Partido Comunista Portugu�s
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Comissão de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas - Intervenção de José Soeiro na AR
Quarta, 26 Abril 2006
Relatório final da Comissão de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas 

 

 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
 Os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP votaram contra o relatório final. 

Fizemo-lo, porque não é um relatório imparcial e objectivo mas, sim, um relatório elaborado de forma a justificar como boas as opções extrajudiciais dos XIII e XIV Governos Constitucionais, ambos liderados pelo Primeiro-Ministro do PS. 

É um relatório que peca pela omissão de factos relevantes para a compreensão e o apuramento da verdade sobre o processo, que ignora factos fundamentais levantados na Comissão e comprovados pela documentação disponível e que se limita, no essencial, a transcrever para o mesmo os pontos de vista justificativos da opção extrajudicial que tão benéfica foi para a Eurominas. 

É um relatório que põe em evidência a forma superficial com que o senhor relator acompanhou as audições, que denota a falta de rigor que teve na leitura das actas, das quais considerou apenas respostas dos auditados justificativas, no essencial, da opção extrajudicial, ignorando totalmente as perguntas sem resposta colocadas por membros da Comissão, bem como os documentos citados, que sustentavam essas mesmas perguntas e que contrariavam, em muitos casos, as respostas dadas.

 É um relatório que não se priva de citar repetidamente os doutos pareceres de conhecidos jurisconsultos, de que são exemplos os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e Freitas do Amaral, encomendados e pagos pela Eurominas para justificar e defender os seus interesses, mas que ignora os pareceres que os contraditam e que defendem os interesses do Estado talvez porque, como chegou a afirmar o senhor relator, não passavam de pareceres de uns quaisquer «Joaquins das iscas», pelo que não mereceriam a mesma credibilidade. 

Registe-se que entre os «Joaquins das iscas» se contam o Dr. Miguel Serpa Soares, cujos pareceres mereceram os despachos favoráveis do Secretário de Estado Eng.º Consigliere Pedroso e do então Ministro do Equipamento Eng.º João Cravinho, ou do Dr. João Tiago da Silveira, actual Secretário de Estado da Justiça, para não citar o parecer do Professor Sérvulo Correia que, curiosamente ou não, pareceu não existir para os decisores políticos intervenientes no processo. Não subestimámos os pareceres referidos, mas também não os valorizámos, ao contrário de outros, como se constituíssem jurisprudência ou decisão judicial transitada em julgado, perante a qual nada mais haveria a opor. 

Aliás, pela forma manipuladora como a Eurominas preparou o dossier que remeteu à Comissão, temos muitas e sérias dúvidas sobre a base documental que terá fornecido para suporte dos referidos pareceres. 

Do que temos a certeza é que qualquer dos citados jurisconsultos, com o brilhantismo e a inteligência que lhes é reconhecida, se fossem chamados a dar pareceres para o Estado dispondo de uma base documental tão vasta e objectiva como a que nos foi fornecida, depressa produziriam pareceres bem melhor sustentados e absolutamente opostos aos produzidos em defesa da Eurominas. 

Finalmente, o relatório, aprovado apenas com os votos favoráveis dos Deputados socialistas, responsabiliza irremediavelmente o Partido Socialista pelas muitas dúvidas e suspeições que ficam no ar quanto às reais motivações e à justeza das opções tomadas pelos decisores políticos que, em nossa opinião, e com base na documentação disponibiliza a, só favoreceram os interesses da Eurominas. 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
 

Inconformados com o relatório final que nos foi presente, conscientes do profundo e insanável antagonismo entre o conteúdo deste e a documentação disponibilizada à Comissão, e face às contradições de muitos dos depoimentos prestados, os Deputados comunistas tomaram a decisão, «ousadia» nas palavras do senhor relator de elaborar e de apresentar para discussão um relatório alternativo que respondesse com objectividade e rigor às questões justificativas do inquérito parlamentar. 

Apresentámos igualmente uma avaliação ao relatório final que analisa e contradita, quesito a quesito, a leitura defeituosa dos factos feita pelo relator.

 Perante a recusa da sua discussão por parte do PS, apresentámos em declaração de voto os documentos referidos, sustentados na documentação existente sobre o processo Eurominas. 

Esses documentos, ao contrário do relatório final aprovado, sublinham a justeza e a legalidade da reversão do terreno e de todas as benfeitorias para a posse do Estado, sem direito a qualquer indemnização, por incumprimento culposo da Eurominas dos compromissos assumidos para com o Estado Português e para com a EDP, pondo consequentemente como má a opção pela via extrajudicial seguida pelos governos do Partido Socialista, a qual permitiu à Eurominas sair da falência eminente em que se encontrava em Novembro de 1995, livrar-se da dívida de energia de quase 5 milhões de contos que tinha para com a EDP e receber ainda, como compensação, 400 000 contos, retirar todos os equipamentos com valor calculado em 1,52 milhões de contos e receber ainda, pasme-se, a título de indemnização por parte Estado, 2, 384 milhões contos, o que equivale a um valor total de mais de 8 milhões de contos. Os documentos que apresentamos põem em evidência várias contradições.

Entre as diligências comprovadamente desenvolvidas a partir do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros, designadamente junto da EDP e da banca, após a reunião realizada em 29 de Novembro de 1995, entre esse mesmo Gabinete e a Eurominas, e as declarações do então Ministro da Presidência, quando afirma «não fiz, não mandei, não autorizei, não tenho conhecimento de qualquer iniciativa do meu gabinete sobre essa matéria».

 Tivemos, em Portugal, dois governos, Sr.as e Srs. Deputados, um que dizia e outro que desconhecia!

Entre os que, subscrevendo o Protocolo de 1998, afirmaram não ser o mesmo vinculativo para as partes e a exigência da indemnização pela Eurominas, ao abrigo do mesmo, no ano 2000 e a aceitação pelo Estado desse mesmo vínculo e, consequentemente, o pagamento da indemnização. 

Entre as afirmações e o papel do Presidente do Grupo de Trabalho, ultrapassando largamente o seu mandato e as declarações, e as declarações e exigências dos representantes do Estado de uma investigação até às últimas consequências à forma como foram obtidos os valores que acabaram por servir, no essencial, de base à indemnização; entre a afirmação da APSS de 1988 de que o projecto de Acórdão do Tribunal Constitucional estava elaborado em 9 de Junho de 1997 e a sua publicação apenas em Novembro de 2000.

 Entre os valores variáveis de cerca de 1,4 milhões de contos atribuídos à subestação adquirida pela EDP à Eurominas e o valor efectivamente dado como pago, de apenas 10 000 contos, sendo os restantes 390 000 pagos como compensação não se sabe de quê entre as sucessivas declarações de deixar seguir o processo nos tribunais e as sucessivas cedências do Governo face à Eurominas para o seu adiamento. 

Numa palavra: um rol de situações pouco claras a exigir uma intervenção de quem de direito, de forma a que, para bem de todos, não subsistam dúvidas sobre este processo. 

Saudamos, por isso, o despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, no sentido de enviar o processo Eurominas à Procuradoria-Geral da República e da sua publicação no Diário da República. 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

O inquérito à gestão do processo Eurominas coloca-nos a todos perante o desafio incontornável de aprovar com urgência novas regras para a criação e funcionamento das comissões de inquérito. 

É absolutamente inaceitável que a condução de um inquérito fique nas mãos de um só partido, por muito maioritário que ele seja, a exemplo do que agora se verificou com a maioria do PS.

Tal facto pode obstar ao desenvolvimento de diligências essenciais para o apuramento da verdade.

O impedimento, por parte do PS, da audição de pessoas com grande intervenção no processo Eurominas, cujos depoimentos eram da maior importância para a clarificação e apuramento da verdade de alguns dos aspectos mais nebulosos do processo, como, por exemplo, o Dr. Saldanha Bento, administrador da EDP que negociou o acordo EDPEurominas, o Dr. Alfredo Neves, da Direcção-Geral do Património, membro do Grupo de Trabalho e único especialista em condições para proceder à avaliação do património da Eurominas, o Sr. Juiz  Conselheiro Messias Bento, Relator do Acórdão do Tribunal Constitucional, o Dr. Miguel Serpa Soares e o Dr. João Tiago da Silveira são exemplo claro do que acabamos de afirmar.

 A possibilidade de os diferentes grupos parlamentares terem o direito de determinar um número de inquiridos a ouvir, sem possibilidade de veto pela maioria, e a definição dos direitos dos membros que compõem as comissões de inquérito poderão, assim, constituir, entre outras, decisões a tomar, em nome da verdade, da transparência e da eficácia na fiscalização dos actos dos governos.

 A não ser assim, as comissões de inquérito ficarão cada vez mais desacreditadas e as suas conclusões perderão toda e qualquer credibilidade. Aqui fica o desafio.