Partido Comunista Portugu�s
  • Narrow screen resolution
  • Wide screen resolution
  • Auto width resolution
  • Increase font size
  • Decrease font size
  • Default font size
  • default color
  • red color
  • green color
�
�

Intervenção de Agostinho Lopes - Seminário – «2000/2010 Dez anos de política de direita - exigência de ruptura»
Sábado, 06 Fevereiro 2010

 

Segundo o Ministro das Finanças os «Mercados escolheram nova presa», que «somos nós».

A «declaração» e a linguagem são uma «síntese comunicacional» exemplar e expressiva da situação a que foi conduzido este país, pela política de direita. Portugal, os portugueses, «presa dos mercados (financeiros) das agências de rating»!!! É o estado a que chegamos, após mais de três décadas de governos do PS, PSD, com ou sem CDS.

E não sabemos o que mais repudiar. Se o cerviz dobrado da indignidade nacional de governantes perante a potência imperial do grande capital, se a chantagem económica, política e ideológica que, assim, desaba sobre nós! E devemos perguntar:

Então a União Europeia, a moeda única e a zona euro não iam constituir refúgio seguro para a economia nacional? Então a «crise económica» ainda não foi ultrapassada, apesar dos anúncios sucessivos e frequentes de retomas?

Camaradas e Amigos

A década culmina com o pico de uma crise do sistema capitalista mundial. Uma crise que põe a nu, sublinha, destaca, todas as nossas fragilidades, todas as nossas dependências, todos os nossos défices, que faz emergir todas as nossas «crises conjunturais e estruturais».

O estado hoje da Nação é o resultado directo da política de direita, nas suas várias dimensões e áreas, particularmente agravada com a década da moeda única. Estes primeiros dez anos do século XXI, da dita «convergência» económica e monetária da UEM, de Maastricht, do pacto de Estabilidade. A década da Estratégia de Lisboa, firmada durante a Presidência Portuguesa da União Europeia (2000). Era governo o PS, e ia levar-nos para o paraíso da «Nova Economia» (capitalista)!

PS, PSD, CDS-PP tudo fazem hoje para apagar, confundir, mistificar, «com a crise do capitalismo», as responsabilidades / resultados da sua política: desemprego, desigualdades (sociais e regionais), dívidas.
Nós temos o dever e o direito de os denunciar e desmascarar, para assegurar outro futuro para Portugal e os Portugueses.

Para usar uma velha expressão, previmos e prevenimos, ao longo da década, na continuidade coerente da denúncia que fizemos nas décadas anteriores, da recuperação capitalista e latifundista. Da oposição que fizemos ao atrelar do País à integração comunitária capitalista (CEE / União Europeia).

Ao arrepio das políticas de direita levadas a cabo na década, o PCP combateu-as de forma sistemática e persistente.

Combatemos as políticas de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores. As políticas de baixos salários e desemprego, de precarização e «flexibilização». Com alterações / contra-revoluções legislativas das leis do trabalho, ao arrepio da Constituição da República. Com políticas orçamentais sujeitas à obsessão do défice. As políticas que despem o trabalho de todos os seus atributos antropológicos e sociais, direitos e garantias ganhos com a revolução socialista e lutas dos trabalhadores no século XX, reduzido no implacável lógica do capitalismo a capital variável e simples mercadoria. Alguém escreveu recentemente, a propósito das «mortes pelo trabalho» neste reino maravilhoso da União Europeia, que «A crise actual não é apenas financeira, económica, social e ecológica, mas também antropológica. O género humano está ameaçado nos seus valores e na sua existência civilizada pela lógica implacável que faz de qualquer actividade, seja mental ou física, uma mercadoria que, ou é rentável ou se pode deitar fora». Inevitabilidade capitalista, diremos nós!

Esta década de desvalorização do trabalho, a década da flexi-segurança, terminou com o Código Laboral do Governo PS/Sócrates.

Esta questão, como temos repetidamente insistido, não é apenas, e já seria muito, um problema de justiça social. É um elemento crucial da resposta aos graves problemas económicos do País. Aos problemas do endividamento das famílias, da anemia do mercado interno, da necessária superação dos baixos níveis de produtividade.

Combatemos as políticas de recuperação capitalista e monopolista que, através fundamentalmente das privatizações efectuadas nas últimas duas décadas, reconstruíram uma estrutura económico-social determinada / dominada pela ditadura dos grupos económicos monopolistas associados ao capital transnacional.

São estes grupos os principais beneficiários e destinatários das políticas de direita na década: do aprofundamento da exploração capitalista do trabalho, da «privatização» do Estado, da ruína das pequenas empresas – alguns descobrem hoje a razão do PCP na sua oposição às privatizações dos sectores financeiros, da energia, das telecomunicações, etc.. São estes grupos que, em permanente articulação, cumplicidade e promiscuidade com o poder político (PS, PSD e CDS), beneficiam do desvirtuamento e confronto da política de direita com a Constituição da República.

São estes grupos que estão a determinar que hoje, na resposta à crise económica e social, a política de direita sacrifique os mesmos de sempre – em desemprego, congelamento de salários e pensões, com cortes nas políticas sociais e no investimento público – para salvaguarda dos seus patrimónios e rendimentos milionários.

Combatemos (como estamos a fazer com o nosso actual combate ao Orçamento do Estado para 2010) políticas orçamentais que, em obediência ao Pacto de Estabilidade de Bruxelas, sujeitas à obsessão pelo défice orçamental, que outra coisa não é que sujeição à ditadura dos mercados financeiros, sacrifica, inviabiliza as necessárias respostas que a conjuntura económica necessitaria (mais investimento, mais mercado interno), mas também impede um efectivo e estrutural saneamento e consolidação das contas públicas. Política orçamental responsável pela queda radical do investimento público e justificação para as grandes negociatas da década com as ditas parcerias público-privadas, nos hospitais, nas estradas, etc., etc..

Combatemos as políticas que, ao longo da década, reforçaram o papel do capital estrangeiro na nossa economia, atribuindo-lhe a função estratégica de «modernizador» do País. A tudo se sujeitam e tudo lhe deram sucessivos governos do PS, PSD e CDS. Vultuosos dinheiros públicos, nacionais e comunitários, elevados benefícios fiscais, solos gratuitos, agências estatais, como a AICEP, dedicadas ao acolhimento e acompanhamento facilitadores dos negócios. Mão-de-obra barata e mão-de-obra qualificada. Total liberdade para exportação dos lucros.

Os “benefícios” do País também são conhecidos. Deslocalizações, com o seu cortejo de desempregados e encargos para a Segurança Social. Chantagens com as Autarquias e desastres como os da QIMONDA.

Temo-lo dito e redito. Não somos insensíveis ao potencial de algum capital estrangeiro. Outra coisa é a sua ocupação crescente e dominante de espaços estratégicos da economia portuguesa. O acentuar da subcontratação, dependências e vulnerabilidades da economia nacional.

Combatemos as «velhíssimas» políticas de fazer das exportações o princípio e o fim do crescimento económico do País. Agora renovadas e reforçadas pelo PS com o velho Plano de Internacionalização das Empresas. A outra face, das políticas de desvalorização e desprotecção do mercado interno (80% da economia nacional).

O que é extraordinário é que esta obsessão pela «exportação», traduzida em políticas para e pela competitividade das empresas nacionais (centrada nos baixos custos do trabalho), sempre se faz à margem, para não dizer em contradição, e esquecimento de três elementos centrais:

A pouca, ou nenhuma, preocupação das políticas de direita pelo elevado custo dos factores de produção, desfavorável às empresas portuguesas, como a energia, os transportes e as telecomunicações, o crédito e os seguros. (Naturalmente que para não ofender os lucros e rendimentos do capital monopolista que domina as empresas fornecedoras desses bens e serviços).
A pouca, ou nenhuma, preocupação da política de direita pelas políticas comerciais da União Europeia (a quem foi entregue por sucessivos tratados a condução exclusiva da política comercial) virada para a sua total liberalização (conforme os interesses do Directório das Grandes Potências), quer nas negociações bilaterais, quer na OMC. É assim que sectores industriais e agrícolas, essenciais para o País (têxtil por exemplo), têm sido objecto de moeda de troca nos negócios externos da União Europeia.
A pouca, ou nenhuma, preocupação da política de direita pela revalorização do euro face ao dólar e outras moedas. A brutal perda de competitividade do País, com graves consequências para as nossas exportações, mais que previsíveis aquando da adesão ao euro, e não merecendo qualquer reflexão ou intervenção do Governo Português junto do Banco Central Europeu e outras instâncias comunitárias.

Os resultados desta concepção das políticas de exportação e do seu privilégio como agente / motor da economia portuguesa são conhecidos:

A consolidação de um modelo de baixos salários e baixo valor acrescentado, sem evolução significativa na década – basta comparar salários portugueses com os dos outros parceiros europeus – e um agravado défice da balança comercial (de bens e serviços), dos mais elevados da União Europeia, avaliado em função do PIB!

Esta foi também a década de consolidação da política de direita, de  mutilação e subversão das políticas sociais e públicas no ensino, na saúde e segurança social.

Impulsionadas e determinadas pelas políticas orçamentais sujeitas aos ditames do Pacto de Estabilidade, confortados pelas políticas comunitárias, nomeadamente as orientações de liberalização e privatização da Estratégia de Lisboa, essas políticas transformaram os serviços sociais e públicos em espaços de acumulação e expansão do capital privado. De utentes e beneficiários, conforme a Constituição da República, os portugueses transformam-se em clientes, pagando serviços, através de taxas (moderadoras, de acesso às áreas protegidas) propinas, etc., aos parceiros e prestadores privados, de serviços públicos. Se há lugar onde o neoliberalismo brilha em todo o esplendor, é certamente nas políticas públicas de ensino, saúde e segurança social, desenvolvidas nos primeiros dez anos deste século.

Todas estas vertentes das políticas económicas e sociais de direita na década, assumindo de forma plena o capitalismo na sua configuração neoliberal, têm como suporte e motor três processos (já referidos em outras intervenções), convergentes e indissociáveis da política de direita ao longo dos últimos trinta anos.

A subversão da Constituição da República Portuguesa, através de revisões desfiguradoras ou de violação sistemática, por omissão ou acção de princípios, direitos e incumbências prioritárias do Estado consignados no seu articulado.
O processo da integração capitalista europeia, com natural destaque para o salto qualitativo da moeda única na década, com a perda de importantes instrumentos de soberania e limitação da independência nacional, com o crescente comando das políticas nacionais, segundo os interesses do capital europeu e das grandes potências europeias.
A reconfiguração do Estado - papel, conteúdo, funcionamento e organização – subvertendo conquistas e direitos, liberdades e garantias, económicos, sociais, culturais de Abril, em conformidade com os processos e necessidades de financiamento e favorecimento públicos de acumulação do capital, em conformidade com os interesses dos grupos monopolistas de capital nacional, intensa e intimamente associado ao grande capital internacional.

É uma evidência que sem ruptura com os eixos que têm determinado e orientado a política de direita de sucessivos governos, atrás referidos, o País continuará «presa e prisioneiro», e não apenas dos mercados financeiros! Continuará sem resposta aos problemas cruciais do nosso futuro colectivo. Aos problemas da sua própria sobrevivência histórica.

Estamos certos que a luta do nosso povo contra este estado das coisas, pela ruptura com as políticas de direita, constrói a libertação. Uma nova e necessária libertação!