Os ventos podem mudar
Speech - Fausto Bertinotti - Secretário Geral do Partido
da Refundação Comunista de Itália
Os ventos podem mudar de direcção, na Europa. Vivemos meses muito
importantes para os jovens, as mulheres, os desempregados, os trabalhadores,
os reformados, para diferentes camadas sociais, para as massas populares da
Europa. Vivemos meses importantes porque a ofensiva contra a sua condição pode
vir a enfrentar novas resistências e porque, a partir deste conflito, podem
surgir formas de luta mais adequadas, em torno de objectivos que ganhem nova
força, credibilidade e vigor.
Os ventos podem mudar.
Vivemos meses importantes para as esquerdas, para as forças
antagónicas, para os comunistas europeus. Vivemos meses
importantes porque podem vir a cair exclusões e vetos
anti-comunistas, porque podem vir a afirmar-se novos –
embora difíceis – caminhos de unidade na luta entre forças
diversas.
Os ventos podem mudar, na Europa.
Cabe-nos a nós, em primeiro lugar, fazê-los mudar. Mas hoje
este objectivo começa a ser possível. As políticas neoliberais
são, e serão cada vez mais, agressivas. Visam reduzir o
trabalho e os trabalhadores a meras mercadorias, que se podem
usar e deitar fora quando deixam de servir. Visam destruir as
conquistas sociais de meio século de lutas. Visam destruir o
Estado Social. Os interesses e as forças que promovem as
políticas neoliberais são fortes. Mas já não conseguem
esconder a sua crise. A Europa de Maastricht e das políticas
neoliberais é um continente rico. Mas no seu seio aumentam
dramaticamente a pobreza e as exclusões. Aumenta o número de
pobres e a miséria volta a afectar mesmo aqueles que já se
haviam libertado dela através de grandes lutas. Mas a
condenação mais irrevogável da Europa de Maastricht é o
desemprego: um desemprego duro, pesado como uma rocha, um
desemprego em massa que esmaga a civilização europeia, que
corrói as suas bases e mina a coesão social. Não existe
civilização, não existe civilização europeia, lá onde
existe desemprego em massa.
As próprias economias nacionais marcam passo. A própria
perspectiva da moeda única europeia torna-se incerta. A Europa
dos bancos e das empresas esmaga a política, corrói a
democracia e enche-nos de desempregados. Para não ter de
enfrentar a crise das políticas liberais, agora as classes
dominantes e os eurocratas, ou seja, os adversários da Europa
dos povos, partem ao assalto do Estado Social, ou seja, da base
material da Europa. Sem o Estado Social, a Europa torna-se uma
província dos Estados Unidos da América. Sem o Estado Social a
Europa transforma-se num território dominado pelas leis da
globalização capitalista, um território sem qualidade. A
ofensiva liberal contra o Estado Social deve e pode ser travada.
A luta pela reforma do Estado Social pode ser o ponto de partida
para uma contra-ofensiva de classe, democrática, das mulheres e
dos homens da Europa.
Novos sujeitos sociais podem vir a ser mobilizados; novas
culturas críticas podem crescer; um novo bloco social pode
começar a delinear-se; as esquerdas antagónicas podem pôr na
defensiva as social-democráticas e moderadas.
Os ventos na Europa podem mudar.
Em todos os países crescem lutas importantes, que
infelizmente não se têm encontrado ao nível europeu. Há que
lutar para unificá-las. A greve europeia dos trabalhadores da
Renault indica uma perspectiva de trabalho. Os patrões estão
unidos em torno das políticas de globalização. Nós também
temos de saber fazê-lo.
Os trabalhadores têm muitas razões de descontentamento e de
protesto, mas os sindicatos não os têm organizado com
objectivos avançados e em lutas unificadoras. Temos de empurrar
o movimento sindical onde quer que hoje não ocupe as posições
que devia ocupar, à cabeça dos trabalhadores com empregos
estáveis e precários, dos desempregados, dos trabalhadores que
estão nos seus próprios países e dos trabalhadores imigrados,
a fim de construir uma nova unidade na luta.
Os patrões pretendem até aumentar a idade de reforma dos
trabalhadores. Querem menos trabalhadores, mas que trabalhem
mais. Seria um desastre para a Europa. Acabaria por não
sobreviver nem o Estado Social, nem a democracia. A fim de
reformar o Estado Social, a fim de alargar a democracia, a Europa
tem de mudar de rumo, tem de optar pela via da alternativa. É
preciso trabalhar menos, e que trabalhem todas e todos. Comecemos
este novo curso ligando a defesa e a reforma do Estado Social à
construção dum movimento, em todos os países europeus, pela
redução do horário de trabalho sem redução de salários.
Em Itália, onde derrotámos a direita, ainda não
conquistámos uma política de reformas. Mas foi travada a
exigência dos patrões e da direita de cortar as pensões e a
saúde.
Blair não representa uma política alternativa, mas os
conservadores foram derrotados na Grã-Bretanha. Se, como
desejamos, as esquerdas vencerem em França, muitas coisas
mudarão em toda a Europa.
Sim, os ventos podem mudar na Europa.
Mas, em última análise, só mudarão se novas lutas sociais
surgirem, se se tornar visível uma alternativa a Maastricht, se
a esquerda anticapitalista se tornar protagonista dum
renascimento mais amplo de todas as esquerdas, se começar a
nascer uma outra Europa, a nossa Europa, a Europa dum novo modelo
social, do modelo social do pleno emprego, de um trabalho digno
para todas e para todos. Apenas nós estamos em condições de
empreender este novo rumo. Façamo-lo!
Os ventos podem mudar!
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