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Sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez - Intervenção do Deputado Octavio Teixeira
Quinta, 20 Fevereiro 1997
Debate dos Projectos de Lei nºs 177/VII, 235/VII e 236/VII

 

O PCP trouxe hoje à Assembleia uma questão real e difícil da situação das mulheres em Portugal. Uma questão social, de saúde pública e de política criminal. Pela nossa parte, quisemos e empenhámo-nos num debate sério, ponderado e profundamente virado para a realidade nacional, e não um debate extremado, cego e demagógico. Como sempre o fizemos e hoje mesmo abundantemente o repetimos, para nós, para o PCP, a permissão do aborto em determinadas circunstâncias não se substitui à necessidade de a nossa sociedade promover as condições económicas e sociais que permitam à mulher criar e educar os filhos que deseja, nem se sobrepõe ou substitui ao planeamento familiar e à educação sexual. É para nós inequívoco que a interrupção voluntária da gravidez não é, nem pode ser usada como, um meio contraceptivo. É sempre um último recurso, um facto penoso, difícil e traumatizante para a mulher.

Com a apresentação do nosso projecto de lei e a utilização de um direito regimental para impor a sua discussão e votação, o PCP quis e quer combater o flagelo social do aborto clandestino. Combate esse que se não faz pela via da dissimulação, como a que nos é oferecida pelos que agora se agarram à invocação do planeamento familiar para impedir a despenalização do aborto, quando antes difamaram a legislação nessa matéria, e que pouco ou nada fizeram e fazem para que se concretize plenamente esse direito no nosso País, nomeadamente nas zonas do interior e junto das camadas populacionais mais desprotegidas. Do mesmo modo que esse combate necessário não se faz com a consagração da sentença de que "desde que seja proibido, podem fazer-se abortos". Opinião em cuja defesa incorrem, ao fim e ao cabo, aqueles que se opõem à exclusão da ilicitude do aborto, mas não exigem paralelamente a maior eficácia da aplicação da lei no sentido de sujeitar a prisão os muitos milhares de mulheres que recorrem ao aborto. Quer as mulheres sem condições económicas que são empurradas para o aborto clandestino realizado sem quaisquer condições de segurança, quer as mulheres da média e alta burguesias que o realizam em qualquer boa clínica - no País ou no estrangeiro. Aliás, durante todo o debate fizemos uma pergunta aos opositores ao projecto de Lei do PCP: querem os Senhores Deputados que essas mulheres sejam presas? Sintomaticamente nenhum desses deputados respondeu à nossa pergunta! Nem se combate esse flagelo social com uma oposição à despenalização do aborto por razões filosóficas ou religiosas, mas que simultaneamente desemboca na manutenção do drama do aborto clandestino. Porque o aborto clandestino existe. Apesar de a lei o proibir. Muitas mulheres morrem ou sofrem graves lesões físicas e psíquicas para toda a vida, em consequência das condições em que o fazem. Senhores Deputados

Fazemos um esforço sincero para compreender que razões de ordem filosófica ou religiosa possam criar problemas de opção e decisão a Deputados que são chamados a votar esta lei. Mas o nosso apelo vai no sentido de que ponderem que o seu voto favorável, em boa verdade, não representará nenhuma denegação dos valores em que acreditam. Porque a questão que hoje está em debate não é ser-se a favor ou contra o aborto, condenar ou não o aborto. O aborto é sentido por todos, e principalmente pela mulher que a ele recorre, como um último recurso, um mal a prevenir e evitar. A questão sobre que hoje verdadeiramente os Deputados se têm de pronunciar, todos nós, é se o aborto deve continuar a ser feito clandestinamente como hoje sucede, ou se deve passar a ser feito em serviços de saúde, em condições que salvaguardem a vida, a saúde e a dignidade da mulher. O aborto pode ser um problema de consciência para a mulher que decide abortar ou para o médico que é chamado a intervir. Mas o que está em causa para o Deputado, enquanto legislador, não é de índole moral ou ética. O que o legislador tem o dever de decidir é se, dentro de certo prazo de gestação, a mulher que em sua própria consciência não pode continuar a gravidez deve ser punível à face da lei e ser obrigada a recorrer ao aborto clandestino; ou se se lhe deve legalmente dar a possibilidade de conscientemente interromper a gravidez em condições de saúde e segurança, sem sujeição a punição criminal. Aprovar uma lei de despenalização do aborto, senhores Deputados, não significa uma obrigação a seguir por quem sobre o aborto tenha um entendimento diferente, já que as consciências e convicções individuais podem e devem seguir as suas próprias orientações. Inversamente, nas questões de consciência individual, o que o legislador não pode nem deve permitir é que a lei imponha a todos os cidadãos as convicções e regras de comportamento sufragadas apenas por uma parte da sociedade, assim violando e restringindo objectiva e ilegitimamente a consciência dos que têm outras e diferentes regras e convicções, igualmente legítimas e respeitáveis.

Esperamos que votem com a consciência clara e assumida de que o projecto de lei do PCP (tal como o subscrito por mais de cinco dezenas de Deputados do PS) não propõe aos Deputados que obriguem quem quer que seja a fazer um aborto. O que propõe é que os Deputados, pelo seu voto, assegurem que cada uma das mulheres portuguesas, nas primeiras doze semanas de gestação, possa escolher livre e conscientemente do recurso à interrupção da gravidez. E que, se assim o decidir como resposta às suas angústias, o possa fazer em condições de segurança e dignidade, independentemente da sua condição económica e social. É isso, e apenas isso, que o projecto de lei do PCP propõe e que os Deputados têm de decidir. É isso, e apenas isso, que uma lei da República deve garantir. São essa responsabilidade política e essa solidariedade social que são devidas pelos Deputados da República às mulheres portuguesas.

 

 

 

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