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Orçamento do Estado para 2009 - Intervenção de Eugénio Rosa na AR
Quinta, 06 Novembro 2008

euros.jpgNo debate na generalidade do Orçamento de Estado para 2009, Eugénio Rosa denunciou o discurso propagandístico do Governo que insistindo no "êxito da redução do défice" esconde a gravíssima situação em que se encontram as famílias, com um endividamento que "em 2007 (...) já representava 126% do seu Rendimento Disponível", ou a situação das empresas, particularmente as pme's, que no final de 2007 registaram um rácio de endividamento correspondente a 114% do PIB.

 

Orçamento do Estado para 2009 (debate na generalidade)

Sr. Presidente,
Estado e das Finanças,

Gostaria de lhe colocar uma questão sobre benefícios fiscais.

Não vou suscitar-lhe, de novo, o problema da banca, que paga metade da taxa legal de IRC - estou à espera que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais me forneça elementos que prometeu e ainda não recebi -, mas quero colocar-lhe uma questão relativa aos benefícios fiscais e a um ponto muito concreto do relatório do Orçamento do Estado.

Em 2009, apesar da crise, o volume de benefícios fiscais é enorme, ultrapassando os 3100 milhões de euros.

A parte de benefícios fiscais ligada às empresas, ou seja, no âmbito do IRC, é superior a 2200 milhões de euros.

Estive a fazer uma pesquisa no Diário da República e constatei que, em 2008, só até Setembro, o Governo já tinha aprovado, em Conselho de Ministros, 17 resoluções onde concedia benefícios a grandes empresas.

Depois, cruzei esse dado com um outro que consta do relatório do Orçamento do Estado para 2009 (proposta de lei n.º 226/X), segundo o qual, relativamente aos grandes investimentos, ou seja, associada às grandes empresas, a despesa fiscal é de apenas 10 milhões de euros.

A questão que coloco ao Sr. Ministro é a seguinte: poderá dizer-me quanto é que vão custar, em termos de perda de receita fiscal, as 17 resoluções do Conselho de Ministros que foram aprovadas em 2008?

Há uma resolução, a que concede um grande benefício à Galp, que é a Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2008, em que estimei que o benefício atinja mais de 200 milhões de euros.

Exactamente! 200 milhões de euros! Muitas vezes esse valor seria o necessário para actualizar os escalões do IRS!
Pergunto: em que ano é que isso será contabilizado?

Outra questão que lhe quero colocar tem a ver com as despesas com pessoal.

Estive a analisar os dados que constam do Orçamento e constatei que, em 2009, o Ministério das Finanças vai transferir para a Caixa Geral de Aposentações menos 242 milhões de euros. Simultaneamente, é criada uma nova contribuição, de 7,5%, a incidir sobre as remunerações, a ser paga, agora, pelos serviços.

Da dotação orçamental de que o Sr. Ministro tanto fala e que tanto utiliza para resolver problemas extraordinários, nomeadamente as linhas de financiamento e de apoio à banca, foram retirados, para despesas com pessoal, 399 milhões de euros.

É bom que ouça, Sr. Ministro, porque, depois, quero que me dê uma resposta concreta.

O aumento de vencimentos prometido pelo Governo para a Administração Pública vai custar, em princípio, segundo estimo, cerca de 230 milhões de euros.

Restam 169 milhões de euros.

A questão concreta que coloco é esta: como é que os serviços, com um saldo de apenas 169 milhões de euros, pagarão o acréscimo de encargos de 242 milhões de euros para a Caixa Geral de Aposentações, de acordo com os dados que estão no Orçamento, sem congelar mudanças de posição remuneratória e sem que milhares de trabalhadores sejam despedidos ou mandados para a situação de mobilidade especial?

(...)

Sr. Presidente da Assembleia da República,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

O Sr. Primeiro-Ministro e o seu Ministro das Finanças continuam a falar, muitas vezes, do êxito que é a redução do défice, talvez por não terem nada de mais importante para apresentar ao fim de quatro anos de Governo, mas o País tem coisas mais importantes para as pessoas do que o défice.

As famílias nunca estiveram tão endividadas como agora: em 2007, a dívida das famílias já representava 126% do rendimento disponível, e continua a aumentar; entre Janeiro de 2005 e Setembro de 2008, portanto, em quatro anos de governo socialista, as taxas de juro do crédito à habitação aumentaram 54%, fazendo disparar as prestações relativas à habitação, tornando-as incomportáveis para muitas famílias, sendo que mais de metade das famílias portuguesas estão endividadas com a aquisição da habitação.

E o Governo nada tem feito de prático para reduzir os efeitos sobre as famílias.

As empresas também nunca estiveram tão endividadas como agora.

No fim de 2007, o rácio do seu endividamento correspondia já a 114% do PIB e, com o agravamento da crise, a situação, nomeadamente das pequenas e médias empresas, tornou-se insustentável.

O Governo fala muito na linha de financiamento de 1000 milhões de euros, mas os problemas mais graves das PME são as dificuldades de tesouraria e a linha de crédito de 1000 milhões de euros não tem esse objectivo.

Por que é que o Governo, no lugar de fazer pequenas alterações no pagamento por conta, não acaba com o pagamento especial por conta (PEC) para as PME, como defende o PCP, o que aliviaria estas empresas?

O Governo fala muito do défice orçamental, mas ainda não compreendeu que, mais grave do que este défice, é o défice externo e o vertiginoso endividamento do País, que é um indicador também da falta de competitividade crescente da economia portuguesa. De 2005 a 2007, ou seja, em três anos de Governo socialista, o saldo negativo acumulado nas nossas contas externas somou mais de 45 000 milhões de euros, fazendo disparar a dívida externa, que já é superior a 87% do PIB.

E, de Janeiro a Agosto de 2008, o saldo negativo da balança corrente rondou os 12 500 milhões de euros, fazendo prever que este ano ultrapasse mesmo os 11% do PIB. Isso irá determinar, conjuntamente com o endividamento do Estado devido ao apoio à banca, o encarecimento do crédito no mercado internacional para Portugal, de que o Sr. Ministro das Finanças nunca fala, anulando os efeitos da redução do défice, de que sempre fala.

Em 2007, a transferência de rendimentos para o estrangeiro atingiu 20 000 milhões de euros. Uma parte crescente da riqueza criada em Portugal está, assim, a ser transferida para o exterior para pagar juros e dividendos.

Como consequência, uma parcela importante e crescente da riqueza criada no País já não fica em Portugal.

Entre 2004 e 2007, a percentagem do PIB transferida para o exterior quase triplicou, pois passou de 1,6% para 4,3% do PIB.

O crescimento da economia medido com base no PIB tem sido anémico nestes três anos de governação socialista, mas se o medirmos com base no produto nacional bruto, ou seja, com base na riqueza criada e que efectivamente fica no País, podemos dizer que, nos últimos três anos, temos vivido no paraíso estagnado socialista.

A quebra verificada no PIB potencial, cujo valor é já inferior a 1,5%, fruto também desta política, torna muito difícil qualquer crescimento sustentado elevado no futuro.

A obsessão de reduzir o défice tem levado o Governo a reduzir investimento. Apesar de economistas conceituados, como o Nobel Paul Krugman, afirmarem que numa crise com a gravidade como aquela que enfrentamos «não é o momento de preocupar-se com o défice», o Orçamento do Estado para 2009 continua dominado pela obsessão do défice.

Embora o Primeiro-Ministro diga que o investimento aumenta muito em 2009, a realidade desmente essas afirmações.

Entre 2005 e 2009, o investimento previsto no PIDDAC diminui em 31% em termos nominais, pois passou de 6724 milhões de euros para apenas 4641 milhões de euros, e a parte financiada pelo Orçamento do Estado em 2009 é apenas de 1671 milhões de euros.

Como é possível dinamizar a economia e combater os efeitos da crise com um investimento público tão reduzido?

Em 2009, a injustiça fiscal vai aumentar em Portugal, não respeitando a segunda parte do artigo 103.º Constituição, que estabelece que um dos objectivos da política fiscal deverá ser também «uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza».

No entanto, as receitas obtidas com impostos indirectos, que são os mais injustos, vão aumentar 1,2 pontos percentuais, pois passam, entre 2008 e 2009, de 57,7% para 58,9% das receitas fiscais totais.

Endividamento das famílias e das empresas, aumento da carga fiscal sobre trabalhadores e reformados, quebra no investimento e nas exportações e aumento do endividamento externo, tudo isto num contexto de grave crise internacional, está a determinar que o País caminhe rapidamente para a estagnação económica.

Só o Governo e o Primeiro-Ministro não conseguem ver isto. E não são apenas as previsões coincidentes do Fundo Monetário Internacional e da União Europeia que confirmam isso, o próprio INE tem divulgado quase diariamente informações que revelam quebras importantes em todos os sectores da actividade económica nacional.

O Governo nem vê! No fim de 2004, a população empregada com o ensino básico ou menos correspondia a 72,7% da população total empregada. Em três anos e meio de governação socialista esta percentagem diminuiu apenas 2,7 pontos percentuais.

A este ritmo seriam necessários quase 50 anos para alcançar a média actual da União Europeia.

A nível do ensino superior, o estrangulamento financeiro das universidades e politécnicos imposto por este Governo, associado à introdução do paradigma de Bolonha, está a determinar uma degradação rápida do ensino superior e a transferência de custos incomportáveis para as famílias.

Hoje, para se poder obter o ensino superior completo tem de se tirar o mestrado, que custa, em média, 5000 euros, despesa essa incomportável para a maioria das famílias; 80% do investimento do ensino superior está centralizado na Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que tem critérios de repartição pouco transparentes, privilegiando as universidades privadas estrangeiras.

O desemprego está a aumentar, mas o Ministro do Trabalho gaba-se de reduzir a despesa com o desemprego.

Depois da publicação da nova lei do subsídio de desemprego do Governo socialista, ou seja, entre 2007 e 2009, a despesa prevista com o subsídio de desemprego baixou de 1960 milhões de euros para apenas 1580 milhões de euros, ou seja, 20%.

Em Julho de 2008, o número de desempregados a receber subsídio de desemprego era apenas de 243 000, o que corresponde a uma taxa de cobertura de 59% do desemprego oficial, mas muito menos em relação ao desemprego efectivo total.

É desta forma, e também à custa dos reformados, a quem nega devolver os 55€/dia que lhes tirou, que o Ministro do Trabalho obtém saldos positivos anuais de 1500 milhões de euros na segurança social, que têm servido para reduzir o défice.

O Sr. Primeiro-Ministro afirmou ontem que os trabalhadores da Administração Pública não iriam ter, em 2009, uma diminuição do seu poder de compra.

Em relação a 2008, já tinha prometido o mesmo e os resultados são conhecidos.

Se juntarmos estes dois anos, os vencimentos aumentam 5% e a inflação 5,5%.

A juntar a isto há ainda a acrescentar o aumento de apenas 4,6% nos escalões do IRS, portanto menos do que a inflação e a subida de salários, o que teve também um efeito corrosivo nas remunerações de todos os trabalhadores portugueses, incluindo os da Administração Pública.

Infelizmente, é isto o que vale a palavra do Sr. Primeiro-Ministro.