Passa este ano, a 7 de Novembro, o 80º aniversário da Revolução de Outubro.
Nela convergiram aspirações e lutas seculares dos explorados e oprimidos
de todo o mundo.
A sua realização vitoriosa desencadeou forças libertadoras que marcaram
decisivamente os progressos alcançados pela sociedade humana neste nosso Século
XX.
Por tudo isso a Revolução russa de Outubro constitui um grande acontecimento
histórico de toda a humanidade.
Mas, 80 anos passados, não é apenas essa a razão para celebrar a Revolução
de Outubro.
Motivo é, também, a sua actualidade, porque nela se contêm as
grandes questões do nosso tempo.
A audácia de dar vida real ao sonho.
O comunismo responde ao sonho antigo de um mundo de Homens livres, trabalhando
solidariamente para uma sociedade de justiça e bem estar, liberta dos grandes
flagelos que marcaram o percurso da história humana: a fome, a guerra, a exploração
e a opressão.
Marx e Engels abriram o caminho para transformar esse sonho num projecto baseado
na realidade social, na análise do processo histórico e na crítica do capitalismo,
apontando as condições para a construção duma nova forma de organização da
sociedade: o socialismo.
Com a Revolução de Outubro, levada a cabo pelos comunistas
russos sob a direcção de Lenin, pela primeira vez na História, socialismo
tornou-se um empreendimento concreto.
Os oprimidos e explorados tomaram nas mãos o seu destino,
erguendo a bandeira vermelha dos trabalhadores.
Esse, só por si, constitui um mérito inesquecível da
Revolução de Outubro.
Um grande sopro de inovações revolucionárias
Tomando o poder nas suas mãos, a classe operária
russa desencadeou um amplo e impetuoso processo de transformações políticas
e sociais que trouxeram um novo horizonte às experiências revolucionárias.
Uma nova forma de poder surgiu, naquelas condições
concretas: os Sovietes, formados pelos representantes dos trabalhadores e do
povo. Um novo tipo de Estado foi criado: o Estado proletário, que pôs fim
à ditadura política do capital.
As riquezas do país foram postas ao serviço
da sociedade, com a entrega da terra aos camponeses e a nacionalização de
empresas, minas e recursos naturais.
O desenvolvimento e aplicação do direito à autodeterminação
dos povos abriu caminho à aliança do movimento operário e socialista
com os movimentos de libertação dos povos oprimidos pelo capitalismo.
O desenvolvimento económico foi posto ao serviço
do desenvolvimento social. Pão, trabalho, saúde, educação, segurança social,
foram pela primeira vez direitos reais, com o primeiro Estado Socialista.
Pela primeira vez na História se viu que é possível
os trabalhadores tomarem nas suas mãos a gestão da sociedade,
e construir uma sociedade de trabalhadores sem capitalistas nem exploradores.
As forças da revolução
A Revolução de Outubro mostrou o papel decisivo da classe operária
nas transformações revolucionárias da nossa época. Foi também uma prova da possibilidade
de juntar à sua volta a grande massa das outras classes e camadas não exploradoras,
na luta pelo progresso social.
Foi a grandiosa movimentação das massas populares,— operários,
camponeses, soldados — que permitiu o derrubamento do despotismo
czarista e do seu aparelho repressivo.
Foi a entusiástica participação da classe operária e das massas
trabalhadoras o que deu suporte e conteúdo às transformações revolucionárias.
Foi a heróica luta dos trabalhadores e do povo em geral que garantiu
a defesa da revolução quando as forças reaccionárias da Rússia e as intervenções
imperialistas tentaram sufocá-la, com mais de oito anos de guerra civil e invasões.
Foi também a entusiástica participação das massas populares e
dos trabalhadores que permitiu a rápida reconstrução do país após a guerra civil
e desencadeou o gigantesco esforço de industrialização que, em menos
de quinze anos, transformou a velha Rússia atrasada do czarismo na dinâmica
União Soviética que foi capaz em poucos anos de ser tornar uma sólida potência
económica.
E foi ainda a empenhada adesão dos povos soviéticos ao regime
e ao Estado criados pela Revolução de Outubro que tornou possível, a custo de
imensos sacrifícios a Vitória da coligação antifascista e a derrota do
nazi-fascismo e dos monstruosos projectos de regressão civilizacional que
ele tentou implantar no nosso século.
Estes factos comprovam a profunda natureza popular e democrática
que ficará a marcar na história a Revolução de Outubro e as suas realizações.
Um partido revolucionário
Experiência de valor universal concretizada na
Revolução de Outubro foi também o papel decisivo da acção de um partido com
um projecto revolucionário de sociedade e com a prática daí decorrente,
claramente assumido como partido de classe, independente, unido, estreitamente
ligado às massas trabalhadoras e populares, capaz de as organizar, mobilizar
e dirigir, ganhando o seu apoio para a luta revolucionária.
Lenin foi o principal inspirador desse partido,
ao qual cabe o mérito de ter sido o dirigente colectivo da Revolução de Outubro;
foi o fundador do Estado Soviético criado com a Revolução; deu uma contribuição
decisiva para a análise das novas realidades históricas desconhecidas no tempo
de Marx, para a definição da nossa época e do novo tipo de sociedade que a revolução
se propôs levar à prática.
A contribuição de Lénin para o desenvolvimento
do marxismo justifica que se tenha passado a designar a teoria revolucionária
da época do imperialismo e das revoluções proletárias como marxismo-leninismo,
cuja verdadeira natureza, ao contrário da dogmatização e cristalização a que
foi sujeito, é ser intrinsecamente um instrumento de análise científica das
realidades em mudança e um guia para a acção, que se deve desenvolver e enriquecer
com o estudo dos novos fenómenos, processos e experiências.
Um património de toda a humanidade
Pelo seu exemplo, pelas suas realizações e pelos apoios que tornou
possíveis, a Revolução de Outubro deu novos impulsos, novos conteúdos, referências
e ânimo ao movimento revolucionário mundial.
Sob o seu impulso criaram-se partidos comunistas em todos os continentes,
o movimento comunista tornou-se um factor determinante na evolução
mundial, outros países tomaram o rumo do socialismo.
A força material, social e política do Estado criado pela Revolução
de Outubro — a União Soviética — além da contribuição decisiva que
deu à derrota da poderosa máquina de guerra do nazi-fascismo, permitiu
a contenção do imperialismo, tornando possíveis a liquidação do colonialismo
e as grandes alterações registadas no panorama mundial no nosso século.
Com o seu exemplo e as suas realizações, a Revolução
de Outubro trouxe para a vida concreta e impôs na consciência do nosso tempo,
mesmo nos países capitalistas, uma nova e mais ampla concepção dos direitos
humanos, alargando-os aos direitos económicos, sociais e culturais. Impulsionou
a universalidade dos direitos políticos e nacionais. Quebrou preconceitos
e barreiras que aprisionavam a condição dos trabalhadores e da mulher.
Abriu caminho a transformações que, em poucos decénios, permitiram radicais
e reais melhorias nos níveis de desenvolvimento e nas condições sociais
dos povos que empreenderam o caminho da construção do socialismo. A sua influência
estendeu-se aos próprios países capitalistas, dando novas forças e confiança
aos trabalhadores, que obrigaram o capitalismo a ceder terreno e a reconhecer
muitas das suas reivindicações políticas, económicas e sociais, graças em grande
medida ao peso da sua concretização prática nos países do socialismo.
A grande ofensiva que, à escala mundial, o capitalismo está a
desencadear, aproveitando a favorável correlação de forças que lhe foi criada
com o desaparecimento da URSS e do socialismo como sistema mundial, para recuperar
terreno e intensificar a exploração, procurando mesmo, em muitos casos, voltar
a impor condições idênticas às do princípio do século, comprova o papel decisivo
e positivo que a Revolução de Outubro e a União Soviética tiveram na
história da nossa época.
Uma reflexão necessária a prosseguir
A construção do socialismo revelou-se mais difícil e complexa
do que esperavam os comunistas. Causas internas e externas, erros graves, desvios
e perversões, levaram a concepções do estalinismo que não foram superadas, ao
burocratismo, formas de corrupção, práticas políticas e de exercício do poder
que falsearam o ideal comunista com um "modelo" que se afastou do
projecto de construção do socialismo, e que generalizadas, copiadas ou impostas,
levaram à derrocada da URSS e dos regimes socialistas no Leste
da Europa.
Retirar as lições desse fracasso é necessário, não só para salvaguarda
do grande património positivo deixado por essas experiências, como para
delas tirar as devidas correcções aos projectos, concepções, propostas e actuações
dos que querem prosseguir e concretizar a luta pelo socialismo.
Questões como as que se referem à essência do Poder, do Estado
e da Democracia; à real intervenção dos trabalhadores e do povo na vida política
e na gestão económica; às formas e ritmos de apropriação e gestão social dos
grandes meios de produção e distribuição dos bens; ao papel do mercado; à generalização,
assimilação e fruição da cultura, da informação e do progresso científico e
técnico; às condições e processos de formação da consciência social; ao aprofundamento
da teoria; e também quanto ao papel, funcionamento, democracia interna, controlo
do exercício do poder e formas de actuação dos partidos no processo da construção
do socialismo — tornam necessária uma reflexão actualizada, tanto
para a recuperação do movimento comunista como para o património de cada partido
comunista.
Defender a memória histórica
Mas fazer a análise e crítica das causas que levaram nos anos
80 à derrota da primeira experiência histórica de construção do socialismo,
iniciada com a revolução de Outubro, não é ceder às pressões dos inimigos
do socialismo que procuram denegrir, caluniar, destruir, tudo o que em nome
do socialismo se fez e faz.
Os objectivos dessa campanha são fomentar a resignação ante as
ofensivas da recuperação capitalista e imperialista, intimidar os defensores
do socialismo, apagar a esperança.
Erros, insucessos, derrotas e desvios sofridos no processo humano
para a realização do projecto revolucionário de Outubro não podem fazer esquecer
os muitos êxitos económicos, sociais e culturais alcançados, nem a sua
influência decisiva nas profundas mudanças, no mundo e na consciência
social, registadas durante o nosso século.
Não só por justiça histórica como pela sua importância
na luta actual contra a regressão capitalista, é indispensável não permitir
que da memória colectiva sejam apagadas as contribuições e realizações que,
para o progresso da sociedade humana, foram resultado das transformações desencadeadas
pela Revolução de Outubro.
Fazer frente à regressão capitalista
Com a perda da URSS foi quebrada uma correlação de forças
que mantinha em contenção as forças mais agressivas e as formas mais brutais
do capitalismo e do imperialismo. Desembaraçado da alternativa representada
pelo campo socialista, o capitalismo desencadeou à escala mundial uma violenta
ofensiva para fazer voltar atrás a marcha da História. Intensifica a exploração
dos trabalhadores e a espoliação dos povos. Proclama e impõe as suas leis como
horizonte inultrapassável não só da vida económica como no conjunto da actividade
humana. Reforça o seu carácter agressivo e de domínio pela força. Nos próprios
países capitalistas mais desenvolvidos os modelos económicos e sociais são reestruturados
em profundidade em detrimento dos trabalhadores, aumenta o desemprego, são desarticuladas
as estruturas de controlo da economia pelo poder político e de protecção social
dos trabalhadores, conquistadas no decorrer do século com a luta e, em larga
medida, pela pressão do confronto com as reais aquisições do socialismo em construção.
Também por isso se confirma a justeza da solidariedade
à União Soviética e à viragem que a Revolução de Outubro imprimiu na vida mundial,
manifestada pelos comunistas, pelos trabalhadores e os povos de todo o mundo.
Mas não só pelo papel que a URSS teve na contenção das forças mais agressivas
do imperialismo e do capital. Também pelo potencial de ânimo, esperança e apoio
que ela representou para a luta de libertação dos trabalhadores e dos povos.
Para fazer frente às ofensivas de regressão capitalista novas
formas e expressões da solidariedade internacional e de cooperação e
unidade dos trabalhadores e dos povos se tornam urgentemente necessárias, dando
conteúdos actualizados ao apelo saído da Revolução de Outubro: "Trabalhadores
de todos os países e povos oprimidos — uni-vos!".
Os comunistas portugueses estão profundamente empenhados no desenvolvimento
desses laços de cooperação internacional.
Para um renovado impulso ao projecto socialista
No limiar do século XXI o empreendimento da superação revolucionária
do capitalismo, iniciado no plano mundial pela Revolução russa de Outubro de
1917, mantem-se como questão central da nossa época.
As imensas possibilidades de promoção do bem estar abertas pelas
realizações do trabalho material e intelectual da humanidade esbarram com as
limitações impostas pela natureza predadora, desumana e irracional do sistema
capitalista, que se tornou cada vez mais destrutivo, tanto da Natureza como
da própria sociedade humana, constituindo não só um sério obstáculo ao progresso
social como uma ameaça para a Humanidade.
Os principais problemas do mundo contemporâneo não podem ser resolvidos
sem ter em conta as propostas e ideias do socialismo.
Contando também hoje, com a grandiosa experiência histórica criada
pela Revolução de Outubro, nos seus tão diversos aspectos, a luta pelo socialismo
está em condições de prosseguir a sua marcha, com uma visão mais rica e profunda,
assente numa experiência disponível que nem Marx e Engels, nem Lenin,
os revolucionários de Outubro e os pioneiros da construção do socialismo detinham.
Oitenta anos depois, as aspirações e projectos que inspiraram
os revolucionários de Outubro de 1917 e as realizações que os mobilizaram mantêm-se
como um acontecimento crucial e decisivo das transformações e avanços
do Século XX. E a causa do Socialismo, pela qual eles lutaram e à qual
deram neste século uma contribuição decisiva, afirma-se como uma necessidade
imprescindível para o futuro da humanidade, como a grande herança e o grande
legado deixado pela História para o Século XXI.
Democracia e socialismo — o futuro de
Portugal
O PCP, no seu total empenhamento na defesa dos trabalhadores e
do povo português, está perfeitamente convicto que o futuro da humanidade e
o futuro de Portugal estará não no capitalismo, mas sim no socialismo
e no comunismo.
Os dados da experiência mostram que o caminho do socialismo exige
que cada país e cada partido procure as suas próprias linhas de orientação,
defina o seu próprio projecto de sociedade socialista, de acordo com as realidades
sociais e económicas do país. O PCP assim tem procurado proceder, rejeitando
modelos feitos ou esquemas e soluções estranhas.
No seu projecto político para Portugal, o PCP sempre esteve atento
à experiência mundial disponível, analisada sem esquematismos e no seu enquadramento
histórico concreto, nas suas aquisições positivas ou negativas, como valiosos
pontos de referência de um socialismo para o nosso tempo e para o nosso
país. Mas a principal referência para o PCP têm sido e são os interesses dos
trabalhadores, do povo português e de Portugal, que o têm orientado na luta
pela liberdade, pelos valores de Abril, pelo futuro socialista de Portugal.
Na proposta de socialismo que apresenta para Portugal o
PCP associa, como objectivos centrais, a abolição da exploração do homem pelo
homem, (com a criação de uma sociedade sem classes antagónicas) e o exercício
alargado de uma democracia avançada, política, económica, social e cultural,
expressa na intervenção permanente e criadora das massas populares em todos
os aspectos da vida nacional.
O PCP considera que, sob o regime capitalista, a liberdade e a
democracia são a cada instante limitadas e postas em causa pela desigualdade
social e a prioridade do lucro capitalista. Sem mudanças profundas no sistema
político do Estado, na propriedade e gestão dos sectores chave da produção e
distribuição, na libertação dos trabalhadores de todas as formas de opressão
e exploração, na formação de uma consciência social e individual em conformidade
com os ideais da liberdade, dos deveres cívicos, do respeito pela pessoa humana
e pela Natureza, da solidariedade, amizade e paz — a democracia não
fica assegurada, nem plenamente realizada.
Por isso o PCP considera o socialismo como condição necessária
para a plena e ampla efectivação da democracia, e o aprofundamento da democracia,
nas suas várias vertentes, como elemento essencial para a construção do socialismo.
O futuro conquista-se com luta
Característica dos comunistas é transformar em realidade as utopias,
os sonhos de uma sociedade mais justa, partindo das realidades concretas, dando-lhes
a força da intervenção das massas e fazendo assim avançar a sociedade para formas
mais perfeitas de realização das capacidades e aspirações do ser humano.
Assim fizeram os trabalhadores que, na Comuna de Paris, se "lançaram
à conquista do céu". Assim fizeram os revolucionários que, em Outubro de
1917, trouxeram para a experiência vivida dos homens conquistas que,
até aí, eram consideradas utopia.
Essa é também uma razão que justifica a actualidade que, 80 anos
passados, faz da Revolução de Outubro um acontecimento que permanece vivo
nos nossos dias e se projecta no futuro da humanidade.
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