1. A decisão recentemente tomada pela Comissão Europeia de
prolongamento do embargo à exportação de bovinos e produtos derivados
de bovinos por mais um ano, até 1 de Agosto de 2000, confirma as piores
perspectivas que se acumulavam no horizonte e que o Governo se recusava
a admitir. Recordamos, a propósito, que o ministro da Agricultura
Capoulas Santos, em Janeiro deste ano, afirmava acreditar que o
levantamento do primeiro embargo (que deveria terminar em Agosto
próximo) poderia ser antecipado para Fevereiro passado. Afinal o que se
passou foi exactamente o oposto. Mais um ano de embargo.
A decisão é profundamente injusta para os produtores portugueses já a
braços com uma quebra de rendimento em dois anos sucessivos, quebra de
preços e perda de mercados. E as deficiências que ainda existem em
Portugal no combate à BSE e, sobretudo, no controlo dos materiais de
risco, não parecem ser suficientes para justificar, por si só, o
prolongamento do embargo, sobretudo quando, simultaneamente, a Comissão
Europeia anuncia uma proposta de levantamento do embargo da carne de
bovino britânica a partir de 1 de Agosto.
O Governo português e, em particular o ministro da Agricultura, afirmam
que não há razões técnicas que justifiquem a manutenção do embargo. Mas
se assim é, não se compreende a resposta frouxa do Governo à decisão da
Comissão Europeia, traduzida unicamente numa carta isolada enviada pelo
titular da Agricultura ao Comissário Franz Fishler ainda antes da
decisão da Comissão. Uma decisão desta natureza, que afecta a produção
pecuária portuguesa, exigia não o silêncio mas uma forte intervenção do
primeiro-ministro. Mais preocupado com as viagens pré-eleitorais pelo
País o Eng. António Guterres ignora os problemas da agricultura e dos
agricultores portugueses.
E é esta postura do Governo que o leva a não tomar todas as medidas que
seriam necessárias para eliminar os pretextos da Comissão Europeia para
o embargo. Como o próprio Governo reconhece no dois últimos relatórios,
de Abril e Maio de 1999, sobre a BSE há enormes deficiências tanto na
transformação dos materiais de risco específicos (MRE) provenientes dos
abates de bovinos – como se comprova com os problemas surgidos na
fábrica de processamento contratada para o efeito em Coruche - como na
sua destruição mantendo-se armazenados em armazéns militares mais de 13
mil toneladas de farinhas e gorduras. As fiscalizações realizadas à
circulação de bovinos, designadamente importados, estão longe de
garantir o controle sanitário necessário. Continua por criar, de facto,
o Corpo Nacional de Inspecção Sanitária. O encerramento de 36
matadouros (em vez de se terem aproveitado os últimos anos para
modernizar e equipar com novas tecnologias os que fossem possíveis de
recuperar e sem se garantirem alternativas para os produtores
pecuários), criou novos problemas para os agricultores e vai
seguramente estimular de novo o abate clandestino. A antecipação em
seis meses da implementação do Sistema Nacional de Identificação e
Registo de Bovinos sem terem sido criadas previamente as necessárias
condições está a fazer com que muitos produtores corram o risco de
serem penalizados.
É que não bastam discursos de propaganda do Ministro dizendo que vai
tudo no melhor dos mundos. E as medidas voluntaristas não conseguem
esconder a ausência de medidas estruturais de fundo que nem os Governos
do PSD nem do PS tomaram. A este propósito é preciso afirmar que o PSD
não tem qualquer moral para criticar hoje o que se está a passar em
matéria de BSE. Se o Governo actual do PS acordou tarde para as medidas
necessárias (como se provou na audição realizada na Assembleia da
República por iniciativa do PCP) o Governo do PSD pura e simplesmente
ignorou e escondeu durante anos a existência de BSE em Portugal.
O PCP protesta contra o embargo agora prolongado pela Comissão
Europeia e critica o Governo português por, mais uma vez, não ter
conseguido tomar as medidas que impedissem esta decisão, prejudicial
aos interesses do País e da produção nacional de bovinos. O PCP exige
que o Governo, como um todo, assuma a defesa da produção pecuária
nacional reclamando junto da Comissão Europeia o levantamento do
embargo aos bovinos portugueses e indemnizando os produtores nacionais
pelos prejuízos sofridos.
2. A política agrícola de direita do Governo PS/António
Guterres, na boa continuidade da política agrícola de Cavaco Silva, não
responde às especificidades da agricultura portuguesa e, assim,
periódica e regularmente, ressurgem problemas afectando o rendimento de
muitas explorações agrícolas e pondo em causa a sobrevivência do mundo
rural português.
A mesma política agrícola que não questiona a PAC, que «produziu» vacas
loucas, porcos a mais e frangos com dioxinas, em nome da sacrossanta
competitividade, e cujos responsáveis aparecem agora, para salvar a
face, a imolar a pequena produção pecuária portuguesa no altar dos
interesses da agro-indústria e da agricultura industrial comunitárias.
No sector pecuário permanecem graves problemas de sanidade animal
(brucelose) com o gado ovino e caprino, em particular nas zonas
montanhosas do Norte e Centro do País. Aparecem ainda como problemas de
particular gravidade no momento, embora localizados, as dificuldades
dos produtores de tomate para a indústria na Península de Setúbal face
à infestação das suas terras pelo chamado bronzeamento do tomateiro, e
os problemas de escoamento da batata primor, particularmente nas zonas
do Litoral.
Paradigmática da política do actual Ministério da Agricultura é a não
resolução dos problemas dos rendeiros da Herdade dos Machados (Moura) e
do Monte Pardal (Lentiscais, Castelo Branco), no acesso à posse da
terra que há longos anos exploram de arrendamento.
A resposta do Ministério da Agricultura tem sido não apenas
insuficiente como ineficaz. Mas, mais grave tem sido a tentativa de se
desresponsabilizar com o recurso ao velho truque de atirar as culpas da
situação para os agricultores e organizações agrícolas.
No caso da batata, a medida anunciada de uma ajuda de 8$00/kg ao
armazenamento é manifestamente insuficiente. O ministro «esquece» a sua
falta de empenhamento na criação de uma Organização Comum de Mercado
(OCM) para a batata, há muito reclamada pelos produtores. Isto enquanto
na Alemanha, França, Bélgica e Holanda, os produtores da batata para
fécula contam com uma ajuda de 20$00/kg (campanha 2000/2001). Exige-se
uma intervenção urgente no mercado, devidamente apoiada e conduzida
pelo Ministério, a preço compensador dos custos de produção.
Relativamente aos problemas decorrentes da praga do «bronzeamento», as
suas inevitáveis consequências ao nível de outras produções
hortofrutícolas e a inviabilidade de outras culturas, exigem que o
Ministério tome as medidas necessárias, em diálogo com os agricultores
atingidos.
Face às reclamações dos rendeiros da Herdade dos Machados e do Monte
Pardal, o espantoso é a situação em que o problema se encontra,
passados quatro anos de Governo, tal e qual o deixou o governo do prof.
Cavaco Silva, isto é, sem regularização da situação, com a propriedade
plena das terras pelos rendeiros. Recorde-se que estas terras fazem
parte das demagógicas operações do PSD e do PS, da criação de
confrontos entre os pequenos agricultores e a Reforma Agrária.
Na questão da sanidade animal, de que o problema da brucelose de ovinos
e caprinos é parte, onde aos fortes prejuízos dos produtores, se somam
problemas de saúde pública, encerra-se a legislatura e quatro anos de
Governo sem que nada de relevante se tenha feito para pôr fim ao
descalabro herdado do governo anterior. Não são operações de propaganda
ou fogachos de activismo, como o encerramento de 36 matadouros, que
poderão responder à gravidade dos problemas.
A tudo isto respondeu recentemente Capoulas Santos com o velho truque
dos «agitadores subversivos», das acções dos «profissionais da
política», mais interessados em manifestações que em resolver os
problemas da agricultura.
Este truque converge com uma prática assumida no fim da legislatura,
pondo em causa o único ponto positivo num saldo extremamente negativo
da governação agrícola do PS: o início de um tratamento plural e
idêntico das principais organizações agrícolas nacionais. Valerá a pena
interrogarmo-nos: porque será que, face a tantos e tão graves problemas
agrícolas, o ministro Capoulas Santos nunca tenha reunido, desde que
tomou posse, o Conselho Nacional da Agricultura, do Desenvolvimento
Rural e das Pescas, expressão dessa pluralidade do mundo agrícola
português e estrutura criada pelo anterior ministro Gomes da Silva?
Será a CAP que não deixa?!
(O ministro Capoulas Santos usou, em recente declaração sobre a Lei da
Caça aprovada na Assembleia da República, um truque do mesmo nível.
Referindo-se ao enorme «consenso» obtido pelo Governo na votação dessa
Lei, o ministro sublinhou para o jornalista que apenas «uma parte do
Grupo Parlamentar da CDU votou contra». É um truque baixo: primeiro
porque o ministro Capoulas Santos sabe que não existe grupo parlamentar
da CDU; segundo porque devia ter referido que dos partidos da oposição,
o PSD e o PP se abstiveram, e que o Grupo Parlamentar do PCP (que não é
uma parte de um grupo parlamentar que não existe!) votou contra.
|