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«Hoje e amanhã» - Vítor Dias no «Semanário»
Sexta, 16 Janeiro 2004
16 de Janeiro de 2004

Em conjunto, os últimos desenvolvimentos em torno da luta pela despenalização do aborto – e nomeadamente o agendamento para 3 de Março pelo PCP do seu projecto de lei, o anúncio pelo PS da apresentação em simultâneo de um seu projecto de lei e de um seu projecto de resolução para um referendo e a reforçada insistência por alguns sectores de esquerda na ideia do referendo como «o único caminho» - são susceptíveis de instalar alguma confusão em alguns espíritos e, por isso, justificam da nossa parte quatro observações essenciais.

A primeira destina-se a lembrar a quem disso já se tenha esquecido que a sujeição a Referendo, em 1998, da despenalização do aborto, escandalosamente decidida já depois de ter sido aprovado na generalidade na AR uma nova lei, resultou de uma infame combinação entre António Guterres (e o PS) e Marcelo Rebelo de Sousa (e o PSD) que foi então justa e indignadamente condenada por todas as forças e correntes políticas à esquerda do PS e por centenas de personalidades vinculadas à defesa daquela despenalização. Importa também recordar que, nos quatro anos seguintes (1999, 2000, 2001 e 2002), sem qualquer quebra significativa, todas essas forças (designadamente PCP, Bloco de Esquerda, «Os Verdes») e todo um vasto campo de personalidades se mantiveram firmes na defesa da integral legitimidade de a AR, querendo, voltar a legislar sobre o assunto. E tanto assim é que em Dezembro de 2001, em cima do julgamento da Maia, centenas de personalidades identificadas com essas áreas políticas subscreveram uma declaração da iniciativa da «Plataforma pelo Direito de Optar» que concluía assim : «exigimos que esta questão volte à Assembleia da República e que seja aprovada uma lei que despenalize a interrupção voluntária da gravidez até às 12 semanas». E remate-se então este ponto assinalando que, sendo cada um livre de mudar de opinião , já não tem o direito de exigir que outros mudem de opinião à mesma velocidade e, em qualquer caso, devia ter o cuidado de não falar de modo que faça António Guterres sorrir de satisfação e julgar que está perdoado.

A segunda observação visa sublinhar que, em nosso entender, a explicação mais benévola para o facto de uma determinada área política ter mudado de posição e ter passado a colocar toda a prioridade na convocação de um referendo parece ser a de que, além da conhecida posição da direita de só por novo referendo se poder voltar a decidir sobre a questão, também a posição do PS com a direcção de Ferro Rodrigues ter passado a ser essa, assim se formando naquela área a consideração táctica de que haveria mais dificuldade em dizer não a um referendo do que à aprovação de uma lei pela AR. Como se calculará, os comunistas não partilham desta visão nem deste juízo e, em qualquer caso, não se disporiam a empunhar bandeiras que historicamente ficam melhor nas mãos de outros. Mas agora não é esse o ponto, porque o ponto está em que é muito desagradável e chocante que seja precisamente no momento em que o PS, sob o impacto do julgamento de Aveiro, flexibiliza a sua anterior posição e passa a afirmar em declarações de Ferro Rodrigues e António Costa a irrepreensível legitimidade de a AR legislar sobre o aborto que o Bloco de Esquerda venha enfatizar a ideia do referendo como «o único caminho» e que mãos e cabeças pouco ponderadas se ocupem a desenhar panos onde escrevem que «o aborto é um direito/sem referendo nada feito».

A terceira observação pretende anotar que não corresponde propriamente a uma muito autoproclamada «nova forma de fazer política» que os promotores da recolha de 75 mil assinaturas para uma petição para um referendo, durante mais de um ano dela sempre tenham falado em termos que não só não contrariavam como antes estimulavam o monumental equívoco de que , uma vez garantida essa recolha, isso significava automaticamente a convocação de um referendo sobre o aborto. De facto, consultam-se dezenas de declarações e de notícias e o que sempre se encontra são fórmulas como a de que essas assinaturas visam «permitir a realização do referendo», «são necessárias para a realização de um novo referendo», «para forçar uma nova consulta popular» ou para «desencadear a nível da AR o processo de realização de um novo referendo».

Seria compreensível e respeitável que os promotores da petição valorizassem a recolha das 75 mil assinaturas como uma importante manifestação e afirmação de uma corrente de opinião. Mas, até porque há sempre um dia seguinte, já não o é o silenciar por sistema que essa petição só leva à discussão da proposta na AR, que a sua sorte está tanto nas mãos da maioria de direita como um projecto de lei e que qualquer partido pode provocar a discussão e votação de um novo referendo (como o BE fez com a Constituição europeia).

A quarta observação é no sentido de que o máximo empenho e energia na obtenção de uma solução imediata não pode prudentemente esquecer o futuro e a eventual necessidade de continuação desta luta. E, nessa perspectiva, seria um péssimo serviço prestado à causa da despenalização do aborto, que palavras hoje ditas criem a inaceitável tese de que, também quando houver uma nova maioria na AR, o referendo continuará a ser «o único caminho».

 

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