Partido Comunista Portugu�s
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Iniciativa dos cidadãos de propor a realização de consultas locais - Intervenção de José Calçada
Quarta, 09 Abril 1997

Projecto de Lei nº 128/VII, do PCP, que atribui à iniciativa dos cidadãos o poder de propor a realização de consultas locais
Intervenção de José Calçada

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados:

Por força da Lei nº 49/90, de 24 de Agosto, apenas as assembleias ou os órgãos executivos da autarquia, ou um terço dos membros das assembleias ou dos órgãos executivos da autarquia em efectividade de funções, podem assumir a iniciativa de apresentar propostas sobre a realização de consultas locais. No essencial, o que pretendemos com a apresentação do nosso projecto nº 128/VII é que, para além das entidades atrás referidas, possam também tomar a iniciativa de propor a realização de consultas locais os cidadãos eleitores da área da respectiva autarquia local, não podendo a proposta ser apresentada por menos de 1/10 dos eleitores recenseados na área da respectiva autarquia, não sendo no entanto em nenhum caso exigível um número de proponentes superior a 5.000 cidadãos eleitores. Entendemos estes números como sensatos e razoáveis, politicamente e quantitativamente, sob pena de, se mais restritivos fossem, esvaziarem de sentido útil o próprio conteúdo do nosso projecto de lei. Não pretendemos montar um simples cenário de aparências, simulando dar aos cidadãos com uma das mãos aquilo que afinal se lhes retiraria com a outra.

Se se visa, como é o caso do nosso projecto, garantir o acesso dos cidadãos ao exercício do poder político local, facultando-lhes um instrumento para suscitarem uma tomada de decisão sobre determinada matéria com plena eficácia jurídica -- mal seria que tal se fizesse em termos tais que, na prática, viessem a anular essa faculdade. Como expressão que são da democracia participativa, as formas de intervenção dos cidadãos nas actividades da Administração Pública e no próprio exercício do poder político nomeadamente do poder político local, devem ser estimuladas e reforçadas. É dentro deste entendimento que, para o artigo 241º da Constituição da República e em sede da CERC, foi possível até ao momento atingir-se a seguinte sugestão de redacção, e cito: "As autarquias locais podem submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas suas atribuições, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei estabelecer, a qual pode admitir a iniciativa dos cidadãos eleitores" (fim de citação). Aliás, se bem que circunstancialmente, esta redacção é exemplar, pela positiva, das potencialidades institucionais de um funcionamento política e eticamente sério da CERC -- e, por contraste, torna ainda mais saliente e condenável o negócio global engendrado pelos estados-maiores do PS e do PSD em matéria de revisão constitucional, à revelia desta Assembleia, à revelia da respectiva Comissão, à revelia ainda da generalidade dos deputados dos seus grupos parlamentares, e contrariando frontalmente compromissos eleitorais e programáticos do Sr. Engº Guterres e do seu Governo.

Os que dizem pretender a vivificação da democracia representativa através de formas de reforço da participação do cidadão pela via da democracia directa -- não podem, por outro lado, subverter princípios e práticas fundamentais de representatividade até agora consagrados na Constituição da República. Tal comportamento, no mínimo, levar-nos-ia a olhar com justificada suspeição os seus esforços com vista ao reforço da democracia directa, esforços que estariam enfermos de uma incurável hipocrisia política e de um oportunismo de todo inaceitável.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados:

Mais do que questionarmos a oportunidade deste debate, o importante é que ele nos permita concluir da existência nesta Assembleia de uma vontade real de abertura à participação popular, à participação dos cidadãos, no domínio que ora apreciamos, domínio em que, independentemente dos critérios de interpretação da Constituição da República, tem vindo a assumir um peso determinante e restritivo a nossa forte tradição centralista.

Pela nossa parte, e com o nosso projecto, estamos a dar um contributo sério para uma real abertura à participação. E fazemo-lo à luz da Constituição da República existente -- e não à luz daquela outra, ou daquelas outras, que por aí correm na penumbra dos corredores, ou no "secretismo" das primeiras páginas dos jornais.