçamental como uma "situação de equilíbrio ou excedente", isto é, amarra esta noção, também aqui, para todo o sempre, ao PEC; e ao tecnicamente insustentável e politicamente errado défice zero. Confundindo estabilidade com equilíbrio anual do Orçamento e responsabilidade financeira. Não é pois uma Lei com preocupação de estabilidade orçamental, mas sim uma Lei de estrita submissão ao PEC. O que é claramente excessivo e estrategicamente errado.

2.º - Para conseguir os objectivos a que se propõe o Governo institui, mal, a possibilidade de não cumprir as Lei das Finanças Locais e Regionais e de pôr em questão, de forma não completamente clara nos termos em que está formulada, a própria Lei de Bases da Segurança Social. Ora, no que toca às duas primeiras, a forma legislativa que o Governo adopta é claramente inconstitucional. Por esta proposta de lei o Governo altera o regime financeiro das regiões autónomas e das autarquias locais mas para tanto deveria propôr a alteração das respectivas Leis, que têm valor reforçado.

3.º - O caminho da eventual não transferência para as Autarquias Locais, para as Regiões Autónomas e para o Sistema Público de Segurança Social dos meios financeiros a que todos têm direito pela aplicação dos respectivos regimes merece o nosso total desacordo. É certo que o Partido Socialista se preparava para fazer o mesmo, indo até mais longe, porque não só atribuía mero carácter indicativo às transferências financeiras impostas por lei como incluia na possibilidade de cortes as próprias Universidades, como se pode ler no "Relatório sobre as Medidas para uma Política Sustentável de Estabilidade e Controle da Despesa Pública", da responsabilidade de um grupo de trabalho dirigido pelo Dr. Sousa Franco e que, com a chancela do então Ministro Guilherme de Oliveira Martins, foi entregue à Assembleia da República. Mas a verdade é que, como aliás o demonstram os quadros informativos anexos ao relatório Sousa Franco, a Administração Regional e Local, a Segurança Social e o próprio subssector Estado diminuiram, entre 1990 e 2000, o seu peso na estrutura tanto da despesa total sem juros como da despesa corrente primária, passando neste último caso, respectivamente de 9,4% para 9,2%; de 26,6% para 25,0% e de 37,3% para 32,9%. O que não quer dizer que não deva haver também nestes subsectores medidas de disciplina e controle financeiro. Mas não pela violação das leis financeiras respectivas.

4.º - Já a situação nos Serviços e Fundos Autónomos é diferente porque aqui, sim, há uma efectiva indisciplina e falta de controle tradicional por parte do Ministério das Finanças. São, aliás, os SFA's que aumentaram a sua responsabilidade na estrutura da despesa corrente primária passando de 26,8% para 33,0% entre 90 e 2000. É por isso que, aqui, não nos repugna um muito maior rigor no controle financeiro e nas condições para que os respectivos organismos possam ser dotados de autonomia financeira.

Mas é estranho que o Governo avance com uma exigência de aumento para 2/3 das receitas próprias, que vai ter evidentes consequências sobre o estatuto e o funcionamento de muitos dos organismos dos SFA's, sem ter claramente definido o elenco dos que vão ser atingidos por esta medida. É de novo a história da lista dos Institutos sujeitos a extinção ou reestruturação no Orçamento rectificativo. Legisla-se mas sem se conhecerem e medirem bem os efeitos das políticas que se adoptam.

5.º - Mas o que é incompreensível é que o Governo optando pelo caminho que nos propõe nada diga sobre a gestão do sector empresarial do Estado; nada proponha do lado da receita, designadamente quanto a medidas de combate à fraude e à evasão e à tributação dos grandes rendimentos patrimoniais (sabendo que é neste lado que se situam os maiores problemas); continue a não querer mexer no sigilo bancário (a não ser, pelo que se vê, em matéria de informação exigida às autarquias locais); o que aliás, torna ineficazes as medidas propostas como sublinha o Tribunal de Contas; nada avance quanto à articulação entre os diversos organismos responsáveis pela arrecadação da receita e quanto à organização dos meios humanos e informáticos respectivos; não envolva o Tribunal de Contas em todo este processo, designadamente disponibilizando-lhe mais meios e mais informação em tempo real e ainda por cima adie para 2004 a entrada em vigor das normas mais inovadoras da Lei de Enquadramento Orçamental que constituem um importante instrumento de informação e de criação de condições para o exercício de controle sobre o Orçamento de Estado e a sua execução por parte da Assembleia da República e do Tribunal de Contas.

6.º - Nem se compreende o adiamento que é proposto de aplicação das normas mais inovadoras da LEO. Porque razão, por exemplo, se adia a entrada em vigor da obrigatoriedade de apresentação dos mapas orçamentais que identifiquem as obrigações financeiras plurianuais do Estado, que foi, e bem, um dos grandes motivos de crítica do PSD na legislatura passada ? Virão aí mais SCUT's e mais leasings ?

O Governo e os analistas pressurosos que fazem ecoar a sua voz insistem permanentemente no elevado nível da despesa pública em Portugal. E mais uma vez é preciso dizer que não é verdadeira essa acusação que envolve claros propósitos ideológicos para criar um ambiente de aceitação de políticas de desresponsabilização do Estado e de alienação de patrimónios publicos e de privatização de políticas públicas, designadamente no plano social. De novo é preciso repetir que a despesa corrente primária de Portugal em percentagem do PIB é da ordem dos 36% e na zona Euro é de mais de 40%.

É por isto tudo que estando de acordo com a necessidade de disciplina e rigor quanto à gestão dos dinheiros públicos, tal como desde sempre temos reclamado, o PCP discorda em absoluto da maioria das soluções que o Governo apresenta nesta Proposta de Lei. Existem outras, melhores, mais eficazes, não penalizadoras do crescimento económico, não atentatórias da autonomia das autarquias locais e das regiões autónomas, não constrangedoras para o Sistema Público de Segurança Social, como as que referimos. Esse é o caminho que continuamos a preferir.

 

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