É preciso mudar a Europa
Mensagem de Robert Hue - Secretário-Nacional do Partido
Comunista Francês, lida por Francis Wurtz
Permitam que antes do mais vos diga quanto lamento não poder estar
convosco hoje. Mas, vós sabeis: vota-se amanhã em França. Obrigações incontornáveis
retêm-me em Paris. Estou certo que compreendem. Dirijo a todas e a todos as
mais fraternais saudações do Partido Comunista Francês!
Obrigado e parabéns ao Partido Comunista Português por ter
tomado a iniciativa de uma tão impressionante concentração!
Este grande comício repercute um movimento profundo que se sente
crescer na Europa. Um movimento de protesto e de cólera. E,
simultaneamente, um movimento de conquista e de construção, que
põe cada vez mais largamente na ordem do dia esta exigência de
grande alcance: é preciso mudar a Europa!
As nossas instituições comuns devem permitir que nos
entreajudemos a promover o emprego, as capacidades humanas e o
progresso social; a favorecer os intercâmbios humanos e o
cruzamento das culturas; a consolidar a paz no continente; a
contribuir para a solução dos grandes problemas
contemporâneos: o desenvolvimento, o desarmamento, o meio
ambiente.
Mudar a Europa nesta direcção exige lutar, cada um de nós
nos seus países respectivos, e juntos na Europa. É preciso
acabar com os negócios escandalosos como os da Renault-Setúbal
e da Renault-Vilvorde! É preciso libertarmo-nos do garrote dos
"critérios de convergência" e do "Pacto de
estabilidade"! É preciso banir a teoria dominadora do
"núcleo duro" germano-francês contra a Europa do Sul!
É preciso sair do impasse duma Europa "otanisada". É
preciso recusar a fatalidade da actual
"mundialização" em nome da qual os grandes grupos
capitalistas querem pôr-nos todos em concorrência, para fazer a
felicidade dos mais poderosos com a infelicidade da grande
maioria!
Naturalmente, não mudaremos a Europa a partir do topo, mas a
partir de cada uma das nossas sociedades singulares. Assim, na
campanha eleitoral em curso, os comunistas franceses esforçam-se
por mobilizar os cidadãos a partir das suas aspirações
próprias, sobre uma concepção da Europa alternativa à Europa
do mercado único e do Tratado de Maastricht. Nós dizemos: o
aumento dos pequenos e médios salários, é necessário! A
redução imediata da duração do trabalho para 35 horas
semanais, sem perda de poder de compra, é necessária! Para
melhorar a vida das pessoas. Para criar empregos. E para dar uma
chicotada na própria economia, hoje asfixiada pela marcha
forçada para a moeda única.
É claro que para empreender esta política, é preciso obter
os meios. Por um lado, uma outra utilização do dinheiro: com um
sistema fiscal e créditos que favoreçam o emprego e a vertente
social, e penalizem os investimentos financeiros. Por outro lado,
novos direitos permitindo aos assalariados e aos cidadãos pesar
na escolha das empresas e do país. Enfim, uma reorientação em
profundidade da construção europeia e das relações
internacionais.
Há meses que estamos a discutir estas propostas com os nossos
concidadãos e que recolhemos assinaturas, às centenas de
milhar, pedindo a organização de um referendo sobre a passagem
ou não à moeda única. Também multiplicámos as iniciativas
susceptíveis de relançar uma dinâmica unitária à esquerda,
para uma mudança real.
Dia 29 de Abril último, numa declaração comum, o Partido
Comunista Francês e o Partido Socialista, conjuntamente, sem
esconderem as suas diferenças, nomeadamente sobre Maastricht,
comprometeram-se, em caso de vitória, a contestar os ditames de
uma Europa ultraliberal, a recusar sacrificar a nação e a sua
soberania, e a agir para reorientar em consequência a
construção europeia.
Assim, se amanhã e no próximo domingo conseguirmos que a
esquerda ganhe em França, quanto a nós, proporemos que o novo
governo tenha sobre a questão crucial da moeda única a
posição seguinte: constatemos conjuntamente que é impossível
aplicar as disposições previstas pela marcha para a moeda
única em condições suportáveis para os povos; propunhamos
desde então aos nossos parceiros europeus reabrir negociações
para um novo tratado; enfim, submetamos este tratado reorientado
aos nossos concidadãos pela via do referendo.
A escolha não é, a nosso ver, entre o euro e o enconchamento
nacional. Avançamos a ideia de manter moedas nacionais e, além
disso, um novo "ecu", baseado nelas, melhor dizendo,
uma moeda comum e não única, um verdadeiro instrumento de
cooperação monetária para partilhar despesas; financiar
coproduções criadoras de empregos; realizar em comum projectos
de desenvolvimento das regiões ou dos países que sofrem graves
desigualdades; solidarizarmo-nos contra os especuladores. Numa
palavra: construir realmente a Europa, tal como a desejam os
Europeus!
Sem dúvida que se a França se empenhasse numa tal via, teria
de fazer face a fortes resistências da aliança dos poderosos.
Mas estou igualmente certo que ela poderia contar com uma grande
corrente de solidariedade por parte dos outros povos da Europa,
pois é do interesse de todos nós empreender resolutamente esta
contra-ofensiva progressista. Todos contribuímos, uns e outros,
para fazer amadurecer esta corrente. Foi assim em Paris, no
encontro europeu de 11 de Maio de 1996. Depois, sob as formas
mais diversas, em Madrid, em Berlim e hoje nesta magnífica
concentração de Lisboa. Muito em breve vamos reencontrar-nos
com outros em Amsterdão, depois de novo em Madrid. E,
naturalmente, cooperamos estreitamente no Parlamento Europeu.
Impulsionemos com audácia este entendimento pluralista entre
progressistas, ecologistas, homens e mulheres ligados aos valores
de esquerda e que querem trabalhar juntos para uma mudança real!
Em cada um dos nossos países, na Europa e no mundo.
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